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terça-feira, 11 de janeiro de 2022

PROVOCAÇÃO DA POETA HELOÍSA PRAZERES – Cyro de Mattos


Provocação da Poeta Heloísa Prazeres  
Cyro de Mattos*
         

           Conterrânea Heloísa Prazeres, bom dia.
           Atendendo seu pedido, assisti ontem à noite sua palestra em parceria com o professor Aleilton Fonseca sobre o tema agoridade, o tempo e a escrita. Bem instrutiva. Você me pede que eu diga alguma coisa sobre a atuação dos dois doutores. Só não me coloque em condição que eu não sou quando carinhosamente me chama de mestre. Mestre era Jesus, o bem-amado salvador da humanidade, que não tinha biblioteca, mas tudo sabia sobre o caminho e a verdade, permita-me. O seu chamamento de mestre não me cabe, fica por conta da generosidade.
           Constato que estou como vínculo de gravidade inserido na agoridade dos tempos eletrônicos. Sincronizado ou submisso, travado pelos dias velozes no que fui como um leitor curioso e voraz de autores fantásticos.   O tempo, como romanceia o genial William Faulkner, não perdoa. Há muito passei a ser sabedor que não muda, nós é que mudamos. Assim, a contragosto, por mais que eu tenha tantas explicações, do princípio ao fim nada sei de mim, nessa viagem caudalosa, pontuada de mistério.  Nessa caminhada por camadas espessas de sombras, que me justapõem por caminhos que se bifurcam, tornados círculos metafísicos como rios que se repetem em busca do que não tem resposta, como nos fala Borges em suas maravilhosas ficções, aquele homem que ficou cego, mas que valia por toda uma literatura, como se refere Infante Cabrera.  
             Cada vez mais estou sabendo que saímos de cena como entramos, despidos de tudo, vestidos no inexorável, nada se fazendo até agora para abrir a porteira com a clarividência e se adentrar no lado de lá. Ser ou não ser, eis a questão. Dou-me conta então que os gregos e seus deuses, a Bíblia, Shakespeare e Cervantes são quatro pilastras gigantescas de nossa evolução cultural, inauguram novos sentidos da vida. Mas quem inaugura o personagem na História é o criador do Quixote, bom não esquecer, como o antropólogo Muniz Sodré observa com conhecimento de causa.
           Depois de duas guerras mundiais, que abalaram os fundamentos do mundo, aconteceu o personagem crítico com a fixação do mal, um discurso de anti-herói em tempo de conflito mesclado com depressões e pessimismo. Com o seu dizer que põe a razão no abismo, sem escape, travado pelo cerco do absurdo indicado por Kafka. Acontece que depois da revolução industrial, este ser que tudo quer, nada lhe satisfaz, mas ainda tanto se desconhece, que se apresenta como homem ou algo que valha com o nome de homem, inventou essa nossa vida recheada de meios eletrônicos. Estou   no trânsito da vida como um ser eletrônico, atônito e pasmo. Tudo é rápido, esgota num abrir e fechar de olho, aqui como acolá, expande-se e volta para a tela da agoridade.
          Nessa circunstância crítica do que sou nesse momento, sincronizado com a agoridade ou vivente com a diáspora dos meios eletrônicos, nada impede que eu escreva os meus pequenos poemas, como esse a seguir chamado de Dunas: “Considero que o silêncio/reencontra-me no imenso/e me ilumina em solidão.” Preciso dizer que estou sendo influenciado por Ungaretti? São jeitos da tão discutida agoridade, um autor ser puxado pelo grande.
         Com quase 83 anos, evidente que o tempo vai ficando curto. Preciso selecionar. Agrava o caso alguns abalos na saúde, o que é próprio da idade avançada. A mente continua saudável, daí continuar escrevendo e publicando, coisas de ontem e hoje como se na escrita da agoridade falassem. Você, minha conterrânea, e o professor Aleilton deram uma aula bem-sucedida sobre o tema agoridade, o tempo e a escrita. Uma exposição eficaz que fez com que eu despertasse sobre a problemática do assunto, como merece, daí agradecer aos dois doutores sobre a acuidade mental com base em instrumental teórico suficiente com que enfrentaram o desafio do assunto.
            Cronos não muda, é o mesmo, mudamos nós, que nos perdemos no viver de cada instante que se vai. Com tanta velocidade, meios eletrônicos que fazem o longe ser perto, a extensão ter compreensão instantânea, tudo ficou relativo. Os seres e coisas postos no mundo para que sejam alcançados são assim detectados, às vezes com proveito, outras horas com desperdício na enxurrada visual das mensagens, mas fica evidente que, graças a Deus, ainda não conseguiram abolir o sonho.  
           Como diz o enorme Fernando Pessoa, aquele que elegeu os heterônimos, substituindo o eu lírico pelas versões filosóficas do poético, “o que dói não é / o que está no coração, / mas essas coisas/ que não existirão.”

           Obrigado
           Cyro de Mattos

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*Cyro de Mattos é autor premiado no Brasil e exterior.

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SENTADA NUM POTE DE OURO – Péricles Capanema


Péricles Capanema

 

Pote de ouro enterrado. A Venezuela tem o maior volume de reservas de petróleo comprovadas na Terra. Nesse aspecto, reservas de petróleo, é a nação mais rica do mundo. Estão por volta de 300 bilhões de barris de petróleo as reservas comprovadas. Em segundo lugar vem a Arábia Saudita, com 270 bilhões. Têm 39 bilhões de barris comprovados os Estados Unidos. O Brasil, 16 bilhões de barris. Em números redondos, a riqueza de petróleo comprovada da Venezuela é quase 20 vezes superior à do Brasil. São aproximativos os números, variam segundo as fontes consultadas, mas um ponto é comum entre elas: a Venezuela está em primeiro lugar. É preciso ainda considerar que o custo de extração por barril na Venezuela é maior que o da Arábia Saudita, o que diminui a vantagem do país sul-americano. Façam as contas, o barril de petróleo está por volta de 80 dólares; pode subir muito ainda. Para a Venezuela, adiantou muito ser assim o passado, adianta quase nada hoje. Afunda sem parar já faz uns dez anos. Logo abaixo, a causa.

Prosperidade passada. A Venezuela foi chamada de “Venezuela saudita”, “o país que mais consome uísque no mundo”. A riqueza jorrava. Caracas maravilhava pelos prédios modernos. Sua renda per capita em 1998 beirava 16 mil dólares, logo atrás da renda per capita dos argentinos, então no primeiro lugar da América do Sul. É o passado; dele, pensa a maioria esmagadora do país, nada ficou, além das lembranças de uma era dourada.

Desgraça presente; pote de ouro que não serve para nada. O Haiti sempre foi o país mais pobre da América Latina. Não é mais. Quando 2021 acabou, segundo projeções do FMI, ele entrou no penúltimo da lista, com renda per capita de 1.690 dólares. Agora é a Venezuela, com renda per capita de 1.627 dólares, o país mais pobre da América Latina. O país tem mais de 4 milhões de refugiados — venezuelanos que fogem da fome, da perseguição política, do desemprego, da vida sem futuro. Está no oitavo ano consecutivo de recessão, desde 2013 a economia encolheu 80%. Por causa da hiperinflação já cortou 14 zeros da moeda. Na prática, o povo abandonou a moeda nacional e dolarizou a economia. Tudo é comprado e vendido com cotação em dólares. Oito milhões de pessoas estão desempregadas em população de pouco menos de 30 milhões.


O socialismo do século XXI destruiu a Venezuela.
A causa, agora. O chavismo [ou socialismo bolivariano] do coronel Hugo Chávez [na foto, com Fidel Castro] estraçalhou a Venezuela, reduzindo-a a frangalhos. Ela hoje vive dos apoios de Cuba, Nicarágua, China, Rússia. No Brasil, tem um apoio fervoroso, o PT, sempre firme em sua defesa mitomaníaca da igualdade, não importa o sofrimento popular. O PT ocupa hoje no Brasil espaço político similar ao que foi tomado ao longo do século XX pelos PCs de orientação soviética em muitos dos países ocidentais. A propósito das eleições venezuelanas de novembro passado, o PT divulgou comunicado de apoio ao pleito venezuelano, fraudulento e autoritário: “o processo eleitoral ocorreu em total respeito às regras democráticas e concedeu a vitória do Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV) em vinte estados, tendo a oposição vencido nos três restantes”. O presente governo estimula a corrupção entre altos oficiais da Forças Armadas (de onde vem parte de seu apoio) e mantém laços com o tráfico de drogas. Tal situação repercute no Brasil, repercutirá ainda mais, se a situação se perenizar na Venezuela, em especial em nossa região norte. E repercutirá de forma devastadora, se o PT sair vitorioso nas eleições de 2022. É inafastável a constatação: a aplicação das políticas preconizadas pelo PT (parecidas com as políticas do chavismo) precipitará o Brasil em situação semelhante à da Venezuela.

Passividade suicida. A situação dantesca que, sem perspectiva de mudança rápida, padecem Venezuela e Cuba, é mortal entre nós para os objetivos eleitorais do PT? Pode “pegar mal” no povo, já que Venezuela e Cuba são hoje o que poderemos ser amanhã, caso o PT volte e se aninhe no poder.

Acoitados no poder. Cuba, Nicarágua, Venezuela, China, perenidades infernais. São modelos para a ação petista. A esquerda deixa o poder? Certo, admito, essa realidade trágica pode prejudicar a força eleitoral do PT. O prejuízo será mortal para seus objetivos? Tenho minhas dúvidas. Lula e Dilma sempre apoiaram Fidel Castro [modelo de Hugo Chávez e Nicolás Maduro] e ganharam quatro eleições presidenciais. E os deputados do PT formam bancada forte, apesar de sempre terem apoiado o socialismo cubano e venezuelano. O dinheiro brasileiro jorrou solto para os dois países e ninguém acha que um dia voltará. O escândalo não tem sido mortal para os objetivos petistas. Sei que há muitos fatores que atenuam a gravidade, e até a culpabilidade, presentes em tomadas de posição do público em geral.

Alarma regenerador. Contudo, fato é que alarmam os atuais índices obtidos por Lula nas presentes pesquisas (passageiros, pouco consolidados, até em parte falseados, concedo). Tendo-os como fundamento de análise, o Brasil pode ter quatro, oito anos, até mais, de governos que admiram sem rebuços a tortura infligida pelos chavistas ao povo venezuelano. De outro lado, tal fato triste e trágico pode ser alarma regenerador, toque de rebate para o começo de atitudes de reconquista. O que será necessário? Em primeiro lugar, entendo, ver com clareza, sem ilusões, a situação, mesmo em seus pontos mais débeis e preocupantes. A seguir, energia e pertinácia, o que implica emprego intenso e arguto dos instrumentos lícitos, sempre na lei e na ordem. Sem coordenação de esforços dificilmente se evitará a tragédia. Adiante do Brasil que presta estão meses de batalha para evitar que a epidemia socialista tome conta do país. Seria atitude de reconquista. Pois parte do público, hoje passiva, letárgica, indiferente, iludida até, precisa ser reconquistada.

Exemplo de reação salvadora. Winston Churchill foi grande condutor político, sempre traz bons exemplos para horas difíceis e estamos em uma delas. Em situação grave da Inglaterra, até desesperadora, o dirigente não escolheu enfiar a cabeça na areia. Fez o contrário. Pintou com cores sombrias (e reais) para o povo inglês o quadro geral. Lembro palavras suas aos britânicos: “Estamos diante de uma das maiores batalhas da História. Digo para a Câmara dos Comuns o que disse para os que apoiaram o governo. Só vos prometo sangue, fadigas, lágrimas e suor. Temos diante de nós muitos longos meses de luta e sofrimento. Vocês perguntam, qual é nossa política. Digo, fazer a guerra por mar, terra e ar, com todo nosso poder e com toda a força que Deus nos dê, fazer a guerra contra uma tirania monstruosa, nunca ultrapassada no negro e lamentável catálogo do crime humano. Esta é nossa política. Perguntam qual é nosso objetivo. Respondo com uma palavra: vitória. Vitória, não importam os custos”.

Ad augusta per angusta. Vitória não vem sem lutas. E clareza de vistas. Que Deus nos ajude.

 

https://www.abim.inf.br/sentada-num-pote-de-ouro/

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