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segunda-feira, 20 de novembro de 2017

A METÁFORA DAS CISTERNAS E FONTES – Isaias Costa

A metáfora das cisternas e fontes

Eu sou fã de carteirinha do mestre Rubem Alves e ler os seus livros tem me ajudado a ser um professor melhor e um ser humano melhor. A forma simples que ele conseguia transmitir grandes ensinamentos me encanta e faz perceber que a famosa frase do Leonardo da Vinci é a mais pura verdade: “A simplicidade é o último grau de sofisticação”.
Li um texto no qual ele falava sobre as pessoas cisternas e as pessoas fontes. Confira!

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William Blake foi um poeta inglês a quem aconteciam aforismos. Disse «aconteciam» porque aforismos são como relâmpagos. Acontecem. Iluminam repentinamente o céu vindos não se sabe donde. Como os relâmpagos, com um poder para rachar rochas. Hoje um dos seus relâmpagos aconteceu: «As cisternas contêm; as fontes transbordam.»

«Cisternas» são buracos que se fazem na terra para guardar a água da chuva. São muito úteis em regiões áridas onde a chuva é rara e os rios não correm.

A água que a cisterna contém não brota dela. É um outro que a põe lá.

As fontes são outra coisa. São símbolos de vida. Parodiando o Riobaldo eu digo: «Onde as fontes borbulham tudo é alegria.»

Para se ter uma fonte não é preciso cavar. É a própria água que cava o seu buraco. A terra não consegue conter a sua pressão para sair. É uma erupção vulcânica, a terra ejaculando a vida.

Olhando-se para o fundo de uma fonte através de sua água cristalina a gente vê a areinha a ser lançada para cima pela força da água. A água vai saindo sem parar até que transborda dos limites do seu buraco, transformando-se num filete de água que pode, eventualmente, transformar-se num rio.

Um outro aforismo de Blake dá-nos a chave para decifrar o sentido deste: «O homem que nunca altera suas opiniões é como água parada: gera répteis na sua mente.» Cisterna é um lugar de água parada que pode gerar répteis. A «fonte» é um lugar de águas sempre novas que transbordam.

São metáforas de dois tipos de pessoas. Há pessoas que são «cisternas» e há pessoas que são «fontes».

E são metáforas de dois tipos de educação. Há uma educação cisterna e uma educação-fonte.

A educação cisterna quer encher o buraco chamado aluno com uma água que não brota dele. A educação-fonte não quer colocar água dentro do aluno. Quer é fazer brotar a fonte que mora dentro dele, escondida.

Lembrei-me do Pequeno Príncipe: «O deserto é belo porque em algum lugar ele esconde uma fonte».
Uma criança é bela porque dentro dela há uma fonte escondida.
Toda a gente tem uma fonte. Com frequência essa fonte está enterrada com entulho.

Rubem Alves

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Sendo professor eu posso afirmar que nosso sistema educacional ainda é extremamente arcaico e contribui para que nossos queridos alunos deixem de ser fontes e passem a ser cisternas.

O que leva a isso é o modelo conteudista. Tem um professor especializado para cada matéria: Matemática, Física, Química, Biologia, Português, Inglês, História, Geografia…

O objetivo é encher o máximo possível os alunos de conteúdos. Para que? Nem os professores sabem explicar.

Quando os alunos perguntam pra que precisam estudar tanta coisa, a resposta quase unânime dos professores é: “Você precisa disso pra fazer a prova do ENEM. Depois que você passar nunca mais vai precisar disso novamente…”.

E infelizmente, eu também digo a mesma coisa, porque é a verdade do nosso país! Aproveito até para comentar sobre a última prova do ENEM, a do ano 2017. Comparada com os anos anteriores, ela estava absurdamente mais difícil e específica. Foi-se o tempo no qual a prova era aquele mamão com açúcar para interpretar um gráfico simples ou uma tabela mais simples ainda.

Eu sou formado em Física e teve questões de Física que se você me perguntar como resolve eu vou dizer simplesmente: “Não sei!”. Tamanho era o grau de dificuldade dessa prova.

Não consigo imaginar como uma prova como essa pode contribuir para que os estudantes sejam fontes. Ela só reforça o modelo que já vem se perpetuando há séculos.

Antes de concluir, quero comentar sobre algo que já falei tempos atrás na fanpage do blog e ilustra perfeitamente a proposta do texto do Rubem.

Em 2013 eu dei aula em uma escola da periferia de Fortaleza. Uma escola na qual a quase totalidade dos alunos eram muito pobres e desfavorecidos.

Foi uma verdadeira oficina de aprendizados na minha vida o tempo que fiquei lá. Sempre digo que eu aprendi muito mais com os alunos do que fui capaz de transmitir a eles.

Tinham alunos com capacidades natas extraordinárias, que não eram valorizadas por causa do contexto no qual viviam. Dentro de uma periferia, com mortes e assaltos acontecendo quase em cada esquina!

Um aluno em especial era o líder de uma das turmas. Era muito querido pelos colegas e deixava o ambiente da sala com uma energia incrível.

Era comunicativo, sabia se expressar como ninguém, tinha liderança, sabia tocar vários instrumentos musicais sem nunca ter feito escolinha de nada. Sabia atuar em peças de teatro com uma destreza que me deixava de queixo caído etc.

No entanto, ele detestava Matemática e Física, as disciplinas que ministrava. A gente se dava super bem e ele tinha um enorme respeito por mim. Mas quando chegava as provas, seu resultado era um desastre total, e quando chegava a hora de dar a nota dele, e me “estrebuchava” como se diz. Eu dizia pra mim mesmo: “Quem sou eu pra dar uma nota dessa para um garoto tão bom, tão talentoso?…”.

Eu me sentia muito mal em fazer isso. Estava, ao lhe dar nota baixa, lhe fazendo se transformar em uma cisterna e deixando de ser uma fonte.

Se ele fosse incentivado a fazer um curso de teatro ou de comunicação e se desenvolvesse nisso, certamente ele se tornaria mais e mais fonte a cada dia, mas a escola faz o contrário, ela enterra esses talentos incríveis.

Esse é só um exemplo do que acontece o tempo todos nos 4 cantos desse país. Qualquer professor de escola que ler esse texto vai se identificar com o que estou dizendo. Isso é praticamente um desabafo em relação a um sistema educacional que já faliu há muito tempo e me parece que vem ganhando força. Foi por isso que comentei sobre a prova ENEM 2017.

Reflita sobre esse genial texto do mestre Rubem Alves e esse relato vivido por mim e procure alimentar o lado fonte que certamente existe dentro de você e que talvez esteja adormecido por causa da vida e da sociedade que acabaram lhe transformando numa cisterna…


ISAIAS COSTA
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Isaias Costa, 28 anos. Sou Bacharel em Física e Mestre em Engenharia Mecânica. Descobri o meu amor pela escrita nas dificuldades que passei no meu caminho, aliado ao prazer de ler sobre Filosofia, Psicologia e Teologia. 

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20/11 - DIA NACIONAL DA CONSCIÊNCIA NEGRA

Dia da Consciência Negra é comemorado em 20 de novembro em todo o país. 

A data homenageia o Zumbi, um escravo que foi líder do Quilombo dos Palmares. Zumbi morreu em 20 de novembro de 1695.

O objetivo do Dia da Consciência Negra é fazer uma reflexão sobre a importância do povo e da cultura africana, assim como o impacto que tiveram no desenvolvimento da identidade da cultura brasileira.

A sociologia, a política, a religião e a gastronomia entre várias outras áreas foram profundamente influenciadas pela cultura negra. Este é um dia de comemorar e mostrar profundo apreço pela cultura afro-brasileira.

Origem do Dia Nacional da Consciência Negra

O Dia da Consciência Negra foi estabelecido pelo projeto Lei nº 10.639, no dia 9 de janeiro de 2003. No entanto, apenas em 2011 a presidente Dilma Roussef sancionou a Lei 12.519/2011 que cria a data, sem obrigatoriedade de feriado.

No entanto, atualmente, o Dia Nacional da Consciência Negra é considerado feriado em mais de mil municípios.

História de Zumbi

No período do Brasil colonial, Zumbi simbolizou a luta do negro contra a escravidão que sofriam os brasileiros de etnia negra. Zumbi morreu enquanto defendia a sua comunidade e lutava pelos direitos do seu povo.

Os quilombos, liderados por Zumbi, formavam a resistência ao sistema escravocrata que vigorava, e eram os principais responsáveis pela preservação da cultura africana no Brasil.


Zumbi lutou até a morte contra a escravidão, que só viria acabar em 1888, com a abolição oficial da escravatura no Brasil, cerca de 193 anos após sua morte.

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