23 Outubro 2017
"Neste momento difícil da sua história, em que tantas
pessoas parecem ter perdido a esperança num futuro melhor diante dos enormes
problemas sociais e da escandalosa corrupção, o Brasil precisa que os
seus padres sejam um sinal de esperança. Os brasileiros precisam ver um clero
unido, fraterno e solidário, em que os padres enfrentam juntos os obstáculos,
sem deixar-se levar pela tentação do protagonismo ou do carreirismo. Tenho a
certeza de que o Brasil vai superar a sua crise, e confio que vocês serão
protagonistas desta superação", afirmou o Papa Francisco, na manhã de
hoje, 21 de outubro, no Vaticano, ao receber em audiência a Comunidade do Pontifício
Colégio Pio Brasileiro de Roma, por ocasião dos 300 anos do encontro da imagem
de Nossa Senhora Aparecida.
O Papa chamou a atenção para a 'doença' do 'academicismo' e
a tentação de fazer dos estudos um mero meio de engrandecimento pessoal e
alertou para que os padres não se deixem "levar pela tentação do
protagonismo ou do carreirismo". "Por favor, pediu Francisco,
não se esqueçam que antes de serem mestres e doutores, vocês são e devem
permanecer padres, pastores do povo de Deus!"
Eis o texto.
Queridos irmãos e irmãs,
Recebo-lhes hoje, por ocasião dos trezentos anos do achado
da veneranda Imagem de Nossa Senhora Aparecida. Agradeço o Cardeal Sérgio
da Rocha, Presidente da CNBB, pelas palavras amáveis que me dirigiu, em nome de
toda a Comunidade presbiteral do Pontifício Colégio Pio Brasileiro, juntamente
com as religiosas e funcionários que colaboram para fazer dessa casa “um
pedacinho do Brasil em Roma”.
Como é importante sentir-se num ambiente acolhedor, quando
estamos longe e com saudades da nossa terra! Isso ajuda a superar as
dificuldades para adaptar-se a uma realidade onde a atividade pastoral não é
mais o centro do dia-a-dia. Vocês já não são mais párocos ou vigários, mas
padres estudantes. E, essa nova condição pode trazer o perigo de gerar um
desequilíbrio entre os quatro pilares que sustentam a vida de um presbítero:
a dimensão espiritual, a dimensão acadêmica, a dimensão humanae
a dimensão pastoral. Evidentemente, neste período concreto da vida de
vocês, a dimensão acadêmica vem acentuada. Contudo, isso não pode significar um
descuido das outras dimensões.
É preciso cuidar da vida espiritual: a Missa diária, a
oração quotidiana, a lectio divina, a oração pessoal com o Senhor, a
recitação do terço. Também a dimensão pastoral deve ser cuidada: na medida
do possível, é saudável e recomendável desenvolver algum tipo de atividade
apostólica.
E, pensando na dimensão humana, é preciso, acima de
tudo, evitar que, diante de um certo vazio ligado à solidão, por não ter mais a
consolação do povo de Deus, como quando estavam nas suas dioceses, acabe-se
perdendo a perspectiva eclesial e missionária dos estudos. Isso abre a porta
para algumas “doenças” que podem afetar o padre estudante, como por exemplo o “academicismo”
e a tentação de fazer dos estudos um mero meio de engrandecimento pessoal. Em
ambos os casos acaba-se por sufocar a fé que temos a missão de guardar, como
pedia São Paulo à Timóteo: «Guarda o depósito que te foi confiado. Evita as
conversas frívolas de coisas vãs e as contradições da falsa ciência. Alguns por
segui-las, se transviaram da fé» (1Tm 6, 20-21). Por favor, não se esqueçam que
antes de serem mestres e doutores, vocês são e devem permanecer padres,
pastores do povo de Deus!
Mas como então manter o equilíbrio entre esses quatro
pilares fundamentais da vida sacerdotal? Eu diria que o remédio mais eficaz
contra esse perigo é a fraternidade sacerdotal. Na verdade, a nova Ratio
Fundamentalis para a formação sacerdotal, ao tratar do tema da formação
permanente, afirma que «primeiro âmbito em que se desenvolve a formação
permanente é a fraternidade presbiteral» (n. 82). Essa é, portanto, como
que o eixo da formação permanente. Isso se fundamenta no fato de que, pela
Ordenação sacerdotal, participamos do único sacerdócio de Cristo e formamos uma
verdadeira família. A graça do sacramento assume e eleva as nossas relações
humanas, psicológicas e afetivas e «se revela e concretiza nas mais variadas
formas de ajuda recíproca, não só espirituais mas também materiais» (João Paulo
II, Pastores dabo vobis, 74).
Na prática, isso significa saber que o primeiro objeto da
nossa caridade pastoral deve ser o nosso irmão no sacerdócio: «carregai – nos
exorta o Apóstolo – os fardos, uns dos outros; assim cumprireis a Lei de
Cristo» (Gal 6,2). Rezar juntos, compartilhar as alegrias e desafios da vida
acadêmica. Ajudar àqueles que sofrem mais com as saudades. Sair juntos para
passear. Viver como família, como irmãos, sem deixar ninguém de lado, sobretudo
aqueles que passam por alguma crise ou, quem sabe, têm comportamentos
repreensíveis, pois «a fraternidade presbiteral não exclui ninguém» (Pastores
dabo vobis, 74).
Queridos sacerdotes, o povo de Deus gosta e precisa de ver
que seus padres se amam e vivem como irmãos, ainda mais pensando no Brasil e
nos desafios tanto de âmbito religioso como no social que lhes esperam ao
retorno. De fato, neste momento difícil da sua história, em que tantas pessoas
parecem ter perdido a esperança num futuro melhor diante dos enormes problemas
sociais e da escandalosa corrupção, o Brasil precisa que os seus padres sejam
um sinal de esperança. Os brasileiros precisam ver um clero unido, fraterno e
solidário, em que os padres enfrentam juntos os obstáculos, sem deixar-se levar
pela tentação do protagonismo ou do carreirismo. Tenho a certeza de que o
Brasil vai superar a sua crise, e confio que vocês serão protagonistas desta
superação.
Para isso, contem sempre com uma ajuda particular: a ajuda da
Nossa Mãe do Céu, a quem vocês brasileiros chamam de Nossa Senhora Aparecida.
Vem a minha mente as palavras daquele canto com o qual vocês a saúdam: «Virgem
santa, Virgem bela; Mãe amável, mãe querida; Amparai-nos, socorrei-nos; Ó
Senhora Aparecida». Que essas palavras se confirmem na vida de cada um de
vocês. Possa a Virgem Maria, amparando e socorrendo, ajudá-los a viver a
fraternidade presbiteral, fazendo com que o período de estudos em Roma tenha
muitos frutos, para além do título acadêmico.
Que Ela, Rainha do Colégio Pio Brasileiro, ajude a fazer
desta comunidade uma escola de fraternidade, transformando cada um de vocês em
um fermento de unidade para as suas Dioceses, pois a “diocesanidade” do
sacerdote secular se alimenta diretamente da experiência da fraternidade entre
os presbíteros. E, para confirmar esses votos, concedo de coração à direção,
alunos, religiosas e aos funcionários juntamente com suas famílias, a Bênção
Apostólica, pedindo também que, por favor, não deixem de rezar por mim. Obrigado.
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