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segunda-feira, 17 de dezembro de 2018

“COISAS DA MÃE DE JESUS” - Um relato divertido



São Pedro investiga por onde almas entram no Céu sem sua permissão
Fev 07, 2018

Um relato divertido e piedoso sobre o que Nossa Senhora anda aprontando na janela...

As redes sociais estão compartilhando o relato que reproduzimos abaixo. Certamente não é nenhum tratado de teologia, mas, imperfeições à parte, ele reflete o quanto Nossa Mãe se empenha em nos ajudar a chegar a Jesus – inclusive quando nos custa tanto perseverar na virtude.

Conta-se que São Pedro, certa vez, ficou preocupado ao notar no Céu a presença de várias almas que ele não se lembrava de ter deixado entrar pela porta. Ele então começou a investigar e, finalmente, encontrou o lugar por onde elas passavam.

Dirigiu-se diligentemente até o Senhor e lhe disse:

“Jesus, percebi que temos aqui várias almas que eu não me lembro de ter deixado entrar. Fiz algumas investigações e descobri por onde elas estão entrando. Gostaria que o Senhor mesmo visse”.

Jesus, com toda a Sua serenidade, acompanhou São Pedro e observou que, de fato, havia uma entrada por onde constantemente subiam almas e mais almas até o Céu.

Ainda um pouco alarmado, São Pedro sugeriu:

“Não deveríamos fechar essa entrada, Senhor?”.

E Jesus, sorridente e até encantado com a cena, respondeu:

“Não, não… Deixe assim. Isso é coisa da Mamãe!”

Maria tinha deixado um enorme rosário pendurado à janela e, por ele, a fila de almas ia subindo continuamente até o Céu.

Não é à toa que se diz que, quando os próprios pecadores se fecham as portas do Paraíso com as trancas do pecado, Maria lhes escancara a janela, para que sempre encontrem alguma nova oportunidade.




* * *

UMA TARDE REPETIDA – Ariston Caldas


            A tarde era de sol, algumas nuvens brancas; sentia-se cheiro de enfado.


            Sentou-se num jardim, lembrou-se do colégio de padres onde cursou o segundo grau e tinha uma área ampla com palmeiras, canteiros ajardinados; sentiu sua infância ao olhar uns meninos que passavam vigiados por empregadas domésticas; via moças de short e de tênis, com os cabelos soltos.

            Lembrou-se de Floripes, quase sua noiva, “se eu tivesse casado com ela!” Floripes casou-se com outro e teve um filho excepcional; “se fosse comigo teria ocorrido o mesmo?”

            Olhava para as flores pelos canteiros do jardim, sentia uma brisa esfriante tangida do mar; assustou-se com a buzina de um carro estacionado ao lado; “este filho da puta é doido!” O dono do carro nem o olhou e continuou buzinando.

            No tempo de quase noivo de Floripes era um sujeito alegre, vestia-se bem e não tinha arranhões com a vida, mas o tempo mudou as coisas, pondo-o frente a um mundo diferente, estranho; nem imaginara que tudo mudasse assim. Sentia-se amargo. Naquela tarde sol  voltava a sentir Floripes, quase sua noiva; “Por que aconteceu?” Lembrou Geraldina estendendo a roupa no quintal vizinho, mulata nova, bonita mas de pouco tino, parecendo doida. “Usei Geraldina como se fosse um bicho, na beira do rio, tudo escuro, entre muriçocas e rabanadas de peixes pela superfície.” Geraldina gemia, xingando a princípio, mas aquietou-se depois; saiu toda doída, enxugando-se  com a borda do vestido, desvirginada. “Floripes me deu o troco”.

            Do outro lado do jardim apareceram uns colegiais marchando, com bandeiras hasteadas, repicando tambores lembrou-se do tempo de colégio e da vida militar; não gostava de uma coisa nem da outra, mas as duas se misturavam, os tambores o ensurdeciam, a marcha deixava-lhe uma sensação de cansaço. Fez o curso primário numa escola pública e nas festas cívicas desfilava pelas ruas, de calça curta, tênis brancos apertando os pés, sol pelando, bandeira em punho; quando o desfile passava, os moradores saíam para os passeios, outros se acotovelavam pelas janelas, batiam palmas, davam vivas; depois havia a concentração no meio da praça onde ficavam a prefeitura e a igreja; os discursadores entravam pela noite falando coisas repetidas, exortando os heróis responsáveis pela grandeza da pátria; os tênis apertando os pés, sentia fome, a goela apertando, as pernas fracas. Quando terminava a concentração, ele estava aporrinhado, enrolava a bandeira embaixo do braço e saía desejando que nunca mais houvesse desfile. Naquele tempo Floripes nem existia, ele nem imaginava que ela nascesse e fosse quase sua noiva, casasse com outro para ter um filho excepcional.

            Os estudantes sumiram por uma esquina e o som dos tambores perdeu-se entre os edifícios que não tinham nenhuma pessoa pelas janelas nem pelos passeios. Agora, sentia-se enfastiado, como quem não vai bem de saúde ou de espírito; respirou fundo, levantou-se e esticou os braços, espreguiçou-se. Sempre fui forte!” Mas não reagiu coisa nenhuma.

            Depois do almoço sentiu-se assim e saiu para o jardim; nunca imaginara que Floripes fosse casar com outro, tivesse um filho excepcional; lembrava-se de Geraldina gemendo embaixo, de olhos fechados na beira do rio, enxugando-se depois.

            Agora a noite aproximava-se, voltaria para o pensionato onde dormia, num quarto escuro e estreito, pouca ventilação; dona Eulália sacudindo os móveis velhos, com espanador de penas, cheiro de comida chegando da cozinha; o quarto sempre desarrumado, cheio de sujo, roupas penduradas pela cabeceira da cama, telhado cheio de pucumã. “Seu porco”, dizia dona Eulália; as lagartixas cruzando pelas paredes encardidas.

            Só deitava-se depois da meia-noite, lembrava-se de Floripes, cabelo ondulado. “Devia ser com você”, disse ela na véspera. Ele nem acreditou; baixou a cabeça, calado, e saiu indignado para um jardim parecido com o que se encontrava agora.

            Pensou ainda por alguns instantes, a cabeça pegando fogo. “Um ridículo!” “quanto tempo, parece que foi ontem”, pensou, levantando-se; lembrou-se do sanatório, “um inferno”.

            Passou u’a mão pela testa, repetiu olhares para um lado, para outro e saiu de cabeça baixa, rua a fora, à busca de coisa nenhuma.


(LINHAS INTERCALADAS – 2ª Edição 2004)
Ariston Caldas
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Ariston Caldas nasceu em Inhambupe, norte da Bahia,  em 15 de dezembro de 1923. Ainda menino, veio para o Sul do estado, primeiro Uruçuca, depois Itabuna. Em 1970 se mudou para Salvador onde residiu por 12 anos. Jornalista de profissão, Ariston trabalhou nos jornais A Tarde, Tribuna da Bahia e Jornal da Bahia e fundou o periódico ‘Terra Nossa’, da Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado da Bahia; em Itabuna foi redator da Folha do Cacau, Tribuna do Cacau, Diário de Itabuna, dentre outros. Foi também diretor da Rádio Jornal.

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