Fernando Henrique acha que a descrença nos políticos poderá
levar a uma queda de participação nas urnas (Crédito: Fabio Braga)
20/04/18
A seis meses das eleições, o ex-presidente Fernando Henrique
Cardoso (PSDB) minimiza o fato de o pré-candidato de seu partido ao Palácio do
Planalto, o ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin, aparecer estagnado nas
mais recentes pesquisas de intenção de voto, na faixa dos 8%. “Geraldo é um
corredor de maratona, não de 100 metros”, disse FHC nesta quarta-feira, 18, ao
jornal O Estado de S. Paulo, em seu escritório na capital paulista.
O tucano, de 86 anos, cita como exemplo sua própria campanha
em 1994, quando só decolou em junho na esteira do Plano Real. Sobre uma
eventual candidatura do ex-presidente do Supremo Tribunal Federal Joaquim
Barbosa, Fernando Henrique afirma: “Foi um juiz competente, teve coragem, mas
isso qualifica você para presidente? Por isso só, não”. “Não sei o que ele
pensa.”
Questionado se o fato de o senador Aécio Neves (PSDB) ter se
tornado réu pode contaminar a campanha tucana, Fernando Henrique cita o
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva: “Qual foi o impacto na inclinação pelo
Lula? Até agora nenhum”. Ao comentar a prisão do petista, condenado na Lava
Jato, ele rebate a tese do partido adversário, dizendo que não se trata de um
preso político. “É um político preso.”
Fernando Henrique lança nesta sexta-feira, 20, o livro
“Crise e reinvenção da política no Brasil”, pela Companhia das Letras. Leia
abaixo os principais trechos da entrevista:
No seu livro, o sr. fala que um líder deve ser capaz de
explicar, passar uma mensagem. Que mensagem é essa e quem seria capaz de
transmiti-la hoje?
Sempre fomos um País que achávamos que daria certo, grande
pela própria natureza. Somos, mas não basta. Temos que ser grandes pela
criatividade, tecnologia, capacidade. Tem que ter um rumo, essa é a mensagem.
Para melhorar a vida das pessoas, com segurança, garantida a liberdade,
crescendo a economia, emprego e bem-estar. Para isso, é preciso um governo que
funcione. É simples, mas é preciso que quem emita a mensagem, tenha chama, toque
no outro. O povo, por enquanto, não está nem aí. Política é assim, estamos
aquecendo os motores.
O livro fala ainda em uma “nova onda de direita”. Quem
representa esse movimento?
No Brasil, temos gente que não é nem de direita nem de
esquerda, é atrasada. O nome mais falado agora é o de (Jair) Bolsonaro. Não sei
o que ele representa. Um sentimento de ‘quero ordem, mata bandido?’ É um
sentimento que não tem expressão política. O que significa na economia, na vida
social? É só uma explosão.
Sobre o Judiciário, o sr. diz que teria se tornado mais
consciente da sua autoridade e mais “permeável” à sociedade. O STF tem sido
alvo de críticas por isso.
Fomos nós da Assembleia Constituinte que demos esse poder ao
Supremo. Você pode requerer ao tribunal que, no vácuo da lei, ele legisle. Ele
tem abusado? Não creio. Nas áreas comportamentais, como o Congresso fica
receoso de avançar, às vezes o Supremo avança.
E nos casos da Lava Jato?
A Lava Jato fez simplesmente o que todo mundo queria que se
fizesse, pegou poderosos e ricos. O Supremo às vezes dá um habeas corpus e a
população reclama, mas é que a lei permite liberar. Não acho que a Lava Jato
tenha, no geral, extrapolado. E muito menos que ela seja facciosa, pegue um só
partido. Estamos vendo agora, pegou os partidos que estavam no poder. Os que
não estavam é natural que tenham menos foco na Lava Jato, porque não estavam
metidos na cumbuca. Não é que a Justiça favorece os tucanos, favorece porque
não estão no poder. Lava Jato foi um fato político muito importante, mas não
dota aquele que foi o protagonista de qualidades para ser líder político. Mas
há uma tentativa também de atacar o (juiz Sérgio) Moro. Acho que ele é apenas
um juiz correto, tenta aplicar as leis tal qual ele entende.
O STF tornou réu Aécio Neves e, na próxima semana, Eduardo
Azeredo, outro ex-presidente do PSDB, pode ser preso. Qual o reflexo disso na
imagem do partido do qual é presidente de honra?
Eu não posso ficar contente quando vejo personalidades
importantes sendo julgadas e presas. O Lula, você acha que eu fico satisfeito?
Não, mas não vou contra a Justiça. No caso do Aécio, foi apenas iniciado o
processo. Ele disse que vai demonstrar que não havia dinheiro público
envolvido. Eu não sei. Agora, eu não posso ser contra o que a Justiça decidiu. Nem
num caso, nem no outro. Tem efeito claro, prejudica os partidos. Mas juiz não
tem de ver se tem efeito político, tem de ver os autos. Tem indício de crime,
abre o processo. Tem crime, condena. Foi o que eles fizeram.
Isso pode ter algum impacto na candidatura do ex-governador
Geraldo Alckmin?
Digo isso até com constrangimento, mas qual foi o impacto na
inclinação pelo Lula (nas pesquisas)?
Até agora nenhum. Eu acho que devia ter,
mas não sei se vai. É provável que as lideranças (tucanas) discutam esse assunto.
Como ele (Aécio) tem direitos políticos, ele que vai decidir (se será
candidato), mas acho que a liderança vai ponderar e dizer: ‘Presta atenção,
olha as consequências’.
Joaquim Barbosa se filiou ao PSB. O sr. acha que ele pode
ser esse novo na eleição?
Não sei o que ele pensa. O que ele pensa sobre economia?
Sobre a sociedade? Pode ser que sim, mas eu não sei. Um perfil parecido com o
dele, no imaginário, é o de Moro. Eu não sei se o Moro seria um bom presidente.
O Joaquim Barbosa foi um juiz competente, teve coragem, mas isso qualifica você
para ser presidente? Por isso só, não.
Alckmin, entre os nomes colocados, parece ser o candidato de
centro que mais tem viabilidade eleitoral, mas não decolou. Como isso vai se
resolver?
Quando eu fui ministro, deixei o Ministério da Fazenda para
ser candidato à Presidência da República em abril, acho. Quando chegou em maio,
eu falei à Ruth (Cardoso, ex-primeira-dama, que morreu em 2008), ‘não dá mais,
vou desistir’, porque eu tinha apenas 11%, o Lula tinha 40%. Quem me apoiava?
Ninguém. Que recurso eu tinha? Nenhum. Em junho, comecei a ganhar. Em agosto,
estava na frente. Em outubro, ganhei no primeiro turno. O Geraldo é um corredor
de maratona, não é de 100 metros rasos. Às vezes, você vai correr maratona e sai
com velocidade de 100 metros e queima na largada. Vamos ver como vai ser, o que
vai acontecer nesse jogo, que está apenas começando. Há elementos para (se
viabilizar como o candidato), mas precisa ver se vai conseguir.
O que representa a prisão de Lula para o processo eleitoral?
Lula tem um peso simbólico, foi líder sindical, criou um
partido. Ele não está sendo processado pelo que fez politicamente. O PT está
dizendo: é um preso político. Não é. É um político preso. A narrativa do PT é
de preso político. Se fosse, eu estaria protestando. É preso por outras razões.
Você pode dizer: decisão não foi correta. Apela. A condição (de preso) vai
pesar contra (no processo eleitoral), com o passar do tempo. Aí na campanha os
partidos vão transformar um fato numa versão. Na política, não adianta eu ter
razão, adianta ter capacidade de convencer, explicar. Melhor que não tivesse
acontecido, mas aconteceu, e agora vamos ter que explicar à população. A força
simbólica de Lula não é sobre o que ele faz e diz, mas sobre o que ele fez. E
foi capaz de, ao fazer, cantar, cacarejar. Um dos defeitos do PSDB e meu é
cacarejar pouco sobre o que se fez, quando se fazia. O Lula tem a virtude de
que ele cacareja: eu fiz, eu fiz, agora sou ideia. A ideia pode ser boa ou pode
ser má, não sei (risos). Mas foi uma boa sacada.
O que uma eventual 3ª denúncia contra Temer representaria
para o País, às vésperas da eleição?
Acho que seria insensato, porque vai ter uma luta de novo. É
difícil que o Congresso a dois meses da eleição vá tomar uma posição contra o
presidente. Acho que deveria ter um pouco de pensamento institucional.
Do Ministério Público?
Inclusive. Tem de ter uma certa visão institucional do País.
Se houve coisa errada, ele vai deixar de ser presidente, vai ser julgado. Por
que balançar mais ainda a situação que já é em si frágil? Tem coisas tão
importantes para fazer, retomar o crescimento, dar emprego, botar segurança na
rua. Se fosse uma coisa afrontosa… Mas se for começar ver pelo em ovo para
poder arranjar argumento para fazer um impeachment, processar presidente… Se
fosse no começo do governo, eu entendo. Mas no fim, com eleição à vista? Tem de
ter um pouco de moderação.
E o que o sr. acha das manifestações de militares da ativa e
da declaração do general Villa Bôas na véspera do julgamento do habeas corpus
de Lula?
Melhor que os militares não falem. Alguns ameaçaram, o chefe
do Exército não fez isso. Basicamente, foi uma mensagem interna corporis. Ele
falou antes que outros falassem coisas mais desabusadas. Não considero que a
declaração do ministro tenha sido uma ameaça. Ele disse o que todo mundo diz: a
impunidade não pode prevalecer, a Constituição diz isso. Ele não disse ‘condene
fulano e beltrano’. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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