O Modelo Moro
Um juiz que tem em mãos processos envolvendo tanta gente
poderosa e que aceita ser o alvo das perguntas e câmeras de um programa como
Roda Viva, da TV Cultura de São Paulo, tem que ser uma pessoa extremamente
confiante em sua própria sensatez. O risco é enorme. Qualquer pré-julgamento,
qualquer opinião fora dos autos, pode ser argumento para ser contestado pelas
defesas - que por tantas vezes já pediram seu afastamento de processos de
corrupção. Pois por hora e meia o juiz Sérgio Moro correu esse risco,
submetendo-se a perguntas de cinco jornalistas e aos olhares implacáveis das
câmeras que acompanharam seus gestos, feições e olhos de todos os ângulos. E
não tropeçou nenhuma vez; nenhum vacilo, nenhuma irritação, nenhum arroubo de
estrelismo diante das luzes daquele plenário que o cercava.
Em pergunta alguma perdeu a naturalidade. Mostrou que é um
juiz equilibrado, calmo, racional, sem paixões e preconceitos. Com profundo
conhecimento do mundo que o cerca, respondeu, no entanto com humildade, com
simplicidade, passando a imagem de sinceridade nas posições. Em nenhum momento
foi além dos limites da lei e de seus deveres como julgador. Depois do que se
viu e ouviu na semana passada no Supremo Tribunal, Moro foi um jato de
esperança a robustecer a aposta na Justiça, no país que vai perdendo
referências civilizatórias. Quando o programa terminou, ficou a impressão de
que o Brasil teve muita sorte quando a operação que começou num lava-jato de
Brasília, envolvendo pessoas com domicílio no Paraná, tenha ficado na Vara
Federal do juiz Sérgio Moro.
Quando tinha em mãos o caso do escândalo do Banestado(Banco
do Estado do Paraná), com evasão em dezenas de bilhões em divisas, o juiz
Sérgio Moro foi criticado por excessos e levado, por isso, ao Conselho Superior
de Justiça, que arquivou o caso. Com humildade, inscreveu-se em cursos da
Polícia Federal para aprender mais sobre lavagem de dinheiro e evasão de
divisas. Sentou-se nos bancos escolares da PF e acabou considerado pelos policiais
como um exemplo de juiz que se aproxima da origem da Justiça - o inquérito
policial - para aprender. O juiz mostrava então que a toga serve com mais
justiça quanto mais conhecimento tiver do crime. Por isso suas sentenças têm
sido irrepreensíveis. Ao se expor no programa da TV Cultura, em nenhum momento
foi acuado por perguntas de jornalistas que certamente se prepararam para o
interrogatório.
Moro virou celebridade mas não sai de si nem levita.
Continua sendo um juiz de primeira instância e não um artista. Ainda que se
deva repetir que juiz só fala nos autos, a situação por que passa o país
precisa de manifestações públicas dele, porque se tornou um símbolo da lei e da
justiça - no país da impunidade, da desordem civil, das leis
circunstanciais, em que o princípio de que todos são iguais perante a lei se
tornou uma farsa em que fingimos acreditar. Um país que fala em democracia
todos os dias é porque tem apenas um arremedo dela. Estados Unidos e Alemanha
não ficam falando em democracia - porque é o fato básico, corriqueiro. Sem
ordem, sem justiça que desestimule os corruptos e criminosos em geral, jamais
chegaremos a ser uma democracia. Sérgio Moro é uma esperança, um modelo, de que
sem histrionismo, sem populismo e com simplicidade, revela um modelo para
recuperarmos o caminho perdido.
Alexandre Garcia
Jornalista
Alexandre Eggers Garcia é um jornalista, apresentador e
colunista político brasileiro. Foi porta-voz do último presidente do período do
regime militar do Brasil, general João Batista Figueiredo. Wikipédia
Nascimento: 11
de novembro de 1940 (77 anos), Cachoeira
do Sul, Rio Grande do Sul
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