Mãe Josefina
Cyro de Mattos
A mãe
era o afeto, a dedicação e os bons conselhos. Apressada recomendava: “Menino,
já para dentro, que vem o vento ventoso levado, levando cisco! Menino, já para
dentro!” Alertava: “Boa romaria faz quem em sua casa está em paz.” Gostava de
fazer adivinhas. Sobre o sol: “O que é, o que é, o ano todo no deserto o mais
quente é?” Para estimular na resposta, antes de cada adivinha, ela observava:
“Responda certo como um menino esperto.” De pura carícia era a adivinha sobre
uma mãe generosa. “O que é, o que é, o beijo da noite, de dia a melhor sombra
é?” Para facilitar na resposta dizia que todos os dias essa pessoa acompanhava
de coração o filho caçula onde ele estivesse precisando de proteção.
A casa era pequena, mas os dias tinham sempre
as mãos zelosas da mãe. Colocavam nos vasos aquelas rosas, colhidas na roseira
que ela mesma plantara, e que agora como sonho enfeitado de pétalas deixavam a
manhã rosada e perfumada. Esbanjavam pelos ares só ternura.
Davam vida à máquina de costura as suas
pernas ativas. Os bordados, como beleza tecida por mãos até certo ponto
divinas, ganhavam admiração de quem fizesse a encomenda e fosse recebê-la
quando estava pronta. Como o mundo de Deus era grandão. Os doces que a mãe
fazia cativavam com açúcar.
Uma
mãe é para cem filhos, mas cem filhos não são para uma mãe, certo dia ela
disse, mas só depois como homem crescido o filho saberia o sentido justo do que
a mãe quis dizer com isso. Conheceria então nos dias ásperos quanta falta suas
mãos faziam, pois já não mais cuidavam, não limpavam os caminhos na lei da vida
para que ele estivesse seguro para fazer a travessia. Teria de ser um dia com o
filho sozinho os caminhos a percorrer na jornada da vida.
Da
balaustrada no jardim gostava de olhar as nuvens acima do rio levando castelos,
gente e carga. Antes que a noite chegasse, desenhavam gigantes, às vezes velhos
barbudos, um deles apareceu em pé no tapete. De calção, peito nu, lá no pátio
da casa, ficava vendo a passagem das nuvens no azul do céu. Como elas que
voltavam naquele pedaço de céu, ele voltaria um dia para brincar com os amigos
de infância quando já fosse um homem? Só havia um jeito de regressar ao
passado, rindo, a mãe disse, sonhando acordado. Um homem com o menino
conversando.
- Você quer
ser peixe ou ser gente? – preocupada, a mãe perguntou. - Primeiro a obrigação,
depois a diversão, só anda agora com o bando de amigos nadando e pescando no
rio. Finalizou séria e se dirigiu calada para a cozinha.
A mãe
alimentava com o marido a ideia de que o filho deveria estudar para se tornar
um dia um homem formado, um cidadão de bem, exercendo na sociedade uma
profissão importante como a de advogado, médico ou engenheiro civil.
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Cyro de Mattos é ficcionista, poeta, cronista, ensaísta e
autor de literatura infantojuvenil. Membro efetivo da Academia de Letras da
Bahia. Doutor Honoris Causa da UESC (Bahia).
Possui prêmios importantes. Publicado no exterior.
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