Sem ajuda
oficial, perturbado pela ação da política, pelos choques de ambições, que
resultavam em assassinatos, assim mesmo crescia, se multiplicava em riquezas,
se desdobrava em frente de trabalho. Principalmente depois das ligações
rodoviárias o movimento se agigantava, o comércio aumentava, as pequenas
indústrias se fixavam, os estabelecimentos de crédito cresciam, os lavradores possuíam
uma mentalidade mais evoluída e tinham consciência do que se chamava
solidariedade de classe.
Mais de dez
mil casas enchiam a cidade e a população não passava de noventa e seis mil habitantes,
no município.
Nas matas
tudo estava povoado e cultivado. Ele, Carlos Sousa, na sua profissão havia
percorrido a área do município. Conhecia a zona pecuária do Salgado e do Colônia,
até a Fartura. Conhecia a zona do cacau de Jussari de Buerarema de Mutuns, de Ribeirão
da Lama, do Boqueirão. Não existia nessa superfície territorial de 2731
quilômetros quadrados um palmo de terra ruim, inaproveitável. Onde acabava o
cacau principiava o gado. A mentalidade de todo o cidadão era produzir e enriquecer.
Havia o
sentido de crescer e evoluir. Os “coronéis” ricos mandavam os filhos para as
academias se ilustrarem. Não queriam que os filhos ficassem ignorantes como eles,
que mal assinavam o nome. Nesse passo o município iria longe, muito longe, em civilização,
em riqueza, em independência econômica. O cacau dava para tudo, pagava tudo,
cobria as despesas e ainda sobrava algum dinheiro. O delegado Reinaldo Sepúlveda
estava fazendo uma campanha muito grande contra o banditismo. Rolava a história
do crime de Antônio Capenga, ligada à história do crime de José Luís, da Avenida
Itabuna, na cidade de Ilhéus.
Antônio Capenga
tinha empreitado a eliminação de Garangau, seu filho de criação, que, por sua
vez, empreitara um crime monstruoso, a mando de um fazendeiro de cacau, para se
apoderar da propriedade de José Luiz, seu vizinho.
Contava a
imprensa que os contratados para o crime foram eliminados para não ficar uma
pista.
Um deles
tomou uma sopa envenenada e morreu. Outro tomou um tiro e caiu fulminado. O último,
Garangau, quando dormia tranquilo havia sido enforcado pelo pai de criação. E,
por sua vez, o pai de criação, Antônio Capenga, desapareceu abatido a tiros e
machadadas.
A polícia
estava atordoada.O doutor Reinaldo Sepúlveda junto ao regional de ilhéus,
doutor Almir Brandão pinto, se esforçavam para descobrir o mistério que envolve
tantas mortes, porém debalde.
Chegaram a
prender fazendeiros como Porfirio Ribeiro e tentaram um processo contra Otoniel
Lima, mas não conseguiram coisa alguma.
Esse Otoniel Lima era um homem forte, de
uma natureza brava como as selvas do cacau. Nada o abalava, nem o demovia. Não tinha
medo de coisa alguma, nem de polícia, nem de ameaças, nem de outro homem. Carlos
Sousa gostava dele, pela lealdade e linha de conduta.
Quando
gostava, não via culpa nem crime nos amigos. Quando não gostava, era capaz de
mandar matar, ou de matar pessoalmente.
Que lhe
importava que dissessem ser o autor de tantas mortes se não provavam coisa
alguma?
E não
provaram nada, o processo rolou, foi para o tribunal e este mandou arquivá-lo e
dele saiu inocente o acusado.
Nessa
época, a guerra europeia continuava acesa EO povo esqueceu os crimes cometidos.
As forças aliadas se preparavam para o desembarque nas costas da França
invadida e dominada.
Quando o País
entrou em guerra, os itabunenses se levantaram com o Brasil. Então, quando os
navios foram torpedeados, os populares se revoltaram e prenderam os súditos do Eixo,
invadindo e depredando a residência de dois alemães construtores, nazistas de primeira
água.
Até Emílio
Niela, brasileiro nascido em Jequié, estava ameaçado de ser preso. A firma
inglesa na qual era empregado havia muitos anos, aproveitou a oportunidade e o
denunciou como italiano, porque assim se livraria do funcionário sem
indenização.
Niela provou
que era brasileiro dos mais legítimos e continuou a desfrutar a sua liberdade,
levando os exploradores ingleses a pagarem a sua indenização.
Também
esses ingleses eram conhecidos como os mais ferrenhos exploradores da lavoura
cacaueira. Verdadeiros especuladores, que agiam no município como sugadores da
economia. O chefe era um inglês, que morava nem Londres, e vivia dos lucros dos
colonos brasileiros. Nunca havia plantado um pé de cacau e colhia sessenta mil
arrobas, nas fazendas tomadas aos cultivadores de cacau. Para isso, atraía o
lavrador como freguês, financiava-o, tratava-o bem, e quando surgia uma crise,
executava a dívida e arrematava a propriedade em leilão público.
Uns
ladrões amparados pela lei e pelas libras inglesas. Só mesmo um país sem
governo concordava com semelhantes espoliações em massa.
Niela
nunca mais poupou os ingleses imperialistas, que a guerra teve a virtude de
enfraquecer economicamente e politicamente. Tanto assim que as cartas de Londres
anunciavam que o chefe da firma havia perdido tudo com a conflagração. Não fossem
as fazendas de cacau, estaria ele reduzido à miséria. O que possuía na Inglaterra
a guerra devorou, destruiu, liquidou, como os inúmeros lavradores que caíram
nas garras da sua firma.
Carlos Pereira Filho
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