Empréstimo bancário
Meteram em
minha cabeça que eu devia tomar dinheiro emprestado em banco.
- Ora,
rapaz, todo mundo faz isso. É como dizem, a gente pode se apertar um dia, e,
aí, ter crédito é bom. – Disse Flávio, antigo colega da escola primária, filho
de fazendeiro.
Vesti um
paletó e saí decidido falar com o gerente. O conheci ainda menino jogando bola
na praia, mas ele havia mudado muito. Nem falava comigo. Tornou-se conceituado
na praça depois que assumiu a gerência do banco. Para isso, bastou o prestígio
de pessoas importantes amigas do pai dele. O rapaz saiu em comitiva pelo
comércio e subscreveu milhares de ações para a nova gerência que seria
instalada na cidade. Tudo em dinheiro vivo.
Quando cheguei
ao banco, um rapazinho fardado mostrou-me o gabinete do gerente. Ficava numa
sala meio-apertada, com ar condicionado, uma cadeira giratória, duas poltronas
e uma carteira envernizada com o lastro coberto com um vidro grosso. O gerente
estava sentado, inclinado para a mesa, escrevendo. Tinha a cara empapuçada e o
cabelo partido de lado. Eu lhe disse que desejava um empréstimo. Aí ele tocou
uma sineta. Apareceu um sujeito engravatado, de óculos brancos.
Faça o
cadastro dele, - autorizou o gerente. Acompanhei o moço até um compartimento ao
lado, simples e sem ar condicionado.
- É agricultor? – Indagou-me ele.
- Não. –
Respondi-lhe.
-
Comerciante?
- Não.
- Bem,
veja seus documentos. Identidade, CPF e título de eleitor. Depois de outras
indagações e anotadas minhas respostas numa ficha cheia de quadradinhos, ele
mandou que eu assinasse embaixo.
- Tudo Ok.
– Concluiu o rapaz de óculos brancos. Voltei ao gerente e fiquei aguardando.
- Mais
alguma coisa? – Perguntou-me ele.
- O
empréstimo que falei. – respondi-lhe com voz meio abafada.
- Só
estaremos operando depois do fim do mês. – Disse-me, de cabeça baixa,
rascunhando uma agenda sobre a carteira de vidro grosso.
- Tá bem. –
respondi-lhe meio-desconcertado. Antes que eu me levantasse para ir embora, o
antigo colega do primário entrou pelo gabinete:
- Já
atendeu meu amigo? É gente muito boa. Sou avalista dele. Aí o gerente abriu um
sorriso afável, puxou uma gaveta e tirou dela uma nota-promissória:
- Quanto o
amigo está precisando? – perguntou-me, colocando uma mão no meu ombro.
- Cinquenta.
Arrisquei.
- Só? –
Acrescentou ele com um sorriso aberto para Flávio que avalizou o documento.
Como o expediente estava se encerrando, fiquei de pegar a grana no dia
seguinte.
Se eu
tivesse contado tudo isso a Nalva, minha mulher, ela teria rasgado a
promissória em minha cara.
(LINHAS INTERCALADAS – 2ª Edição 2004)
Ariston Caldas
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Ariston Caldas nasceu em Inhambupe, norte da Bahia, em 15 de dezembro de 1923. Ainda menino, veio para o Sul do estado, primeiro Uruçuca, depois Itabuna. Em 1970 se mudou para Salvador onde residiu por 12 anos. Jornalista de profissão, Ariston trabalhou nos jornais A Tarde, Tribuna da Bahia e Jornal da Bahia e fundou o periódico Terra Nossa, da Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado da Bahia; em Itabuna foi redator da Folha do Cacau, Tribuna do Cacau, Diário de Itabuna, dentre outros. Foi também diretor da Rádio Jornal.
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