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domingo, 6 de agosto de 2017

10 DE AGOSTO: DIA DE JORGE AMADO - Posfácio por José Saramago

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posfácio
Uma certa inocência


          Durante muitos anos Jorge Amado quis e soube ser a voz, o sentido e a alegria do Brasil. Poucas vezes um escritor terá conseguido tornar-se, tanto como ele, o espelho e o retrato de um povo inteiro.

            Uma parte importante do mundo leitor estrangeiro começou a conhecer o Brasil quando começou a ler Jorge Amado. E para muita gente  foi uma surpresa descobrir nos livros de Jorge Amado, com a mais transparente das evidências, a complexa heterogeneidade, não só racial, mas cultural, da sociedade brasileira.
           
            A generalizada e estereotipada visão de que o Brasil seria reduzível à soma mecânica das populações brancas, negras, mulatas e índias, perspectiva essa que,  em todo caso, já vinha sendo progressivamente corrigida, ainda que de maneira desigual, pelas dinâmicas do desenvolvimento nos múltiplos sectores e atividades sociais do país, recebeu, com a obra de Jorge Amado, o mais solene e ao mesmo tempo aprazível desmentido.

            Não ignorávamos a emigração portuguesa histórica nem, em diferente escala e em épocas diferentes, a alemã e a italiana, mas foi Jorge Amado quem veio pôr-nos diante dos olhos o pouco que sabíamos sobre a matéria. O leque étnico que refrescava a terra brasileira era muito mais rico e diversificado do que as percepções europeias, sempre contaminadas pelos hábitos selectivos do colonialismo, pretendiam dar a entender: afinal, havia também que contar com a multidão de turcos, sírios, libaneses e tutti quanti que, a partir do século XIX e durante o século XX, praticamente até aos tempos actuais, tinham deixado os seus países de origem  para entregar-se, em corpo e alma, às seduções, mas também aos perigos, do eldorado brasileiro. E também para que Jorge Amado lhes abrisse de par em par as portas dos seus livros.

            Tomo como exemplo do que venho dizendo este pequeno e delicioso livro cujo título – A descoberta da América pelos turcos – é capaz de mobilizar de imediato a atenção do mais apático dos leitores. Aí se vai contar, em princípio, a história de dois turcos, que não eram turcos, diz Jorge Amado, mas árabes, Raduan Murad e Jamil Bichara, que decidiram emigrar à América à conquista de dinheiro e mulheres. Não tardou muito, porém, que a história, que parecia prometer unidade, se subdividisse em outras histórias em que entram dezenas de personagens, homens violentos, putanheiros e beberrões, mulheres tão sedentas de sexo como de felicidade doméstica, tudo isto no quadro distrital de Itabuna, Bahia, onde Jorge Amado (coincidência?) precisamente veio a nascer.

            Esta picaresca  brasileira não é menos violenta que a ibérica. Estamos em terra de jagunços, de roças de cacau que eram minas de ouro, de brigas resolvidas a golpe de facão, de coronéis que exercem sem lei um poder que ninguém é capaz de compreender como foi que lhes chegou, de prostíbulos onde as prostitutas são disputadas como as mais puras das esposas. Esta gente não pensa mais que em fornicar, acumular dinheiro, amantes e bebedeiras. São carne para o Juízo Final, para a condenação eterna. E, contudo...

            E, contudo, ao longo desta história turbulenta e de mau conselho, respira-se (perante o desconcerto do leitor) uma espécie de inocência, tão natural como o vento que sopra ou a água que corre, tão espontânea como a erva que nasceu depois da chuvada. Prodígio da arte de narrar, A descoberta da América pelos turcos, não obstante a sua brevidade quase esquemática e a sua aparente singeleza, merece ocupar um lugar ao lado dos grandes murais romanescos, como Jubiabá, Tenda dos Milagres ou Terras do sem-fim.

            Diz-se que pelo dedo se conhece o gigante. Aí está, pois, o dedo do gigante, o dedo de Jorge Amado.



(A DESCOBERTA DA AMÉRICA PELOS TURCOS)
Jorge Amado

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JOSÉ SARAMAGO, escritor português - (16 de novembro de 1922 — 18 de junho de 2010)
Escritortradutorjornalistapoetacronistadramaturgocontista, romancista, teatrólogoargumentista ensaísta. Foi galardoado com o Prêmio Nobel de Literatura de 1998. Também ganhou, em 1995, o Prémio Camões, o mais importante prémio literário da língua portuguesa. Saramago foi considerado o responsável pelo efetivo reconhecimento internacional da prosa em língua portuguesa.

(Wikipédia)

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HIROSHIMA LEMBRA 72 ANOS DA BOMBA, COM APELO AO DESARMAMENTO NUCLEAR

Cerimônia começou com um minuto de silêncio na hora exata em que a bomba atômica foi lançada pelos EUA. Homenagem contou com a participação de representantes de cerca de 80 países e da União Europeia.
Por Agencia EFE
06/08/2017

Homem reza por vítimas da bomba de Hiroshima durante cerimônia de homenagem no Japão (Foto: Kyodo/via REUTERS )

A cidade japonesa de Hiroshima lembrou neste domingo (6) o 72º aniversário do lançamento da bomba atômica que matou centenas de milhares de pessoas ao final da Segunda Guerra Mundial, com uma cerimônia na qual se apelou ao desarmamento nuclear global.

O ato aconteceu no Parque da Paz desta cidade do oeste do Japão, situado perto do ponto central da devastadora explosão nuclear, e começou com um minuto de silêncio às 8h15 (horário local, 20h15 de sábado em Brasília).

Essa foi a hora exata na qual o B-29 Enola Gay da Força Aérea dos Estados Unidos lançou no dia 6 agosto de 1945 o Little Boy, nome com o qual o primeiro artefato nuclear da história foi batizado.

Após o minuto de silêncio, o prefeito da cidade, Kazumi Matsui, pediu a todos os líderes mundiais que apoiem o tratado adotado por 122 membros das Nações Unidas no começo do mês para proibir as armas nucleares, o primeiro deste tipo a nível global.

"É o momento que todos os governos devem lutar para avançar rumo a um mundo livre de armas nucleares", afirmou Matsui, pedindo em particular ao Governo de Japão "que manifeste o pacifismo estabelecido pela sua Constituição e faça todo o possível por facilitar a adoção global do pacto".

Tal acordo foi aprovado por quase dois terços dos países membros da ONU, ainda que tenham se mantido à margem todas as potências atômicas e muitos dos seus aliados, Japão entre eles, o que representa uma dúvida para o sucesso da iniciativa.

Cerimônia em homenagem às vítimas da bomba atômica de Hiroshima (Foto: Kyodo/via REUTERS )

O primeiro-ministro japonês, Shinzo Abe, evitou mencionar diretamente o tratado durante a sua intervenção, ainda que tenha destacado a necessidade de que tanto as potências nucleares como os demais países "se envolvam para se conseguir um mundo verdadeiramente livre de armas atômicas".

"O Japão está decidido a liderar a comunidade internacional, mantendo os seus princípios de não produzir ou possuir armas nucleares nem de permitir a sua entrada em território nacional, e pedindo a todos os países para tomar medidas similares", disse Abe no seu discurso.

A cerimônia contou com a participação de representantes de cerca de 80 países e da União Europeia, entre eles potências nucleares como Reino Unido, França, Estados Unidos e Rússia.

A subsecretária geral das Nações Unidas e alta representante para o desarmamento, a japonesa Izumi Nakamitsu, afirmou que os sobreviventes do bombardeio atômico de Hiroshima "enviam uma mensagem heroica ao mundo e uma lembrança dos devastadores efeitos destas armas", em uma mensagem lida em nome do secretário geral da ONU, Antonio Guterres.

A bomba lançada sobre Hiroshima detonou com uma intensidade de 16 quilotons a cerca de 600 metros de altura muito perto de onde se ergue o parque onde aconteceu a cerimônia, e matou imediatamente cerca de 80 mil pessoas.

O número aumentaria até 1945, quando o balanço de mortos subiu para 140 mil, e nos anos posteriores as vítimas pela radiação somaram mais do que o dobro.

Três dias após o ataque sobre Hiroshima, em 9 de agosto de 1945, os EUA lançaram uma segunda bomba nuclear sobre a cidade de Nagasaki, o que levou à capitulação do Japão seis dias mais tarde e pôs fim à Segunda Guerra Mundial.

Os ataques atômicos sobre ambas as cidades japonesas foram os únicos deste tipo executados até hoje.

Em março passado o número total de "hibakusha" ou sobreviventes dos bombardeios nucleares em Hiroshima e Nagasaki era de 164.621, comparado com os 372.264 que havia em 1980, e a sua idade média era de 81,41 anos.



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PALAVRA DA SALVAÇÃO (38)

Transfiguração do Senhor - Domingo 06/08/2017

Anúncio do Evangelho (Mt 17,1-9)

— O Senhor esteja convosco.
— Ele está no meio de nós.
— PROCLAMAÇÃO do Evangelho de Jesus Cristo + segundo Mateus.
— Glória a vós, Senhor.

Naquele tempo, Jesus tomou consigo Pedro, Tiago e João, seu irmão, e os levou a um lugar à parte, sobre uma alta montanha. E foi transfigurado diante deles; o seu rosto brilhou como o sol e as suas roupas ficaram brancas como a luz. Nisto apareceram-lhes Moisés e Elias, conversando com Jesus. Então Pedro tomou a palavra e disse: “Senhor, é bom ficarmos aqui. Se queres, vou fazer aqui três tendas: uma para ti, outra para Moisés, e outra para Elias”. Pedro ainda estava falando, quando uma nuvem luminosa os cobriu com sua sombra. E da nuvem uma voz dizia: “Este é o meu Filho amado, no qual eu pus todo meu agrado. Escutai-o!” Quando ouviram isto, os discípulos ficaram muito assustados e caíram com o rosto em terra. Jesus se aproximou, tocou neles e disse: “Levantai-vos, e não tenhais medo”. Os discípulos ergueram os olhos e não viram mais ninguém, a não ser somente Jesus. Quando desciam da montanha, Jesus ordenou-lhes: “Não conteis a ninguém esta visão até que o Filho do Homem tenha ressuscitado dos mortos”.

— Palavra da Salvação.
— Glória a vós, Senhor.

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Ligue o vídeo abaixo e acompanhe a reflexão do Pe. Paulo Ricardo:


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A luz que nos trans-figura

 “O seu rosto brilhou como o sol e as suas vestes ficaram brancas como a luz” (Mt 17,2)

“Saí de vossas trevas! Deixai para trás a segurança do vale e empreendei sem medo a subida ao monte, porque lá no alto a luz vos espera!”. Este poderia ser o apelo do evangelho da Transfiguração, que pede de nós mobilidade para sair das falsas seguranças de uma vida sem horizontes.

De fato, há em nós uma força atrofiadora que nos faz preferir a acomodação, permanecendo tranquilos, perdidos no imediato e alheios à capacidade de transfiguração que se esconde por detrás da aparente normalidade das pessoas e das coisas.
“O mundo está cheio de esplendor espiritual e de segredos maravilhosos, mas basta um pequeno cisco sobre nossos olhos para que tudo fique escondido”(Baal Sem Tov).

Por isso, no Evangelho de hoje, e com diferentes graus de intensidade, o evangelista sai da esfera plana das descrições precisas e exatas e se expressa na linguagem do excessivo, do simbólico, do totalizante: “seu rosto brilhou como o sol”, “suas roupas ficaram brilhantes como a luz”, “uma nuvem luminosa os cobriu”... E como contraste escuro frente a tanta luz, três pobres homens assustados que balbuciam disparates, que preferiam dormir e ficar aí junto a esta situação tão surpreendente.

A Transfiguração está nos dizendo quem era realmente Jesus e quem somos realmente cada um de nós. Essa cena que Mateus relata é um símbolo das muitas “experiências de transfiguração” que todos experimentamos. A vida diária tende a fazer-se cinza, monótona, cansada, e a deixar-nos desanimados, sem forças para caminhar. Mas, eis que surgem momentos especiais, com frequência inesperados, em que uma luz atravessa nosso coração, e os olhos de nossa interioridade nos permitem ver muito mais longe e muito mais fundo daquilo que estávamos acostumados a olhar até esse momento.

A realidade é a mesma, mas nos aparece transfigurada, com outra figura, revelando sua dimensão interior, essa na qual tínhamos acreditado, mas que com o cansaço do caminhar tínhamos esquecido. Essas experiências, verdadeiramente espirituais, nos permitem renovar nossas energias e, inclusive, entusiasmar-nos para continuar caminhando, com o sentimento de “como se víssemos o Invisível”.

Aquele Monte (Tabor) foi um espaço instigante para Jesus, lugar alto de sua experiência radical, de onde Ele podia ver os problemas da humanidade, para senti-los, para assumi-los e mudar... O mesmo Jesus nos faz subir à grande montanha para que vejamos as coisas de outra forma, de outra perspectiva...

É preciso, de vez em quando, tomar distância e nos afastar do cotidiano rotineiro e atrofiado, para ampliar nossa visão e contemplar o drama humano; é decisivo nos situar diante do calor de Deus (sarça ardente) para desvelar nossa verdadeira identidade. Somente assim a Montanha nos transfigurará para que nos empenhemos no serviço em favor dos “desfigurados” do mundo.

Todos nós aspiramos por experiências como a dos discípulos de Jesus no alto do Tabor. Mas nós não podemos nos encontrar com Jesus no Tabor da Galiléia. Necessitamos buscar nosso Tabor particular, os rincões de nossa morada interior onde estão as fontes que mais forças nos dão, as luzes com as quais nos sintonizamos para iluminar e dar um novo significado ao nosso compromisso primeiro. Todos nós somos portadores de uma luz que procede de dentro, uma iluminação interior, que só aquele que vive a partir de sua própria interioridade consegue ter acesso a ela.

Ao relatar suas experiências espirituais, muitos místicos fazem referência a uma luz que ilumina com força seu interior. É uma graça que não se revela rara, pois temos consciência que “Deus é luz” e que o mesmo Jesus se definiu como a “Luz do mundo”. Somos envolvidos providencialmente por esta expansiva Luz. Todas as pessoas que fizeram esta experiência de encontro com o “Deus da Luz”, puseram os meios para fazer a viagem interior e ativar a “faísca da luz divina” ali presente. Na medida em que se deixaram invadir por essa luz, aproximaram-se cada vez mais dela para vivê-la com mais intensidade e para deixá-la refletir em seus rostos e ações. Por isso, foram pessoas de presenças originais e iluminantes em seu meio.

No ritmo do cotidiano, o dom imenso da luz passa desapercebido. Que o digam aqueles que não podem ver; que o digam aqueles que nunca puderam estremecer-se diante de um pôr-do-sol ou diante das cores vivas de uma pintura; que o digam aqueles que nunca puderam ver o brilho de uns olhos cheios de amor... Na costumeira cotidianidade, o perigo de não valorizar a luz é evidente; no entanto, para quem contempla sua cotidianidade, a formosura da luz que se derrama sobre nós que vivemos neste planeta sem luz própria é a prova da generosidade de Deus para conosco.

Por isso mesmo, há vidas luminosas e vidas obscuras. Há pessoas cuja luz interior transfigura suas vidas: vivem na transparência da luz, seus gestos e atos são luminosos, admiram-se com o brilho da vida e desejam que tudo tenha esse brilho, iluminam com sensata positividade tudo o que acontece ao seu redor, colocam-se sempre na perspectiva de quem desfruta da cor e do amor no encontro com os outros... O resplendor da Transfiguração brilha no interior de cada um de nós; não nos vemos vazios por dentro porque no mais profundo de nós, na morada mais interior, está o “sol de onde procede uma grande luz” (Santa Teresa de Jesus).

Deixar-se transfigurar. Somos seres de luz e nossa verdadeira transformação nasce de nosso interior. Na Transfiguração, Jesus nos faz descobrir nosso verdadeiro ser, que vemos refletido n’Ele. A transfiguração não é condição de um “iluminado”, mas a realidade de toda pessoa que é capaz de “sair de seu próprio amor, querer e interesse” (S. Inácio). Deixar-se transfigurar é descentrar-se e expandir sua luz, para realizar aquele chamado único de Jesus dirigido a todos nós: “Vós sois a luz do mundo”.

Transfiguração é festa da luz: Jesus é a Luz e no encontro com Sua Luz podemos ativar a tímida luz presente no nosso interior. Só assim podemos ampliar os espaços de luz em nossas vidas, para contagiar-nos de luz e para comunicar uma mística de luz em nosso entorno. Não se trata de falsas iluminações, mas de alcançar outra perspectiva de vida, mais luminosa, mais positiva, mais esperançada.

Para transitar na noite de nosso tempo precisamos buscar na Transfiguração a Luz que a ilumine e nos indique a direção e o sentido de nossa existência. A “noite de nosso mundo”- carregada de tanta corrupção, violência, preconceito - pede pessoas marcadas pela experiência da Transfiguração, capazes de ver a presença d’Aquele que é a Luz no meio das realidades simples e cotidianas, no profundo do coração de cada ser humano, de cada realidade vivente, de cada palmo de nossa terra, no mistério insondável do universo grávido de graça.

Precisamos cultivar não só olhos que vejam a realidade, senão que sejam capazes de contemplar, no meio da noite, a presença da Luz: uma luz que brota das profundezas da realidade, do profundo do ser onde o Deus, Fonte de vida, sustenta tudo; uma luz que nos faz descobrir nosso ser essencial: filhos e filhas amados(as) e irmanados(as) com todos e com tudo.

Texto bíblico:  Mt. 17, 1-9

Na oração: Na nossa vida cristã não faltam momentos de claridade e certeza, de alegria de luz. E tudo depende de nossa visão, ou seja, se nosso olhar só capta o imediato e rasteiro que nos rodeia, ou se é capaz de descobrir o profundo e o luminoso em tudo... “Tudo é segundo a cor da lente com que se olha”.
- Como é seu olhar? Mais além do imediato que o rodeia? você é capaz de ver a presença da Luz, da profundidade de sentido, da presença de Deus... que há por detrás de cada circunstância?
- Você é capaz de transfigurar o olhar para captar a presença da luz que tudo resignifica?

Pe. Adroaldo Palaoro sj
Campinas-SP



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