O Padre Zezinho responde a pastor que comparou a imagem de
Nossa Senhora com uma garrafa de Coca-Cola
É lamentavelmente frequente que algumas correntes religiosas
ou mesmo laicistas ataquem Nossa Senhora e até profanem propositalmente imagens
que a representam. E é bastante significativo refletir sobre o porquê de se
incomodarem tanto com aquela a quem o próprio Deus escolheu para ser Sua mãe –
e nossa, quando a confiou aos Seus seguidores ao pé da cruz.
Nos últimos dias, repercutiu pela internet o vídeo em que o
pastor brasileiro Agenor Duque, da autodenominada Igreja Apostólica Plenitude
do Trono de Deus, faz uma comparação entre Nossa Senhora e uma garrafa de
refrigerante.
As reações de indignação vieram tanto de católicos quanto de
protestantes que desaprovam esse tipo de agressão contra a mãe do mesmo Jesus a
quem tais correntes religiosas dizem seguir. Entre as reações, reproduzimos a
seguir o comentário do padre Zezinho, um dos sacerdotes mais conhecidos e
queridos do Brasil:
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“Ecumenismo é o respeito que um crente em Deus tem pelos
outros crentes, mesmo que não orem nem creiam do mesmo jeito. Basta-lhes saber
que o outro ama o mesmo Deus e que Deus também ama os outros crentes. Neste
sentido são irmãos de fé. E, espero, irmãos na caridade que Jesus nos ensinou a
viver.
Tenho 76 anos e, pela sua atuação na TV, o pastor Agenor
Duque está há menos tempo pregando a fé cristã. Também não conheço seus
escritos e sua formação em filosofia, sociologia ou teologia. Realmente não sei
qual é a sua vertente cristã!
Mas recentemente ele nos brindou com uma agressão totalmente
desnecessária ao ridicularizar uma de nossas imagens de Maria. Temos muitas
imagens dela através do mundo mostrando que a mãe de Jesus é mãe para negros,
índios, europeus, esquimós, árabes, escravos e libertos, porque a vemos
vestindo a dores, as vestes e as cruzes de quem sofre.
O pastor Duque também se veste de mendigo e supostamente
quer dizer alguma coisa com aquelas vestes de quem sofre e não visa riqueza nem
lucro!
Mas, recentemente, ele comparou a imagem de nossa senhora
aparecida com uma garrafa de Coca-Cola; simbolicamente deixou cair a garrafa
dizendo que aquela garrafa não ora, nem ouve, nem pode ajudar a sua
plateia-assembleia! É claro que estava ridicularizando nossas imagens e
símbolos – e também a nossa Bíblia, porque a nossa Bíblia e as Bíblias que
imagino que ele usa também não falam, porque são feitas de papel.
Quis dizer que é mais fiel a Jesus do que nós, católicos,
porque ele não pede oração à mãe de Jesus nem acredita na intercessão dos
santos do céu, embora ele mesmo, na TV, intercede por seus fiéis como santo
pastor na terra, que ele afirma ser! Quem ora pelo seus fiéis está
intercedendo. Maria faz a mesma coisa no céu, para onde o Filho a levou. Ou
será que o pastor acha que Jesus ainda não levou a sua mãe para o céu?
1 – Esse tipo de pregação ridicularizando Maria raramente dá
certo. Até mesmo entre seus ouvintes e fiéis haverá crentes chocados com o
desrespeito do pregador pela mãe de Jesus, que, entre os católicos, é
representada em mais de 300 imagens através do mundo. Mas é a mesma mãe,
vestida de outras vestes – como o pastor Duque faz com seu terno, ou com sua
túnica de saco!
2 – Se um advogado católico quiser processá-lo por desprezo
à religião e aos símbolos da outra Igreja, ele terá enorme dificuldade em
provar que não agrediu a nossa fé.
3 – Uma coisa é repercutir um vídeo de outra igreja e
mostrar o que eles estão pregando; outra coisa é vilipendiar um culto de outra
Igreja. Num caso é informação reproduzida na internet; no outro é fazer uma
pregação induzindo os fiéis da sua igreja a agredirem a outra!
O pastor Agenor Duque, que se veste de mendigo humilde, nos
ofendeu e nos chamou de ignorantes porque ousamos representar Maria negra em
veste azul.
Acho que ele não se lembrou de que ele também é uma imagem
exótica quando entra naquele palco vestido de mendigo para anunciar a sua
igreja!"
O
inexorável sempre nos alcança, mostra, em momento irreversível, o quanto somos
frágeis. Submete sem remorso o nosso coração a essa hora ruim, com ares cor de cera. Fere
quando tira de nós
um ente querido, amigo fraterno
ou uma dessas criaturas que
aprendemos a amar no seu percurso de vida. Mesmo que a amizade tenha sido começada
a menos de vinte anos, com os parceiros distantes um do outro e só tiveram um
encontro pessoal duas vezes. É um dos
milagres que a literatura consegue fazer, aproximando as criaturas, que logo se
identificam de tal forma que parecem conhecidos íntimos ao longo de muitos
anos.
Isso me veio à mente, desde que me chegou a notícia da secretária
Nilsi, da União Brasileira de Escritores/SP, via e-mail, de que a situação
do Caio não era boa. Estava internado na
unidade de terapia intensiva do hospital, não falava. Procurei saber detalhes sobre a condição do
amigo, através do seu editor Nicodemos
Sena, que até então não tinha conhecimento sobre a saúde dele, a inspirar
extremos cuidados.
A
escritora Rosani, uma das amigas queridas de Caio, informou-me depois que era verdade. “Ele está com o lado
esquerdo todo paralisado e a fala comprometida. Está se alimentando por sonda.
Talvez seja irreversível. Vamos rezar por ele. Está para ter alta do
hospital e, provavelmente, irá para uma clínica. Requer cuidados, durante 24
horas por dia. Fui visitá-lo no hospital e fiquei muito sensibilizada. Não
entendi nada que falou. Pegou minha mão e deu um beijo. Voltei para casa sabe
como...“
Era o que
vinha fazendo, rezar por ele, para que saísse logo da agonia e voltasse ao
convívio de amigos e admiradores, ao diálogo constante com os livros, às
veredas que percorrera com tanto brilho como contador de histórias. Se fosse para ficar no sofrimento, sem
perspectiva de recuperação, melhor viesse o
que se anunciava como o que temos de mais triste. E isso veio na notícia
enviada por Rosani: “ Lamento informar que o Caio faleceu hoje.”
Cearense nascido em Fortaleza, em 17 de julho
de 1928, Caio Porfírio Carneiro era um homem simples, um mestre do conto.
Sobre seu romance O Sal da Terra (Editora LetraSelvagem, 2010), disse o consagrado escritor João
Antonio: “Esta história pisa em
território virgem na literatura brasileira. O mundo branco e desconhecido do
sal no Nordeste, visto de dentro para fora e devassado com uma autenticidade
fotográfica, supera, de pronto, as frouxas investidas literárias que se tem
notícia na área das salinas e da sua gente.”
Acompanhei a trajetória do valoroso escritor desde
sua estreia, com os contos de Trapiá,
em 1961. Nessa época acontecia o
arranque do moderno conto brasileiro, que posteriormente teria um plantel de primeira
linha em nossas letras, formado no começo
por Samuel Rawet, Luís Vilela,
Dalton Trevisan, Rubem Fonseca, Murilo Rubião, José J. Veiga, Lígia Fagundes
Telles, João Antonio e Ricardo Ramos,
entre outros.
O contista
cearense publicaria uma dezena de livros no gênero, conquistando também seu
lugar no melhor do conto moderno brasileiro.
As histórias de Trapiá ultrapassavam os limites do regionalismo dos anos
30/40. Engajavam-se em uma literatura que tem como tema o ser humano tocado de
suas verdades essenciais: tristezas e dores.
Contos que
se apresentaram depois no espaço urbano, preocupados em flagrar essencialmente os conflitos nas relações humanas,
todos eles fazem ver a marca inconfundível de um ficcionista que usa como impressão digital a economia dos
meios expressionais. Portador de agudo sentimento de mundo, alcança a síntese do discurso com a precisão da
palavra capaz de revelar o drama amplo
no instante súbito.
Focado no
drama perante a existência, sem desprezar a ternura, o estilo enxuto de Caio
Porfírio Carneiro projeta densidade humana forçando o leitor participar da história,
tornar-se cúmplice do destino dos
personagens com sua feição sofrida. Envolve a alma humana sob o peso da vida,
sempre preenche o texto com sentimentos verdadeiros, a evitar que se percam no
anonimato e esquecimento.
Exemplar
secretário-administrativo da União Brasileira de Escritores, Seção de São Paulo, durante décadas. Contista premiado com o Jabuti e o Afonso
Arinos da Academia Brasileira de Letras.
O prêmio que mais se orgulhava de ter era o de conhecer
como ninguém um sem número de
escritores espalhados por esse Brasil de dimensões continentais. Desfrutava com
inúmeros deles de uma amizade especial, nutrida de gestos fraternos, solidários.
Hoje, 17
de agosto, está fazendo um mês que Caio
nos deixou. Ele, que se transferiu para São Paulo em 1952 e que nunca esqueceu sua condição de nordestinado.
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*Cyro de Mattos é baiano de Itabuna.Membro efetivo da Academia de Letras da Bahia
e Pen Clube do Brasil, UBE/SP e do Rio. Doutor Honoris Causa pela Universidade
Estadual de Santa Cruz (Sul da Bahia). Premiado no Brasil, Portugal, Itália e
México.Publicado em Portugal, Itália,
França, Alemanha,Espanha e Dinamarca.
Com Os Ventos Gemedores (EditoraLetraSelvagem),ganhou o Prêmio Pen Clube do Brasil -2015.
Clique sobre as fotos, para vê-las no tamanho original
Mais um atentado islâmico, covarde, brutal e cruel. Desta
vez em Barcelona, contra transeuntes de várias nacionalidades que,
despreocupados, numa ensolarada tarde de verão, desfrutavam do lazer no famoso
calçadão de Las Ramblas, na capital da Catalunha.
Terroristas planejavam grande atentado
Ao volante de uma van, um terrorista islâmico irrompeu numa
corrida louca no calçadão e, ao longo de 500 metros, atropelou a esmo quem
estava diante de si, inclusive crianças e bebês. 13 mortos, mais de 100
feridos, 15 dos quais em estado grave.
Um segundo ataque, poucas horas depois, se deu em Cambrilis,
Tarragona. Um outro veículo, conduzido por terroristas, também foi jogado sobre
pedestres, ferindo sete pessoas, uma das quais veio a falecer. A polícia abateu
os cinco terroristas.
Na noite anterior aos atentados, uma explosão se dera numa
casa em Alcanar. As forças de segurança espanholas creem que a mesma foi fruto
da manipulação de substâncias com as quais os terroristas preparavam um
grande atentado com veículos-bomba. Após a falha, improvisaram os ataques da La
Rambla e Cambrilis.
Estado Islâmico reivindica
A Catalunha é conhecida pelos serviços secretos europeus
como um dos principais centros do terrorismo islâmico. E as ações terroristas
de atropelar pedestres repetiram a estratégia dos atentados em Nice, Berlim,
Londres, Estocolmo.
A dantesca visão de cadáveres e de corpos feridos jogados na
calçada correu o mundo, gerando espanto e confusão. E, evidentemente,
tiveram início as reações. As de costume. As indecisões, as dúvidas… sobre
aquilo que não é indeciso nem duvidoso. Por fim, o Estado Islâmico reivindicou
os atentados como atos de seus “soldados” em solo espanhol.
“Pray for Barcelona”
As páginas das redes sociais começaram a encher-se de fotos
com os dizeres “pray for Barcelona”, como já tinha acontecido anteriormente nos
diversos atentados: “pray for Nice”, “pray for London”, etc. E, claro, pouco
depois não faltariam as flores e as velas no local do massacre.
A prece é algo de muito precioso e até sublime, fora de
dúvida. Mas tenho impressão de que essas preces são, muitas vezes, mencionadas
com o estado de espírito de certas crises de lágrimas e de soluços
humanitários, momentâneos, mas sem maiores consequências: um modo de acalmar a
consciência para, logo em seguida, prosseguir no indiferentismo e na rotina do
dia-a-dia. Afinal a maneira de fugir da dor é muitas vezes anestesiar-se diante
dela; e o meio pode muito bem ser uma prece mecânica e filantrópica.
“Vigiai e orai”
Ora Nosso Senhor, nos momentos que antecederam sua Paixão,
ensinou-nos: “Vigiai e orai, para não entrardes em tentação”. “Vigiai e
orai”. Este apelo à vigilância, antes mesmo da oração, é uma advertência contra
nossa índole despreocupada e bonacheirona, amiga de pactuar, adversa ao esforço
e a considerar de frente o mal. Ele nos ensinou, pois, antes de tudo a
vigiar, para não entrarmos em tentação, já que o mal não recua diante de nada e
não recuou sequer ao matar o Homem-Deus, o Inocente por excelência.
“Vigiai”: diante do mal, todas as desconfianças são
rigorosamente necessárias, já que é ele capaz até mesmo das piores infâmias.
Contra ele devem empregar-se todas as atitudes preventivas, inclusive de força,
conformes à Lei de Deus e dos homens. O otimismo bobo, o não considerar o
perigo, o adiar o combate ao mal são verdadeiros crimes de quem não quer
vigiar. E nossa oração só atingirá todo o seu fruto se vigiarmos, como nos
ensina o Divino Redentor.
Paganismo insolente
Diante do atentado terrorista islâmico de Barcelona não
fechemos os olhos, uma vez mais, apelando a uma prece vaga. Tenhamos coragem de
ver o perigo, de analisá-lo, de enfrentá-lo com sabedoria e fé. O Islã,
que hoje procura o Ocidente para se refugiar de seus próprios fracassos
políticos, sociais e econômicos, se manifesta em muitos de seus elementos “como
um paganismo insolente, opressivo, xenófobo e com ares racistas”, como com
previdente vigilância advertia, em 1943, Plinio Corrêa de Oliveira, em um
de seus célebres artigos no “Legionário” (cfr. “Neopaganismo”, 8-8-1943).
Não nos esqueçamos de que o mal é de tal forma ardiloso que
não se esquiva sequer de usar suas máquinas de propaganda para tentar
justificar os assassinos, diminuir a gravidade dos atos terroristas, escamotear
seus fundamentos, enquanto, manipulando palavras e termos “talismãs” –
como “islamofobia” – tenta inibir qualquer reação e voltar a desconfiança
contra as próprias vítimas da barbárie.
Sim, “pray for Barcelona”. Mas não nos esqueçamos das
palavras de Nosso Senhor: “Vigiai e orai”, para que nossas preces não sejam
vãs.
* * *
Acabo de receber de um amigo a fotografia da estátua del
“Mio Cid”, Rodrigo Díaz de Vivar, o lendário cavaleiro castelhano do século XI
que enfrentou os muçulmanos por diversas vezes. Segundo reza a lenda, às
vésperas de uma batalha contra os infiéis, “El Cid Campeador” faleceu de
ferimentos em seu castelo de Valência. Seus adversários ficaram confiantes pois
haviam finalmente matado o El Cid. Entretanto, sua mulher mandou amarrar seu corpo
ao cavalo e sua espada a sua mão e o enviou ao campo de batalha. Ao ver El Cid
em cima do seu cavalo os muçulmanos fugiram em debandada sendo perseguidos e
derrotados pelo exército de Rodrigo.
Numa das faces do pedestal da estátua de “El Cid”, na cidade
espanhola de Burgos, está escrito: “O Campeador, levando consigo sempre a
vitória, foi, por sua infalível clarividência, pela prudente firmeza de seu
caráter, e pela sua heroica bravura, um milagre entre os grandes milagres do
Criador”.
Espelhemo-nos no Cid Campeador, um homem que, em relação a
si e ao mal, teve uma “infalível clarividência” e foi vitorioso por seguir o
conselho do Divino Mestre: “Vigiai e orai, para não entrardes em
tentação”!
— O Senhor esteja convosco.
— Ele está no meio de nós.
— PROCLAMAÇÃO do Evangelho de Jesus Cristo + segundo Lucas.
— Glória a vós, Senhor.
Naqueles dias, Maria partiu para a região montanhosa, dirigindo-se,
apressadamente, a uma cidade da Judeia. Entrou na casa de Zacarias e
cumprimentou Isabel. Quando Isabel ouviu a saudação de Maria, a criança
pulou no seu ventre e Isabel ficou cheia do Espírito Santo. Com um grande
grito, exclamou: “Bendita és tu entre as mulheres e bendito é o fruto do teu
ventre! Como posso merecer que a mãe do meu Senhor me venha
visitar? Logo que a tua saudação chegou aos meus ouvidos, a criança pulou
de alegria no meu ventre. Bem-aventurada aquela que acreditou, porque será
cumprido o que o Senhor lhe prometeu”.
Então Maria disse: “A minha alma engrandece o Senhor, e o meu espírito se
alegra em Deus, meu Salvador, porque olhou para a humildade de sua serva.
Doravante todas as gerações me chamarão bem-aventurada, porque o
Todo-poderoso fez grandes coisas em meu favor. O seu nome é santo, e sua
misericórdia se estende, de geração em geração, a todos os que o respeitam. Ele
mostrou a força de seu braço: dispersou os soberbos de coração. Derrubou
do trono os poderosos e elevou os humildes. Encheu de bens os famintos, e
despediu os ricos de mãos vazias. Socorreu Israel, seu servo, lembrando-se
de sua misericórdia, conforme prometera aos nossos pais, em favor de
Abraão e de sua descendência, para sempre”. Maria ficou três meses com
Isabel; depois voltou para casa.
Ligue o vídeo abaixo e acompanhe a reflexão do Pe. Paulo
Ricardo
---
VISITAÇÃO:
o encontro com o outro faz saltar a vida em nosso interior
“Quando Isabel ouviu a saudação de Maria, a criança pulou no
seu ventre...” (Lc 1,41)
A festa da Assunção de Maria nos oferece uma privilegiada
oportunidade para aprofundar o mistério de toda vida humana. A todos nos
preocupa qual será meta de nossa existência. Para grande parte do povo
católico, a festa de hoje, juntamente com a festa da Imaculada, é a festa de
Maria. A Imaculada marca o começo de sua história, a Assunção marca o destino
final. Entre ambos “mistérios” ocorre o transcurso de sua vida, numa contínua
identificação com Deus, ao lado da vida de Jesus.
Porque “assumiu” Deus em sua vida, Maria foi “assumida”
totalmente por Deus; ela deixou Deus ser grande na sua vida; por isso, Deus a
engrandeceu plenamente. Realiza-se, portanto, em Maria a situação final, já
dentro da história, situação prometida a toda humanidade: “ser um dia de Deus e
para Deus”; Maria o é desde o início (imaculada) até o final (assunção),
através de uma fidelidade de toda a sua vida.
Sabemos que o encontro definitivo em Deus só acontece quando
preenchemos de sentido os “encontros” com aqueles(as) que cruzam nossas vidas.
No relato do Evangelho de Lucas, indicado para a festa de hoje, há duas
mulheres, Maria e Isabel, que experimentaram profundamente o dom da gratuidade,
e seu lugar de carência se converteu em lugar de abundância. As duas
descobriram o dinamismo curador das relações e a riqueza que os encontros
pessoais revelam.
As relações que nos constituem são o tecido pelo qual
circula nossa abertura a Deus e por onde crescemos em humanidade, acolhendo e
sendo acolhidos pelos outros. Vivemos em um mundo hiperconectado, em contato
permanente e presente, ao mesmo tempo, em todos os lugares. O mundo, nossa
vida, se converteu num “chat” contínuo. No entanto, em meio a este “chat”
universal, a conversação emudeceu; a maior parte de nossas “conversações”
tornaram-se prisioneiras das telas (celulares, tablets, smartphones, internet).
Corremos o risco de reduzir a comunicação à conexão. Banalizam-se os conteúdos
da conversa, mas também são amputadas dimensões fundamentais da experiência da
comunicação, sobretudo a presença física. Sem essa presença, sem o encontro
pessoal, não é possível o diálogo e a verdadeira comunicação. Este empobrecimento
da comunicação vivente com o outro, ou a atrofia e medo de um face-a-face, é
sinal claro de uma profunda desumanização.
O “mistério da visitação” nos possibilita recuperar o
sentido e o dinamismo de um encontro interpessoal. O encontro é uma realidade
inter-humana dinâmica e, até certo ponto, tem algo de arriscado e imprevisível,
derrubando todas as nossas prévias tentativas de controlá-lo. Podemos
planificá-lo preparando estratégias; podemos acolhê-lo cheio de expectativas
ou, pelo contrário, sem elas, esperando uma mera formalidade, repetição de
outras situações semelhantes; podemos nos mostrar desejosos ou desconfiados,
seguros ou ansiosos... De repente, algo inesperado acontece, na outra pessoa,
ou em nós mesmos, ou no contexto, convertendo aquele encontro numa situação
única e original, afetando nosso viver ou transformando nosso eu profundo.
O evangelista Lucas nos apresenta uma visita inesperada: a
visita daquela que não permanece fechada nem ensimesmada em seu mistério; a
visita daquela que se sente impulsionada a sair de si mesma para colocar-se a
serviço daquela que está necessitada de ajuda. Uma visita alegre, espontânea e
gratuita, porque cheia da experiência de Deus; Maria que faz Isabel sentir a
alegria de uma maternidade não esperada e Isabel que faz Maria sentir as
maravilhas que Deus realizou nela. Uma visita que se expressa em dois cantos de
louvor e ação de graças: “Bendita és tu que acreditaste” e “Minha alma
engrandece o Senhor”.
As duas mulheres se encontram em diferentes momentos vitais:
Isabel na terceira etapa de sua vida, Maria quase na primeira, entrando na
segunda. Uma é estéril e anciã, a outra, jovem e virgem, ambas portadoras de
uma vida maior que elas mesmas, conhecedoras do mistério que crescia em seu
interior. Devido à sua gravidez, as duas se encontram fora da norma social, do
estabelecido. Isabel é idosa para poder conceber, e Maria está grávida sem
estar casada. Ambas deviam sentir não só alegria no abraço, mas também a
comoção e as dúvidas: “quê vai acontecer?”, “como vamos ajeitar as coisas?”...
Elas apoiam-se mutuamente no momento no qual estão, na
situação que atravessam; reconhecem-se e se confirmam; estabelecem um vínculo
entre elas, aceitam-se mutuamente; não se julgam nem valoram em função do que a
sociedade considera correto ou incorreto; compreendem o que significa para cada
uma delas que algo novo está crescendo em seu interior.
Maria não vai só servir a Isabel; ela precisa de alguém que
a partir de sua experiência lhe diga: “vai em frente, que isso é de Deus”.
Necessita que Isabel a confirme e a bendiga. E Isabel, por sua vez, necessita
agradecer o sonho de Deus que as duas compartilham e que se tornou possível.
Isabel e Maria se convertem cada uma em comadre, em parteira da outra; a partir
de seus diferentes momentos vitais, vão se ajudar a esperar e a passar o
processo do “dar à luz”. Na vida nova que está se gestando nelas, no secreto,
anseiam em uníssono para trazer ao mundo algo de Deus que estava oculto.
As duas sabem de espera e de dores de parto. O parto não é
um fato isolado e acontece nele a contração e a relaxação, a dor e o prazer, a
posse e o desprendimento, a tristeza e a alegria, o medo e a confiança. Isto
que as parteiras mencionam como momentos do parto, do “dar à luz”, são momentos
de nossa vida, de nossos encontros. Todos nos reconhecemos aí. Somos parteiros
uns dos outros, e necessitamos cuidar desses processos cotidianos onde a vida
do Espírito se manifesta como luz da vida.
À sombra do encontro entre Maria e Isabel e contemplando o
modo de visitar e de ser visitado, agradecemos o tecido relacional que
configura nossas vidas. É um tempo para orar os encontros, para considerar
aqueles que precisamos continuar alimentando e aqueles que se romperam e que
queremos reparar. Agradecer os encontros que nutrem nossa vida. Trazer ao
coração as pessoas significativas que nos fizeram provar o sabor do amor em nós
e seus bons efeitos. Recolher agradecidamente os pequenos gestos de amor, de
carinho, de escuta, de confiança, de paciência... que tiveram conosco.
Há visitas que não significam muito: só servem para matar o
tempo e “jogar conversa fora”. E há visitas que despertam vida, que faz saltar
a vida divina que carregamos dentro de nós. Por isso, todos somos seres
carentes de “mais visitações”. Visitações que despertem nossas possibilidades e
sonhos, visitações que nos façam saltar de alegria, visitações que nos ajudem a
reconhecer as maravilhas que Deus realiza em nós e nos outros.
Isabel e Maria se fazem valer mutuamente e despertam o
melhor que há em cada uma. Viveram uma história de agradecimento e de
libertação, se encontraram a partir da alma, a partir do mais profundo de si
mesmas e se ofereceram mutuamente palavras amigas, palavras de encorajamento e
de sabedoria. Elas nos ajudam a nos perguntar: Quê tipo de história relacional
queremos viver? Uma história a partir do ego ou a partir interioridade?
Texto bíblico: Lc 1,39-45
Na oração: sua casa, lugar de visitação e encontro, espaço
humano de partilha, convivência, festa, ajuda...?
Ou, casa cercada de parafernália eletrônica de segurança,
com entrada rigorosamente controlada..., impedindo o acesso até mesmo dos mais
próximos (parentes, amigos)?
- Seja uma casa sempre aberta: “entrada franca”;
Casa, lugar do lava-pés, do mandamento novo, da amizade, da
visitação...
Casa, lugar de unção-acolhida, serviço e cuidado...
Casa, lugar da gestação de novas vidas, da experiência de
nascimentos permanentes...