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terça-feira, 4 de abril de 2017

A CONQUISTA DE UM IDEAL - Antônio Carlos de Souza Hygino

O texto que se seque, eu o escrevi quando do meu ingresso na magistratura. Após publicá-lo, por conta de mudança de comarca, etc... Acabei por não ficar com uma cópia sequer.
Debalde foram buscas no sentido de conseguir um exemplar do vespertino que o veiculou. E os anos se passaram. Havia perdido a esperança. Entretanto, na Noite de Natal do ano passado, fui presentado com exemplar do aludido jornal pelo meu irmão Jorge Hygino, brilhante advogado baiano, a quem sou eternamente grato. Ao relê-lo, voltei ao passado e não contive a emoção, por motivos óbvios. Trata-se da trajetória de um menino de família humilde, que se atreveu a ser Juiz. Ei-lo:

A conquista de um ideal


Vitorioso no vestibular de Direito da FESPI, subi-lhe as escadarias que davam acesso à sala onde iria assistir minha primeira aula de Introdução à Ciência do Direito. Vibravam em mim o entusiasmo e a esperança de ser advogado, para defender os interesses dos que tivessem sede de justiça. Durante quatro anos consecutivos repeti o mesmo ritual para receber, naquele Templo onde se cultuava a ciência de Têmis, as luzes do conhecimento jurídico. Findo o quatriênio, bacharelei-me em Direito. Impossível descrever as emoções daquele dia. O entusiasmo e a esperança do ingresso cederam lugar às responsabilidades que aguardavam o egresso no exercício da vida profissional.

Assustei-me ante o conflito existente entre o mundo teórico , de onde saía, e a complexidade do meu mister. Mergulhado em milhões de pensamentos desci, pela última vez, os patamares da minha querida Faculdade de Direito. O derradeiro deles, colocar-me-ia frente a frente com a realidade que temia encontrar. Entretanto, a vontade de crescer e de vencer na vida foi maior que o temor momentâneo. Enfrentei o mundo com determinação e firmeza de ânimo e exerci a advocacia com lealdade e amor à profissão, em respeito à sua nobre classe e à justiça.

No desempenho de minha profissão de advogado percebi, de logo, que a advocacia não me bastava. Queria ir mais longe. Queria ser magistrado. Para isso, amarguei os dissabores de vários concursos. Entretanto, não me deixei abater pelo pessimismo, pois só os fortes, os que não se acomodam, vencem e triunfam. E, se não fosse vitorioso no concurso de Juiz de Direito a que me submeti, estaria disposto a repetir a experiência tantas vezes fossem necessárias para ver realizado o meu sonho, o supremo ideal de minha vida.

E a magistratura me veio como uma recompensa, uma premiação aos meus esforços, aos meus sacrifícios por conquistá-la. Por isso mesmo saberei dar-lhe o devido valor. Saberei honrá-la e dignificá-la, lacerado que tenho os pés dos cardos do caminho por atingi-la.

Hoje sou magistrado e estou consciente da responsabilidade que flui da magistratura, a mais sublime missão que um mortal pode aspirar. Missão quase divina. Meu objetivo é ser aquele Juiz do futuro, de que fala o comentário de “La vie Judiciaire”: “Cavalheiresco, hábil para sondar o coração humano, enamorado da ciência e da justiça, ao mesmo tempo que insensível às vaidades do cargo; arguto para descobrir as espertezas dos poderosos; informado das técnicas do mundo moderno, no ritmo da era nuclear, onde as distâncias se apagam e as fronteiras se destroem, onde, enfim, as diferenças entre os homens serão simples e amargas lembranças do passado...”

Estou ciente da soma dos poderes e prerrogativas que o Juiz encarna e que, como bem disse Eliasar Rosa: “não pode cair em mãos quaisquer, sem riscos e perigos para todos, e sem o aviltamento, inclusive, da própria ordem jurídica”.
Apesar de jovem, tenho conhecimento da ciência da vida, que julgo mais importante que o direito, pois o saber jurídico, como magnificamente enfocou o eminente Desembargador Oscar Tenório, do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, “por si só, não é suficiente ao digno exercício da magistratura. O conhecimento dos Códigos, mesmo à luz da doutrina dos grandes interpretes, não é domínio exclusivo dos juízes. O atributo essencial do grande magistrado é a sabedoria, cujas raízes conceituais se aprofundam na vida e na razão”.

Imbuído desses princípios é que, no exercício da judicatura, procurarei aplicar bem a justiça, como bálsamo para todas as chagas sociais. Procurarei ser digno de mim mesmo, como magistrado, reconhecendo, como Calamandrei, que as qualidades que mais se respeitam nos Juízes são a imparcialidade e a sua resistência a todas as seduções do sentimento.

E quero, ao final de minha carreira, diante do terrível NÃO JULGUEIS, dizer com os olhos fitos nos Céus: SENHOR, cumprir com o meu dever, convicto, porém, de que É TEU O PODER DE JULGAR.

Hoje, vinte e seis anos depois, venho aqui dizer que sinto em mim o mesmo vigor, a mesma devoção, o mesmo amor e mesmo respeito à magistratura. Vou ao fórum com a mesma disposição, encantamento e coragem dos primeiros dias.

A magistratura não me cansa, muito pelo contrário, renova diariamente as minhas energias. Sinto-me feliz com o meu trabalho. É enriquecedor ao espírito servir aos que têm sede e fome de justiça. O servir é o bálsamo que alivia os sofrimentos causados pelos cardos do caminho. A magistratura é a razão da minha existência.

Sou magistrado por vocação.



Antônio Carlos de Souza Hygino
Juiz de Direito titular da 5ª Vara Cível da Comarca de Itabuna – Bahia.

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