Solenidade da Assunção de Maria – Domingo 19/08/2018
Anúncio do Evangelho (Lc 1,39-56)
— O Senhor esteja convosco.
— Ele está no meio de nós.
— PROCLAMAÇÃO do Evangelho de Jesus Cristo + segundo
Lucas.
— Glória a vós, Senhor.
Naqueles dias, Maria partiu para a região montanhosa,
dirigindo-se, apressadamente, a uma cidade da Judeia. Entrou na casa de
Zacarias e cumprimentou Isabel. Quando Isabel ouviu a saudação de Maria, a
criança pulou no seu ventre e Isabel ficou cheia do Espírito Santo. Com um
grande grito, exclamou: “Bendita és tu entre as mulheres e bendito é o fruto do
teu ventre! Como posso merecer que a mãe do meu Senhor me venha
visitar? Logo que a tua saudação chegou aos meus ouvidos, a criança pulou
de alegria no meu ventre. Bem-aventurada aquela que acreditou, porque será
cumprido o que o Senhor lhe prometeu”.
Então Maria disse: “A minha alma engrandece o Senhor, e
o meu espírito se alegra em Deus, meu Salvador, porque olhou para a
humildade de sua serva. Doravante todas as gerações me chamarão
bem-aventurada, porque o Todo-poderoso fez grandes coisas em meu favor. O
seu nome é santo, e sua misericórdia se estende, de geração em geração, a
todos os que o respeitam. Ele mostrou a força de seu braço: dispersou os
soberbos de coração. Derrubou do trono os poderosos e elevou os
humildes. Encheu de bens os famintos, e despediu os ricos de mãos
vazias. Socorreu Israel, seu servo, lembrando-se de sua
misericórdia, conforme prometera aos nossos pais, em favor de Abraão e de
sua descendência, para sempre”. Maria ficou três meses com Isabel; depois
voltou para casa.
— Palavra da Salvação.
— Glória a vós, Senhor.
...
Ligue o vídeo abaixo e acompanhe a encenação da Visitação de
Maria a Isabel:
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Na festa da Assunção, a liturgia nos propõe aprofundar o
sentido do encontro a partir da contemplação deste horizonte inspirador: a
Visitação. Os ícones que ao longo dos séculos expressam esta visita, esta
saudação, nos apresentam duas mulheres vinculadas, unidas por um abraço, por um
beijo, por uma mesma alegria. Em seu modo de entrar em comunhão, em sua maneira
de dialogar e de se alegrar, elas se revelam mestras para nós, para nossa
humanidade fragmentada que aspira viver a “cultura do encontro”.
A cena apresentada por Lucas nos deixa na agradável e
desafiante companhia de Maria e Isabel: duas mulheres, dois ventres cheios de
vida; duas mulheres cheias de Deus; duas mulheres em um mesmo encontro. Ambas
estão grávidas e de um modo surpreendente. As duas esperam filhos muito
especiais; sentem que carregam em seus ventres uma novidade que as supera. As
duas tem “um corpo abençoado” e um ventre fecundo, sinal e realidade da ação de
um Deus que é Vida.
Duas mulheres com duas missões diferentes: uma, portadora do
Messias, e outra, portadora daquele que preparará os caminhos. Duas mulheres
diferentes, mas cada uma com sua experiência de Deus. Uma, a experiência de
Deus em um seio virginal; a outra, a experiência de Deus em um seio seco e
estéril. No encontro entre as duas, cada uma descobre e reconhece o mistério da
presença de Deus na outra.
O ícone da Visitação contagia e desperta o prazer e a
alegria: a do encontrar-se, a do crer e a do servir. Alegria fecunda, já que
está ligada a dois nascimentos que vão mudar a história de seu povo e da
humanidade. Nesta cena, Deus mesmo se infiltra no cotidiano e naquilo que
socialmente não tem maior relevância, ou seja, a vida diária de duas mulheres:
Maria e Isabel. Quebra-se assim a centralidade do Templo. Elas festejam as
maravilhas do Senhor em um lugar simples, numa região montanhosa, num caminho e
numa casa de família simples. O maravilhoso e extraordinário tem lugar no
ordinário e humilde. Ali se celebra a vida chegada e por chegar. As
protagonistas da cerimônia são duas simples mulheres.
Neste maravilhoso acontecimento tudo é encontro, junta-se o
Antigo e o Novo Testamento, a juventude e a idade madura. As duas mulheres
estão profunda e intimamente vinculadas entre si. Com elas e delas nasce o
tempo novo, o do Reino, o de Jesus. Tem-se a impressão de viver um momento
culminante da história. Elas nos conduzem a agradecer a capacidade feminina de
deixar transparecer o Mistério que nos habita, de despertar-nos uns aos outros
para essa Vida cuja presença reconhecemos em nosso interior.
Maria, aquela que sente o êxodo de Deus, saindo de si mesmo,
para encarnar-se no seu seio virginal, e que a move a pôr-se em caminho, saindo
de si mesma, porque o serviço aos outros a apressa.
Maria é a Mulher que inaugura e estabelece os critérios para
encontrar-se com o Senhor e com os(as) demais. Sua capacidade de encontro parte
de uma experiência de profunda interioridade; interioridade visitada por Deus
e, portanto, fecundada por seu olhar cheio de amor e ternura, cheio de
compaixão pela humanidade e pela criação. Só a partir de uma interioridade
fecunda se dá a possibilidade dos encontros mais verdadeiros.
Na Laudato si (n. 240) o Papa Francisco nos diz que “a
pessoa humana mais cresce, mais amadurece e mais se santifica à medida que
entra em relação, quando sai de si mesma para viver em comunhão com Deus, com
os outros e com todas as criaturas. Assim, assume em sua própria existência
esse dinamismo trinitário que Deus imprimiu nela desde a criação. Tudo está
conectado, e isso nos convida a amadurecer uma espiritualidade da solidariedade
global que brota do mistério da Trindade”.
O dogma da Assunção, festa do encontro pleno, nos revela que
precisamos nos converter à cultura do encontro em todos os sentidos. Maria foi
“assumida” para o encontro definitivo com Deus porque foi presença que
inspirava e proporcionava encontros humanizadores. Ela “subiu” porque “desceu”
ao encontro dos preferidos do Pai.
Maria, na cena da Visitação, passa da interioridade ao
acontecer, à história, ao encontro. É assim como se dá uma autêntica
experiência de Deus. Ela nos mostra que tal experiência tem dois pés: um posto
na experiência do amor de Deus que nos visita, e outro posto sempre no caminho
que precisamos percorrer para ir ao encontro dos demais. Os dois pés são indispensáveis
para que a experiência de Deus seja cristã, seja encarnada, seja Visitação. Os
dois pés, sempre em movimento cordial: de sístole e diástole.
Deus começa sempre pelo coração; mas logo desce aos pés. Em
outras palavras: Deus põe pés no coração. Maria recebeu do anjo a notícia que
sua prima Isabel estava esperando um filho e já estava no sexto mês de
gestação. Não foi necessário que Isabel pedisse a Maria e solicitasse seus
serviços. O amor descobre as necessidades dos outros; o amor não necessita que ninguém
lhe peça favores, nem que alguém lhe solicite serviços. Maria não esperou o
chamado de Isabel. Porque o amor não espera, antecipa. O amor sempre tem
pressa, não sabe esperar. O amor não fica em sentimentos; o amor se faz gesto,
atitude, caminho e serviço. “O amor consiste mais em obras que em
palavras” (S. Inácio).
O amor põe o coração em caminho; o coração põe pressas aos
pés. Amor, coração e pés se fazem serviço aos demais. Quando amamos, nossos pés
se põem em caminho: levar alegria aos outros. Por isso, nesta visita e neste
encontro, todas saltam de alegria: João salta de alegria no ventre de Isabel.
Isabel salta de alegria e extravasa seu júbilo. Maria salta de alegria e entoa
seu hino de reconhecimento e agradecimento. Isabel encheu-se de surpresa ao ver
a surpreendente Maria diante de si. E não pode segurar sua alegria; por isso,
também explodiu em um grito de louvor e reconhecimento.
Nosso mundo está carente de Visitação, de uma vida cristã
com iniciativa e experiência de encontros, que deixe suas seguranças, que saia,
atenta às necessidades dos demais, que cuide da vida que há nela e onde queira
que esteja germinando ou tenha possibilidades de acontecer; assim entendemos a
vida cristã vinculada com a terra e o cuidado da casa comum.
Encontrar-nos é construir pontes e derrubar muros, é
desafiar a cultura do desencontro, da fragmentação e do descarte. Os encontros
mudam nossa vida e vamos descobrindo nossa identidade através deles. Eles nos
colocam em atitude de êxodo, de saída, de Visitação. O encontro, quando se dá a
partir da experiência de Deus, que é contemplação e saída, se torna autêntica e
solidária profecia.
Texto bíblico: Lc 1,39-56
Na oração: é indispensável situar-se na cena da Visitação;
escutar as duas mulheres que conversam entre si; seguir seus passos, proceder
como elas, viver hoje o que elas viveram.
A Visitação é, portanto, um convite a “cruzar montanhas”,
transpassando fronteiras, abrindo buracos nos ilusórios muros de classe, de
cultura, de raça, de gênero, de religião, etc... Cruzar montanhas, saindo
apressadamente ao encontro do outro, para fazer a experiência de viver, em
ritmo de Visitação, o regozijo da vida divina que habita no humano e se expande
na criação inteira.
- Como encarnar o ícone da Visitação no seu ritmo cotidiano?
Há lugar para encontros surpreendentes?
Pe. Adroaldo Palaoro sj
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