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sábado, 19 de novembro de 2016

BABILÔNIA: ENTRE BEIRU E ENGOMADEIRA FORA MOCAMBO DE GUERREIROS ANCESTRAIS - Davi Nunes

Babilônia: entre Beiru e Engomadeira fora mocambo de guerreiros ancestrais

Esse trecho de Apocalipse – 18.16:19 “Ai! Ai! da grande cidade,… porque, em uma só hora, foi devastada!” – falando da destruição da Babilônia, dá conta de muito que vou descrever aqui. Visto que num só dia (19/07/2016) um jovem foi morto, uma criança de 2 anos e uma mulher foi baleada por ações impetradas pelo estado sanguinolento da Bahia, cuja cor negra a vestir a pele tem que ser também tingida com o sangue da morte, é a lógica macabra do genocídio e foi isso que ocorreu na Babilônia, um local que se encontra entre os bairros Engomadeira, Beiru/Tancredo Neves e Estrada das Barreiras, no miolo cidade do Salvador, o Cabula.

O local está onde hoje é um vale preenchido de casas com telhas de Eternit, lajes e blocos nus. No passado, segundo relato de um amigo morador da comunidade: ele ouviu de um mais velho que a região era habitada por uns homens e mulheres negras que não se misturavam e eram descendentes diretos de Beiru, homem nigeriano que veio escravizado na primeira metade do século XIX para Salvador e conseguiu a liberdade e terras. Eles viviam da agricultura, além da caça, pesca e da colheita de frutas, visto a imensidade de árvores frutíferas que existiam na região, além do rio que hoje é esgoto e divide o bairro Beiru e Engomadeira.

Óbvio que reconstruímos isso tudo através dos fios tênues da oralidade, os quais vão chegando no ouvido e vamos tentando transfigurar em escrita, pois como nos diz Hampatê Bâ, pensamento e fala não se contradizem, tem que ser um fato verdadeiro  e documental. Assim vamos como bibliotecas vivas transpassando saberes, tradições e histórias através das gerações.

A violência que atinge os moradores da região não fora porque desafiaram algum deus construindo o zigurate de Babel para alcançarem o céu, ela existe porque desde a escravização à favelização atual, ela fora a pedra de toque, o escopo de uma (como fala Achille Mbembe) necropolítica secular.

E o movimento que se arvora paralelo na comunidade não se reveste em ações para colocá-la como sujeita da construção de um novo porvir; ver-se imbuída, ou é arquitetada pelas próprias frechas assassinas do estado a nos criminalizar e fazer da gente corpos matáveis.

Sei que o espírito transformador ainda existe, está lá desde os primeiros habitantes quilombolas, ainda estamos em busca de um método, buscando o jeito para fazer com que toda a nossa potencialidade ganhe grande proporções, nos una como um povo para além da primeira ação de revolta à violência, que o principio dos ônibus atravessados na rua de descontentamento possa se tornar algo poderoso e transformador.

Davi Nunes, graduado em Letras Vernáculas pela Universidade do Estado da Bahia, é poeta e contista.

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