13 de janeiro de 2021
Péricles Capanema
No dia 21 de dezembro, o Papa Francisco em mensagem de Natal
para a Cúria Romana repentinamente desfechou: “E recordo o que dizia
aquele santo bispo brasileiro: ‘Quando me ocupo dos pobres, dizem de mim que
sou um santo; mas, quando me pergunto e lhes pergunto: ‘Por que tanta
pobreza?”, chamam-me ‘comunista’”.
Também vou recordar, apontando evidências. O “santo bispo
brasileiro” a quem ele se refere é Dom Hélder Câmara (1909 – 1999) [foto acima].
E a frase lembrada não passa de uma “boutade” de Dom Hélder, frasista
conhecido, foi pirueta para escapar de censura pertinente de que sua ação
favorecia o comunismo.
A alusão inesperada do Papa Francisco — é penoso constatar,
contudo inevitável, incoercível a lógica, foi propaganda mundial para Dom
Hélder, com reflexo caloroso também para o comunismo, nomeado sem reservas como
movimento que luta pelos pobres — suscitou esperada alegria na esquerda. Apenas
como exemplo, festejou-a Fernando Haddad, candidato derrotado do PT nas últimas
eleições presidenciais: “Dom Hélder foi citado pelo Papa Francisco na sua
mensagem de Natal. Não poderia ser mais inspirador”. Inspirador aqui significa
animador. Em sentido contrário, tais palavras contristaram os setores que temem
a ascensão do petismo. Desconcertaram, jogaram muitos no desânimo.
De passagem, em perspectiva ampla, a alusão do Pontífice é
de molde a agravar a exclusão social, racha a sociedade ainda mais, piora as
perspectivas para os menos favorecidos. Na prática, agride a causa dos pobres e
bafeja estruturas de opressão. Falarei sobre isso abaixo.
Agora, recordações esclarecedoras, pingo sobre alguns dos
principais iis. Dom Hélder teve carreira versátil. Integralista desenvolto nos
primeiros anos de sacerdócio (ordenado em 1931), acabou aclamado por correntes
de esquerda no mundo inteiro por sua ação contínua a favor da pauta dela, em
especial nos anos de episcopado (sagrado em 1952). Aliás, não saiu do
integralismo batendo a porta: “Nunca rompi com o integralismo”, observou
em 1983.
Assim, depois de alguns anos como ativista saliente do
integralismo, migrou resolutamente para se transformar no Brasil no mais
decisivo promotor da agenda do progressismo e do esquerdismo nas fileiras do
Clero e do Episcopado.
Ainda na década de 30 Dom Hélder se aproximou do ideário e das propostas de Jacques Maritain (1882-1973), pensador de grande influência na Ação Católica brasileira. O filósofo francês, corifeu do liberalismo católico, promovia a junção das doutrinas da Revolução Francesa com o ensinamento da Igreja, expressa de forma concisa em sua formulação “sociedade laica, vitalmente cristã”. Já não se procuraria a ordem temporal cristã, ideal de restauração, mas se aceitaria (ou pelo menos se toleraria) a sociedade nascida da Revolução Francesa, objetivo de acomodação. Nela, na sociedade laica, moldada pelo racionalismo, buscar-se-ia insuflar uma vida evangélica.
A Ação Católica no Brasil, influenciada pelo maritainismo,
da qual Dom Hélder foi assistente geral e grande impulsionador, está nas
nascentes da esquerdização do Clero e do laicato. Neste quadro, Dom Hélder foi
ainda o motor da criação da CNBB, da qual foi secretário-geral por muitos anos
entre 1952 e 1964. A entidade, todos sabem, tornou-se correia de transmissão
das palavras de ordem da esquerda brasileira, do PT tem sido fiel e
disciplinada companheira de viagem nos últimos lustros. Da Ação Católica nasceu
a JUC; no caldo de cultura da mencionada organização universitária surgiu a AP,
marxista e guerrilheira — e aqui lembro o fato apenas como ilustração de
realidade generalizada nos ambientes da Ação Católica. Ali também medraram a
JEC, JOC, JAC, todas favorecedoras de programas de esquerda radicalizados. O
mais simbólico rebento da JEC é frei Betto. Do mesmo modo, daí vieram as
comunidades eclesiais de base (CEBs), ali teve seu começo a Teologia da
Libertação. Para a gestação e nutrição de todas essas entidades e correntes
doutrinárias que pululavam no seio da Igreja Católica colaborou Dom Hélder. E
por isso, era natural, tornou-se a figura símbolo do esquerdismo católico no
Brasil. O PT fincou um de seus esteios em dito universo agitado — as CEBS e a
esquerda católica em geral. As outras duas estacas foram o movimento sindical e
a esquerda universitária.
“Pelos frutos os conhecereis”, não pelas palavras. Os frutos
pestilenciais estão à vista, corrupção, roubalheira e empobrecimento causados
pelos anos do PT no poder. E apoio às tiranias na América Latina, Cuba,
Venezuela, Nicarágua, onde, em situação totalitária, perpetuam a miséria.
Se a mencionada corrente voltar ao poder entre nós,
trabalhará para fazer do País, logo que possível, uma cópia da Venezuela ou de
Cuba. Para tanto, temos visto já atuando agora a CNBB, a CPT e o MST, todos
ligados umbilicalmente à esquerda católica. Nas raízes estão Jacques Maritain,
a Ação Católica e o ativismo de Dom Hélder.
O que tal movimento trouxe para os pobres em todos os
lugares em que venceu? Somente atraso, destruição dos horizontes de
crescimento, agravamento da pobreza. O que mais? Estruturas de opressão na
sociedade e no Estado. E exclusão social. Onde se instalou se pavoneia
arrogante a casta dirigente e padece manietado décadas afora o povo oprimido,
os excluídos. E não nos iludamos, é cenário trágico de retrocesso
obscurantista, mas possível, de alto a baixo, toda a América Latina está agora
ameaçada por tais programas de destruição. A atuação de Dom Hélder os
beneficiou de forma relevante e por isso multidões de católicos estão perplexos
com seu elogio pelo Papa Francisco.
https://www.abim.inf.br/exclusao-e-empobrecimento/
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