Nascida na zona rural de Itabuna, Eglê Santos Machado não
terminou o segundo grau. Abriu mão de trabalhar e estudar para cuidar de seus
filhos, coisa cada vez mais rara hoje em dia. Mesmo sem diplomas e títulos, o
contato com os livros a fez uma mulher sábia, com grande bagagem de
conhecimento e escritora de lindos poemas.
Desde 2009 administra o Blog Itabuna Centenária onde
fala de cultura, cidadania, política, educação e poesia.
Em janeiro de 2014 concedeu-me gentilmente esta
entrevista, onde fala de sua infância, suas experiências e e sobre a região
cacaueira. Tudo para que pudéssemos conhecer um pouco mais da história dessa
mulher genuinamente grapiúna.
Obrigada Querida Eglê
ENTREVISTA
Por Raquel Rocha
Relembrando seu tempo de professora, como foi a experiência
de lecionar na zona rural?
As crianças e os adolescentes da zona rural tinham a escola
como a coisa mais importante da vida, eram amorosas e atentas às aulas. A
professora era amada e sua palavra era lei. Como eu era muito jovem (havia
alunos e alunas da minha idade, alguns até mais velhos) lecionar era como
brincar de escola. Porém conseguia conduzir a sala de aula e ministrar as
lições com responsabilidade e paciência, mesmo porque a mamãe estava
disfarçadamente de olho em tudo o que acontecia naquela enorme sala com quase
cinquenta estudantes.
Você presenciou o auge da riqueza da região cacaueira e a
sua falência. O que você acha que piorou ou melhorou em Itabuna comparando o
passado com o presente?
Nasci e vivi até os 18 anos numa fazenda de cacau,
administrada pelo meu pai. Era muito grande e no auge da safra empregava pelo
menos vinte trabalhadores; os empregados casados tinham uma média de três
filhos, a esposa e algumas vezes um casal de idosos pais de um dos cônjuges. Os
domingos eram muito divertidos, pois todos os trabalhadores e familiares
reuniam-se para as compras na despensa da fazenda. Compravam carne seca, arroz,
sal, açúcar, sabão, fósforo, fumo e querosene; frutas, verduras e outros
produtos colhiam nas roças da fazenda. O rio lhes dava muitos peixes. Alguns
criavam galinhas, porcos, fabricavam farinha. O dono da fazenda só tinha
interesse no cacau. Morava na cidade, aparecia na fazenda quando muito uma vez
ao ano. O assunto cacau era o importante, tudo girava em torno do cacau, de
barcaças, de chuvas no tempo certo, de sol para a secagem das amêndoas, de boas
tropas para transportar o cacau seco para os armazéns da cidade.
Quando
começou a falência na região cacaueira eu já morava em Itabuna, mas pude muito
bem perceber o tamanho da calamidade, pelas pessoas que antes trabalhavam nas
fazendas e jaziam abandonadas nas periferias da cidade, crianças seminuas,
famintas; e o pior, muitos pais de famílias enxotados e agredidos, quando pegos
em alguma roça na beira das estradas cortando um cacho de bananas para amainar
a fome urgente dos filhos. Foi muito triste ver tudo isso, eu que sempre vi
tanta fartura na fazenda.
Quando começou com o ITABUNA CENTENÁRIA?
No final de 2009. Nasceu quase por acaso com o objetivo de
homenagear a cidade que festejaria centenário em 2010, por isso o nome. Foi bem
difícil o início, pois eu e algumas amigas mal sabíamos o básico em computação.
Quantos colaboradores o site tem? Quem são eles?
ITABUNA CENTENÁRIA abriga 282 membros. Já teve mais.
Poucos interagem, a maioria por dificuldade em lidar com o site. Além do
mais o Facebook é bem mais divertido. Esta semana eu comentava com um novo
membro que quem não tem alguma bagagem literária ou gosta de pesquisar na
Internet não consegue fazer algo na RSIC. Temos poetas, escritores,
padres, O Bispo de Itabuna, pastor protestante, atletas, psicólogo, gente da
região e muitos de outros estados. Alguns são membros, mas me enviam textos por
e-mail para eu postar. Todas as postagens feitas são compartilhadas no
Facebook, no Twitter e no Google + que são como vitrines da RSIC.
Qual a linha editorial do site? Sobre quais assuntos você
gosta de escrever?
Como se trata de uma rede social, sempre que entra um novo
membro, depois dos votos de boas-vindas é pedido que leia o regulamento
que sugere que em suas postagens conste sempre a fonte, que as
relações entre os membros sejam de cordialidade, gentileza e, sobretudo de
respeito, para fomentar uma convivência pacífica e harmônica. Eu gosto de
escrever poesias, mas no site posto artigos referentes a manifestações
artísticas na cidade e quaisquer textos enviados por contatos, confrades
e amigos, dando preferência a textos referentes a Itabuna e Região Grapiúna.
O que vale a pena ser preservado em nossa região?
Esta força do povo e sua capacidade de em momentos difíceis
praticar a gentileza e conservar a esperança.
Como você vê a vida cultural em Itabuna?
Tem altos e baixos, mas desde o segundo semestre do ano
passado percebo que tem se mantido bem efervescente.
O que a poesia representa em sua vida?
Resplende a Luz. Transborda a Alegria
A Paz mostra sua serena face,
Triunfa a Vida em sua inteireza
Vibra o imenso da amizade!
Funciona a tática da delicadeza
Que faz de cardo relva tenra e branda!
Repouso em ombro quente, amigo
Sem ferida, sem vergonha de chorar.
Após a solidão, final feliz!
Eglê S. Machado
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