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quarta-feira, 21 de fevereiro de 2018

TODO DIA ACONTECE - Antonio Nunes de Souza


Todo dia acontece!


É como uma novela interminável que, diariamente, apresenta um novo capítulo, porém com os mesmos problemas, as mesmas falhas, os mesmos descuidos e, principalmente, as mesmas faltas de vergonha e caráter dos políticos administradores e executivos dos municípios. Principalmente o nosso, que é o que mais me preocupa, fazendo com que esqueçamos que o país está desgovernado nas mãos de bandidos implicados, processados e, absurdamente, cumprindo seus mandatos tranquilamente, protegidos pelas nossas obsoletas e estranhas leis que foram aprovadas por eles mesmos, cheias de aberturas propositais, para que façam seus crimes e saiam imunes!

Refiro-me as reclamações que o povo faz, diariamente, contra os aumentos de ônibus, falta de médicos nos postos, colégios caindo aos pedaços, funcionários não recebendo seus salários, ruas esburacadas, saneamento dos piores, moradias sendo entregues com defeitos graves de construção, falta de creches e as que tem, funcionando em estados deploráveis, e ainda uma segurança precária (ESSA VERGONHA É NACIONAL), nos deixando dentro dessa roda viva, ou circo dos horrores, cotidianamente!
Deixei para falar separadamente os descabidos descontos e atrasos substanciais nos salários dos professores, causando greves constantes, prejudicando milhares de alunos nos cumprimentos dos seus currículos anuais!

Será que é uma praga ter que enfrentar essa podre situação todos os dias e, pelos desejos dos políticos, acreditar que medidas estão sendo tomadas para sanear as pendências?
Parece até que sim, pois, por mais que falem, gritem, esperneiem, etc., continuam segurando essa barra pesadíssima e, pior ainda, reelegendo esses prometedores de palanques, achando tolamente, que desta nova vez eles cumprirão o que não pode ser feito!
Vamos ser mais enérgicos, ter uma atitude mais solidária, defender os nossos direitos, exigir deveres, uma vez que nós é que estamos pagando seus altos salários. Lembrar sempre a eles que nós é que somos os patrões!

Antonio Nunes de Souza, escritor
Membro da Academia Grapiúna de Letras-AGRAL



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GOSTO DE GENTE... – Elires Sartori


Gosto de gente... 


Gosto de gente com a cabeça no lugar... de conteúdo interno, idealismo nos olhos e dois pés no chão da realidade. Gosto de gente que ri, chora, se emociona com uma simples carta, um telefonema.

Gosto de gente que se emociona com uma canção suave, um bom filme,  um bom livro, um gesto de carinho, um abraço de afago. Gente que ama  e curte saudades, gosta de amigos, cultiva flores, ama os animais, admira paisagens , poeira e escuta.

Gente que tem tempo para sorrir bondade, semear perdão, repartir ternura, compartilhar vivências... Gente que tem tempo para dar espaços  para as emoções  dentro de si, emoções que fluem  naturalmente  de dentro do seu ser. Gente que gosta de fazer coisas que gosta, sem fugir dos compromissos difíceis e inadiáveis, por mais desgastantes  que sejam.

Gente que colhe, orienta e se entende, aconselha, busca a verdade e quer sempre aprender, mesmo que seja de uma criança, de um pobre, de um analfabeto. Gosto de gente  de coração desarmado, sem ódio  e preconceitos baratos, com muito amor dentro de si.

Gente que erra e reconhece, cai e se levanta, Apanha  e assimila os golpes, tirando lições dos erros e fazendo redentora suas lágrimas e sofrimentos. Gosto muito de gente assim... e desconfio  que é desse tipo de gente que DEUS também gosta.

Elires Sartori

 "Gotas de Crystal" gotasdecrystal@gmail..com

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O DIABO E A CARNE - Marco Lucchesi


O diabo e a carne  


Não posso dissociar Carlos Heitor Cony de meu antigo professor do Salesianos, em Niterói, José Inaldo Alonso. Foi este quem me levou ao romance “Pilatos”, fascinado pelo estranho rumor de suas palavras.

Colegas de seminário, Carlos Heitor e José Inaldo não chegaram a padres. E, no entanto, nenhum deles perdeu a visão do mundo como liturgia, cujo centro era Roma. Munidos de adágios latinos, foram bater às portas da Suma teológica, para adoção da dialética tomista. Guardaram ambos a visão técnica e elegância do conceito, mas logo se tornaram agostinianos. Leram O diabo de Papini e Os grandes cemitérios sob a lua, de Bernanos, pintaram quadros e tiveram filhos.

Carlos Heitor Cony fez parte de uma constelação inicial que incluía um traço de diversidade que abarcava tanto a vocação plural de Alceu Amoroso Lima quanto as memórias poéticas de Antonio Carlos Villaça, os romances de Lúcio Cardoso e de Otavio de Farias, os poemas de Murilo Mendes e Jorge de Lima.

Cony criou um mundo literário singular. Homem de ampla cultura, nunca se desligou do presente, do Brasil e do mundo. Quase memória é um de seus livros mais reconhecidos, redesenhou a figura do pai na literatura brasileira e trouxe Cony de volta para uma nova geração de leitores, como quem renasce de um longo silêncio.

E houve ainda O piano e a orquestra. Daí em diante sua obra não saiu de meu campo visual. Admirava o fato de navegar rio acima, contra a corrente, jamais prisioneiro de um lugar, de uma voz, de uma tendência. Espírito rebelde, sempre a ler o mundo a contrapelo. Uma espécie de Papini moderno, com a sua dialética sem concessão, estilo que correspondia a uma atitude complexa diante da modernidade, liquida ou gasosa, à qual aderia com método, ou dela se afastava, com uma leve polêmica de fundo neotomista.

Gostava de ópera e amava as igrejas de Roma, que conhecia em detalhes. Antepunha Lima Barreto a Machado de Assis, os charutos cubanos aos toscanos. Preferia Caravaggio a Guido Reni, Michelangelo a Bernini.  A pincelada mais densa, o corte mais profundo. 

Seu pensamento era um contraste irrequieto, fruto de escolhas excludentes. Um mosqueteiro pronto ao ataque, entre o diabo e a carne.
  
O Brasil foi a sua razão dominante e possuía uma forma toda sua de ler a história recente. Mesmo que nem sempre concordássemos, era impossível não ler seus artigos, não se sentir desafiado pela inteligência de suas posições. Um duelo importante no campo das ideias, justo quando o país se mostra cada vez mais deserto de ideias.
  
Cony gostava de “Os Bruzundangas”, de Lima Barreto, esse país estranho e paralelo ao nosso, íntimo e remoto, misto de rascunho e loucura.  Esse modelo negativo de país é um espantalho que obriga a repensar nossos caminhos. Um momento de intensa crise.

Nesse estranho interregno, sua obra guarda o brilho de um mundo aberto e inacabado.

O Globo, 07/02/2018


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Marco Lucchesi - Sétimo ocupante da cadeira nº 15 da ABL, eleito em 3 de março de 2011, na sucessão de Pe. Fernando Bastos de Ávila , foi recebido em 20 de maio de 2011 pelo Acadêmico Tarcísio Padilha. Foi eleito Presidente da ABL para o exercício de 2018.

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