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domingo, 5 de agosto de 2018

GERALDO MAIA PARA EGLÊ: Há 6 anos... - Água de Palavra

ITABUNA, TERRA AMADA!
3 de agosto de 2012 às 08:25 


ÁGUA DE PALAVRA

Para Eglê Machado pelo centenário de nossa amada Itabuna


Por favor, amiga, fale um pouco de tua cidade, de suas ruas e sombras, das casas de cochilo, dos litros de mar engasgado.

Por favor, fale das esquinas de tua cidade onde o vento bêbado passeia aos trancos à cata de sonhos sem par.

Fale para mim das flores que saltam nas vidraças como aranhas cegas, e do menino na praça com seu picolé calado lambido de olho na pipa com preguiça.

Fale, por favor, da velha, aquela na janela perto da lua com gestos sem memória.

Qualquer coisa serve, pode ser daquelas moças que com seus risos rútilos desafiam muros e que perfume mora em seus lábios, mel de sol e cor de chuva, pele tatuada de ternura, lindas e puras ateiam o amor nas conversas que tropeçam no organdi das coxas.

Moça, por favor,  fale daquele namorado no ponto de táxi com uma rosa rouca, a boca pronta para o silêncio.

Fale para mim de quando te vi vindo daquela rua tímida perto da igreja úmida, e que estavas nua, apenas o amor vestia tua nudez de água de palavra.

Geraldo Maia, poeta.
Estudou Jornalismo na instituição de ensino PUC-RIO (incompleto)
Estudou na instituição de ensino ESCOLA DE TEATRO DA UFBA
Coordenou Livro, Leitura e literatura na empresa Fundação Pedro Calmon
Trabalha na empresa Folha Notícias.

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Eglê S. Machado para Geraldo Maia Santos Santos:
3 de agosto de 2012 às 08:50  

Oh, meu caro amigo, quanta inspiração, quanta beleza no teu jeito terno de poetizar chorando a saudade de tua amada Itabuna!
Geraldo Maia, meu querido irmão/amigo, volta para o regaço da tua terra Natal, vem trazendo o teu meigo encanto, vem cantar teu doce canto, vem encantar Itabuna com a tua poesia rica de amor e luz.

Me pedes para falar da minha cidade e eu te digo: cada esquina deste rincão grapiúna, os ventos, as aranhas cegas, a velha da janela, as moças de risos rútilos, tudo em Itabuna vive na esperança da chegada de Geraldo Maia, o menino que na praça muitas vezes lambendo um picolé com os olhos na pipa fez Itabuna sorrir vibrante, com um orgulho enorme de ser sua mãe.

Aqui tudo continua encantador, mas o encanto de vez em quando é quebrado pela falta que sentimos de ti.

Volta poeta, aqui é o teu lugar!... Também o site ITABUNA CENTENÁRIA-ICAL  https://cemanosdeitabuna.blogspot.com/ está com saudades de ti!...

Eglê S. Machado, poetisa.
Academia Grapiúna de Letras-AGRAL



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JAVALIS SELVAGENS E HOMENS COMUNS - Ana Maria Machado


Dá para imaginar o que é isso? Ficar dias e dias na escuridão total, encolhido entre o declive de um chão de pedra e a proximidade de teto e paredes de rocha, cercado de água, sem saber se é dia ou noite. De início, dividindo com mais 12 pessoas a parca ração de uma merendazinha. Depois, sem ter o que comer. E sem saber se alguém lá fora tem noção do que se passa.

De repente, brota da água uma luz. Uma voz estranha diz algo num idioma que ninguém entende. Quase ninguém. Ainda bem que há um imigrante no grupo. Bendito imigrante, a confirmar que alguém diferente sempre tem algo a dar. É o único capaz de compreender e responder ao que o dono da voz diz em inglês. Assim o jovem time de futebol dos Javalis Selvagens sabe que era alvo de buscas, havia sido encontrado, e alguém lhes acenava com comida, remédios e o fiapo de esperança de uma operação complicadíssima para tentar salvar o grupo ilhado na escuridão das profundezas de uma caverna.

Ilhado até certo ponto. Homem algum é uma ilha, garantira um poeta nesse mesmo idioma inglês há quatro séculos. O mesmo John Donne que escrevera outras palavras que desde então têm lembrado a fraternidade, solidariedade e igualdade entre todos os seres humanos: “A morte de cada homem me diminui, pois sou parte da humanidade. Portanto, nunca procure saber por quem os sinos dobram; eles dobram por ti.”

Dando provas de que essa noção ainda não se perdeu e continua viva na espécie humana, no exterior da caverna as pessoas faziam o que estavam a seu alcance: se mobilizavam, rezavam, montavam a lógica racional de uma incrível operação de resgate. Especialistas de outros países viajaram para a Tailândia e se associaram aos esforços locais, disciplinados e objetivos, sem perguntar o que ganhariam com isso ou de que etnia ou nacionalidade eram os prisioneiros da caverna. Técnicos anônimos e milionários conhecidos ofereceram o que podiam. E depois de semanas o planeta festejou o final feliz que parecia impossível naquela tragédia anunciada. Homens comuns a consagrar a humanidade comum de vítimas e heróis — incluindo o mergulhador que perdeu a própria vida na luta para salvar as dos outros. Vitória possível a partir do profundo sentimento da condição humana compartilhada. Todos homens comuns.

Impossível não contrastar essa consciência de destino comum com a pretensão de se distinguir do comum dos mortais, exibida com acinte e desenvoltura em uma operação de resgate montada do outro lado do mundo, num plantão judiciário de domingo, simultâneo às últimas horas do esforço coletivo heroico na Tailândia.

Mas talvez não devesse ser surpresa. O objetivo era soltar Lula, alguém que não é visto como homem comum. Aliás, já ele mesmo atestara que entende não haver essa natureza comum entre todos nós. Desde que, há tempos, consagrou a doutrina de dois pesos e duas medidas quando afirmou de outro ex-presidente: “O Sarney tem história no Brasil suficiente para que não seja tratado como se fosse uma pessoa comum”, apesar de antes já ter se referido ao político maranhense com pesados insultos e ofensas.

Mais recentemente, o condenado em segunda instância, agora alvo da tentativa de libertação no domingo, fizera questão de frisar: “Eu não sou um ser humano, sou uma ideia”. Ideias não são encarceráveis. Todos sabemos (ou podemos imaginar com boa dose de realismo) que, mais cedo ou mais tarde, Lula será solto por algum indulto — como José Dirceu, condenado a mais de 30 anos, está solto. Não ficará preso muito tempo — como Cabral e Cunha, por exemplo, têm mais chance de ficar. A ideia que Lula encarna é mais poderosa que a destes, reveste-se do charme de uma narrativa de Cinderela ou Robin Hood, e tem mais seguidores escancarados. Embora também seja poderosíssima, a ideia encarnada por outros, de encher os bolsos quando ninguém está olhando, não se presta a defesas públicas, apoio de intelectuais, simpatia no exterior. Explicitada, choca pelo cinismo, não é temperada e resgatada pelo mito.

Por isso, no fundo dessa caverna curitibana em cujas paredes se projetam sombras míticas, dá para acusar o clarão vindo da realidade exterior. A culpa é da luz. Sem ela, não se veria o mal nem haveria sombras. Talvez até essa acusação possa colar. Ao menos em alguns setores, por algum tempo.

De qualquer modo, mesmo que não se possa enganar a todos durante todo o tempo, somos reféns da irresponsabilidade dos Três Poderes que aprisionam o país. Não há como fugir da máxima de Millôr Fernandes: o resultado é o que resultar. Para ele despencamos.

Ou dá para ter esperança de que brote das águas a cabeça de alguém comum, trazendo uma luz e falando uma língua que a maioria de nós não vai entender, mas que aceitaremos como um caminho para o resgate? Feito de racionalidade e disciplina.

Nesse caso, ainda precisaríamos fazer como os Javalis Selvagens : treinar o fôlego, aprender a nadar e mergulhar no desconhecido. Seremos capazes?

Haja coração, como nos repetiram à exaustão nos últimos dias.

O Globo, 21/07/2018

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Ana Maria Machado - Sexta ocupante da Cadeira nº 1 da ABL, eleita em 24 de abril de 2003, na sucessão de Evandro Lins e Silva e recebida em 29 de agosto de 2003 pelo acadêmico Tarcísio Padilha. Presidiu a Academia Brasileira de Letras em 2012 e 2013.

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ABL: ‘Luzia-Homem’, o mito mulher de Domingos Olympio, é o tema da palestra na ABL da antropóloga Maria Laura Viveiros de Castro Cavalcanti



A Academia Brasileira de Letras dá continuidade ao seu ciclo de conferências do mês de agosto de 2018, intitulado Cadeira 41, com palestra da antropóloga, professora e pesquisadora Maria Laura Viveiros de Castro Cavalcanti. A coordenação será da Acadêmica e escritora Ana Maria Machado. O tema escolhido foi Luzia-Homem de Domingos Olympio: a criação de um mito mulher.

Serão fornecidos certificados de frequência.

A Acadêmica Ana Maria Machado é, também, a Coordenadora-Geral dos ciclos de conferências de 2018.

De acordo com a palestrante, Luzia Homem, de Domingos Olympio (1903), tem por pano de fundo a histórica tragédia da seca que assolou o Ceará entre 1877 e 1879, quando legiões de retirantes do ressequido sertão encontraram algum abrigo temporário na cidade de Sobral. Entre eles, a “taciturna e forte” Luzia, que compõe, nas palavras de Lúcia Miguel Pereira, um “dos tipos mais complexos e misteriosos de nossa ficção”.

“A palestra ressalta o engenhoso uso narrativo dos causos e do linguajar populares e explora a dimensão mítica do romance. A força ativa dos vulneráveis personagens femininos acentua a dramática abordagem do assédio sexual cujo desfecho fatal faz de Luzia, para sempre, um símbolo da sexualidade livre em processo de descoberta. Luzia Homem é um romance mitológico sobre a condição feminina”, afirma a conferencista. 

Cadeira 41 terá mais três palestras, às quintas-feiras, no mesmo local e horário, com os seguintes dias, conferencistas e temas, respectivamente: dia 16, Acadêmico Antonio Carlos Secchin, Drummond: poesia e aporia; 23, Luís Camargo, Cem anos de “Urupês”, de Monteiro Lobato: o primeiro best-seller nacional; e 30, Hugo de Almeida, Osman Lins, 40 anos depois, mais atual.

A CONFERENCISTA

Maria Laura Viveiros de Castro Cavalcanti é antropóloga, pesquisadora do CNPq e professora titular da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) onde atua na Pós-Graduação de Sociologia e Antropologia do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais.

Pesquisadora dos rituais e de seu simbolismo, os interesses de Maria Laura transitam entre estudos da religião e da cultura popular. Autora de O Mundo Invisível: sistema ritual, cosmologia e noção da pessoa no espiritismo, de 1983; Carnaval carioca: dos bastidores ao desfile; 2006; e Carnaval, ritual e arte, 2016. Tem, também, diversos artigos publicados sobre o Bumbá de Parintins, Amazonas.

Sua atenção voltou-se, ainda, para a história da antropologia e das ciências sociais. Pesquisou a obra de Oracy Nogueira, sociólogo precursor do estudo das relações raciais e do estigma na sociedade brasileira, e os estudos de folclore, compreendidos como uma vertente formadora das ciências sociais. O livro de Maria Laura Reconhecimentos: antropologia, folclore e cultura popular foi premiado, em 2013, pela Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciências Sociais.

Antes de seu ingresso na Universidade Federal do Rio de Janeiro, a conferencista trabalhou no então Instituto Nacional de Folclore, da Fundação Nacional de Arte. Permanece ligada a essa instituição por intermédio da Associação de Amigos do Museu de Folclore Edison Carneiro, da qual é, atualmente, diretora presidente.

Editora da revista Sociologia & AntropologiaMaria Laura publicou o livro de contos Todo dia amanhece no Arpoador, em 2012; e o infantil A viagem de Luiza, em 2017.

A palestrante é bisneta por parte de pai de Domingos Olympio Braga Cavalcanti, cujo romance Luzia Homem é o tema de sua palestra neste ciclo: Luzia Homem de Domingos Olympio: a criação de um mito mulher.
03/08/2018


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PALAVRA DA SALVAÇÃO (90)


18º Domingo do Tempo Comum – 05/08/2018

Anúncio do Evangelho (Jo 6,24-35)

— O Senhor esteja convosco.
— Ele está no meio de nós.
— PROCLAMAÇÃO do Evangelho de Jesus Cristo + segundo João.
— Glória a vós, Senhor.

Naquele tempo, quando a multidão viu que Jesus não estava ali, nem os seus discípulos, subiram às barcas e foram à procura de Jesus, em Cafarnaum. Quando o encontraram no outro lado do mar, perguntaram-lhe: “Rabi, quando chegaste aqui?” Jesus respondeu: “Em verdade, em verdade, eu vos digo: estais me procurando não porque vistes sinais, mas porque comestes pão e ficastes satisfeitos. Esforçai-vos não pelo alimento que se perde, mas pelo alimento que permanece até a vida eterna, e que o Filho do Homem vos dará. Pois este é quem o Pai marcou com seu selo”. Então perguntaram: “Que devemos fazer para realizar as obras de Deus?”
Jesus respondeu: “A obra de Deus é que acrediteis naquele que ele enviou”.
Eles perguntaram: “Que sinal realizas, para que possamos ver e crer em ti? Que obra fazes? Nossos pais comeram o maná no deserto, como está na Escritura: ‘Pão do céu deu-lhes a comer’”.
Jesus respondeu: “Em verdade, em verdade vos digo, não foi Moisés quem vos deu o pão que veio do céu. É meu Pai que vos dá o verdadeiro pão do céu. Pois o pão de Deus é aquele que desce do céu e dá vida ao mundo”.
Então pediram: “Senhor, dá-nos sempre desse pão”. Jesus lhes disse: “Eu sou o pão da vida. Quem vem a mim não terá mais fome e quem crê em mim nunca mais terá sede”.

— Palavra da Salvação.
— Glória a vós, Senhor.

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Ligue o vídeo abaixo e acompanhe a reflexão do Frei Alvaci Mendes da Luz, OFM:

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Ser pão que ativa e sustenta a vida


“Quem vem a mim não terá mais fome...” (Jo 6,35) 

Continuamos seguindo o cap. 6 do evangelho de S. João. No texto deste domingo Jesus entra diretamente em discussão com os judeus e o v. 59 diz expressamente que este encontro conflituoso teve lugar na sinagoga de Cafarnaum. Estamos no início de uma discussão longa e dura, na qual Jesus vai aprofundando as exigências do seguimento. E, à medida que Ele vai radicalizando o discurso, aumenta a distância dos seus ouvintes. O processo será esse: entusiasmo, dúvida, desencanto, desilusão, oposição, rejeição, abandono.

O diálogo tenso desvela a real motivação daqueles que O buscavam, não porque tinham visto sinais, mas porque comeram pão até ficarem saciados. O “sinal” tinha sido um convite a compartilhar. Mas eles se fixaram só na satisfação da própria necessidade. Esvaziaram o sinal de seu conteúdo. Essa busca de Jesus é vazia, porque eles só estavam atrás da segurança alimentar. Jesus vai diretamente ao ponto e desmascara tal intenção. Não buscavam a Ele, mas o pão que Ele lhes deu. Não O buscavam porque Ele abriu as portas de um futuro mais humano, mas se fixaram nos seus próprios interesses.

“Eu sou o pão da Vida”. Em todos os grandes discursos que encontramos no 4º. Evangelho, há uma referência explícita à Vida, com maiúscula. Trata-se de uma realidade que não podemos explicar com palavras, nem enquadrá-la em conceitos humanos. Somente através de símbolos e metáforas podemos indicar o caminho de uma vivência que é o único que nos levará a descobrir de quê se está falando.

A Vida que Jesus promete não vem de fora e de maneira espetacular, como o maná no deserto. Ela está presente em cada um e se manifesta no cotidiano, como amor descentrado, como partilha dos dons, como preocupação pelo outro. Esta Vida interior é ativada pela adesão e identificação com a pessoa de Jesus. Daí a necessidade de trabalhar pelo alimento que dura dando Vida definitiva. Este apelo de trabalhar em favor da Vida, é o resume de toda a mensagem do evangelho deste domingo.

Jesus salva e alimenta porque é pão. Ele é o alimento que gera vida nova no mundo, vida oferecida e compartilhada. Devemos unir a imagem de Jesus/pão com a imagem Jesus/grão de trigo que é triturado para ser alimento e fecundar a vida. Um alimento “subversivo” porque subverte a tradicional “ordem” das coisas. Antes de partir o pão, Jesus parte-se a si mesmo, faz-se alimento. Toda sua vida foi entrega. Sua vida inteira dá significado ao partir, compartilhar e repartir o pão da vida.

E é isso que, no nível mais profundo, somos todos. Todos somos Vida, todos somos “pão de vida”. Somos pão quando alimentamos o outro na esperança, no perdão, na acolhida, na compaixão, no compromisso... Sim, podemos multiplicar o pão da festa, da alegria, o pão da justiça, o pão da ajuda fraterna... Quanto pão para ser dividido! Em nosso interior há uma reserva de nutrientes, de pão substancioso, que corre o risco de perder a validade, se não é compartilhado. O centro da vida é “pão”, e (como Jesus), só somos pão na medida em que partilhamos o que somos e temos.

Tal como Jesus, todo(a) seguidor(a) é chamado(a) a ter vida e a ser vida. E vida expansiva. A vida não deve ser corroída pela tirania do egoísmo mesquinho. Vida é encontro, interação, comunhão. Vida é solidariedade. Vidas são olhares que se cruzam, são mãos que se estendem e se estreitam, são passos que rompem distancias e se interligam. Somos chamados a ser “biófilos”, amigos e defensores da vida.

 “É entre nossas mãos que está a vida” (Bloch). Nossas mãos não podem jogar fora a vida. Nossas mãos precisam manter, nutrir e proteger a vida. Nossas mãos devem ser protagonistas para sustentar a vida, precisam dignificar a vida. Nosso compromisso é preservar a vida que dança em nossas mãos. Nas raízes profundas do nosso ser, reside a Biofilia, o amor à vida.

“Eu sou o pão da vida”. O encontro com a Vida que se faz Pão nos move a buscar o sentido de nossa própria existência; e quem encontra o sentido se torna dinâmico, persegue um horizonte, abre-se a uma causa mobilizadora. Para isso é necessário outro ritmo de vida, que nos permita vivê-la com mais sabor, com mais autenticidade.

A vida é vivida intensamente quando a força do “Pão da Vida” atua, impulsionando a abrir, a avançar, a progredir. Porque a vida autêntica é a vida movida, iluminada, impulsionada pelo amor. É este dinamismo de amor que somos chamados a contemplar no mistério do Pão da Vida, do qual cada pessoa é uma pequena, mas preciosa imagem. O(a) seguidor(a) de Jesus deixa refletir esta imagem em sua vida concreta de cada dia quando vive esse dinamismo do “pão partilhado”, numa relação cordial, aberta e receptiva à originalidade do outro, entrando num verdadeiro dinamismo de vida. Um dinamismo de amor.

A adesão a Jesus, portanto, não fica na exterioridade. Ele não é modelo exterior a ser imitado, e sim, é presença interiorizada. Essa comunhão íntima muda o interior do(a) discípulo(a), possibilita a sintonia com Jesus e faz viver a identificação com Ele. Fazendo-se alimento, Jesus nos ajuda a conhecer nossa própria interioridade, desperta nossa vida, arrancando-a de seus limites estreitos e constituindo-a como vida expansiva em direção a novos horizontes.

E Jesus não somente vai conosco, mas nos precede, nos sustenta e, na liberdade de seu amor, nos impele a ampliar nossa vida a serviço. Toda peregrinação, em clima de admiração e assombro, se revela rica em descobertas e surpresas, e desperta o coração para dimensões maiores que a rotina de cada dia. Nesse sentido, a vida tem a dimensão do milagre e até na morte anuncia o início de algo novo; ela carrega no seu interior o destino da ressurreição.

Jesus se revela, assim, como autoridade de amor, porque ofereceu seu “corpo”, isto é, sua vida, para que outros pudessem viver. Na multiplicação dos pães, nas refeições com pecadores e sobretudo na Última Ceia, Ele oferece aquilo que não pode ser comprado nem vendido: o pão do próprio corpo carregado de humanidade, o vinho de sua vida portador das energias alegres e criativas.

Comungar o pão e o vinho não é só aderir a Jesus, à sua pessoa e à sua mensagem; não é só experimentar sua intimidade, deixando-se transformar por Ele. Implica estar dispostos a comungar com todos, porque Jesus nunca vem só: “traz” com ele toda a realidade. “Não nos devemos envergonhar, não devemos ter medo, não devemos sentir repugnância de tocar a carne de Cristo” (papa Francisco).

Todo ser humano carrega “outras fomes” em seu interior. Jesus procura despertar nas pessoas uma fome diferente: Ele lhes fala de um pão que não sacia a fome de um dia, mas a fome e sede de vida plena. Ou seja, ser seu seguidor é associar-se à Sua Fome: aliviar o sofrimento humano. Trata-se de uma “fome humanizadora”: fome de comunhão, de cuidado, de compaixão..., fome de novas relações, de um mundo novo... Fome de vida! Jesus quer oferecer-lhes um alimento que pode saciar esta fome de vida.

Texto bíblico:  Jo 6,24-35

Na oração: Jesus é Aquele que sabe a arte de despertar fomes. Estamos saturados de “coisas”, mas carentes de fome. Quem tem fome, busca, cria, constrói... Quem não tem fome cai numa apatia paralisante.

Experimentamos fome quando saímos de nós mesmos, quando nos consumimos no trabalho pelo Reino, quando nos empenhamos por abrir caminhos de humanização...

- Quais são minhas fomes existenciais?

- Vivo faminto de sabedoria? Ou me contento com alimentos que não saciam?

- Em quê circunstâncias experimento ser “pão de vida”?

- Quê pão me sacia existencialmente? De quê tenho fome? 


Pe. Adroaldo Palaoro sj


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