Estive no Brasil nas últimas semanas, rodando por São Paulo,
Curitiba, Belo Horizonte e Rio de Janeiro. Nesse não pisava há mais de ano. A
deterioração é visível, especialmente do espírito. O clima é o pior possível.
Com todos que conversei, desde motoristas e cabeleireiros até grandes
empresários, a sensação é de derrota, cansaço e desesperança. Se pudesse, a
maioria se mudava ontem.
As três prioridades identificadas são: segurança, emprego e
resgate de valores morais. Ninguém aguenta mais ser refém dos bandidos, mas
como não é possível se enclausurar e deixar de viver, as pessoas se adaptam,
ainda que com medo. No dia em que fui embora, três senhoras foram assaltadas
por um motoqueiro e seu cúmplice. Basta ver uma moto com alguém na garupa para
sentir calafrios. Isso não é normal, mas o carioca se esquece.
Já a economia é o básico: a condição de vida está ruim para
todos, com 13 milhões mergulhados no desemprego. Motoristas de Uber têm rodado
mais tempo para compensar, e muitos sequer conseguem pagar as contas. Diversos
reclamaram que a situação vem piorando. Dois me disseram que pretendem arriscar
uma ida para Portugal ou Estados Unidos.
A corrupção generalizada e a degradação de valores morais
também jogam lenha na fogueira da revolta. A turma não aguenta mais os
políticos do establishment e a mídia “progressista”, que distorce a realidade e
ignora as demandas do povo em troca de pautas sem sentido, produzidas por
figuras estranhas que querem “lacrar” nas redes sociais. O anseio por algum
“outsider” durão que confronte “isso tudo que está aí” e coloque ordem na
bagunça vem crescendo.
Em palestras para empresários, não foi difícil identificar o
pavor que produz a ideia de um retorno da esquerda radical, por meio de Ciro
Gomes ou do PT. Esse pânico, totalmente legítimo, e a fragmentação de um
“centrão” que não decola, tem feito muita gente esclarecida flertar com a
candidatura de Jair Bolsonaro, como uma alternativa menos pior.
Quando lembram que o liberal Paulo Guedes poderá ser seu
ministro da Fazenda, os riscos são mitigados pelo selo de qualidade, ainda que
o candidato seja o capitão, não o economista. Mas o desespero tem feito com que
o desejo por mudança fale mais alto do que qualquer cautela. Basta andar pelo
País para entender como a “análise” de que Bolsonaro vai desidratar não passa
de pura torcida. O fenômeno é real e bastante significativo, pois ele já se
tornou um símbolo de uma reação a esse caos todo, não importa se com ou sem
fundamento.
Por fim, retornei para minha casa na Flórida. Passei pela
imigração com toda a documentação em dia. O Trump “malvadão” não me separou dos
meus filhos. Os brasileiros esquecem que em países sérios os crimes costumam ser
punidos. Por isso são sérios…
Mike Pence, vice-presidente dos Estados Unidos, desembarcou
em Brasília na 3ª feira, 26 de junho [foto]. De lá foi para Manaus.
No aeroporto manauara, não o esperavam nem o governador nem o prefeito da
cidade. Ficou dois dias entre nós.
O presidente Donald Trump ainda não veio ao Brasil. Em quase
dois anos de governo, visitou a Itália (duas vezes), o Vaticano, Bélgica,
Canadá, China, França, Alemanha, Israel, Japão, Filipinas, Polônia, Arábia
Saudita, Cingapura, Coreia do Sul, Suíça, Vietnã.
Ampliando, até agora não visitou apenas o Brasil, de fato
não pôs os pés em nenhum país da América Latina, coalhada de tradicionais
aliados. A situação reflete deprimente realidade, nem é preciso comentar — para
ambos os lados. Os fatos urram. De passagem, está marcada para 30 de novembro
próximo visita de Donald Trump a Buenos Aires para a reunião do G-20.
Em boa parte, política é símbolo. Em certo sentido, é
sobretudo símbolo. Que a constatação leve a um trabalho sério para aumentar
objetivamente a importância da América Latina.
Repito, Mike Pence desembarcou em Brasília. A primeira
gestão do mandatário, tentou coordenar com as autoridades brasileiras atitude
mais enérgica em relação a Caracas. Mais que mera gestão, veio para isso.
Deveria ter sido recebido com entusiasmo por tal objetivo.
Fracassou redondamente. O chanceler Aloysio Nunes
Ferreira [à esquerda de Mike Pence]jogou um balde de água fria na
esperança do norte-americano que, no caso, só queria mais efetividade e menos
lero-lero na compaixão que sentimos do povo venezuelano e maior consciência das
ameaças pelas quais passa o Brasil. Disse o vice-presidente dos Estados
Unidos: “O Brasil liderou esforços para expulsar a Venezuela do Mercosul,
uniu-se aos EUA para suspender a Venezuela da OEA. Agora, chegou a hora de agir
com mais firmeza, e os EUA pedem ao Brasil e às outras nações mais atitudes
contra o regime de Maduro”.
O recado era direto: chegou a hora de atuar com mais
firmeza, de resolver o caso. A resposta brasileira foi também direta: chegou
nada, não vamos proceder com mais firmeza, vai continuar o lero-lero, azar do
povo venezuelano. Sublinhou o chanceler, ao frisar que a posição dos EUA sobre
a Venezuela não coincide totalmente com a do Brasil. “Somos contra
qualquer iniciativa unilateral em matéria de sanções. Para nós, o tema da
Venezuela está colocado onde deveria estar colocado: na OEA, a Organização
dos Estados Americanos”.
Quem de momento mais sofre com as atitudes lenientes do
Brasil com a ditadura de Maduro? O povo venezuelano. Quem poderia estar se
deliciando com a frieza e o distanciamento do Brasil em relação aos Estados
Unidos? A esquerda em geral, claro, em especial a China comunista. Pode ter
dividendos amazônicos, é o que veremos.
Quem sofrerá duramente no futuro, se o rumo não for mudado?
Nós. Volto a assunto que nenhum brasileiro esclarecido deveria situar fora de
suas preocupações. Michel Temer não visitou Washington. Donald Trump não
visitou Brasília. Michel Temer visitou Pequim. Xi Jingping, presidente da
China, já visitou Brasília. Lembro, política é símbolo.
Política é realidade. Estamos nos lances iniciais de uma
gigantesca disputa comercial entre Estados Unidos e China que pode degenerar em
guerra comercial generalizada e daí, sabe Deus, em embates até piores. Em tais
choques, a China, perdendo mercado dentro dos Estados Unidos, pela força das
circunstâncias buscará novos fornecedores e novas parcerias.
À primeira vista, situação favorável para o Brasil. Poderá
substituir os Estados Unidos no fornecimento de numerosas commodities e
apresentar oportunidades de aplicação de capitais. É, aliás, o que já divulgam
setores ligados aos interesses chineses no Brasil. E vão continuar procurando
criar clima de simpatia pela posição chinesa, por apresentar reflexo favorável
aos interesses brasileiros. De parceiros comerciais seríamos alçados à condição
de aliados estratégicos. Balela, soft powerdiplomacia.
Recolho repercussões iniciais de fenômeno perigoso com
potencial gigantesco de expansão. “Para o chinês, o investimento não é
resultado de uma parceria geopolítica, ele é parte dessa parceria”, declarou
Eduardo Centola, sócio do Banco Modal, instituição parceira da estatal CCCC (China
Communications Construction Company). Aliás, a bem dizer todo o investimento
chinês no Brasil provém de estatais chinesas.
Talvez o Sr. Centola não tenha percebido, mas parceria
geopolítica, por ele tanto elogiada, o que é? Geopolítica. Obviamente,
favorecer interesses chineses nessa parte do mundo. Qual deles salta logo à
vista? Sitiar os Estados Unidos. Aqui está tarefa à qual se prestaria o Brasil.
Vamos adiante. “A China olha o Brasil como um país onde
pode escoar capital, tecnologia e capacidade ociosa”, corrobora Kevin Tang,
diretor-executivo da Câmara de Comércio Brasil-China.
Satisfeita pelo novo quadro, constata Marianna Waltz,
diretora da agência de risco Moody’s; “o Brasil faz parte da estratégia
global [da China] de garantir acesso à matéria-prima e de construir a
infraestrutura necessária para importá-la”. De novo, houve noção da envergadura
do que disse? Pois esse é o papel que desempenhavam as regiões colonizadas em
relação às metrópoles nos séculos XIX e XX. Forneciam matéria-prima, as
potências colonizadoras construíam sua base.
Com esse quadro de conjunto, para qual situação o Brasil vai
sendo empurrado? Para a de Estado cliente. Estado cliente, para quem anda
desmemoriado, é Estado econômico, política, às vezes militarmente subordinado a
outro. Sinônimos da expressão, Estado finlandizado, Estado satélite, Estado
vassalo, Estado tributário, protetorado.
Fascinado por bruxedos aliciantes, passo pesado, o Brasil
bambaleia atordoado numa estrada cujo ponto de chegada — Estado cliente — vem
sendo escondido. À vera, a estação de destino ainda está pouco clara até mesmo
para muitos de seus setores mais responsáveis. Recorro a Mike Pence, chegou a
hora de acordar.
Solenidade de São Pedro e São Paulo – Domingo 01/07/2018
Anúncio do Evangelho (Mt 16,13-19)
— O Senhor esteja convosco.
— Ele está no meio de nós!
— PROCLAMAÇÃO do Evangelho de Jesus Cristo + segundo
Mateus.
— Glória a vós, Senhor!
Naquele tempo, Jesus foi à região de Cesareia de Filipe
e ali perguntou aos seus discípulos: “Quem dizem os homens ser o Filho do
Homem? ”Eles responderam: “Alguns dizem que é João Batista; outros que é Elias;
outros ainda, que é Jeremias ou algum dos profetas”.
Então Jesus lhes perguntou: “E vós, quem dizeis que eu sou?”
Simão Pedro respondeu: “Tu és o Messias, o Filho do Deus
vivo”. Respondendo, Jesus lhe disse: “Feliz és tu, Simão, filho de Jonas,
porque não foi um ser humano que te revelou isso, mas o meu Pai que está no
céu. Por isso eu te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra construirei a
minha Igreja, e o poder do inferno nunca poderá vencê-la. Eu te darei as
chaves do Reino dos Céus: tudo o que tu ligares na terra será ligado nos céus;
tudo o que tu desligares na terra será desligado nos céus”.
Ligue o vídeo abaixo e acompanhe a reflexão do Frei Alvaci
Mendes da Luz, OFM:
---
Quando Jesus é
"rocha" em nosso interior...
“Tu és Pedro, e sobre esta rocha edificarei a minha
igreja...” (Mt 16,18)
Há indicações históricas de que já no séc. IV se celebrava
uma festa em honra de S. Pedro e S. Paulo. Não é fácil descobrir as razões que
levaram aqueles primeiros cristãos a unir em uma mesma celebração litúrgica
duas figuras humanas tão diferentes. O mais provável é porque os dois foram
martirizados em Roma durante a perseguição de Nero e quase ao mesmo tempo. Pode
ser também porque suas sepulturas estivessem juntas durante muito tempo. É
também provável que muito cedo se descobriu a complementariedade desses dois
homens. De qualquer forma, são um claro exemplo de que personalidades tão
diferentes, que inclusive discutiram duramente aspectos importantes da
primitiva fé cristã, pudessem ser dois seguidores autênticos de Jesus.
Mas, desde sempre, Pedro e Paulo foram considerados como as
colunas da Igreja. No caso de Paulo é tão evidente que alguns estudiosos
chegaram a dizer que ele foi o verdadeiro fundador da Igreja, enquanto
organização. Pedro é o personagem mais destacado em todo o NT. Mesmo assim, sabemos
muito pouco de sua vida. Pelo contrário, Paulo é a pessoa melhor documentada. É
o único apóstolo do qual podemos fazer uma biografia quase completa.
O texto do Evangelho da festa de hoje nos ajuda a reler
nossa vida. Ali afirma-se nossa identidade: temos um nome, que carrega algo
sólido, firme, resistente, que não se desfaz com as adversidades existenciais
(crises, fracassos...). A identidade de uma pessoa é dada por aquilo que é
consistente, seguro... no seu interior e não pelo nome em si.
“Tu és Pedro e sobre esta rocha edificarei minha
Igreja..."
E sobre ela, ao longo dos séculos, se assentou a fé dos
cristãos de todos os tempos. Mas a Pedra da qual Cristo fala não é Pedro, pois
a pedra da sua presunção, de sua segurança, de seu orgulho se transformou em
cacos com suas negações na noite da Paixão. Mais tarde, Pedro, estará em
condição de entender que a Pedra é unicamente Jesus. Somente Ele oferece toda a
segurança. Pedro nos alenta na fé: confirma os seus irmãos, mas a fé é em Jesus
Cristo.
O fundamento da Igreja é Jesus Cristo. Quem é decisivo na
Igreja é Ele. O papa, os bispos, a clero tem sua missão e sua importância, mas
a pedra angular é o Senhor. Igualmente decisivo é o Reino de Deus, não a
Igreja. A Igreja é aquela que trabalha em favor do Reino de Deus, mas o
fundamento último é o Reino de Deus. Um Reino de justiça, de amor e de paz.
Mateus, no evangelho deste domingo, nos situa diante de um
jogo de palavras entre “petros” (pedregulho, pedra sem estabilidade e que se
esfarela) e “petra” (rocha firme, consistente). Simão é, por si mesmo, um
“petros”, mas através de sua confissão messiânica, acolhendo a revelação de
Deus e confessando Jesus como o Cristo, Filho de Deus vivo, alargou sua
interioridade para que o mesmo Jesus ali se fizesse “petra” (Rocha –
fundamento). Pedro chega ao grau máximo de identificação com Jesus, que mais
tarde Paulo afirmará: “Não sou eu que vivo é Cristo que vive em mim”. Pedro é
proclamado bem-aventurado porque na sua fragilidade (petros) Jesus se faz presença
solidificada (petra). A Igreja se fundamenta na misericórdia de Deus, não na
força dos homens. A Igreja é a comunidade dos pecadores perdoados, não a
comunidade dos perfeitos.
A primeira coisa que estes dois personagens, Pedro e Paulo,
nos ensinam é que não é nada fácil aceitar a mensagem de Jesus e segui-lo.
Precisamente, os dois foram os mais resistentes, cada um à sua maneira, na hora
de dar o passo e aceitar o verdadeiro Jesus. Tanto Pedro como Paulo eram
pessoas muito religiosas e que se encontravam muito confortáveis dentro do
judaísmo. O encontro com Jesus desbaratou essa segurança e os fez entrar na
dinâmica de uma autêntica relação com o Mestre galileu. Pedro, com toda
espontaneidade, não perde ocasião de manifestar sua oposição àquilo que o Mestre
dizia. Paulo foi um fanático na defesa de sua religião. Por defender o
judaísmo se converteu em perseguidor de todos aqueles que seguiam a maior
heresia surgida dentro do judaísmo: “os seguidores do caminho”.
Mais ainda: pode-se perceber claramente nos evangelhos os
obstáculos que eles tiveram de superar para passar do conhecimento de Jesus à
vivência de tudo o que Ele pregou. Seria muito interessante descobrir que
somente a partir da vivência pessoal alguém pode se lançar à missão de
comunicar uma fé. Isto explica como um punhado de pessoas, em pouco tempo,
foram capazes de transformar o mundo até então conhecido.
Essa dificuldade que Pedro e Paulo tiveram para seguir
Jesus, pode ser de muita ajuda para nós hoje. Pedro, antes da experiência
pascal, seguia a um Jesus que se encaixava em seus ideais e interesses de bom
judeu. Paulo, antes da queda a caminho de Damasco, servia ao Deus do AT que
estava a anos-luz do Deus de Jesus.
Não serve para nada seguir a Jesus sem conhecê-Lo a fundo,
identificando-nos com seu modo de ser e viver. Só depois de termos superado os
nossos pré-juízos, estaremos preparados para despertar nos outros o desejo de
viver o mesmo seguimento. Todos temos de passar pelo doloroso processo de
maturação na fé, pelo qual passaram Pedro e Paulo. No caso deles, a dificuldade
se agravou porque os dois tiveram que dar o salto de uma religião centrada na
Lei a uma experiência interior de seguimento, o que não é em nenhum caso, algo
cômodo.
Da aprendizagem de uma doutrina à vivência do seguimento de
uma Pessoa, há um grande percurso que todos devemos fazer. Sem essa passagem a
fé se converte em pura teoria, que torna estéril nossa vida e nem desperta
sedução nos outros. Talvez esteja aqui a causa de muitos fracassos no caminho
da evangelização. Estamos mais preocupados em “passar” uma doutrina, uma moral,
uma religião... e não deixamos transparecer em nossas vidas que somos
seguidores d’Aquele que é Rocha em nosso interior.
Na origem do discipulado e da igreja está sempre presente a
consciência de termos sido chamados. A vontade e a decisão de cada um são
imprescindíveis, mas são despertadas pela chamado e testemunho de outros, pelo
chamado de Jesus e, em último termo, pelo chamado do próprio Deus. Isso é o que
significa originariamente o termo “igreja” (ekklesia): “comunidade de
chamados”. No chamado de Jesus, Pedro e Paulo reconheceram o chamado de seu
próprio interior, o chamado do povo sofredor, o chamado dos tempos difíceis e,
em última instância, o chamado do Deus grande e próximo que lhes convidava à
identificação com seu Filho e ao compromisso com o Reino.
Texto bíblico: Mt 16,13-19
Na oração: É o Espírito que, guiando-nos pelo caminho da
escuta de nosso “eu interior”, nos faz sentir originais, únicos, sagrados...
A oração é a chave interior que abre caminho para
chegarmos até o “eu original”, aquele lugar sólido, a rocha sobre a qual
construímos nossa vida. Este é o nível da graça, da gratuidade, da abundância,
onde mergulhamos no silêncio, à escuta de todo o nosso ser.
Nossa própria interioridade é a rocha consistente e firme,
bem talhada e preciosa sobre a qual encontramos segurança para caminhar na
vida, superando as dificuldades e as inevitáveis resistências na vivência do
Reino.
- Dê nomes aos seus recursos internos, valores e capacidades,
sonhos e desejos... que dão solidez à sua vida.