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segunda-feira, 6 de fevereiro de 2017

ITABUNA CENTENÁRIA REFLETINDO (2)

De onde viemos...

(Simplesmente espetacular! Não sei quem é o autor. Recebi assim)


"Eu venho de lá, onde o bem é maior. De onde a maldade seca, não brota. De onde é sol, mesmo em dia de chuva e a chuva chega como benção.

Lá sempre tem uma asa, um abrigo para proteger do vento e das tempestades.

Eu venho de um lugar que tem cheiro de mato, água de rio logo ali e passarinho em todas as estações.

Eu venho de um lugar em que se divide o pão, se divide a dor e se multiplica o amor.

Eu venho de um lugar onde quem parte fica para sempre, porque só deixou boas lembranças.

Eu venho de um lugar onde criança é anjo, jovem é esperança e os mais velhos são confiança e sabedoria.

Eu venho de um lugar onde irmão é laço de amor e amigo é sempre abraço. Onde o lar acolhe para sempre, como o coração de mãe.

Eu venho de um lugar que é luz mesmo em noite escura. Que é paz, fé e carinho.

Eu venho de lá e não estou sozinho, “sou catador de lindezas”, sobrevivo de encantamento, me alimento do que é bom, do bem.

Procuro bonitezas e bem querer, sobrevivo do que tem clareza e só busco o que aprendi a gostar.

Não esqueço de onde venho e vou sempre querer voltar.

Meu lugar se sustenta do bem que encontro pelo caminho, junto a maços de alfazema e alecrim.

Assim, sou como passarinho carregando a bagagem de bondade, catando gravetos de cheiro, para esquentar e sustentar o ninho...

Talvez a vida tenha feito você acreditar que este lugar não existe. Te digo: tem sim, é fácil encontrar.

Silencie, respire, desarme-se, perceba, é pertinho. Este lugar que pulsa amor é dentro da gente, é essência, está em cada um de nós. Basta a gente buscar."



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HISTÓRIA DE ITABUNA: Pânico no Montepio

Pânico no Montepio
(Humor)

Em 1930, alguns dias após a vitória da revolução, houve em Itabuna uma reunião na sede da Sociedade Montepio dos Artistas para se tratar de assuntos relativos aos preenchimentos dos cargos públicos, abandonados pelos seus titulares.
      A esta reunião compareceram os representantes de todas as classes, autoridades militares e também um contingente de atiradores do tiro de guerra 500 de ilhéus, sob o comando do tenente Astor Badaró.
      No decorrer da reunião, surgiram algumas discussões acaloradas, com os ânimos um pouco exaltados. Justamente numa destas ocasiões, um dos atiradores notando que o seu fuzil estava com o ferrolho aberto tratou de consertá-lo, sendo que para isso teve de fazer a devida manobra. Ouvindo o barulho característico da manobra do fuzil, o tenente Astor, inadvertidamente, apitou para pedir atenção. foi o bastante para se estabelecer o pânico no apertado salão do Montepio, sendo inteiramente impossível evitar-se a debandada dos que ali se encontravam.
      Apavorados, enquanto uns tratavam de sair pelos fundos, galgando os muros e os telhados das casas que davam para a Avenida Sete de Setembro, outros tentavam sair pela frente.
      Logo na entrada do salão, existia uma grande vitrine, com algumas selas em exposição, obra do artista seleiro José Cupertino de Sousa Gomes. Com o atropelo, os vidros dessa vitrine foram os primeiros que se quebraram, causando ferimentos em alguns.
      Entretanto, um dos apavorados, na carreira em que vinha, entrou pela vitrina adentro, julgando que a mesma fosse a porta de saída. Neste exato momento, uma das selas lhe caiu sobre as costas e ele julgando que fosse alguém que lhe estivesse embargando a carreira, investiu forte carregando a sela nas costas até o meio da rua.


José Dantas de Andrade

Documentário Histórico Ilustrado de Itabuna – 1ª Edição - 1968

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ITABUNA VIVE IMERSA NUM ETERNO VELÓRIO – Braulino Santana

Itabuna vive imersa num eterno velório


          O cortejo dos desesperados, uma leva de gatos pingados e mulambentos, calçados de sandália de dedo de feira, arrasta-se conduzindo o defunto ladeira acima. Repousa no caixão, olhos cerrados e boca em agonia, mais um garoto de 16 anos, apunhalado a facadas na periferia de Itabuna. O velório, numa noite longa, é interrompido vez ou outra por um choro em desconforto. A sensação de abandono sufoca o ambiente, e flagra a ausência de qualquer autoridade pública – um delegado, o prefeito, um promotor, um vereador, nada nem ninguém que ouça aquela história e não a deixe esvair-se em vão.
          Aquela história termina em melancolia, como a de centenas de outras e codifica a falência completa de organização social mínima. É o décimo sexto rapaz assassinado, em menos de dois meses, na cidade que ostenta a macabra cifra de mais violenta da Bahia – a Nigéria do Boko Haram é aqui. Um dilúvio ou uma bola de fogo vinda de um céu com aquelas nuvens de fumaça enegrecida de campos de concentração resolveriam a inação da classe média da outrora ‘capital do cacau’: Itabuna precisa morrer de uma certa forma (na verdade, já está morta, pois lidera o macabro ranking no Brasil com o maior índice de assassinato de jovens em cidades com mais de 200 mil habitantes – a Bahia ocupa o posto de segundo estado no país nesse ranking) para que as suas cinzas modelem um novo começo, novas consciências – a frieza de conviver com índices de violência atormentadores e se fechar num silêncio cúmplice é atitude de gente-defunta. A violência se intensifica e se cronifica por incidir sobre as classes mais desassistidas e periféricas, entregues à própria sorte.
          A bola de fogo poderia começar abatendo certeira, rápida e lancinante as ideias ensinadas nos Departamentos de Direito e de Filosofia da UESC. Aliás, o governo do Estado deveria interditar a UESC – ou lacrar aquilo ali, emulando o fechamento da tampa do caixão de dezenas de jovens que morrem a faca, a bala, a marteladas. Como é possível uma cidade estampar números obscenos de violência e uma faculdade de Direito – lugar onde a noção de Justiça deve ser ensinada e aprendida – sair impune? Para que serve investir tanto dinheiro público em um ambiente narcisista e simbolicamente violento ele mesmo? Quando vociferam por aqueles corredores a demagógica manutenção do “estado de direito”, “estado de direito” é traduzido aqui como a manutenção dos privilégios da classe média calculista no poder ali.
          Se uma universidade não consegue apresentar estudos e alternativas de políticas que combatam aberrações como a violência, ela é defunta por si mesma, e já passou da hora de ser enterrada junto com o banho de sangue com o qual lava as mãos e as enxuga com seus currículos duvidosos. Desconfia-se, portanto, de que onde há violência ou miséria, isso é ensinado e aprendido por gerações, e desconfia-se de que a própria universidade eduque para a morte, já que ela não consegue ensinar a conviver pacificamente ou a estabelecer discussões políticas mínimas que combatam os problemas que suas comunidades pagam para ela ajudar a resolver.
          Sequências de ocupantes daquela reitoria (a atual reitora aparece vestida de vermelho na internet e maquiada na imprensa pedindo ao DNIT, socorro!, uma lombada em frente à UESC) disputam a gestão da universidade sem ser capaz de escrever uma linha sequer sobre os graves problemas da região. Não atuam como intelectuais. Estão ali para ostentar seus carros, maquiagens, perfumes caros, e não apresentam estratégias para refletir sobre o que quer que seja. A reitoria da UESC deveria promover a criação de um núcleo permanente de estudos e pesquisas sobre a violência na região. Estimular e obrigar sociólogos, pesquisadores do direito, pedagogos, economistas, filósofos, cientistas políticos a responder para a sociedade por que ganham salários públicos e se escondem em suas casas de praia, no conforto de suas vidas vazias, deixando a sociedade assolada por problemas sociais inadmissíveis, como a ausência de saneamento e a incidência de violência há décadas.
          Há décadas Itabuna vive imersa em esgotos (o canal do São Caetano e o do bairro Santo Antônio são dois exemplos horripilantes) como se fossem bocas com todos os dentes podres. Carnes são vendidas a poucos metros de fezes naquelas feiras livres – se as autoridades públicas abandonam as populações a comprar víveres ao lado de fezes, isso estimula e justifica a violência numa outra ponta, já que homens e mulheres vão devolver uns para os outros o que receberam. Os investimentos públicos que conseguem escapar da gatunagem do superfaturamento e da corrupção se concentram nos bairros do centro e da classe média. A reforma da Avenida do Cinquentenário – rua central – e o calçamento de bairros como o Jardim Vitória (onde mora boa parte da gente rica) é prova da valorização dos lugares dos endinheirados.
          No ano de 2834, quando essa história for contada como ela de fato ocorreu, Itabuna será lembrada como a cidade do esgoto e dos assassinatos abertos contra pretos pobres da periferia. E suas memórias serão reconstruídas a partir das histórias de diplomados funcionais em direito, economia, pedagogia e filosofia da UESC, reconhecida, então, como a universidade que promovia a morte ou, no mínimo, deixava a morte acontecer.



Braulino Pereira de Santana, doutor em Linguística pela UFBA 


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DE SANTOS DUMONT A EIKE BATISTA – Por Kleber Galvêas

De Santos Dumont a Eike Batista

          Poucos anos após inventar uma maneira de dirigir balões, fazendo-os retornar ao ponto de partida, Santos Dumont decolou com o seu Demoiselle (“senhorita”), o primeiro avião a sair do chão sem um empurrão. O dos Irmãos Wright foi empurrado do chão para cima: através de uma catapulta; pelo interesse do exército americano; financiado por empresários e incentivado pela propaganda nacionalista cabotina.

          Santos Dumont atuava com recursos próprios. Romântico, voltou para o Brasil. Os Irmãos Wright, com espirito weberiano, apoio da mídia, do governo e de empresários, criaram uma empresa. Seus descendentes fabricam peças para aeronaves nos EUA.

          Transcorrido um século, brasileiros continuam desacreditados por parte expressiva da mídia, pelo espírito provinciano, comum entre nós (“Fazer sucesso no Brasil é ofensa pessoal” — Tom Jobin) e principalmente pelo governo que nos descapitaliza tomando o nosso dinheiro, com taxas e impostos abusivos. Não adianta nossa criatividade e espirito empreendedor se não há capital, e os juros sufocam.

          O empresário nacional, mesmo o pequeno, tem que ter manha de camelô: “um olho na esquina, outro no freguês”, ou melhor, um olho no governo e o outro na empresa. Tamanha a burocracia, diversidade e instabilidade legal vigentes.  Em alguns casos, agentes do governo induzem o incauto a saltar obstáculos legais (propinas), como a única maneira de continuar trabalhando.

          A cultura antecede a política que prevalece sobre ela, porque promulga as leis. Culturas diferentes propiciam diferentes políticas e leis próprias.

          Dizem os historiadores que a instituição da propina no Brasil remonta ao tempo das Capitanias Hereditárias. A coisa aqui se fez tão antiga, universal, volumosa e descarada, que acabou se tornando um monstro perigoso para todo mundo, visto por outros países como expressão da deslealdade comercial.

          Uma empresa, ao se expandir, se torna responsável por mais bocas dependentes do salário. O empresário que conhece a cultura local encara a ação paralela (propina) como vital, e, assim, contrata consultores e cria um departamento específico para agir com competência, consoante o ambiente.

          Embora tenha uma boa formação, ele se torna condescendente com o crime quando avalia o interesse pessoal, o da sua empresa e a responsabilidade para com terceiros. Então filosofa: se a Cultura concebe a Política, e os políticos fazem as Leis que nos convidam a transgredir, não há risco. Não será abandonado, com tantas informações, em barco furado, no meio de um oceano de denúncias.
Aconteceu!

          Daí o interesse pelas oportunas palavras do empresário Eike Batista ao embarcar para ser preso no Brasil: havendo culpa, pagar pelos erros cometidos, apoiar a Operação Lava Jato e apostar que, daqui para frente, a relação empresa-governo será diferente, transparente. Subliminarmente ele justificou as delações e indicou que, como a Operação Lava Jato alcança os políticos, a participação das empresas na nefasta rede de corrupção será esclarecida.

          Empresas criam riquezas. Mesmo a elite chinesa, que ontem “xingava” a Rússia de “revisionista”, percebeu que, sem formar uma classe empresarial, não conseguiria sustentar o seu povo e se manter no poder. O gigante chinês, deitado em berço esplêndido, compreendeu e cresceu.

          Acorda Brasil! Punição aos criminosos, vida longa e saudável para nossas empresas! 


Kleber Galvêas, pintor. Tel. (27) 3244 7115 www.galveas.com fevereiro, 2017.

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