Tabocas
foi aumentando, com o tempo. Cada dia que se passava crescia a sua população e
as suas roças de cacau ampliavam-se. Os plantadores de cacau se embrenhavam
para as matas no rastro dos bons terrenos, para os lados da Boa Lembrança,
Preguiças, Virotes, Mutuns, Outeiro da Palha, Ribeirão de Areia, Boqueirão,
Ribeirão da Lama, Jacaré, até Macuco. Os moradores locais começaram a dizer que
Tabocas necessitada de uma igreja, porque terra sem Deus não andava para a
frente. E citavam fatos, que comprovavam a influência do “capeta” solto nas
ruas do povoado.
Reuniram-se os maios graduados da localidade. Falaram sobre religião,
discutiram sobre a construção da igreja. Firmino Alves, que era chefe, iniciou
o trabalho de uma igreja grande, que não concluiu, mas Joaquim Batista de
Oliveira edificou a capelinha de Santo Antônio, na qual o visitador, cônego
Moisés Gonçalves do Couto rezava missa, batizava o povo e pregava os seus
sermões, ensinando ao povo o temor de Deus e o amor ao próximo.
Todavia,
se o povo se tornava devoto, se as plantações cresciam, e as áreas do cacau se
alargavam, se os fazendeiros melhoravam de sorte, a tranquilidade pública
piorava, passava por graves agitações. Raro era o dia em que não se matava um
cidadão. Raro era o dia em que não se registrava uma arrelia.
Num dia de
abril, Tabocas foi, de surpresa, atacada por um grupo de clavinoteiros
procedentes de Conquista e de Belmonte. Morreram dois indivíduos e quatro
ficaram feridos. Mas o povo não correu, o povo lutou, até os clavinoteiros
recuarem. Naquele tempo o povo não corria, nem mesmo havia para onde correr,
desde quando as matas se apresentavam ainda mais terríveis, com o domínio dos
bandidos.
As
providências pedidas para a Capital davam melhor ideia doa que se passava em
Tabocas: “Manuel Bomfim Neto, indivíduo sem profissão decente, à frente a força
pública Tabocas cometendo depredações toda ordem, comércio fechado, população
horrorizada. Homens ordeiros trabalhadores e até fazendeiros barbaramente
espancados, no tronco. Minha residência, negócio, fazendas, sofrendo grandes
prejuízos, com vida arriscada. Peçam Governo providências. Tabocas em paz antes
chegada destacamento pedido para desabafo paixões Manuel Bonfim criminoso morte
é quem dirige polícia”. E terminava: “Tabocas não precisa soldados, quais devem
retirar-se bem da ordem progresso lugar”.
Dias
depois, um outro despacho explicava: “Os abaixo assinados, negociantes Tabocas,
protestam contra a revoltante calúnia publicada jornal dia 19 em que diz que a
força pública tem cometido absurdos. Ela é garantia ordem pública. O sargento
comandante procede corretamente. Pedimos conservação destacamento em bem da
ordem pública”.
As cenas
de sangue, entretanto, prosseguiam ao ponto de os cronistas registrarem que o
distrito “continuava a ser palco de arbitrariedades das autoridades policiais,
de saques de estabelecimentos comerciais, de assassínios, espancamentos,
prisões, indo e vindo os jagunços à vontade por toda a parte, sob a proteção
dos mandões da terra”.
E,
aliviando o alarma sobre tais desmandos, os mesmos cronistas escreviam: “Esta é
um fenômeno familiar das paragens recentemente exploradas, que pela abundância
das suas riquezas naturais atraem forasteiros de todas as condições sociais”.
Assim, aconteceu no Acre, no Amazonas, nas zonas diamantíferas das Lavras, do
Salobro e no rio das Garças”.
Tabocas
não podia fugir à regra. No seio fecundo das suas ubérrimas terras, o sangue
dos heróis anônimos sacrificados pelo ideal do trabalho tinha de ser o resgate
da opulência, que hoje resplandece nos cacauais e na riqueza do seu povo
progressista.
(Capítulo VI do livro TERRAS de ITABUNA)
Carlos Pereira Filho.
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