Do livro ao grão
Conheço desde
criança, quando lia a Bibliotca Infantil o slogan que vinha no final dos
livrinhos: “Do pinheiro ao livro, uma realização Melhoramentos.” Quando menino,
voltando de trem para Araraquara passava por Caieiras eu via os extensos
bosques de eucaliptos que eram transformadas em papel e depois em livros. Eram
para mim tão encantados quanto as florestas das histórias de João e Maria.
Meses atrás, saí
com minha mulher, para comprarmos grãos de variadas espécies. Castanhas do Pará
ou de caju, frutas secas e oleaginosas, aveia, farelo de trigo e outras que
Marcia mistura na perfeição de uma Bela Gil. Porque faz uma granola que a
família inteira cobiça. Tem a mão, sabe as quantias certas, a temperatura
exata, o tempo de forno. Muitos meses atrás, esperávamos um taxi passar na
Teodoro Sampaio, quando vimos um espaço novo, aberto depois da pandemia. Noz da
Terra, grãos. Vidros e mais vidros contendo tudo que precisávamos. Marcia,
encantada : “Tem mais do que no mercado de Pinheiros.”
Estava cheio,
esperávamos, quando alguém disse: “Loyola, o que faz aqui? Não se lembra de
mim? Guilherme Felipe. Vendi muito livro para você. E já chegou outro: “E eu,
então? Sou o Ricardo Souza.” Tinham sido livreiros na Cultura, naquele tempo
áureo quando chegávamos e cada funcionário sabia tudo, orientava, propunha
substituição correta, não tem esse, mas tem outro na mesma linha. Conheciam
pessoalmente a maioria dos escritores brasileiros, se não tinha o que
desejávamos, nos ajudavam, ligavam para deus e o mundo. Senti diferença na
tarde em que dei ao caixa meu numero de CPF, ele digitou e perguntou:
“Inguinácio?”. Naquele momento senti que algo estava se passando.
E passou. E
infelizmente, deu no que deu. Vivi na Cultura, por mais de quarenta anos,
alguns dos melhores momentos de minha vida. Nunca esqueço eu chegando ao
meio-dia (ideia do Pedro) e sentado até dez da noite assinando livros. Ou os
sábados com o Ives Gandra Martins servindo coxinhas e o Pedro Herz oferecendo
uísque. Quem éramos? Lygia Fagundes Telles, Fábio Lucas, Ana Maria Martins,
Marcos Rey e sua mulher Palma , Ivan Angelo, Mário Chamie, Tereza Collor,
Gilberto Mansur, Bruna Lombardi, Ricardo Ramos, Joyce Cavalcanti.
Ou foram tardes
papeando na mesa do café da livraria com Evandro Ferreira e Leo Lama.
Veio a pandemia,
perdi contatos. Súbito este reencontro. E aqueles vindos da livraria me
oferecendo agora grãos. Do livro, um alimento, ao grão, outro alimento. Faz
meses que o empório me recebe e agora chegou também Flávia Wulf, que também
mexia (como dizem os mineiros) com livros Do livro ao grão uma realização da
necessidade. E da criatividade.
Estado de São
Paulo, 18/06/2023
https://www.academia.org.br/artigos/do-livro-ao-grao
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Ignácio de Loyola Brandão - Décimo ocupante da Cadeira 11,
eleito em 14 de março de 2019 na sucessão do Acadêmico Helio Jaguaribe.
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