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quinta-feira, 26 de outubro de 2017

TABOCAS, ITABUNA E REGIÃO – Clóvis Góis

Tabocas, Itabuna e Região


            O final do século XIX e início do XX foi o período da chegada daqueles que mais tarde seriam responsáveis tanto para receber a boa semente como para distribuí-la. 

            A divisão territorial e administrativa da região era enormemente  diferente da atual. Em todo o Centro Sul baiano, existiam somente cinco municípios: São Jorge dos Ilhéus (Ilhéus), Barra do Rio de Contas (Itacaré), São Pedro de Belmonte (Belmonte), Una e Imperial Vila de Canavieiras (Canavieiras).   

            A Vila de Tabocas estava em efervescência! Era o distrito mais movimentado e numeroso de Ilhéus, localizado estrategicamente entre o interior do país (passagem para Vitória da Conquista) e o porto de Banco do Vitória. Local de plantação, compra e venda do fruto de ouro. As mudanças eram rápidas, população aceleradamente crescente, gente de toda parte chegando atrás do eldorado, grande circulação de dinheiro (em 1890 o Município de Ilhéus já exportava 3.500 toneladas de cacau), política inflamada (efeito direto da competição partidária promovida pelas famílias ilheenses Pessoa e Adami de Sá), vozes clamando por emancipação, e violência, muita violência! 

            A ebulição humana daqueles dias proporcionava o surgimento de desocupados, vadios, arruaceiros e meliantes. Mesmo cidadãos de bem e trabalhadores, impulsionados pela fácil circulação do dinheiro, cometiam excessos e desordens, ações casadas com a ingestão de bebida alcoólica, jogo, prostituição e paixões políticas. 

            Em Ilhéus, o maior líder político local, coronel Domingos Adami de Sá, foi brutalmente agredido na Vila de Pontal. Aquele que seria o futuro intendente de Itabuna, Olinto Leone, foi submetido a júri popular acusado de ser o mandante do assassinato do advogado Virgílio Sá. No distrito do Almada, atuava uma perigosa quadrilha de salteadores, que, além de subtrair os pertences, também agredia suas vítimas. No mesmo local, durante um espetáculo circense, até uma criança foi ferida à bala. Num outro momento, mesmo um oficial de polícia sofreu um atentado quando se dirigia de Ilhéus para Tabocas. 

            Outro fato que mexeu muito com a população de Ilhéus foi o assassinato, por questões de demarcação de terra, do engenheiro Agenor Portela Passos. Acerca das ocorrências que se passavam em 1904, João da Silva Campos afirma que toda a região vivia “endêmicos surtos de desordem...”, pois, “crescido número de criminosos pronunciados pela justiça local... perambulavam... sem qualquer constrangimento ou receio”. O mesmo memorialista afirma, sem detalhar o fato,  que, no início do século XX, em Tabocas, “haviam ocorrido alguns excessos capazes de produzirem funda alteração da ordem, se o governo não adotasse prontas e imediatas providências”. Nesse caso, um delegado foi deslocado e conseguira “abafar as manifestações de anarquia”. Dias depois de acalmados os ânimos, “repetiam-se as desordens em Tabocas. Depois, até  agosto, a agitação dos espíritos manteve-se em potencial, dinamizando-se daí em diante, até dezembro...”, ou seja, a confusão pública continuava de mal a pior! 

            Entre os anos de 1905 e 1906, o ar continuava carregado. O medo foi instalado quando notícias chegaram de que um grupo de foras da lei sitiara o arraial para tirar a vida de um político local. No ano seguinte, muitos indivíduos de procedência duvidosa – “cavaleiros estranhos” – tiveram que ser enxotados da localidade por meio do chefe da polícia. Todos esses acontecimentos  deixavam a população em polvorosa. 

            Um bando de mercenários, os Cauaçus, provenientes da região de Jequié, implantou o terror em Itabuna, no período de 1916 a 1918. Aqui chegaram, contratados por José Kruschewsky para dar-lhe proteção política. Terminado o serviço, os Cauaçus resolveram ficar, estabelecendo seu quartel general na Rua Rui Barbosa (antiga Rua do Quartel Velho), de onde saíam para executar seus trabalhos, sempre a mando de pessoas influentes da cidade. Praticavam toda sorte de barbaridades: faziam cobranças de dívidas, com requintes de perversidade; invadiam propriedades rurais; extorquiam comerciantes oferecendo uma possível proteção; espancavam cidadãos a título de vingança; e, ainda, agiam como grupo de extermínio. Conseguiram espalhar o medo em toda a região! 

            Os tempos e a região clamavam por um evangelho da paz e da presença ordeira do Espírito Santo, por intermédio de homens dedicados ao Senhor! Seria a Plenitude dos Tempos para o aparecimento do Adventismo! 

            As agitações políticas em Tabocas, às vezes superavam sua vizinha materna. Muita coisa nova acontecia por aqui, e lá, não! As  comemorações dos 400 anos do descobrimento do Brasil e a eleição do presidente da Bahia, Severino Vieira, em 1900, foram ativas e efusivas por aqui. Esses eventos foram emudecidos em Ilhéus. 

            Num primeiro momento, o povoamento de Tabocas se resumia a alguns ajuntamentos humanos localizados onde são hoje os bairros de Fátima (Caldeirão Sem Tampa), Bananeira (Burundanga), Conceição (Marimbeta) e proximidades da Praça Olinto Leone (defronte ao Rio Cachoeira e na Rua da Areia). Com o crescimento vertiginoso da população, em pouco tempo as roças (1857) se transformaram em arruados (1877), estes em arraial (1897) que, por fim, foi elevado à categoria de  vila (1906), chegando ao status de cidade em 28 de julho de 1910. O desenvolvimento foi tamanho que chamou à atenção do redator do Jornal de Notícias, o jornalista Alfredo Requião, que elogiou Tabocas como um local pródigo em um “arraial muito populoso que, ainda em 1893, reduziu-se a oito ou nove casebres de palha e, agora (1902), apresenta-se como animadíssimo e rico empório comercial”. 

            A população Grapiúna sempre fora bastante miscigenada, tendo sido formada por negros, índios, estrangeiros, sertanejos (norte da Bahia) e sergipanos. Os negros, remanescentes dos africanos, eram  constituídos de ex-escravos provenientes da lavoura canavieira. As etnias Camacan, Pataxó e Aymoré representavam os indígenas. Do Oriente Médio vieram os sírios, libaneses, judeus e árabes.  

            A combinação dessas gentes produziu uma população de rápido crescimento, com saltos demográficos em espaço diminuto de tempo. Em 1887, enquanto arruado, constava de 2.000 pessoas. Em 1890, a localidade era habitada por 3.024 moradores. Já em 1906, momento da elevação para status de vila, já possuía 15.000 habitantes. Dobrou seu contingente humano para 30.000 pessoas em 1916 e, dois anos após o grande batismo de Boqueirão (1918), já tinha alcançado uma população de 41.980 indivíduos (1920). Enquanto o crescimento populacional no restante do Estado era de aproximadamente 2%, aqui era por volta de 6% ao ano. Foi um terreno fértil para os representantes dos Três Anjos de Apocalipse 14, que deveriam anunciar a Mensagem a todas as nações, tribos, línguas e povos. Poucos lugares no Brasil proporcionariam tal vantagem! 

            Tabocas, e depois Itabuna, aglutinava num espaço relativamente pequeno, representantes humanos diversos, com histórias, culturas, anseios e falas distintas! Estudos revelam que a formação da cidade foi composta, comprovadamente, por grandes levas de migrantes de dez cidades sergipanas (Chapada dos Índios, Vila Cristina, Itabaianinha, Capela, Estância, Buquim, Simão Dias, Itaporanga D’Ajuda, Tobias Barreto, Cristinápolis e Itabaiana) e 17 cidades baianas (Vila Nova da Raínha, Feira de Santana, Tucano, Aporã, Conde, Itiúba, Rio Real, Abadia, Itapicuru, Cícero Dantas, Inhambupe, Paripiranga, Jandaíra, Cipó, Entre Rios, Esplanada e Ribeira do Pombal). Alguma semelhança com Atos 2: 9 a 11? Tal como Deus utilizou o diverso ajuntamento de Jerusalém no Pentecostes para impulsionar a Igreja cristã nascente, fez uso das diferentes famílias e etnias neste solo para produzir a Igreja Adventista, que, hoje, é composta de uma sede de Associação, sete distritos pastorais, um colégio com 425 alunos e 53 igrejas e grupos, onde adoram 7.049 membros!

(A GÊNESE DO ADVENTISMO GRAPIÚNA, Cap.1)
Clóvis Silveira Góis Júnior

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Clóvis Silveira Góis Júnior é trineto de Genoveva França Jacó (integrante do primeiro batismo adventista realizado em Boqueirão, no ano de 1918).
Servidor público federal há 30 anos, é graduado em Administração e licenciado em história. É casado com Iara Souza setenta Góis, pedagoga, e tem dois filhos: Felipe e João.

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