(Castro Alves)
Uma noite, eu me lembro, ela dormia
Numa rede encostada molemente...
Quase aberto o roupão, solto o cabelo
E o pé descalço no tapete rente.
Estava aberta a janela. Um cheiro agreste
Exalavam as silvas da campina,
E ao longe, num pedaço do horizonte,
Via-se a noite plácida e divina.
De um jasmineiro os galhos encurvados,
Indiscretos entravam pela sala,
E, de leve oscilando ao tom das auras,
Iam na face trêmulos – beijá-la.
Era um quadro celeste!... A cada afago
Mesmo em sonhos a moça estremecia...
Quando ela serenava, a flor beijava-a,
Quando ela ia beijá-la, a flor fugia...
Dir-se-ia que naquele doce instante
Brincavam duas cândidas crianças...
A brisa, que agitava as folhas verdes,
Fazia-lhe ondear as negras tranças!
E o ramo ora chegava, ora afastava-se,
Mas quando a via despertada a meio,
Pra não zangá-la sacudia alegre
Uma chuva de pérolas no seio.
Eu, fitando esta cena, repetia
Naquela noite lânguida e sentida:
“Ó flor! – tu és a virgem das campinas!
Virgem! – tu és a flor da minha vida!...”
S. Paulo, novembro de 1868
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