Para Eglê Machado pelo centenário de nossa amada Itabuna
Por favor, amiga, fale um pouco de tua cidade, de suas ruas
e sombras, das casas de cochilo, dos litros de mar engasgado.
Por favor, fale das esquinas de tua cidade onde o vento
bêbado passeia aos trancos à cata de sonhos sem par.
Fale para mim das flores que saltam nas vidraças como
aranhas cegas, e do menino na praça com seu picolé calado lambido de olho na
pipa com preguiça.
Fale, por favor, da velha, aquela na janela perto da lua com
gestos sem memória.
Qualquer coisa serve, pode ser daquelas moças que com seus
risos rútilos desafiam muros e que perfume mora em seus lábios, mel de sol e
cor de chuva, pele tatuada de ternura, lindas e puras ateiam o amor nas
conversas que tropeçam no organdi das coxas.
Moça, por favor, fale
daquele namorado no ponto de táxi com uma rosa rouca, a boca pronta para o
silêncio.
Fale para mim de quando te vi vindo daquela rua tímida perto
da igreja úmida, e que estavas nua, apenas o amor vestia tua nudez de água de
palavra.
Geraldo Maia, poeta.
Estudou Jornalismo na instituição de ensino PUC-RIO
(incompleto)
Estudou na instituição de ensino ESCOLA DE TEATRO DA
UFBA
Coordenou Livro, Leitura e literatura na
empresa Fundação Pedro Calmon
Oh, meu caro amigo, quanta inspiração, quanta beleza no teu
jeito terno de poetizar chorando a saudade de tua amada Itabuna!
Geraldo Maia, meu querido irmão/amigo, volta para o regaço
da tua terra Natal, vem trazendo o teu meigo encanto, vem cantar teu doce
canto, vem encantar Itabuna com a tua poesia rica de amor e luz.
Me pedes para falar da minha cidade e eu te digo: cada
esquina deste rincão grapiúna, os ventos, as aranhas cegas, a velha da janela,
as moças de risos rútilos, tudo em Itabuna vive na esperança da chegada de
Geraldo Maia, o menino que na praça muitas vezes lambendo um picolé com os
olhos na pipa fez Itabuna sorrir vibrante, com um orgulho enorme de ser sua
mãe.
Aqui tudo continua encantador, mas o encanto de vez em
quando é quebrado pela falta que sentimos de ti.
Dá para imaginar o que é isso? Ficar dias e dias na
escuridão total, encolhido entre o declive de um chão de pedra e a proximidade
de teto e paredes de rocha, cercado de água, sem saber se é dia ou noite. De
início, dividindo com mais 12 pessoas a parca ração de uma merendazinha.
Depois, sem ter o que comer. E sem saber se alguém lá fora tem noção do que se
passa.
De repente, brota da água uma luz. Uma voz estranha diz algo
num idioma que ninguém entende. Quase ninguém. Ainda bem que há um imigrante no
grupo. Bendito imigrante, a confirmar que alguém diferente sempre tem algo a
dar. É o único capaz de compreender e responder ao que o dono da voz diz em inglês.
Assim o jovem time de futebol dos Javalis Selvagens sabe que era alvo de
buscas, havia sido encontrado, e alguém lhes acenava com comida, remédios e o
fiapo de esperança de uma operação complicadíssima para tentar salvar o grupo
ilhado na escuridão das profundezas de uma caverna.
Ilhado até certo ponto. Homem algum é uma ilha, garantira um
poeta nesse mesmo idioma inglês há quatro séculos. O mesmo John Donne que
escrevera outras palavras que desde então têm lembrado a fraternidade,
solidariedade e igualdade entre todos os seres humanos: “A morte de cada homem
me diminui, pois sou parte da humanidade. Portanto, nunca procure saber por
quem os sinos dobram; eles dobram por ti.”
Dando provas de que essa noção ainda não se perdeu e
continua viva na espécie humana, no exterior da caverna as pessoas faziam o que
estavam a seu alcance: se mobilizavam, rezavam, montavam a lógica racional de
uma incrível operação de resgate. Especialistas de outros países viajaram para
a Tailândia e se associaram aos esforços locais, disciplinados e objetivos, sem
perguntar o que ganhariam com isso ou de que etnia ou nacionalidade eram os
prisioneiros da caverna. Técnicos anônimos e milionários conhecidos ofereceram
o que podiam. E depois de semanas o planeta festejou o final feliz que parecia
impossível naquela tragédia anunciada. Homens comuns a consagrar a humanidade
comum de vítimas e heróis — incluindo o mergulhador que perdeu a própria vida
na luta para salvar as dos outros. Vitória possível a partir do profundo
sentimento da condição humana compartilhada. Todos homens comuns.
Impossível não contrastar essa consciência de destino comum
com a pretensão de se distinguir do comum dos mortais, exibida com acinte e
desenvoltura em uma operação de resgate montada do outro lado do mundo, num
plantão judiciário de domingo, simultâneo às últimas horas do esforço coletivo
heroico na Tailândia.
Mas talvez não devesse ser surpresa. O objetivo era soltar
Lula, alguém que não é visto como homem comum. Aliás, já ele mesmo atestara que
entende não haver essa natureza comum entre todos nós. Desde que, há tempos,
consagrou a doutrina de dois pesos e duas medidas quando afirmou de outro
ex-presidente: “O Sarney tem história no Brasil suficiente para que não seja
tratado como se fosse uma pessoa comum”, apesar de antes já ter se referido ao
político maranhense com pesados insultos e ofensas.
Mais recentemente, o condenado em segunda instância, agora
alvo da tentativa de libertação no domingo, fizera questão de frisar: “Eu não
sou um ser humano, sou uma ideia”. Ideias não são encarceráveis. Todos sabemos
(ou podemos imaginar com boa dose de realismo) que, mais cedo ou mais tarde,
Lula será solto por algum indulto — como José Dirceu, condenado a mais de 30
anos, está solto. Não ficará preso muito tempo — como Cabral e Cunha, por
exemplo, têm mais chance de ficar. A ideia que Lula encarna é mais poderosa que
a destes, reveste-se do charme de uma narrativa de Cinderela ou Robin Hood, e
tem mais seguidores escancarados. Embora também seja poderosíssima, a ideia
encarnada por outros, de encher os bolsos quando ninguém está olhando, não se
presta a defesas públicas, apoio de intelectuais, simpatia no exterior.
Explicitada, choca pelo cinismo, não é temperada e resgatada pelo mito.
Por isso, no fundo dessa caverna curitibana em cujas paredes
se projetam sombras míticas, dá para acusar o clarão vindo da realidade
exterior. A culpa é da luz. Sem ela, não se veria o mal nem haveria sombras.
Talvez até essa acusação possa colar. Ao menos em alguns setores, por algum
tempo.
De qualquer modo, mesmo que não se possa enganar a todos
durante todo o tempo, somos reféns da irresponsabilidade dos Três Poderes que
aprisionam o país. Não há como fugir da máxima de Millôr Fernandes: o resultado
é o que resultar. Para ele despencamos.
Ou dá para ter esperança de que brote das águas a cabeça de
alguém comum, trazendo uma luz e falando uma língua que a maioria de nós não
vai entender, mas que aceitaremos como um caminho para o resgate? Feito de
racionalidade e disciplina.
Nesse caso, ainda precisaríamos fazer como os Javalis
Selvagens : treinar o fôlego, aprender a nadar e mergulhar no desconhecido.
Seremos capazes?
Haja coração, como nos repetiram à exaustão nos últimos
dias.
Ana Maria Machado - Sexta ocupante da Cadeira nº 1 da ABL,
eleita em 24 de abril de 2003, na sucessão de Evandro Lins e Silva e recebida
em 29 de agosto de 2003 pelo acadêmico Tarcísio Padilha. Presidiu a Academia
Brasileira de Letras em 2012 e 2013.
A Academia Brasileira de Letras dá continuidade ao seu ciclo
de conferências do mês de agosto de 2018, intitulado Cadeira 41, com
palestra da antropóloga, professora e pesquisadora Maria Laura Viveiros de
Castro Cavalcanti. A coordenação será da Acadêmica e escritora Ana Maria
Machado. O tema escolhido foi Luzia-Homem de Domingos Olympio: a
criação de um mito mulher.
Serão fornecidos certificados de frequência.
A Acadêmica Ana Maria Machado é, também, a
Coordenadora-Geral dos ciclos de conferências de 2018.
De acordo com a palestrante, Luzia Homem, de Domingos
Olympio (1903), tem por pano de fundo a histórica tragédia da seca que assolou
o Ceará entre 1877 e 1879, quando legiões de retirantes do ressequido sertão
encontraram algum abrigo temporário na cidade de Sobral. Entre eles, a
“taciturna e forte” Luzia, que compõe, nas palavras de Lúcia Miguel Pereira, um
“dos tipos mais complexos e misteriosos de nossa ficção”.
“A palestra ressalta o engenhoso uso narrativo dos causos e
do linguajar populares e explora a dimensão mítica do romance. A força ativa
dos vulneráveis personagens femininos acentua a dramática abordagem do assédio
sexual cujo desfecho fatal faz de Luzia, para sempre, um símbolo da sexualidade
livre em processo de descoberta. Luzia Homem é um romance mitológico
sobre a condição feminina”, afirma a conferencista.
Cadeira 41 terá mais três palestras, às quintas-feiras,
no mesmo local e horário, com os seguintes dias, conferencistas e temas,
respectivamente: dia 16, Acadêmico Antonio Carlos Secchin, Drummond:
poesia e aporia; 23, Luís Camargo, Cem anos de “Urupês”, de Monteiro Lobato: o
primeiro best-seller nacional; e 30, Hugo de Almeida, Osman
Lins, 40 anos depois, mais atual.
A CONFERENCISTA
Maria Laura Viveiros de Castro Cavalcanti é
antropóloga, pesquisadora do CNPq e professora titular da Universidade Federal
do Rio de Janeiro (UFRJ) onde atua na Pós-Graduação de Sociologia e
Antropologia do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais.
Pesquisadora dos rituais e de seu simbolismo, os interesses
de Maria Laura transitam entre estudos da religião e da cultura
popular. Autora de O Mundo Invisível: sistema ritual, cosmologia e noção
da pessoa no espiritismo, de 1983; Carnaval carioca: dos bastidores ao
desfile; 2006; e Carnaval, ritual e arte, 2016. Tem, também, diversos
artigos publicados sobre o Bumbá de Parintins, Amazonas.
Sua atenção voltou-se, ainda, para a história da
antropologia e das ciências sociais. Pesquisou a obra de Oracy Nogueira,
sociólogo precursor do estudo das relações raciais e do estigma na sociedade
brasileira, e os estudos de folclore, compreendidos como uma vertente formadora
das ciências sociais. O livro de Maria Laura Reconhecimentos:antropologia, folclore e cultura popular foi premiado, em 2013, pela
Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciências Sociais.
Antes de seu ingresso na Universidade Federal do Rio de
Janeiro, a conferencista trabalhou no então Instituto Nacional de Folclore, da
Fundação Nacional de Arte. Permanece ligada a essa instituição por intermédio
da Associação de Amigos do Museu de Folclore Edison Carneiro, da qual é,
atualmente, diretora presidente.
Editora da revista Sociologia & Antropologia, Maria
Laura publicou o livro de contos Todo dia amanhece no Arpoador, em
2012; e o infantil A viagem de Luiza, em 2017.
A palestrante é bisneta por parte de pai de Domingos Olympio
Braga Cavalcanti, cujo romance Luzia Homem é o tema de sua palestra
neste ciclo: Luzia Homem de Domingos Olympio: a criação de um mito
mulher.
— PROCLAMAÇÃO do Evangelho de Jesus Cristo + segundo
João.
— Glória a vós, Senhor.
Naquele tempo, quando a multidão viu que Jesus não
estava ali, nem os seus discípulos, subiram às barcas e foram à procura de
Jesus, em Cafarnaum. Quando o encontraram no outro lado do mar,
perguntaram-lhe: “Rabi, quando chegaste aqui?” Jesus respondeu: “Em
verdade, em verdade, eu vos digo: estais me procurando não porque vistes
sinais, mas porque comestes pão e ficastes satisfeitos. Esforçai-vos não
pelo alimento que se perde, mas pelo alimento que permanece até a vida eterna,
e que o Filho do Homem vos dará. Pois este é quem o Pai marcou com seu
selo”. Então perguntaram: “Que devemos fazer para realizar as obras de
Deus?”
Jesus respondeu: “A obra de Deus é que acrediteis naquele
que ele enviou”.
Eles perguntaram: “Que sinal realizas, para que possamos ver
e crer em ti? Que obra fazes? Nossos pais comeram o maná no deserto, como
está na Escritura: ‘Pão do céu deu-lhes a comer’”.
Jesus respondeu: “Em verdade, em verdade vos digo, não foi
Moisés quem vos deu o pão que veio do céu. É meu Pai que vos dá o verdadeiro
pão do céu. Pois o pão de Deus é aquele que desce do céu e dá vida ao
mundo”.
Então pediram: “Senhor, dá-nos sempre desse pão”. Jesus
lhes disse: “Eu sou o pão da vida. Quem vem a mim não terá mais fome e quem crê
em mim nunca mais terá sede”.
Ligue o vídeo abaixo e acompanhe a reflexão do Frei Alvaci
Mendes da Luz, OFM:
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Ser pão que ativa e sustenta a vida
“Quem vem a mim não terá mais fome...” (Jo 6,35)
Continuamos seguindo o cap. 6 do evangelho de S. João. No
texto deste domingo Jesus entra diretamente em discussão com os judeus e o v.
59 diz expressamente que este encontro conflituoso teve lugar na sinagoga de
Cafarnaum. Estamos no início de uma discussão longa e dura, na qual Jesus vai
aprofundando as exigências do seguimento. E, à medida que Ele vai radicalizando
o discurso, aumenta a distância dos seus ouvintes. O processo será esse:
entusiasmo, dúvida, desencanto, desilusão, oposição, rejeição, abandono.
O diálogo tenso desvela a real motivação daqueles que O
buscavam, não porque tinham visto sinais, mas porque comeram pão até ficarem
saciados. O “sinal” tinha sido um convite a compartilhar. Mas eles se fixaram
só na satisfação da própria necessidade. Esvaziaram o sinal de seu conteúdo.
Essa busca de Jesus é vazia, porque eles só estavam atrás da segurança
alimentar. Jesus vai diretamente ao ponto e desmascara tal intenção. Não
buscavam a Ele, mas o pão que Ele lhes deu. Não O buscavam porque Ele abriu as
portas de um futuro mais humano, mas se fixaram nos seus próprios interesses.
“Eu sou o pão da Vida”. Em todos os grandes discursos que
encontramos no 4º. Evangelho, há uma referência explícita à Vida, com
maiúscula. Trata-se de uma realidade que não podemos explicar com palavras, nem
enquadrá-la em conceitos humanos. Somente através de símbolos e metáforas
podemos indicar o caminho de uma vivência que é o único que nos levará a
descobrir de quê se está falando.
A Vida que Jesus promete não vem de fora e de maneira
espetacular, como o maná no deserto. Ela está presente em cada um e se
manifesta no cotidiano, como amor descentrado, como partilha dos dons, como
preocupação pelo outro. Esta Vida interior é ativada pela adesão e
identificação com a pessoa de Jesus. Daí a necessidade de trabalhar pelo
alimento que dura dando Vida definitiva. Este apelo de trabalhar em favor da
Vida, é o resume de toda a mensagem do evangelho deste domingo.
Jesus salva e alimenta porque é pão. Ele é o alimento
que gera vida nova no mundo, vida oferecida e compartilhada. Devemos unir
a imagem de Jesus/pão com a imagem Jesus/grão de trigo que é triturado para ser
alimento e fecundar a vida. Um alimento “subversivo” porque subverte a
tradicional “ordem” das coisas. Antes de partir o pão, Jesus parte-se a si
mesmo, faz-se alimento. Toda sua vida foi entrega. Sua vida inteira dá
significado ao partir, compartilhar e repartir o pão da vida.
E é isso que, no nível mais profundo, somos todos. Todos
somos Vida, todos somos “pão de vida”. Somos pão quando alimentamos o outro na
esperança, no perdão, na acolhida, na compaixão, no compromisso... Sim, podemos
multiplicar o pão da festa, da alegria, o pão da justiça, o pão da ajuda
fraterna... Quanto pão para ser dividido! Em nosso interior há uma reserva de
nutrientes, de pão substancioso, que corre o risco de perder a validade, se não
é compartilhado. O centro da vida é “pão”, e (como Jesus), só somos pão na
medida em que partilhamos o que somos e temos.
Tal como Jesus, todo(a) seguidor(a) é chamado(a) a ter vida
e a ser vida. E vida expansiva. A vida não deve ser corroída pela tirania do
egoísmo mesquinho. Vida é encontro, interação, comunhão. Vida é solidariedade.
Vidas são olhares que se cruzam, são mãos que se estendem e se estreitam, são
passos que rompem distancias e se interligam. Somos chamados a ser “biófilos”,
amigos e defensores da vida.
“É entre nossas mãos que está a vida” (Bloch). Nossas
mãos não podem jogar fora a vida. Nossas mãos precisam manter, nutrir e
proteger a vida. Nossas mãos devem ser protagonistas para sustentar a vida,
precisam dignificar a vida. Nosso compromisso é preservar a vida que dança em
nossas mãos. Nas raízes profundas do nosso ser, reside a Biofilia, o amor à
vida.
“Eu sou o pão da vida”. O encontro com a Vida que se faz Pão
nos move a buscar o sentido de nossa própria existência; e quem encontra o
sentido se torna dinâmico, persegue um horizonte, abre-se a uma causa
mobilizadora. Para isso é necessário outro ritmo de vida, que nos permita
vivê-la com mais sabor, com mais autenticidade.
A vida é vivida intensamente quando a força do “Pão da Vida”
atua, impulsionando a abrir, a avançar, a progredir. Porque a vida autêntica é
a vida movida, iluminada, impulsionada pelo amor. É este dinamismo de amor que
somos chamados a contemplar no mistério do Pão da Vida, do qual cada pessoa é
uma pequena, mas preciosa imagem. O(a) seguidor(a) de Jesus deixa refletir esta
imagem em sua vida concreta de cada dia quando vive esse dinamismo do “pão
partilhado”, numa relação cordial, aberta e receptiva à originalidade do outro,
entrando num verdadeiro dinamismo de vida. Um dinamismo de amor.
A adesão a Jesus, portanto, não fica na exterioridade. Ele
não é modelo exterior a ser imitado, e sim, é presença interiorizada. Essa
comunhão íntima muda o interior do(a) discípulo(a), possibilita a sintonia com
Jesus e faz viver a identificação com Ele. Fazendo-se alimento, Jesus nos ajuda
a conhecer nossa própria interioridade, desperta nossa vida, arrancando-a de
seus limites estreitos e constituindo-a como vida expansiva em direção a novos
horizontes.
E Jesus não somente vai conosco, mas nos precede, nos
sustenta e, na liberdade de seu amor, nos impele a ampliar nossa vida a
serviço. Toda peregrinação, em clima de admiração e assombro, se revela rica em
descobertas e surpresas, e desperta o coração para dimensões maiores que a
rotina de cada dia. Nesse sentido, a vida tem a dimensão do milagre e até na
morte anuncia o início de algo novo; ela carrega no seu interior o destino da
ressurreição.
Jesus se revela, assim, como autoridade de amor, porque
ofereceu seu “corpo”, isto é, sua vida, para que outros pudessem viver. Na
multiplicação dos pães, nas refeições com pecadores e sobretudo na Última Ceia,
Ele oferece aquilo que não pode ser comprado nem vendido: o pão do próprio
corpo carregado de humanidade, o vinho de sua vida portador das energias
alegres e criativas.
Comungar o pão e o vinho não é só aderir a Jesus, à sua
pessoa e à sua mensagem; não é só experimentar sua intimidade, deixando-se
transformar por Ele. Implica estar dispostos a comungar com todos, porque Jesus
nunca vem só: “traz” com ele toda a realidade. “Não nos devemos envergonhar, não
devemos ter medo, não devemos sentir repugnância de tocar a carne de Cristo”
(papa Francisco).
Todo ser humano carrega “outras fomes” em seu interior.
Jesus procura despertar nas pessoas uma fome diferente: Ele lhes fala de um pão
que não sacia a fome de um dia, mas a fome e sede de vida plena. Ou seja, ser
seu seguidor é associar-se à Sua Fome: aliviar o sofrimento humano. Trata-se de
uma “fome humanizadora”: fome de comunhão, de cuidado, de compaixão..., fome de
novas relações, de um mundo novo... Fome de vida! Jesus quer oferecer-lhes um
alimento que pode saciar esta fome de vida.
Texto bíblico: Jo 6,24-35
Na oração: Jesus é Aquele que sabe a arte de despertar
fomes. Estamos saturados de “coisas”, mas carentes de fome. Quem tem fome,
busca, cria, constrói... Quem não tem fome cai numa apatia paralisante.
Experimentamos fome quando saímos de nós mesmos, quando nos
consumimos no trabalho pelo Reino, quando nos empenhamos por abrir caminhos de
humanização...
- Quais são minhas fomes existenciais?
- Vivo faminto de sabedoria? Ou me contento com alimentos
que não saciam?
- Em quê circunstâncias experimento ser “pão de vida”?
- Quê pão me sacia existencialmente? De quê tenho
fome?