4.4. Em busca do ministro
Em
boqueirão, por volta do ano de 1915, fiéis já declinavam dos labores no sétimo
dia. Liam a pouca literatura que possuíam, mas faltava-lhes alguém preparado
para oficiar sermões e dirigir cerimônias e rituais cristãos. Anelavam por
batismos! Queriam selar sua fé publicamente e obter o referendo dos céus! Mas
como? Nunca UM PASTOR HAVIA PISADO EM Boqueirão. Depois dos folhetos, vieram
colportores, mas estes não foram ordenados pela igreja para oficiar batismos.
Estavam certos de que já obedeciam a Deus em tudo. Porém, tinham lido em Marcos
16:16 que “quem crer e for batizado será salvo”. Então, eles precisavam cumprir
esta segunda parte. A volta de Jesus lhes parecia iminente e poderiam assim
ficar fora do céu.
A
comunidade campesina do Boqueirão havia enviado cartas anunciando ao
responsável interino pela Obra na Bahia a existência de interessados na
localidade, mas sem sucesso. Insatisfeito com a situação, João Roberto Ramos
encetou viagem a São Salvador para homologar sua salvação por meio do batismo.
Imagine as dificuldades e os custos inerentes a uma viagem como essa há 100
anos. Não havia estradas carroçáveis para a capital e viagens marítimas via
porto de Ilhéus deviam onerar bastante qualquer reserva financeira.
Chegou a
Salvador, inquirindo onde residiam os adventistas. Por fim, recomendaram-lhe
uma Igreja Batista, onde, inicialmente, foi afavelmente recebido por quem lá se
encontrava, naquele momento, fora do horário do culto: o zelador. Todas as
dependências do complexo religioso lhe foram mostradas: templo, escola
paroquial, salas de reuniões e o tanque batismal, onde, segundo o aplicado
funcionário, João Roberto seria batizado no domingo. Aquela última palavra não
soou bem para os seus ouvidos do nosso protagonista: Domingo!?
“Que dia
observam os cristãos dessa comunidade?” perguntou o irmão Roberto. Prontamente,
próprio daqueles que tem o zelo missionário na veia, já certo de testemunhar
mais uma conversão no próximo culto dominical, o zelador respondeu: “Guardamos
o Domingo, dia da ressurreição de Cristo!” Começava naquele momento mais um
embate teológico-leigo dos muitos que o fazendeiro Grapiúna iria travar em sua
longa vida de cristão adventista. Fazendo uso de sua retórica e habilidade no
conhecimento textual, garantiu: “Tenho lido a Bíblia muitas vezes durante os
anos passados, porém nunca li que os filhos de Deus devem guardar o Domingo!”.
O semblante do interlocutor decaiu rapidamente e, dando por finalizado o
pequeno debate, exasperou: “Se o senhor quer ser judeu e guardar o Sábado, não
deve nos procurar, mas ir procurar os sabatistas”. Provavelmente, apontando o
dedo com certo desprezo para um determinado local, o zelador mostrou onde
encontraria o ministro desejado. E lá se foi o dedicado irmão.
A
esperança de ver seu objetivo alcançado esmoreceu momentos depois, quando
constatou a ausência do ministro por ele procurado. Não se encontrava em
Salvador aquele que cerimonialmente e humanamente lhe conduziria aos pés de
Cristo e Este anotaria seu nome no Livro da Vida. Na verdade, o presidente
responsável pela Missão Nordeste (Bahia, Sergipe, Alagoas, Paraíba e
Pernambuco), no período de 1914 a 1920, era o pastor Ricardo José Wilfart, que
morava em Caruaru/PE, e quem atendia interinamente no Estado da Bahia era o
obreiro Zacarias Martins Rodrigues. Depreende-se daí que a casa apontada como
residência do pastor na verdade era onde residia o obreiro e colportor Zacarias
(que era considerado pelos leigos como um pastor), e este, quando escrevia
algum artigo param a Revista Adventista, o fazia datando e assinando da Bahia,
nome mais conhecido de Salvador à época. Ele próprio reconheceu, na Revista
Adventista de fevereiro de 1918, p. 11, que estava ausente na visita que João
Roberto fizera a sua casa. E, no mesmo ano, sua ausência foi justificada por
meio da Review and Herald. São suas as seguintes palavras: “veio em minha casa
uma série de interessados que haviam viajado longa distância do Boqueirão para
Bahia, para convidar-me para ir lá. Eles voltaram, no entanto, muito
desapontados, já que na época eu estava buscando outros interessados em outras
partes do estado”.
Chateado
pela situação, mas não desesperançoso, magoado, mas não desiludido; abatido,
mas não desanimado, retornou ao Boqueirão. Sua fé lhe sussurrava aos ouvidos
que logo mais chegaria o dia em que não somente ele, mas todos os fiéis de sua
comunidade mergulhariam nas águas, morrendo para o mundo secular e nascendo
salvos para Cristo!
Retornando
aos seus, novas missivas são produzidas e encaminhadas ao obreiro Zacharias
Martins Rodrigues. Ele responde-as alegando ausência em virtude de falta de
tempo e também por questões administrativas:
“Ultimamente, recebi uma carta
destes irmãos, convidando-me que lhes
fizesse uma visita, pois, que existe ali
um bom grupo, a cujo pedido, porém,
não pude atender imediatamente por
falta de tempo e porque estava
esperando aqui o irmão Lipke”.
(A GÊNESE DO ADVENTISMO GRAPIÚNA Cap. 4.4.)
Clóvis Silveira Góis Júnior
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