Luis Dufaur (*)
Para obter votos o futuro presidente Macron foi se fotografar na festa de Santa Joana
d'Arc em Orleans
Pode parecer estranho, mas não é. Nas eleições nacionais
francesas os principais candidatos apostaram corrida para ver quem se
identificava mais com a heroína medieval Santa Joana d’Arc.
Nenhum deles é especialmente devoto, nem muito praticante,
provavelmente só queriam o voto do eleitor.
Mas o que há na cabeça dos franceses para que ainda hoje o candidato se
tornar presidente de uma República formalmente laica e agnóstica ele necessite
mostrar-se também ligado ao passado sacral católico da França?
O jornais foram à procura de eminências do pensamento
francês para achar uma explicação do fenômeno que, para ele, parece uma
aberração.
François Huguenin, autor de As grandes figuras católicas da
França respondeu: “Existe uma trama comum entre o cristianismo e a fundação da
França. É impossível separar os fios da tapeçaria sem desmanchar tudo. O
catolicismo é a matriz da França”.
No livro Deus escolheu a França, o professor auxiliar de
História Camille Pascal concorda que o singular é que isso acontece no fundo
das cabeças de muitos presidentes, até mesmo socialistas, que da língua para
fora não querem saber de religião.
Rémi Brague, historiador de filosofia medieval, foi
aprofundar-se no catarismo, heresia do sul da França no século XIV explica: “Em
nosso país, jamais existiu uma situação na qual a política não teve alguma
dimensão religiosa e vice-versa”.
E acrescenta: foi a Revolução Protestante! Do tronco a
religião protestante nasceu o Iluminismo racionalista que sabotou os
fundamentos da monarquia até derrubá-la e implantar uma República laica, ateia,
que muda segundo o capricho dos homens. Nicolas Le Roux, secretário geral da
Associação dos Historiadores Modernistas diz que no povo francês, “o reino era
visto como um corpo, imagem do Corpo Místico da Igreja. O rei era a cabeça
desse corpo político e social. Por meio do convívio social, das festas, das
procissões, das missas, se atingia a salvação. Deixar de ir à Missa, quebrar as
imagens de Nossa Senhora, cantar os salmos em francês punha em perigo essa vida
em comum, a salvação de todos”.
A contribuição religiosa do Islã foi nula e fonte de guerra
constante. O historiador de filosofia medieval árabe e judia, Rémi Brague, fala
com clareza : “Não, o islã não contribuiu para nossa história. Os saqueadores
árabes e berberes que vieram até Poitiers só tinham o Corão numa mão e a
cimitarra na outra. Eles vieram para pilhar”.
Hoje essas tendências subterrâneas carregadas de alta tensão
voltam a se chocar. E Nicolas Le Roux
conclui: “O verdadeiro problema continua sendo que os modelos de Estado
católico-monárquico e laico-republicano não são capazes de coabitar. Essa é a
questão que se punha no século XVI e que se põe hoje”.
( * ) Luis
Dufaur é escritor, jornalista, conferencista de política internacional e
colaborador da ABIM
Fonte: Agência Boa Imprensa – (ABIM)
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