Tive na vida irmãos (três) maravilhosos, o Sylvio, o Odilon e o Júlio. Todos mais velhos, que nasceram ainda na Polônia, mas cedo vieram para o Brasil, ajudando os meus pais nas tarefas de educação dos irmãos mais moços, o Arnaldo e a Rachel. Não os decepcionei, fazendo do estudo a razão de ser da minha vida.
O último dos três irmãos, já na idade de 94 anos, faleceu
vítima da Covid-19. Senti muito a sua falta e, apesar de todas as restrições
sanitárias, compareci à cerimônia de inauguração da sua sepultura, no Cemitério
Israelita de Vilar dos Teles. Foi muito feliz a frase cunhada pelas suas três
filhas: 'Por onde andou, soou o diálogo, a arte e a cultura.' Síntese admirável
do que foi a sua vida, como profissional do Direito e como exemplar funcionário
do Banco do Brasil.
No dia da cerimônia, o rabino pediu que a gente dirigisse
algumas palavras aos presentes. Não podia recusar. Aproveitei para lembrar de
uma das visitas feitas ao Estado de Israel, quando conheci a minha tia-avó,
Mime Reisel, que tinha a cara da Golda Meir. Ela me disse uma frase
inesquecível: 'Você, da nova geração, deve sempre se lembrar de que a nossa
família descende diretamente do rei Davi.' Existe honra maior? E um compromisso
comportamental, do qual não podemos dissociar.
Foi o que falei, no subúrbio carioca, recordando de onde
viemos. E ao mesmo tempo prometendo ações que estejam sempre coerentes com essa
formação. É a hora em que não importam a riqueza nem os bens materiais.
Odilon foi um líder sindical de proeminência. Graças aos
seus contatos no jornalismo, especialmente na recém-lançada 'Ultima Hora', pude
arranjar uma vaga de repórter no jornal de Samuel Wainer, valendo-me dos seus
conhecimentos. Passei a ser repórter-esportivo, fazendo a crônica dos jogos de
domingo, dentro e fora do Maracanã. Assim fiz carreira, mas nunca esqueci de
agradecer ao mano querido pela providencial apresentação. E retribuí como pude,
depois apresentando o doce Odilon ao João Pinheiro Neto, meu amigo da Manchete,
quando foi designado ministro do Trabalho pelo presidente João Goulart. Assim
ele chegou ao topo da carreira de advogado do Banco do Brasil, graças à nossa
interferência. Só se faz isso por quem verdadeiramente merece.
Jornal Dois Estados, 05/08/2021
Arnaldo Niskier - Sétimo ocupante da Cadeira nº 18 da ABL,
eleito em 22 de março de 1984, na sucessão de Peregrino Júnior e recebido em 17
de setembro de 1984 pela acadêmica Rachel de Queiroz. Recebeu os acadêmicos
Murilo Melo Filho, Carlos Heitor Cony e Paulo Coelho. Presidiu a Academia
Brasileira de Letras em 1998 e 1999.
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