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quinta-feira, 26 de outubro de 2017

“ANTE A ESCANDALOSA CORRUPÇÃO E OS ENORMES PROBLEMAS SOCIAIS, O BRASIL PRECISA QUE SEUS PADRES SEJAM SINAL DE ESPERANÇA”

23 Outubro 2017

"Neste momento difícil da sua história, em que tantas pessoas parecem ter perdido a esperança num futuro melhor diante dos enormes problemas sociais e da escandalosa corrupção, o Brasil precisa que os seus padres sejam um sinal de esperança. Os brasileiros precisam ver um clero unido, fraterno e solidário, em que os padres enfrentam juntos os obstáculos, sem deixar-se levar pela tentação do protagonismo ou do carreirismo. Tenho a certeza de que o Brasil vai superar a sua crise, e confio que vocês serão protagonistas desta superação", afirmou o Papa Francisco, na manhã de hoje, 21 de outubro, no Vaticano, ao receber em audiência a Comunidade do Pontifício Colégio Pio Brasileiro de Roma, por ocasião dos 300 anos do encontro da imagem de Nossa Senhora Aparecida.

O Papa chamou a atenção para a 'doença' do 'academicismo' e a tentação de fazer dos estudos um mero meio de engrandecimento pessoal e alertou para que os padres não se deixem "levar pela tentação do protagonismo ou do carreirismo". "Por favor, pediu Francisco, não se esqueçam que antes de serem mestres e doutores, vocês são e devem permanecer padres, pastores do povo de Deus!"

Eis o texto.

Queridos irmãos e irmãs,

Recebo-lhes hoje, por ocasião dos trezentos anos do achado da veneranda Imagem de Nossa Senhora Aparecida. Agradeço o Cardeal Sérgio da Rocha, Presidente da CNBB, pelas palavras amáveis que me dirigiu, em nome de toda a Comunidade presbiteral do Pontifício Colégio Pio Brasileiro, juntamente com as religiosas e funcionários que colaboram para fazer dessa casa “um pedacinho do Brasil em Roma”.

Como é importante sentir-se num ambiente acolhedor, quando estamos longe e com saudades da nossa terra! Isso ajuda a superar as dificuldades para adaptar-se a uma realidade onde a atividade pastoral não é mais o centro do dia-a-dia. Vocês já não são mais párocos ou vigários, mas padres estudantes. E, essa nova condição pode trazer o perigo de gerar um desequilíbrio entre os quatro pilares que sustentam a vida de um presbítero: a dimensão espiritual, a dimensão acadêmica, a dimensão humanae a dimensão pastoral. Evidentemente, neste período concreto da vida de vocês, a dimensão acadêmica vem acentuada. Contudo, isso não pode significar um descuido das outras dimensões.

É preciso cuidar da vida espiritual: a Missa diária, a oração quotidiana, a lectio divina, a oração pessoal com o Senhor, a recitação do terço. Também a dimensão pastoral deve ser cuidada: na medida do possível, é saudável e recomendável desenvolver algum tipo de atividade apostólica.

E, pensando na dimensão humana, é preciso, acima de tudo, evitar que, diante de um certo vazio ligado à solidão, por não ter mais a consolação do povo de Deus, como quando estavam nas suas dioceses, acabe-se perdendo a perspectiva eclesial e missionária dos estudos. Isso abre a porta para algumas “doenças” que podem afetar o padre estudante, como por exemplo o “academicismo” e a tentação de fazer dos estudos um mero meio de engrandecimento pessoal. Em ambos os casos acaba-se por sufocar a fé que temos a missão de guardar, como pedia São Paulo à Timóteo: «Guarda o depósito que te foi confiado. Evita as conversas frívolas de coisas vãs e as contradições da falsa ciência. Alguns por segui-las, se transviaram da fé» (1Tm 6, 20-21). Por favor, não se esqueçam que antes de serem mestres e doutores, vocês são e devem permanecer padres, pastores do povo de Deus!

Mas como então manter o equilíbrio entre esses quatro pilares fundamentais da vida sacerdotal? Eu diria que o remédio mais eficaz contra esse perigo é a fraternidade sacerdotal. Na verdade, a nova Ratio Fundamentalis para a formação sacerdotal, ao tratar do tema da formação permanente, afirma que «primeiro âmbito em que se desenvolve a formação permanente é a fraternidade presbiteral» (n. 82). Essa é, portanto, como que o eixo da formação permanente. Isso se fundamenta no fato de que, pela Ordenação sacerdotal, participamos do único sacerdócio de Cristo e formamos uma verdadeira família. A graça do sacramento assume e eleva as nossas relações humanas, psicológicas e afetivas e «se revela e concretiza nas mais variadas formas de ajuda recíproca, não só espirituais mas também materiais» (João Paulo II, Pastores dabo vobis, 74).

Na prática, isso significa saber que o primeiro objeto da nossa caridade pastoral deve ser o nosso irmão no sacerdócio: «carregai – nos exorta o Apóstolo – os fardos, uns dos outros; assim cumprireis a Lei de Cristo» (Gal 6,2). Rezar juntos, compartilhar as alegrias e desafios da vida acadêmica. Ajudar àqueles que sofrem mais com as saudades. Sair juntos para passear. Viver como família, como irmãos, sem deixar ninguém de lado, sobretudo aqueles que passam por alguma crise ou, quem sabe, têm comportamentos repreensíveis, pois «a fraternidade presbiteral não exclui ninguém» (Pastores dabo vobis, 74).

Queridos sacerdotes, o povo de Deus gosta e precisa de ver que seus padres se amam e vivem como irmãos, ainda mais pensando no Brasil e nos desafios tanto de âmbito religioso como no social que lhes esperam ao retorno. De fato, neste momento difícil da sua história, em que tantas pessoas parecem ter perdido a esperança num futuro melhor diante dos enormes problemas sociais e da escandalosa corrupção, o Brasil precisa que os seus padres sejam um sinal de esperança. Os brasileiros precisam ver um clero unido, fraterno e solidário, em que os padres enfrentam juntos os obstáculos, sem deixar-se levar pela tentação do protagonismo ou do carreirismo. Tenho a certeza de que o Brasil vai superar a sua crise, e confio que vocês serão protagonistas desta superação.

Para isso, contem sempre com uma ajuda particular: a ajuda da Nossa Mãe do Céu, a quem vocês brasileiros chamam de Nossa Senhora Aparecida. Vem a minha mente as palavras daquele canto com o qual vocês a saúdam: «Virgem santa, Virgem bela; Mãe amável, mãe querida; Amparai-nos, socorrei-nos; Ó Senhora Aparecida». Que essas palavras se confirmem na vida de cada um de vocês. Possa a Virgem Maria, amparando e socorrendo, ajudá-los a viver a fraternidade presbiteral, fazendo com que o período de estudos em Roma tenha muitos frutos, para além do título acadêmico.

Que Ela, Rainha do Colégio Pio Brasileiro, ajude a fazer desta comunidade uma escola de fraternidade, transformando cada um de vocês em um fermento de unidade para as suas Dioceses, pois a “diocesanidade” do sacerdote secular se alimenta diretamente da experiência da fraternidade entre os presbíteros. E, para confirmar esses votos, concedo de coração à direção, alunos, religiosas e aos funcionários juntamente com suas famílias, a Bênção Apostólica, pedindo também que, por favor, não deixem de rezar por mim. Obrigado.




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TABOCAS, ITABUNA E REGIÃO – Clóvis Góis

Tabocas, Itabuna e Região


            O final do século XIX e início do XX foi o período da chegada daqueles que mais tarde seriam responsáveis tanto para receber a boa semente como para distribuí-la. 

            A divisão territorial e administrativa da região era enormemente  diferente da atual. Em todo o Centro Sul baiano, existiam somente cinco municípios: São Jorge dos Ilhéus (Ilhéus), Barra do Rio de Contas (Itacaré), São Pedro de Belmonte (Belmonte), Una e Imperial Vila de Canavieiras (Canavieiras).   

            A Vila de Tabocas estava em efervescência! Era o distrito mais movimentado e numeroso de Ilhéus, localizado estrategicamente entre o interior do país (passagem para Vitória da Conquista) e o porto de Banco do Vitória. Local de plantação, compra e venda do fruto de ouro. As mudanças eram rápidas, população aceleradamente crescente, gente de toda parte chegando atrás do eldorado, grande circulação de dinheiro (em 1890 o Município de Ilhéus já exportava 3.500 toneladas de cacau), política inflamada (efeito direto da competição partidária promovida pelas famílias ilheenses Pessoa e Adami de Sá), vozes clamando por emancipação, e violência, muita violência! 

            A ebulição humana daqueles dias proporcionava o surgimento de desocupados, vadios, arruaceiros e meliantes. Mesmo cidadãos de bem e trabalhadores, impulsionados pela fácil circulação do dinheiro, cometiam excessos e desordens, ações casadas com a ingestão de bebida alcoólica, jogo, prostituição e paixões políticas. 

            Em Ilhéus, o maior líder político local, coronel Domingos Adami de Sá, foi brutalmente agredido na Vila de Pontal. Aquele que seria o futuro intendente de Itabuna, Olinto Leone, foi submetido a júri popular acusado de ser o mandante do assassinato do advogado Virgílio Sá. No distrito do Almada, atuava uma perigosa quadrilha de salteadores, que, além de subtrair os pertences, também agredia suas vítimas. No mesmo local, durante um espetáculo circense, até uma criança foi ferida à bala. Num outro momento, mesmo um oficial de polícia sofreu um atentado quando se dirigia de Ilhéus para Tabocas. 

            Outro fato que mexeu muito com a população de Ilhéus foi o assassinato, por questões de demarcação de terra, do engenheiro Agenor Portela Passos. Acerca das ocorrências que se passavam em 1904, João da Silva Campos afirma que toda a região vivia “endêmicos surtos de desordem...”, pois, “crescido número de criminosos pronunciados pela justiça local... perambulavam... sem qualquer constrangimento ou receio”. O mesmo memorialista afirma, sem detalhar o fato,  que, no início do século XX, em Tabocas, “haviam ocorrido alguns excessos capazes de produzirem funda alteração da ordem, se o governo não adotasse prontas e imediatas providências”. Nesse caso, um delegado foi deslocado e conseguira “abafar as manifestações de anarquia”. Dias depois de acalmados os ânimos, “repetiam-se as desordens em Tabocas. Depois, até  agosto, a agitação dos espíritos manteve-se em potencial, dinamizando-se daí em diante, até dezembro...”, ou seja, a confusão pública continuava de mal a pior! 

            Entre os anos de 1905 e 1906, o ar continuava carregado. O medo foi instalado quando notícias chegaram de que um grupo de foras da lei sitiara o arraial para tirar a vida de um político local. No ano seguinte, muitos indivíduos de procedência duvidosa – “cavaleiros estranhos” – tiveram que ser enxotados da localidade por meio do chefe da polícia. Todos esses acontecimentos  deixavam a população em polvorosa. 

            Um bando de mercenários, os Cauaçus, provenientes da região de Jequié, implantou o terror em Itabuna, no período de 1916 a 1918. Aqui chegaram, contratados por José Kruschewsky para dar-lhe proteção política. Terminado o serviço, os Cauaçus resolveram ficar, estabelecendo seu quartel general na Rua Rui Barbosa (antiga Rua do Quartel Velho), de onde saíam para executar seus trabalhos, sempre a mando de pessoas influentes da cidade. Praticavam toda sorte de barbaridades: faziam cobranças de dívidas, com requintes de perversidade; invadiam propriedades rurais; extorquiam comerciantes oferecendo uma possível proteção; espancavam cidadãos a título de vingança; e, ainda, agiam como grupo de extermínio. Conseguiram espalhar o medo em toda a região! 

            Os tempos e a região clamavam por um evangelho da paz e da presença ordeira do Espírito Santo, por intermédio de homens dedicados ao Senhor! Seria a Plenitude dos Tempos para o aparecimento do Adventismo! 

            As agitações políticas em Tabocas, às vezes superavam sua vizinha materna. Muita coisa nova acontecia por aqui, e lá, não! As  comemorações dos 400 anos do descobrimento do Brasil e a eleição do presidente da Bahia, Severino Vieira, em 1900, foram ativas e efusivas por aqui. Esses eventos foram emudecidos em Ilhéus. 

            Num primeiro momento, o povoamento de Tabocas se resumia a alguns ajuntamentos humanos localizados onde são hoje os bairros de Fátima (Caldeirão Sem Tampa), Bananeira (Burundanga), Conceição (Marimbeta) e proximidades da Praça Olinto Leone (defronte ao Rio Cachoeira e na Rua da Areia). Com o crescimento vertiginoso da população, em pouco tempo as roças (1857) se transformaram em arruados (1877), estes em arraial (1897) que, por fim, foi elevado à categoria de  vila (1906), chegando ao status de cidade em 28 de julho de 1910. O desenvolvimento foi tamanho que chamou à atenção do redator do Jornal de Notícias, o jornalista Alfredo Requião, que elogiou Tabocas como um local pródigo em um “arraial muito populoso que, ainda em 1893, reduziu-se a oito ou nove casebres de palha e, agora (1902), apresenta-se como animadíssimo e rico empório comercial”. 

            A população Grapiúna sempre fora bastante miscigenada, tendo sido formada por negros, índios, estrangeiros, sertanejos (norte da Bahia) e sergipanos. Os negros, remanescentes dos africanos, eram  constituídos de ex-escravos provenientes da lavoura canavieira. As etnias Camacan, Pataxó e Aymoré representavam os indígenas. Do Oriente Médio vieram os sírios, libaneses, judeus e árabes.  

            A combinação dessas gentes produziu uma população de rápido crescimento, com saltos demográficos em espaço diminuto de tempo. Em 1887, enquanto arruado, constava de 2.000 pessoas. Em 1890, a localidade era habitada por 3.024 moradores. Já em 1906, momento da elevação para status de vila, já possuía 15.000 habitantes. Dobrou seu contingente humano para 30.000 pessoas em 1916 e, dois anos após o grande batismo de Boqueirão (1918), já tinha alcançado uma população de 41.980 indivíduos (1920). Enquanto o crescimento populacional no restante do Estado era de aproximadamente 2%, aqui era por volta de 6% ao ano. Foi um terreno fértil para os representantes dos Três Anjos de Apocalipse 14, que deveriam anunciar a Mensagem a todas as nações, tribos, línguas e povos. Poucos lugares no Brasil proporcionariam tal vantagem! 

            Tabocas, e depois Itabuna, aglutinava num espaço relativamente pequeno, representantes humanos diversos, com histórias, culturas, anseios e falas distintas! Estudos revelam que a formação da cidade foi composta, comprovadamente, por grandes levas de migrantes de dez cidades sergipanas (Chapada dos Índios, Vila Cristina, Itabaianinha, Capela, Estância, Buquim, Simão Dias, Itaporanga D’Ajuda, Tobias Barreto, Cristinápolis e Itabaiana) e 17 cidades baianas (Vila Nova da Raínha, Feira de Santana, Tucano, Aporã, Conde, Itiúba, Rio Real, Abadia, Itapicuru, Cícero Dantas, Inhambupe, Paripiranga, Jandaíra, Cipó, Entre Rios, Esplanada e Ribeira do Pombal). Alguma semelhança com Atos 2: 9 a 11? Tal como Deus utilizou o diverso ajuntamento de Jerusalém no Pentecostes para impulsionar a Igreja cristã nascente, fez uso das diferentes famílias e etnias neste solo para produzir a Igreja Adventista, que, hoje, é composta de uma sede de Associação, sete distritos pastorais, um colégio com 425 alunos e 53 igrejas e grupos, onde adoram 7.049 membros!

(A GÊNESE DO ADVENTISMO GRAPIÚNA, Cap.1)
Clóvis Silveira Góis Júnior

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Clóvis Silveira Góis Júnior é trineto de Genoveva França Jacó (integrante do primeiro batismo adventista realizado em Boqueirão, no ano de 1918).
Servidor público federal há 30 anos, é graduado em Administração e licenciado em história. É casado com Iara Souza setenta Góis, pedagoga, e tem dois filhos: Felipe e João.

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