Qual dessas representações (esta acima ou a imagem abaixo)
da Anunciação glorifica mais a puríssima Mãe de Deus?
Luis Sérgio Solimeo
Um espetáculo que não se pode deixar de qualificar como
sacrílego realizou-se no dia 27 de janeiro em presença do Papa Francisco,
durante a Jornada Mundial da Juventude no Panamá.1 Os atores
ridicularizaram o mistério da Anunciação e trataram Nossa Senhora com grande
irreverência. Apesar disso, no final da apresentação, o Papa aplaudiu e deu a
sua aprovação.22
Nessa peça
burlesca, a Virgem Santíssima é apresentada como “uma jovem normal, uma
jovem de hoje”, como a definiu recentemente o Papa Francisco.3 A jovem que
interpretou Nossa Senhora usava tênis, calça masculina ajustada e uma blusa
folgada de cor azul claro. Sua cabeça estava descoberta, e seu celular à vista.
O “anjo Gabriel” foi interpretado por um rapaz com calça, camisa e chapéu
brancos, tendo um par de pequenas asas preso às costas.
Qual dessas representações (esta ou a imagem no alto do
artigo) da Anunciação glorifica mais a puríssima Mãe de Deus?
Em uma
paródia da Anunciação, o “anjo” diz a “Maria” que ela se tornará mãe por obra
do Espírito Santo. Ela se mostra nervosa, quase histérica, e diz que ainda não
está casada com José, não está pronta, tem que ir à universidade, tem medo etc.
O “anjo” trata de convencê-la, e lhe diz que deveria regozijar-se. Cada vez
mais nervosa, ela responde que não pode regozijar-se: “Que dirá José? Que
pensará sua mãe quando souber? E os vizinhos?”
Então a
mulher começa a cantar que tem medo, se sente despreparada, e outras coisas. O
“anjo” a toma pelas mãos, dizendo que ela é a eleita, e ambos começam a dançar.
Outras “anjas” bailarinas, descalças, entram rodopiando, com vestes flutuantes,
como em qualquer espetáculo teatral obsceno.
Em seguida,
“Gabriel” e as “anjas” bailarinas põem uns óculos carnavalescos, e todos dançam
em ronda, cantando em termos semelhantes aos das Escrituras. “Maria” continua a
dizer que tem medo, mas logo começa a cantar as palavras do Evangelho, sempre
em ritmo pop: “Faça-se a tua vontade”.Em meio a risos, ela toma seu
celular e faz uma selfie com “Gabriel”. Outras duas moças sobem ao
palco, e dizem que o resto da história é bem conhecido: Jesus veio a nós e nos
deu seus ensinamentos.
Entra
depois no palco um time de futebol, representando os 12 Apóstolos, declamando e
cantando que têm medo de evangelizar, porque serão perseguidos. Surge então um
grupo de “policiais”, e os “apóstolos” fogem. Os “policiais” começam a cantar e
bailar loucamente, e depois se vão.
Os
“apóstolos” regressam ao cenário e continuam a cantar e dançar em coreografia,
repetindo sempre: “Tenho medo”. Depois de algum tempo dançando e
cantando, “Maria” se aproxima deles, segura suas mãos e diz que já falou com
“Gabriel”, e tudo funcionará.
Logo se
ouve uma voz forte pelos altofalantes: “Recebe o Espírito Santo, não
tenhas medo, regozija-te, e vai evangelizar”. Todos então se ajoelham,
levantam-se e começam a cantar junto com as bailarinas “anjas” e “Gabriel”. Em
seguida uma dança louca e uma canção, da qual participa “Maria”.
Quando
terminou a paródia sacrílega da Anunciação e Pentecostes, o Papa Francisco fez
um gesto de aprovação entusiástica. Depois se levantou e saudou efusivamente os
dois atores principais. Se já é extremamente grave a própria presença do Papa
em uma apresentação sacrílega como essa, tanto mais sua manifestação de apoio
irrestrito.
Encenação da doutrina do Papa Francisco
Essa
paródia parece ilustrar a doutrina do Papa sobre a Santíssima Virgem Maria. Com
efeito, há declarações dele sobre Maria Santíssima que contradizem tudo o que
veneramos e encontramos nos Evangelhos, na Tradição e no Magistério da Igreja,
bem como no sentimento dos fiéis. Recentemente assinalou que Maria “não
nasceu santa”, negando implicitamente o dogma da Imaculada Conceição.4 Suas
concepções sobre Nossa Senhora estão resumidas em seu livro-entrevista, ao
jornal italiano “Corriere della Sera”:
“[Uma]
jovem normal, uma jovem de hoje… normal, normalmente educada, disposta a se
casar, a ter uma família. […] Logo depois de conceber a Jesus, [ela] era ainda
uma mulher normal. […] Nada foi excepcional em sua vida, [ela era] uma mãe
normal: inclusive em seu matrimônio virginal, casta nesse sinal de virgindade,
Maria era normal. Ela trabalhou, fez compras, ajudou a seu Filho, e auxiliou
seu esposo. Normal”.5
Bem o contrário de tudo isso é o que nos diz o Papa Pio XII,
de saudosa memória, na encíclica Ad Cœli Reginam, de 11 de outubro de
1954, na qual estabelece a festa da Realeza da Santíssima Virgem Maria:
“Desde
os primeiros tempos os cristãos creram, e não sem razão, que Ela, de quem
nasceu o Filho do Altíssimo, recebeu privilégios de graça sobre todos os demais
seres criados por Deus. […] E quando os cristãos refletiram sobre a conexão
íntima que existe entre uma mãe e um filho, reconheceram facilmente a suprema
dignidade real da Mãe de Deus”.6
Nada é mais caro ao coração católico do que a honra da Mãe
de Deus, a Amada Filha do Padre Eterno, a Admirável Mãe do Filho de Deus, e a
Esposa Fidelíssima do Espírito Santo. O fato de o Papa Francisco tratar de
maneira simplista e confusa os temas mais delicados e complexos não elimina,
antes aumenta o dano que suas declarações fazem às almas, como as que se
referem a Nossa Senhora. Sua maneira confusa, improvisada e contraditória de
falar é incompatível com o ensinamento verdadeiro, claro e lógico da Igreja, e
com a missão do Papa de confirmar os irmãos na Fé.7
Ao
expressar a nossa indignação pela ofensa feita à Virgem Maria, nossa Mãe
Santíssima, nessa paródia teatral da Anunciação e de Pentecostes, apresentada
diante do Sumo Pontífice e com o apoio dele, sugerimos a todos os leitores que
façam atos de reparação por esse evento.
________________________
Notas:
1. “O sacrilégio é, em geral, a violação ou o tratamento
injurioso de um objeto sagrado. Num sentido menos apropriado, qualquer
transgressão contra a virtude da religião seria um sacrilégio”. – J. Delany,
s.v. “Sacrilege”, The Catholic Encyclopedia, (New York: Robert Appleton
Company, 1912). http://www.newadvent.org/cathen/13321a.htm.
4. No dia 21-12-18, o Papa Francisco declara aos empregados do
Vaticano: “Então, quem está feliz no presépio? Nossa Senhora e São José
estão cheios de júbilo: olham para o Menino Jesus e sentem-se felizes porque,
depois de numerosas preocupações, acolheram esta Prenda de Deus, com tanta fé e
tanto amor. ‘Transbordam’ de santidade e, por conseguinte, de alegria. E vós me
direis: claro! São Nossa Senhora e São José! Sim, mas não pensemos que foi
fácil para eles: não nascemos santos, tornamo-nos, e isto é válido também para
eles”.http://w2.vatican.va/content/francesco/es/speeches/2018/december/documents/papa-francesco_20181221_dipendenti-vaticani.html.
5. Papa Francesco: “La Chiesa è popolo, l’élite il peccato,”
Corriere della Sera, Oct. 7, 2018,
https://www.corriere.it/cronache/18_ottobre_07/papa-francesco-chiesa-popolo-elite-peccato-2ab8a8ce-ca64-11e8-8417-701d201b7018.shtml.
Ver também, Luiz Sérgio Solimeo, artigo citado.
— Proclamação do Evangelho de Jesus Cristo + segundo
Lucas.
— Glória a vós, Senhor.
Naquele tempo, Jesus contou uma parábola aos
discípulos: “Pode um cego guiar outro cego? Não cairão os dois num buraco?
Um discípulo não é maior do que o mestre; todo discípulo bem
formado será como o mestre.
Por que vês o cisco que está no olho do teu irmão, e não percebes
a trave que há no teu próprio olho?
Como podes dizer a teu irmão: ‘Irmão, deixa-me tirar o cisco
do teu olho’, quando não percebes a trave no teu próprio olho? Hipócrita! Tira
primeiro a trave do teu olho, e então poderás enxergar bem para tirar o cisco
do olho do teu irmão.
Não existe árvore boa que dê frutos ruins, nem árvore ruim
que dê frutos bons. Toda árvore é reconhecida pelos seus frutos. Não se colhem
figos de espinheiros, nem uvas de plantas espinhosas.
O homem bom tira coisas boas do bom tesouro do seu coração.
Mas o homem mau tira coisas más do seu mau tesouro, pois sua boca fala do que o
coração está cheio”.
Ligue o vídeo abaixo e acompanhe a reflexão do Pe. Roger
Araújo:
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Coração Divinizado
“O homem bom tira coisas boas do bom tesouro do seu coração”
(Lc 6,45)
A antropologia bíblica considera o coração como o interior
do ser humano em um sentido muito mais amplo que o das línguas latinas, que
evocam a vida afetiva, a sede dos sentimentos... O coração é o centro de nosso
ser, o nosso cerne mais íntimo, o coração do coração, que consiste, sobretudo,
no lugar do encontro com Deus.
“O sentido de nossa vida não é outro que a busca deste
lugar do coração” (Olivier Clément). Ou seja, no centro de nós mesmos,
unificando nosso ser, está o coração, o “cofre” onde se guarda/oculta o que é
mais nobre em nós. Por isso Jesus dava tanta importância ao coração: “a boca
fala daquilo que o coração está cheio” (Lc. 6,45); “Bem-aventurados os puros de
coração, porque verão a Deus” (Mt. 5,8).
É no “coração” que as forças vitais se acham
disponíveis para ajudar a pessoa a crescer dia-a-dia, tornando-a aquilo para o
qual foi chamada a ser. Trata-se da dimensão mais verdadeira de si, a sede das
decisões vitais, o lugar das riquezas pessoais, onde ela vive o melhor de si
mesma, onde se encontram os dinamismos do seu crescimento, de onde partem as
suas aspirações e desejos fundamentais, onde percebe as dimensões do Absoluto e
do Infinito da sua vida.
O coração do ser humano é a própria fonte de sua
personalidade consciente, inteligente e livre. É o lugar de suas escolhas
decisivas, da lei não escrita e da ação misteriosa de Deus. Trata-se do centro
existencial que permite à pessoa orientar-se como um todo e plenamente em
direção a Deus e ao bem. No coração está gravada a imagem divina oculta, “o
homem de coração oculto” (1Pd. 3,4). S. Serafim de Sarov o denomina “o altar de
Deus”.
Aqueles que descem às profundidades do seu interior ficam
fascinados pelo esplendor daquilo que contemplam. O coração de cada um está
habitado de sonhos de vida, de futuro, de projetos; aqui, todo ser humano
sente-se seduzido pelo que é verdadeiro, bom e belo; busca ardentemente a
pacificação, a unificação interior, a harmonia com tudo e com todos...; sente
ressoar o chamado da verdade, o magnetismo do amor, da plenitude; sente-se
atraído por um desejo irreprimível de autotranscedência...
Por ser livre e responsável, o ser humano é capaz de
decisões e de realizações, de ser artífice de seu destino e de sua história.
Ele sente por dentro o impulso para a expansão de si; ele escuta por dentro o
chamado a viver e a viver em plenitude. Nesse sentido, o “coração” é, de nossa
parte, o espaço divino por excelência. “Só o amor pode adentrar-se no Deus que
é amor”. Assim, a descoberta do próprio ser profundo aproxima cada um do
autor da vida: Deus.
É no coração, “última solidão do ser”, que a pessoa se
decide por Deus e a Ele adere. Aqui Deus marca “encontro” com cada um. “Deus é
mais íntimo a cada um de nós do que nós mesmos” (S. Agostinho). Chegar ao lugar
do coração é dom de Deus: “Eu lhes darei um coração para conhecer-me; saberão
que eu sou o senhor. Eles serão meu povo e eu serei seu Deus; eles se
converterão a mim com todo seu coração” (Jer. 24,7). Eis o “lugar” onde
poderemos estar em segurança, profundamente repousados.
Um coração que vibra harmoniosamente, de modo coerente, “com
ondas de frequência elevada”, nos permite perceber a realidade de um modo
igualmente harmonioso; sua energia radiante, transmissora de paz, de quietude,
de confiança, de abertura, alcança os outros, tornando possível o sonho da
unidade entre nós e aqueles que estão ao nosso redor.
Para os antigos monges, o contrário desta abertura de
coração é a “sklerokardia”, ou seja, a “dureza de coração”, que impede a
entrada em si mesmo e o encontro com os outros e com Deus. O coração pode
palpitar ao ritmo da soberba ou da humildade, do amor ou do ódio, do egoísmo ou
da generosidade. E está cheio de mesclas: de trigo e de joio.
Quando nosso coração está “fechado”, nossos olhos não veem,
nossos ouvidos não ouvem, nossos braços e pés se atrofiam e não se movimentam
em direção ao outro; vivemos voltados sobre nós mesmos, insensíveis à admiração
e à ação de graças. Quando nosso coração está “fechado”, em nossa vida não há
mais compaixão e passamos a viver indiferentes à violência e injustiça que
destroem a felicidade de tantas pessoas. Vivemos separados da vida,
desconectados. Uma fronteira invisível nos separa do Espírito de Deus que tudo
dinamiza e inspira; é impossível sentir a vida como Jesus sentia.
A viagem para a própria interioridade, para a terra sagrada
do coração, necessita de um hábil discernimento para conhecer as armadilhas e
os “inimigos” que aparecem ao longo do percurso.
Quando, numa visão mais profunda de nós mesmos e do mundo,
nos vemos como criaturas que surgem do amor de Deus, e quando essa visão é
fruto de uma vivência interior e transbordante, começa a brotar no coração
humano um movimento de unificação para Deus. Esse movimento é feito de
confiança, de canto, de amor, de entrega, de serviço...
Por ser imagem de Deus, e porque “Deus é Amor”, o coração do
ser humano é capaz do melhor: tem dada por Deus como dom da Criação, a
potencialidade de amar aos outros com o mesmo amor com que Deus lhe ama, ou
seja, com um amor gratuito e generoso. Mas, por ser uma imagem ofuscada pela
limitação e pela fragilidade, o coração humano é também capaz do pior: de negar
sua origem e sair ao encontro com a realidade a partir de suas
potencialidades necrófilas (forças de morte); de viver dando as costas a
Deus e distorcendo a imagem essencial de seu Criador; de se preocupar com o
“cisco” no olho do outro, assumindo atitudes intolerantes e julgadoras...
Quando nosso coração está centrado em Deus, ou seja, quando
ele se percebe que vem d’Ele, vive para Ele e para Ele retorna, tudo está em
seu lugar, tudo vai bem. É “árvore boa que dá bons frutos”. As “coisas” não são
obstáculos, e as pessoas muito menos. Nem sequer o nosso próprio e ambíguo “eu”
é tentação.
Até nossos instintos mais primários ficam integrados nessa
corrente de amor recebido e amor entregue. Mas quando se produz um
descentramento do coração, dá-se um corte com a Fonte e, portanto, com seu
destino; quando o coração é presa do “diá-bolos” (aquele que desune, que
divide), então tudo começa a desandar: o “eu” inflado se converte num
depredador; os instintos básicos se transformam em obsessões; a vida fica
fragmentada e dispersa. Tudo se petrifica. O coração torna-se “oxidado”, pois
seus impulsos oblativos não são ativados. “Não se colhem figos de espinheiros,
nem uvas de plantas espinhosas”. É a deriva do coração humano, a inversão de
sua vocação mais profunda.
Faz-se urgente reconectar-se com a Fonte, onde o coração é
continuamente gerado, sustentado, alimentado pelo amor de Deus que o irriga,
que o restaura. O coração profundo pode estar desprezado, adormecido, fechado,
mas não pode morrer.
Texto bíblico: Lc 6,39-45
Na Oração: A oração é o caminho interior que faz você
chegar até o seu próprio “eu original”, aquele lugar santo, intocável, onde
reside não só o lado mais positivo de você mesmo, mas o próprio Deus. Este é o
nível da graça, da gratuidade, da abundância, onde você é chamado a mergulhar
no silêncio, à escuta de todo o seu ser.
- Nas profundezas do seu coração, acolha, escute e reconheça
o murmúrio da voz de Deus, que, como um rio calmo e ao mesmo tempo vivaz, o(a)
acompanha, da nascente ao mar aberto.