4 de janeiro de 2018
O ex-ministro do Planejamento da Venezuela (1992-1993) e
ex-economista-chefe do Banco Interamericano de Desenvolvimento, Ricardo
Hausmann, que é diretor do Centro para Desenvolvimento Internacional da
Universidade Harvard, escreveu um polêmico artigo para a Project Syndicate esta semana considerando
uma intervenção militar estrangeira na Venezuela como uma alternativa, uma vez
que a ditadura socialista de Maduro vem destruindo o país e jogou a população
no completo caos social. Diz ele:
No que se refere a soluções, por que não considerar a
seguinte: a Assembleia Nacional poderia declarar o impedimento de Maduro e do
vice-presidente Tareck
El Aissami, narcotraficante e sancionado pelos EUA.
A Assembleia poderia indicar constitucionalmente um novo
governo, que por sua vez poderia pedir ajuda militar a uma coalizão de países
dispostos, incluindo latino-americanos, norte-americanos e europeus.
Essa força libertaria a Venezuela, assim como canadenses,
australianos, britânicos e americanos libertaram a Europa em 1944-45. Mais
perto de nós, seria como quando os
EUA libertaram o Panamá da opressão de Manuel Noriega, instalando a
democracia e o mais rápido crescimento econômico da América Latina.
Segundo o direito internacional, nada disso exigiria a
aprovação do Conselho de Segurança da ONU (o que a Rússia e a China poderiam
vetar), porque a força militar seria convidada por um governo legítimo buscando
apoio para o cumprimento da Constituição do país. A existência dessa opção
poderia até melhorar as perspectivas das atuais negociações na República
Dominicana.
Uma implosão na Venezuela não é do interesse da maioria dos
países. E as condições lá constituem um crime contra a humanidade que deve ser
detido por razões morais.
O fracasso da Operação Mercado Jardim em setembro de 1944,
imortalizada no livro e no filme “Uma Ponte Longe Demais”, levou à penúria nos
Países Baixos no inverno de 1944-45. A fome na Venezuela hoje já é pior.
Quantas vidas devem ser destruídas antes que chegue a salvação?
Hoje, a folha publicou dois textos em resposta. O primeiro
foi a coluna de Matias Spektor, que considerou a proposta
“estapafúrdia”. Ele apresenta três motivos: a falta de alternativa de poder, a
limitação geopolítica de quem poderia realizar tal intervenção, e a falta de
legalidade ou legitimidade a ela. Diz ele:
A Venezuela encontra-se em seu pior momento, mas ir à guerra
contra o chavismo no que seria a primeira intervenção na América do Sul no
século 21 não é solução. Há alternativas para lidar com o problema que não
trazem o risco embutido de uma aventura militar questionável e de resultado
incerto.
Resta perguntar: quais? Que alternativas são essas, se até
hoje só vemos a Venezuela afundar mais e mais no caos ditatorial? Vamos
acreditar em “diálogo” ainda? Há algo menos legítimo do que o regime
atual? Gostaria de saber quais alternativas concretas o especialista apresenta,
pois não consigo nem imaginar quais sejam.
O segundo texto é de Xabier Coscojuela, resposta direta ao
original, e que rotula a proposta de Hausmann como “desesperada”. De fato. Mas
a situação na Venezuela não é de desespero? “Os males desesperados são
aliviados com remédios desesperados ou, então, não têm alívio”, disse
Shakespeare em Hamlet. Coscojuela, porém, rejeita a ideia, e diz:
Considero-a uma alternativa totalmente inconveniente para o
país. Uma possibilidade que só geraria mais anos de instabilidade para a
Venezuela.
O sensato, o conveniente, é que as negociações que estão
sendo realizadas na República Dominicana terminem com acordos nos quais se
inclua a eleição presidencial com garantias de respeito à vontade popular ali
expressada e que também se eliminem ou se imponham limites, muito precisos, à
atuação da Assembleia Nacional Constituinte.
Não tenho nenhuma dúvida de que os que governam a Venezuela
não são democratas, que utilizaram e utilizarão todas as alternativas ao seu
alcance para manter-se no poder, sem importar a opinião da maioria dos
venezuelanos, mas é preciso tirá-los do poder mediante o voto e constituir um
governo de muita amplitude porque a crise nacional é das mais graves que a Venezuela
teve em toda a sua história.
Se o próprio autor reconhece que Maduro não vai sair por
livre e espontânea vontade, como ele será retirado por meio do voto? Se ele
manipula as “eleições”, como os votos vão derruba-lo? Entendo o argumento dele,
e também de Colette Capriles, de que propor essa intervenção já serve como arma
para Maduro justificar a intensificação da opressão. Mas não é por isso que
será um erro considerar esta opção.
Não sei se a ideia é exequível, se há como colocá-la em
prática mesmo, se haveria coordenação de vários países, ou se o governo
americano tomaria uma decisão dessas de forma unilateral. Só sei que o
“diálogo” não vai resolver nada, e acreditar nisso é uma quimera perigosa,
típica de românticos pacifistas, os mesmos que vibraram quando Chamberlain
assinou um pacto com Hitler, ou quando Obama assinou um pacto com o Irã.
A Venezuela vive um grande impasse. Não há saída fácil. É
sempre assim com experimentos socialistas: todos terminam em miséria, terror e
escravidão. E a imensa maioria só caiu com luta, com intervenção externa, com
muita pressão. Com “diálogo” realmente não temos caso na história para contar…
Rodrigo Constantino
..........
Economista pela PUC com MBA de Finanças pelo IBMEC,
trabalhou por vários anos no mercado financeiro. É autor de vários livros,
entre eles o best-seller “Esquerda Caviar” e a coletânea “Contra a maré
vermelha”. Contribuiu para veículos como Veja.com,
jornal O Globo e Gazeta do Povo. Preside o Conselho Deliberativo do Instituto
Liberal.
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