22 de julho de 2020
No Brasil teremos eleições municipais em 15 de novembro; nos
casos de 2º turno, ainda em 29 de novembro, votações para prefeitos. Sem dúvida
importantes, fornecerão estimativa, instantâneo, de como se posiciona a opinião
pública e tornarão mais plausíveis os prognósticos para 2022.
Aqui as eleições brasileiras serão tocadas de raspão, não é
sobre elas que pretendo discorrer. Eleições presidenciais norte-americanas
serão o tema. Muita gente já comentou em blague, repito o gracejo, as eleições
presidenciais nos Estados Unidos influenciam tanto, que todo mundo deveria
votar delas.
A conhecida revista inglesa “The Economist”, em sua última
avaliação sobre o pleito de 3 de novembro, coloca Joe Biden com 54% dos votos
populares, Trump com 46%. Ainda segundo “The Economist”, de momento Biden tem
90% de chances de ser o próximo presidente dos Estados Unidos (98% de
probabilidade de vencer no voto popular).
Se os atuais prognósticos foram confirmados, e não é difícil
que o sejam — ainda que pesem sobre eles as justificadas reservas sobre a
objetividade das pesquisas —, Biden chegará ao poder à frente de gigantesca
coligação que incluirá, apenas como exemplos, simpatizantes do movimento
vandálico de derrubada de estátuas, setores extremados do “Black Lives Matter”,
defensores da pauta LGBT, ideologia do gênero, aborto. E ainda forças políticas
que simpatizam com partidos de esquerda na América Latina. Em outro âmbito,
presumivelmente ficarão mais fáceis as manobras de Xi Jinping e Vladimir Putin
para expandir a própria influência e minar a importância dos Estados Unidos no
mundo. Queira-se ou não, terão sido enormes golpes nos interesses do Ocidente,
eco pálido (a demolição interna é enorme) e, paradoxalmente poderoso (engloba
países de grande poder) do que foi a Cristandade. Enormes golpes, disse e
reafirmo. Presumivelmente desferidos de forma gradual, passamos por era
girondina. E possivelmente menos contundentes para a opinião pública pela
restauração parcial, quando menos publicitária, do papel internacional dos Estados
Unidos, com a recusa do “America first”.
Descendo a detalhes e analisando de perto o período
pré-eleição, Joe Biden tem contra si a falta de carisma, o ar distante e a
aparência um tanto avoada. Não galvaniza seguidores, eleitores potencialmente
seus poderão não se sentir animados a votar no 3 de novembro. Contudo, tais
circunstâncias devem ser vistas com olhar matizado. Biden sabe ganhar eleições.
Senador aos 30 anos, venceu a seguir seis disputas sucessivas para o Senado; e
por duas vezes, junto com Barack Obama, foi vitorioso em eleições
presidenciais. É nome nacional desde 1973.
Católico, não age na política de forma coerente com a fé,
tendo tido choques com o bispo diocesano, por causa de seu favorecimento do
aborto. Semanas atrás, declarou que agirá contra os estados da União que
promulgam leis restritivas ao aborto: “Os direitos à saúde das mulheres
estão sob ataque quando estados no país inteiro aprovam leis extremadas
restringindo o direito de escolha das mulheres sob quaisquer circunstâncias”. Continuou:
“Como presidente vou colocar na legislação o determinado pela decisão Roe vs.
Wade da Suprema Corte e o Departamento de Justiça fará tudo que estiver a seu
alcance para impedir a avalanche de leis estaduais que tão claramente violam o
direito de escolha das mulheres”. Suas posições pró-aborto e favoráveis ao
“same sex marriage” podem lhe tirar votos; é forte o eleitorado conservador nos
Estados Unidos.
Joe Biden tem histórico familiar amplo e controverso. Alguns
fatos o favorecem eleitoralmente; outros podem prejudicá-lo, em proporção ainda
não conhecida. Casou-se em 1966 com Neilia Hunter. Tiveram três filhos, dois
meninos e uma menina. A mulher e a filha, em 1972, morreram em desastre de
automóvel. Biden casou-se uma segunda vez, em 1977, com Jilly Tracy, com quem
teve uma filha. O filho mais velho de Biden, Beau, faleceu de câncer aos 46
anos. O outro filho, Hunter, — observa o sociólogo Manuel Castells, favorável a
Biden, em “La Vanguardia” de Barcelona — “uma bala perdida, expulso da
Marinha por vícios em drogas e envolvimento em negócios com empresas chinesas e
depois ucranianas, que lhe pagavam salários astronômicos por ter um Biden em
seus conselhos. Isso explica o escândalo da negociação de Trump com o
presidente da Ucrânia para que lhe facilitasse informação sobre Biden júnior em
troca de ajuda, um assunto que levou à tentativa de impeachment contra Trump”.
De momento, as estrepolias do filho parecem não prejudicar significativamente a
candidatura do pai. Os Estados Unidos têm outras preocupações, em especial a
crise econômica e a pandemia.
Uma palavra sobre Donald Trump. Mesmo sem mudanças
ideológicas e de aspirações no eleitorado, a crise econômica e a decepção com o
comportamento presidencial podem lhe tirar votos decisivos. E, então, reitero,
pode começar uma época particularmente difícil: liberdades ameaçadas, crescente
desagregação social, ameaças de totalitarismo caminhando a nosso encontro.
Percebo, não despertei esperanças róseas, e fico sujeito à
censura de atrair, quiçá prematuramente, o olhar do leitor para perspectivas
sombrias. Errei? Não me parece. Em primeiro lugar, não é tão prematuro assim. E
a seguir, tudo o indica, teremos avalanche de fatos que, já agora, precisam ser
entendidos, combatidos e detidos quanto possível. A mais, pode-se alegar em
favor de tal atitude exemplo histórico de um grande vitorioso. Sem ele, a
história da liberdade e das democracias ocidentais teria sido outra. Quando
ascendeu ao cargo de primeiro-ministro, no discurso inaugural de 13 de maio de
1940, julgou Winston Churchill necessário para enrijecer a fibra britânica e
preparar o país para uma luta vitoriosa expor de forma escancarada a realidade
sombria: “Só tenho a oferecer sangue, sacrifícios, lágrimas e suor. Temos
diante de nós provação muito dolorosa. Diante de nós estão muitos e muitos
meses de luta e sofrimento. Qual é nosso objetivo? Fazer a guerra por terra,
mar e ar. Guerra com todo o nosso poder, com toda a força que Deus nos deu.
Guerra contra uma tirania monstruosa nunca suplantada no escuro e lamentável
catálogo dos crimes dos homens. Esta é nossa política. Qual é nosso objetivo?
Respondo com uma palavra: a vitória. Vitória. Não importam os custos, apesar de
todos os sofrimentos. Vitória, ainda que o caminho seja longo e duro. Sem vitória,
não há sobrevivência”.
“Proportione servata”, se as considerações acima valem para
a situação geral, valem também para os dias difíceis que podem estar diante de
nós no Brasil, em consequência das eleições de 2020 e 2022.
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