29 de junho de 2017
Péricles Capanema
Em comunicado de 17 de maio, o Conselho Indigenista
Missionário (CIMI), com expressões como as abaixo transcritas, agrediu o
relatório da chamada CPI da FUNAI/INCR, a qual solicitara o indiciamento de 14
missionários: “A CPI da FUNAI/INCRA mostrou-se parcial do início ao fim
dos trabalhos. Criada e relatada por ruralistas para atender os interesses
ruralistas e atacar os povos originários. Descomprometidos com a verdade, os
ruralistas tentam criminalizar mais de uma centena de lideranças indígenas,
indigenistas, religiosos e cientistas sociais. Tentativa de retorno ao
escravagismo no campo e venda do território brasileiro para estrangeiros por
parte dos ruralistas [suposto objetivo dos deputados ruralistas e de seus
apoiadores]. Chama atenção a forma racista de os ruralistas se referirem a
lideranças e povos indígenas. Trata-se de ranço colonialista que acentua o
preconceito contra os povos originários de nosso país. Outrossim, preocupa a
onda de massacres cruéis cometidos por fazendeiros e seus jagunços contra povos
indígenas, quilombolas e camponeses Brasil afora”.
Longe da concórdia, que nasce da caridade, esse é o tom do
órgão que supostamente coordena as atividades de missionários cuja missão é
arrancar os indígenas do paganismo e conduzi-los ao Catolicismo. Labuta de
pregação, convencimento e conversão de fato altamente civilizatória. Tarefa de
harmonia e de inclusão.
Missão é uma coisa; trabalho efetivo, outra. Exemplo da
atividade real: intolerante, o CIMI investe contra os fazendeiros. Alguém no
Brasil acredita que exista “onda de massacres” promovida por fazendeiros,
dirigida contra índios, quilombolas e camponeses? E que os ruralistas procuram
reinstalar a escravidão no campo e vender suas terras a estrangeiros? O órgão,
unido à CNBB, prejudica os pobres ao jogá-los contra o agronegócio, que está
evitando a quebra do Brasil e a precipitação numa miséria como a da Venezuela e
Cuba, para onde nos conduzirá a ação das correntes que apoiam o CIMI, como MST,
CPT, CUT, entidades e partidos afins.
Em comunicado de 22 de junho, a CNBB apressou-se em defender
o CIMI: “O Conselho Permanente da Conferência Nacional dos Bispos do
Brasil – CNBB, reunido em Brasília – DF, nos dias 20 a 22 de junho de 2017,
manifesta seu total apoio e solidariedade ao Conselho Indigenista Missionário
(CIMI) diante das infundadas e injustas acusações que recebeu da Comissão
Parlamentar de Inquérito, denominada CPI da Funai e Incra. O indiciamento de
missionários do CIMI é uma evidente tentativa de intimidar esta instituição tão
importante para os indígenas. Tenha-se em conta ainda que as proposições da CPI
se inserem no mesmo contexto de reformas propostas pelo governo, especialmente
as trabalhista e previdenciária, privilegiando o capital em detrimento dos
avanços sociais. Tais mudanças apontam para o caminho da exclusão social”.
Assinam o documento Dom Sérgio da Rocha, cardeal-arcebispo de Brasília, Dom
Murilo Krieger, arcebispo de Salvador, e Dom Leonardo Steiner, bispo-auxiliar
de Brasília, respectivamente, presidente, vice-presidente e secretário-geral da
CNBB.
O avanço social no Brasil está ligado ao estímulo dos
investimentos, tanto o público como o privado, os quais dependem fortemente de
reformas sensatas nos âmbitos trabalhista e previdenciário. Fracassando,
minguarão as aplicações, a produtividade tenderá a estacionar. Na prática, a
proposta da CNBB petrifica o atraso. E, no bojo de outras de igual inspiração,
favorecerá o retrocesso, com o agravamento da miséria. De passagem, avanço
social autêntico é o que propicia, com proporção, condições para que os membros
do corpo social atinjam a plenitude de suas potencialidades, e não o que
favorece desnaturadas políticas igualitárias.
Dois pontos finais a destacar. Primeiro, convém ter em vista
dados divulgados pela revista EXAME e, em particular, pelo Dr. Evaristo de
Miranda [foto ao lado]. Existem hoje no País 584 terras indígenas, as quais
ocupam 114.699.057 ha, por volta de 14% do território nacional. Deambulam no
Brasil 869,9 mil indígenas, aproximadamente 0,42% da população. Estes 0,42%
povoam os 14% do território nacional que lhes são destinados? Que nada. Um em
cada três dos índios (36,2%) reside nas cidades, 63,8% habitam áreas rurais.
Entre os que estão fora das terras indígenas, só 12,7% falam alguma língua
indígena. Dentre os íncolas das terras demarcadas, 78,9 mil se declaram de
outra raça, dos quais 70% pardos. Dos 869,9 mil, 147,2 mil não sabem a qual
etnia eles pertencem. Em geral, vivem em casas. Nas terras demarcadas, 2,9%
moram em ocas. Nas terras indígenas, a energia elétrica chega a 70,1% dos
domicílios. 76,7 dos índios são alfabetizados em português. Resumo: em sua ação
revolucionaria, o CIMI, força do atraso, afirma defender um índio que quase não
existe mais, se um dia existiu. A maioria deles, como o brasileiro em geral,
quer é crescer na vida.
O segundo ponto eu o registro alegre, por dever de justiça.
Em nenhum momento a CNBB afirma que houve unanimidade no Conselho Permanente. O
que levanta a suspeita de oposição interna. A propósito, em março, Dom Odilo
Scherer, cardeal-arcebispo de São Paulo, marcou distância em relação às
posições oficiais da CNBB: “Penso que de toda maneira há necessidade de
reformas tanto na lei trabalhista como na lei da Previdência. Sim, acho que é
necessário fazê-las e fazê-las bem”.
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