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domingo, 20 de outubro de 2019

JORNALISTA IGNÁCIO DE LOYOLA BRANDÃO TOMA POSSE NA CADEIRA 11 DA ABL E AFIRMA: “NÃO PODEMOS REPOUSAR A CABEÇA ALHEIOS AO TERROR NEM PERMITIR QUE NOS ARRANQUEM A VOZ DE NOSSAS GARGANTAS”


A chegada de Ignácio de Loyola Brandão à Academia Brasileira de Letras constitui motivo de júbilo pessoal e institucional. Somos leitores de sua bela ficção, audaciosamente brasileira, composta de muitas vozes. Ignácio realiza em plenitude o diálogo entre literatura e liberdade. Tal gesto reflete o destino da Casa de Machado. Bem-vindo, Ignácio”, afirmou o Presidente da ABL, Acadêmico Marco Lucchesi.

O jornalista Ignácio de Loyola Brandão tomou posse na Cadeira 11 da Academia Brasileira de Letras sexta-feira, dia 18 de outubro, em solenidade no Salão Nobre do Petit Trianon. O novo Acadêmico foi eleito no dia 14 de março deste ano, na sucessão do Acadêmico Helio Jaguaribe, falecido em 9 de setembro de 2018. Em nome da ABL, o Acadêmico e escritor Antônio Torres fez o discurso de recepção.

Antes, Ignácio de Loyola Brandão discursou na tribuna. Ao terminar, assinou o livro de posse. A seguir, o Presidente Marco Lucchesi convidou o Acadêmico Celso Lafer para fazer a aposição do colar; o Acadêmico e professor Arnaldo Niskier (decano presente) para entregar a espada; e a Acadêmica Rosiska Darcy de Oliveira para entregar o diploma. Terminada a cerimônia, o Presidente, então, declarou empossado o novo Acadêmico.

A mesa da cerimônia foi presidida por Marco Lucchesi e composta pelos Acadêmicos Ana Maria MachadoJosé Murilo de CarvalhoMerval Pereira e Antônio Torres.

Os ocupantes anteriores da Cadeira foram: Lúcio de Mendonça (fundador) – que escolheu como patrono Fagundes Varela –, Pedro LessaEduardo RamosJoão Luís AlvesAdelmar TavaresDeolindo CoutoCelso Furtado e Helio Jaguaribe.

DISCURSO DE POSSE
Em seu discurso de posse, o Acadêmico Ignácio de Loyola Brandão declarou: “para desenvolver o Brasil precisamos de Desenvolvimento, democracia, liberdade, saúde para sobreviver, ensino e trabalho, ausência de fome e miséria, de segurança e acima de tudo ética e verdade. E principalmente nos relacionarmos sem ódio, indignação, acirramento.” 

E encerrou: “não podemos repousar a cabeça alheios ao terror nem permitir que nos arranquem a voz de nossas gargantas”.

DISCURSO DE RECEPÇÃO
O Acadêmico Antônio Torres afirmou em seu discurso de recepção: “precisaria de mil e uma noites para juntar no Salão Nobre do meu cérebro todos os grãos separados em minhas leituras, releituras, anotações, e memórias em torno da sua imensurável trajetória.

“Eu me recordo de uma redação agitada e barulhenta de um jornal vibrante, no Vale do Anhangabaú, na qual éramos colegas de trabalho há mais de um ano, mas pouco nos falávamos.

“Num dia em que bati o ponto no grande relógio postado um pouco além da porta de entrada da redação bem antes da hora, imaginando ser o primeiro a chegar, fui surpreendido com o tac-tac-tac de uma máquina de escrever, único sinal de vida naquele salão vazio. Ao passar perto de quem, de costas para a entrada, catava feijão nas teclas completamente absorvido pelo seu matraquear, tive outra surpresa: a de um aceno para que me aproximasse. A mão que acenava apontou para uma pilha de páginas que mal cabiam na borda de uma estreita mesa, enquanto uma voz dizia: - Dá uma olhada nisso.

“E foi assim, ao acaso, que me senti testemunha ocular do nascimento do primeiro livro de um escritor que não demoraria muito a se tornar um dos expoentes de uma geração que chegaria a esta Casa”.

O NOVO ACADÊMICO
Ignácio de Loyola Brandão nasceu em Araraquara, São Paulo, em 1936. Jornalista na sua cidade natal, foi para São Paulo aos 21 anos, onde continuou sua carreira. Trabalhou no jornal Última Hora, nas revistas Cláudia, Realidade, Setenta, Planeta, Ciência e Vida, Lui e Vogue. Atualmente escreve uma crônica quinzenal para o jornal O Estado de S. Paulo.

Viveu em Roma e depois em Berlim. Em 2008, ganhou o prêmio Jabuti, com o O Menino que Vendia Palavras, considerado a melhor ficção do ano. Em 2011, lançou A Morena da Estação, crônicas sobre trens, ferrovias, estações. Publicou, em 2014, Os olhos cegos dos cavalos loucos, um emocionante pedido de perdão de um neto para seu avô. Em 2016, recebeu o Prêmio Machado de Assis da Academia Brasileira de Letras pelo conjunto de sua obra.

Para ele, literatura é sonho, paixão, divertimento, prazer, viagem por mundos desconhecidos, terapia. Com sua filha Rita Gullo subiu ao palco em teatros e nas unidades do SESC com o show “Solidão no fundo da agulha”, experiência inédita em que relembra momentos importantes de sua biografia.

Publicou mais de 40 livros, entre romances e contos, crônicas infantis e infantojuvenis.




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VIDA ATRAENTE NUMA SOCIEDADE ORGÂNICA - Gabriel J. Wilson

20 de outubro de 2019
Gabriel J. Wilson


Na França, o tempo é das flores. A sede da comuna de La Barre en Ouche engalana-se, para o prazer de seus novecentos e tantos habitantes e de todos os que circulam por essas paragens.

A pequena cidade normanda existe desde o século XI. Surgiu à beira de uma via romana que ligava Dreux a Lisieux, terra de Santa Teresinha do Menino Jesus.

Por que Catolicismo publica esta foto? Para mostrar que num lugar tão pequeno, tão isolado dos grandes centros, habitado por agricultores e alguns comerciantes, as pessoas têm amor à sua terra. A sede da comuna, como se vê, é de apurado estilo clássico. As flores lhe conferem um encanto ainda maior, de dar inveja a muitas cidades grandes.

Em nossos dias, muitas cidades não passam de aglomerados sem história, enquanto as populações de pequenas vilas como Barre en Ouche têm com o lugar uma ligação profunda. Nas sociedades orgânicas a vida circula através das relações de família, de amizade e de dependência natural. Na sociedade totalitária moderna o indivíduo vive isolado, mesmo quando cercado de uma multidão. Faltam os vínculos naturais, que dão sabor à vida.

http://www.abim.inf.br/vida-atraente-numa-sociedade-organica/#.XaxVSOhKhpk

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PALAVRA DA SALVAÇÃO (153)


29º Domingo do Tempo Comum – 20/10/2019

Anúncio do Evangelho (Lc 18,1-8)

— O Senhor esteja convosco.
— Ele está no meio de nós.
— PROCLAMAÇÃO do Evangelho de Jesus Cristo + segundo Lucas.
— Glória a vós, Senhor.

Naquele tempo, Jesus contou aos discípulos uma parábola, para mostrar-lhes a necessidade de rezar sempre, e nunca desistir, dizendo:
”Numa cidade havia um juiz que não temia a Deus, e não respeitava homem algum. Na mesma cidade havia uma viúva, que vinha à procura do juiz, pedindo: ‘Faze-me justiça contra o meu adversário!’
Durante muito tempo, o juiz se recusou. Por fim, ele pensou: ‘Eu não temo a Deus, e não respeito homem algum. Mas esta viúva já me está aborrecendo. Vou fazer-lhe justiça, para que ela não venha a agredir-me!’”
E o Senhor acrescentou: “Escutai o que diz este juiz injusto. E Deus, não fará justiça aos seus escolhidos, que dia e noite gritam por ele? Será que vai fazê-los esperar?
Eu vos digo que Deus lhes fará justiça bem depressa. Mas o Filho do homem, quando vier, será que ainda vai encontrar fé sobre a terra?”

— Palavra da Salvação.
— Glória a vós, Senhor.


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Ligue o vídeo abaixo e acompanhe a reflexão do Padre Roger Araújo:

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“Faze-me justiça contra o meu adversário!” (Lc 18,3)

O maior poder do mundo não é a bomba, nem o grande capital, nem um estado autoritário e violento, nem uma igreja triunfante, mas o rosto impotente do órfão, da viúva, do refugiado, do excluído..., o rosto que sofre e se indigna, que olha e suplica, pois carrega no mais profundo de si mesmo toda a energia de Deus; este é o poder que desestabiliza, o grito dos indignados. Falamos da eficácia do “rosto suplicante”, ou seja, do argumento dos indignados que gritam com seu rosto, exigindo justiça.

Vivemos em um mundo que parece dominado pela voz daqueles que vivem para impor e abafar a voz dos mais vulneráveis, um mundo fundado na propaganda de um sistema que quer silenciar todos os gritos e enganar-nos a todos com o circo midiático das mentiras organizadas (fake news). 

Para que este mundo se transforme e a justiça se faça presente, continua sendo necessário o grito das viúvas, a indignação dos pobres e excluídos, a voz de todos os oprimidos da terra, aos quais o mesmo Jesus diz: “juntai-vos e gritai ao Deus onipotente”. Pois bem, é chegado o momento de nos comprometer a elevar a voz, como tantos homens e mulheres de nosso tempo. Chegou o momento dos(das) grandes indignados(as), como a viúva do evangelho com sua palavra suplicante e com sua voz que denuncia todo tipo de injustiça.
“É muito bom gritar através das personagens o que quero gritar para o mundo” (Adriana Esteves)

Em um mundo onde a realidade feminina era invisível, Jesus tornou-a visível. Sua conduta e seu ensinamento foram radicalmente “contra-culturais” com relação à mulher. Ele foi um autêntico reformador e inclusive revolucionário. Considerando seus gestos e palavras, percebe-se que Jesus se mostrava sensível a tudo o que pertencia à esfera feminina, em contraposição ao mundo masculino cultural, centrado na dominação e submissão da mulher.

Com sua presença e sua linguagem Jesus faz emergir o mundo vital das mulheres; ao tirá-las do seu anonimato e trazê-las à luz, Ele realça e louva os traços característicos da mulher. Por isso, Jesus narrou preciosas parábolas tendo as mulheres como protagonistas, especialmente as mais pobres, como no Evangelho deste domingo:  Jesus deu voz àquela que, por sua condição de viuvez, não tinha chance nenhuma de expressar seu clamor por justiça.

A mensagem e a prática de Jesus, portanto, significam uma ruptura com a situação imperante e a introdução de um novo tipo de relação, fundado não na ordem patriarcal da subordinação, mas no amor como mútua doação que inclui a igualdade entre homem e mulher. A mulher irrompe como pessoa, filha de Deus, destinatária do sonho de Jesus e convidada a ser, junto com os homens, também discípula e membro de um novo tipo de comunidade.

Em um contexto social e religioso no qual as relações se estabelecem através do poder, da hierarquia, da maneira de exercer a autoridade, onde o mais forte se impõe sobre o fraco, o rico sobre o pobre, o homem sobre a mulher, o que possui informação sobre o ignorante, a cena da parábola deste domingo nos introduz em uma nova ordem das relações que devem caracterizar o Reino. A maneira de Jesus tratar as pessoas marginalizadas, sobretudo as viúvas, pôs em marcha um movimento de inclusão que quebrava toda pretensão de poder e de imposição. 

Na tradição bíblica, as viúvas são, juntamente com os órfãos e os estrangeiros, as pessoas mais indefesas, as mais pobres entre os pobres. A viúva, de modo especial, é o símbolo por excelência da pessoa que vive só e desamparada; ela não tem marido nem filhos que a defendam e não conta com nenhum apoio social. É nesta situação de total abandono que sua vida se converte em um grito: “Fazei-me justiça!”.

Na Bíblia, as viúvas aparecem submetidas à arbitrariedade dos poderosos, mas tem uma voz que chega até Deus. Elas ocupam um lugar especial no evangelho de Lucas, visibilizada aqui na parábola da viúva suplicante, aquela do grito que tudo consegue. Sua persistência inspira em todos nós a luta por libertação das estruturas de dominação, em todas as dimensões da vida.

Contrariamente àqueles que pensam que não vale a pena sair às ruas para gritar e protestar (no plano social e religioso, político e eclesial), o evangelho deste domingo (29º  Tempo Comum) nos situa diante do grito da viúva, capaz de mudar a ordem injusta do sistema. Muitas vezes, tudo parece ficar restrito a um grito, mas esse grito é mais profundo e eficaz que todas as vozes opressoras, ocas, prepotentes, intolerantes, do sistema dominante. Esse grito da viúva que chega ao coração de Deus (e à cabeça do juiz injusto), continua sendo promessa de vida para nós.

Jesus também foi um indignado que adotou uma atitude crítica e rebelde frente ao sistema político e religioso de seu tempo; Ele se comportou como um “transgressor”, frente à ordem estabelecida, centrada no poder e na exclusão. O conflito, nascido de sua indignação, define seu modo de ser, caracteriza sua forma de viver e constitui o critério ético de sua prática libertadora. A transgressão e a resistência foram as opções fundamentais durante os anos de sua atividade pública, tanto no terreno religioso como no político, ambos inseparáveis em uma teocracia que não suportava sua liberdade e tornou-se a chave para explicar seu trágico final.

A indignação de Jesus de Nazaré com os poderes econômicos, religiosos, políticos e patriarcais constitui um desafio para os cristãos e cristãs de hoje e um chamado a incorporar-se ao movimento dos indignados. E não para sacralizá-lo, mas para mobilizar e somar forças no empenho por “um outro mundo possível”. 

Precisamos alimentar uma espiritualidade da indignação, quando é preciso reagir frente à impiedade, à violência e à injustiça que campeiam e envenenam as relações entre as pessoas. Somos habitados pelo mesmo Espírito que movia Jesus a ser presença original e provocativa no contexto do seu tempo. 

Na vivência do seguimento de Jesus, há algo contraditório entre nós cristãos: somos seguidores do maior transgressor da história e, no entanto, nos acovardamos escondidos atrás de leis, doutrinas, ritos, que nos levam a alimentar uma cultura de indiferença e de frieza frente à realidade que nos cerca. Precisamos ativar a atitude evangélica da denúncia nesta sociedade perplexa que somos, neste tempo incerto que vivemos, neste planeta ameaçado que habitamos.

Em definitiva, trata-se de deixar ressoar o clamor dos(as) “descartados”, tantas pessoas e grupos hoje excluídos do direito ao pão, ao trabalho, à terra, ao teto, à justiça...; deixar ecoar o grito da terra frente a tanta destruição; deixar fluir o grito de tantas vítimas da violência institucionalizada. Se pararmos para escutar, ouviremos gritos insistentes. Há um clamor uníssono tão forte capaz de atravessar os céus, ultrapassar as nuvens e não deixar de ser escutado. No fundo, é o próprio Deus que grita nos seus filhos e filhas; escutar o grito dos últimos e dos excluídos é escutar a voz do próprio Deus que “derruba os poderosos de seus tronos e eleva os humildes”. 

Texto bíblico:  Lc 18,1-8

Na oração: Orar, como diz S. Inácio de Loyola, é buscar e encontrar Deus em todas as coisas, detectar sua presença como anúncio ou como denúncia, como carícia ou como grito. A oração é sempre um clamor, é uma aspiração, é gemido do Espírito em nós, expressão dos desejos mais profundos da humanidade e do próprio coração.
A oração, portanto, não é nunca um clamor estéril, nem sequer um desafogo psíquico, mas um desejo esperançado, fundado na confiança de que o Deus, todo misericórdia e cuidado a partir dos últimos, não abandona nunca.
- Frente ao contexto social e político no qual vivemos, sua voz está a serviço de quem?
- Sua voz é prolongamento do grito indignado da viúva ou é voz conivente com a morte? 

Pe. Adroaldo Palaoro sj


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