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domingo, 20 de janeiro de 2019

EDIFICAÇÃO E ESCÂNDALO – Péricles Capanema


19 de Janeiro de 2019
♦  Péricles Capanema

Durante longos períodos na Idade Média e, mesmo depois, o Papa agiu repetidas vezes como árbitro em conflitos de nações e povos. Dava a última palavra, acatada por imperadores, reis, outros dirigentes temporais. Não era função ligada intrinsecamente ao múnus petrino, mas, entre outros fatores, a enorme respeitabilidade do Soberano Pontífice o empurrava naturalmente, pela força das coisas, para o centro da vida temporal europeia.

Tarefa edificadora, outros tempos. A laicização da esfera civil limitou enormemente seu papel em tais matérias. A Santa Sé, relativamente, poucas vezes agiu como árbitro de forma oficial nos últimos tempos. Mas dessa longa e benéfica presença dos Papas em matérias temporais, ficou o hábito de ouvir o Soberano Pontífice, cuja voz não fere apenas os tímpanos dos católicos, mas de incontáveis pessoas interessadas em conhecer suas tomadas de posição, por sua evidente relação com o destino dos povos.

Contudo, ainda relativamente recente, em nossa época, tivemos eco importante da outrora grande relevância dos Vigários de Cristo na resolução de disputas temporais. Em fins de 1978, a Argentina e o Chile estiveram à beira de conflito armado por causa do Canal de Beagle, no sul do continente; brigavam pela posse das ilhas Picton, Lennox e Nueva.

Fracassados os esforços diplomáticos, em 21 de dezembro, tropas argentinas se puseram em marcha para ocupar as ilhas e, se necessário, até partes do Chile continental. O 4º Batalhão de Infantaria da Marinha tinha ordens para nelas desembarcar em 22 de dezembro. As consequências do conflito militar entre Argentina e Chile, imprevisíveis, mas certamente repercutiriam provavelmente por décadas em todas as Américas.

Basta alinhar o que hoje é admitido em suas linhas gerais. O alto comando argentino previa aproximadamente 50 mil baixas nas três primeiras semanas. O Equador entraria no lado da Argentina. O Peru e a Bolívia apoiariam a Argentina. Os chilenos pretendiam atacar a usina nuclear de Atucha. Não se sabe que posição tomaria o Brasil. A guerra com certeza deixaria sequelas destruidoras, traria dilacerações dificilmente suturáveis na América do Sul.

Poucas horas antes do choque, talvez minutos, Argentina e Chile aceitaram a mediação de João Paulo II, que enviou à região, como seu representante, o cardeal Antonio Samoré. Tendo como pano de fundo a respeitabilidade pontifícia, os dois países, depois de negociações difíceis, chegaram a um acordo, ilhas para o Chile e controle marítimo da área para os argentinos.

Em 29 de novembro de 1984 no Vaticano assinaram declaração conjunta de paz e amizade. Hoje, sem sequelas, são duas potências amigas. Ação papal edificadora ou edificante, se quisermos. Atitudes que constroem.

Viro a página, mas permaneço na América do Sul (e Central) e também em assuntos temporais. Na mensagem de Natal de 2018 (25 de dezembro), o Papa Francisco afirmou “que este tempo de bênção permita à Venezuela encontrar de novo a concórdia e que todos os membros da sociedade trabalhem fraternalmente pelo desenvolvimento do país, ajudando os setores débeis da sociedade”. Sobre a Nicarágua disse: “diante do Menino Jesus os habitantes da Nicarágua se redescubram irmãos para que não prevaleçam divisões e discórdias, mas que todos se esforcem em favorecer a reconciliação e em construir juntos o futuro do país”. Só.

Em 5 de janeiro, 20 ex-presidentes e chefes de governo latino-americanos, entre os quais Oscar Arias, Prêmio Nobel da Paz (1987), ex-presidente da Costa Rica, Eduardo Frei, ex-presidente do Chile, Vicente Fox e Felipe Calderón, ex-presidentes do México, César Gaviria, Andrés Pastrana e Álvaro Uribe, ex-presidentes da Colômbia, Fernando de la Rua, ex-presidente da Argentina, divulgaram severa carta que haviam enviado ao Papa Francisco. De forma serena e respeitosa se confessam escandalizados com a atitude papal por favorecer as ditaduras venezuelana e nicaraguense, assassinas da liberdade e promotoras da miséria popular. Diz a missiva:

“Conhecemos sua preocupação pelo sofrimento que hoje padecem, sem distinções, todos os venezuelanos e, agora, os nicaraguenses. Os primeiros são vítimas da opressão de uma narcoditadura militarizada, que pisa de maneira sistemática os direitos a vida, liberdade, integridade pessoal e, a mais, como consequência de suas políticas públicas deliberadas e de uma deslavada corrupção que escandaliza mundialmente, submete-os a fome generalizada e falta de remédios.

Os segundos, em meados do ano, foram vítimas de onda de repressão com quase 300 mortos e 2.500 feridos. De modo que nos preocupa o chamado de Vossa Santidade à concórdia, já que no contexto atual pode entender-se sua fala como um pedido aos povos, que são vítimas, para que entrem em acordo com seus algozes; no particular, o caso venezuelano, com um governo que causou 3.000.000 de refugiados, numa diáspora que a ONU julga chegará a 5,4 milhões de pessoas em 2019”.

Lembra a seguir o texto, com base em João XXIII, que os que oprimem não contribuem à unidade.

A censura dos 20 presidentes e chefes de governo é gravíssima: para eles, o Papa Francisco está equiparando vítima e algoz, opressores e oprimidos. Com isso favorece o opressor e o algoz. É acusação de conduta escandalosa, demolidora.

Poucos dias depois da carta, em 8 de janeiro, documento oficial da Conferência Episcopal Venezuelana declarou ilegítimo o novo governo Maduro que se iniciaria no dia 10 de janeiro. Afirma o texto:

“É um pecado que clama ao céu querer manter a toda custa o poder e pretender prolongar o fracasso e ineficiência dessas últimas décadas. É moralmente inaceitável. A convocação [da eleição presidencial] foi ilegítima como o é a Assembleia Nacional Constituinte imposta pelo Poder Executivo. Portanto a pretensão de iniciar um novo período presidencial em 10 de janeiro de 2019 é ilegítima”. E reconheceu a Assembleia Nacional como único poder legítimo: “A Assembleia Nacional, eleita com o voto livre e democrático dos venezuelanos, atualmente é o único órgão do poder público com legitimidade”.

No dia 10 de janeiro tomou posse o novo governo, festejado ruidosamente por representantes da China, Rússia, Cuba, Irã, Turquia, Vietnam, Coreia do Norte, (Gleisi Hoffmann, presidente do PT, estava lá, o PC do B também mandou representante, havia ainda outros enviados da extrema esquerda brasileira), — ausentes a maior parte dos países da América do Sul, União Europeia, OEA, Estados Unidos. No meio daquela “societas sceleris” (a expressão brota incoercível, já que ali se reuniam para promover um governo opressor), com luz soturna brilhava monsenhor George Koovakod, encarregado de negócios da Santa Sé, enviado especial, a quem Nicolás Maduro agradeceu a presença no início do discurso. Vem natural à mente a denúncia de Paulo VI de 7 de dezembro de 1968 do “misterioso processo de autodemolição” que se havia instalado na Igreja Católica.

Edificação e escândalo. As intervenções papais nos assuntos temporais edificavam, isto é, construíam. Nossa época tem deixado claro que, para escândalo dos fiéis, podem também demolir. Paro por aqui, as palavras faltam; morrem na boca, sufocadas pelo respeito filial. Deus tenha pena de nós.



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ITABUNA CENTENÁRIA, Curtas e boas - Amorecos, se acalmem!...


Leio aqui uma enxurrada de gente cobrando a tal da investigação, já exigindo pena de morte para o Flávio Bolsonaro, todos revoltadíssimos que ainda não houve conclusão dos fatos!

Calma minha gente, antes disso tem o assassinato do Celso Daniel, tem os fundos de pensão saqueados, tem o enriquecimento dos filhos do Lula, da filha da Dilma, tem a filha do Cunha, tem o BNDES, tem os 12 processos do Renan Calheiros, que não andam, tem a roubalheira do Aécio e da Dilma, do Lindberg e da Gleisi, tem o Temer e sua trupe, tem os saqueadores da Lei Rouanet, tem a morte do Teori Zavaski, tem o caso Marielle, tem a tentativa de assassinato do Bolsonaro, etc. etc. etc.

Vocês estão achando que só porque a Globo quer ferrar com o governo vai furando a fila assim?

Nananinanão, ela nunca cobrou nada nesses 30 anos sem ser a morte da Marielle, de corrupção de seus protegidos, ZERO!

Amorecos, se acalmem, vamos com calma, não entrem na pilha, e deixem de ser manipuláveis!


(Recebi via WhatsApp – autor não mencionado)

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PALAVRA DA SALVAÇÃO (114)

2º Domingo do Tempo Comum, 20 de janeiro de 2019

Anúncio do Evangelho (Jo 2,1-11)

— O Senhor esteja convosco.
— Ele está no meio de nós.
— PROCLAMAÇÃO do Evangelho de Jesus Cristo + segundo João.
— Glória a vós, Senhor.

Naquele tempo, houve um casamento em Caná da Galileia. A mãe de Jesus estava presente. Também Jesus e seus discípulos tinham sido convidados para o casamento. Como o vinho veio a faltar, a mãe de Jesus lhe disse: “Eles não têm mais vinho”. Jesus respondeu-lhe: “Mulher, por que dizes isto a mim? Minha hora ainda não chegou”.
Sua mãe disse aos que estavam servindo: “Fazei o que ele vos disser”.
Estavam seis talhas de pedra colocadas aí para a purificação que os judeus costumam fazer. Em cada uma delas cabiam mais ou menos cem litros.
Jesus disse aos que estavam servindo: “Enchei as talhas de água”. Encheram-nas até a boca. Jesus disse: “Agora tirai e levai ao mestre-sala”. E eles levaram.
O mestre-sala experimentou a água, que se tinha transformado em vinho. Ele não sabia de onde vinha, mas os que estavam servindo sabiam, pois eram eles que tinham tirado a água.
O mestre-sala chamou então o noivo e lhe disse: “Todo mundo serve primeiro o vinho melhor e, quando os convidados já estão embriagados, serve o vinho menos bom. Mas tu guardaste o vinho melhor até agora!”
Este foi o início dos sinais de Jesus. Ele o realizou em Caná da Galileia e manifestou a sua glória, e seus discípulos creram nele.

— Palavra da Salvação.
— Glória a vós, Senhor.


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Ligue o vídeo abaixo e acompanhe a reflexão do Padre Roger Araújo
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Rupnik

“Mas tu guardaste o vinho melhor até agora!” (Jo 2,10)

O Evangelho deste domingo parece estar fora de contexto. Estamos no tempo litúrgico “Ano C” e deveríamos ter presente algum texto do evangelista Lucas. O motivo é que, antigamente, na festa da Epifania, celebrava-se três acontecimentos: a adoração dos Magos, o Batismo de Jesus e as Bodas de Caná.

Atualmente, no dia da Epifania só se celebra o encontro dos Magos com o Menino Jesus; e a liturgia continua celebrando os outros dois acontecimentos nos dois domingos seguintes (1º. e 2º. dom. do Tempo Comum). Por esta razão, lemos o evangelho de João, que é o único que relata as Bodas de Caná.

O evangelista João não diz que Jesus fez “milagres” ou “prodígios”. Ele os chama “sinais”, porque são gestos que conduzem a realidades profundas e decisivas para nossa transformação interior, e que nossos olhos  nem sempre conseguem perceber. Concretamente, os “sinais” que Jesus realiza, orientam para sua pessoa e nos fazem descobrir sua força salvadora. Nessa “transformação da água em vinho” nos é proposta a chave para captar o tipo de transformação salvadora que Jesus realiza e que, em seu nome, seus(suas) seguidores(as) devem oferecer.

O mais surpreendente, no evangelho de hoje, é que João usa a imagem de um casamento para falar-nos das relações de Deus com a humanidade. Tudo acontece no contexto de um casamento, a festa humana por excelência, o símbolo mais expressivo do amor, a melhor imagem da tradição bíblica para evocar a comunhão definitiva de Deus com o ser humano.

A salvação de Jesus Cristo deve ser vivida e oferecida por seus seguidores como uma festa que dá plenitude às festas humanas, quando estas ficam vazias, “sem vinho” e sem capacidade de preencher o desejo de felicidade total.

Deus se manifesta em todos os acontecimentos que nos instigam a viver com mais sabor; Ele não quer que renunciemos a nada do que é verdadeiramente humano. Deus quer que vivamos o divino naquilo que é o cotidiano e o normal da vida. A ideia do sofrimento, da mortificação e da renúncia como exigência divina não tem espaço na experiência evangélica. Deus está presente onde os homens e mulheres se amam, se atrevem a iniciar a travessia da vida na intimidade solidária, em bodas íntimas, mas abertas à solidariedade universal. Ali, nas bodas de Caná, pode-se fazer memória, sem medo e sem mentira, do Deus de Jesus.

Deus é “festeiro” e, certamente, a festa das Bodas de Caná é uma ocasião privilegiada para “sentir e saborear” a presença amorosa d’Ele em nossas vidas. Tal celebração deixa transparecer que Deus não está presente só nos ritos religiosos externos (mais missas sem o pão abundante, mais novenas sem compromissos, mais sacrifícios sem espírito solidário...), mas na festa da vida, no pão e no vinho compartilhados com todos, começando pelos mais pobres e excluídos... “Nosso Deus sempre vem a nós em festa. Deus é festa”.

À semelhança do amor, a festa tem caráter de gratuidade dentro de um mundo mercenário e ingrato que nos cerca; uma gratuidade sem pressas e sem urgências. O ápice da festa é gratuito. Justamente por isso a festa tem algo a ver com o mistério da vida; é esta vida, plena e plenificante, que brota gratuitamente do meio da festa. Por isso, festa não é superficialidade, mas manifestação do mais profundo da vida; ela traz à tona o sentido daquilo que se vive e daquilo que se espera.

A festa verdadeira é subversiva: nasce da vida e remete à vida. 

A mensagem do evangelho de hoje para nós é muito simples, mas provocadora. Nem os ritos e nem as abluções podem purificar o ser humano. Só quando saboreia o vinho-amor do seu interior, ele ficará todo limpo e purificado. Quando ele descobre Deus presente e atuante dentro de si mesmo e identificado com todo o seu ser, será capaz de viver a imensa alegria que nasce desta profunda unidade. Portanto, o melhor vinho está para ser servido e está escondido no centro de cada um. 

Toda pessoa possui dentro de si uma profundidade que é o seu “mistério”  íntimo e pessoal. Na adega interna existe um vinho guardado que procura se expressar (sentimentos, emoções, atitudes e valores, crenças, percepções, motivações...). O melhor de cada pessoa é gestado na profundeza de sua vida; às vezes demora tempo em aflorar, mas está aí latente, esperando um olhar ou uma voz que venha despertá-lo. Quanto mais ela mergulha no seu íntimo, mais percebe esta riqueza. 

Só quando a pessoa se deixa “habitar” por Deus, a água interior vai se transformando num delicioso vinho. E quando o vinho é provado, canta no coração. O vinho é sempre da melhor qualidade, sempre próximo e fácil. É o vinho presente no “eu profundo” que plenifica tudo o que a pessoa é e faz, que dá um sabor especial à sua vida e ao seu compromisso.

“Sentir e saborear interiormente” é expressão da mística inaciana; só quem é capaz de saborear o “vinho interior” de suas riquezas, dons, intuições, inspirações... estará mobilizado para “sentir e saborear” a realidade habitada pela presença d’Aquele que é Fonte dos Vinhos mais nobres.Por isso, é preciso “habitar a própria casa”, aprender a se conectar com as fontes profundas da Vida que nutrem a existência e acalmam a sede de vida plena que pulsa em todos os corações. 

O vinho que brota do coração nos purifica continuamente, nos transforma, dá um impulso vibrante à nossa vivência cristã e, ao mesmo tempo, fornece o elemento vital necessário para que alimentemos novas festas. Não se trata simplesmente de fazer banquetes, mas ser banquete de refeição e amor, de vinho para todos, uma mesa redonda como o mundo: abrir um espaço e tempo de bodas sobre o universo de Deus, sobre o amplo solo da terra, com Jesus como convidado (ensinando-nos a transformar a água em vinho), com Maria como animadora, os convidados como comunidade festiva.

O decisivo é ter acesso ao vinho interior de recursos e energias que procuram chegar à tona, mas muitas vezes encontram resistências e dificuldades. É preciso “descer” até às profundezas para descobrirmos uma nova fonte para a nossa vida; é “descendo” que poderemos revitalizar a vida que se tornara vazia, ressequida e sem sabor. 

Somente quando escutamos a voz que vem lá de dentro e lhe damos a devida atenção é que poderemos encontrar o verdadeiro sabor da vida. Somente ali poderemos recomeçar uma nova relação com Deus e com os convidados; somente ali poderemos sentir quem é Deus e o que é a Sua Graça. Alí nos situamos como realmente somos, mergulhamos nas intenções mais profundas e puras, encontramo-nos cara a cara, como que feitos para a eternidade.

Texto bíblico:  Jo 2,1-11 

Na oração:

- A água transformada em vinho é símbolo de festa, de partilha...

- Chegou o dia da festa para todos, de uma festa que não acaba. A alegria é sem fim porque Deus sempre tira mais e mais vinho para brindar.

- Sua experiência de Deus é vivida somente nos tempos de oração-celebração, ou também é sentida no ritmo cotidiano de sua vida?

- Quem é o Deus em quem você crê? É o Deus da lei, do sacrifício, cuja presença atrofia tudo o que é humano...   ou é o Deus de ternura, o Deus da vida e da festa...? 

Pe.Adroaldo Palaoro sj

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