FLIP 2017: Lima Barreto
A obra do escritor carioca Lima Barreto estará em discussão
na 15ª Flip, que acontece de 26 a 30 de julho de 2017.
Sobre o autor
Afonso Henriques de Lima Barreto nasce no Rio de Janeiro em
13 de maio de 1881. Perde a mãe, Amália Augusta, escrava liberta e professora,
quando tinha seis anos, ficando sob os cuidados do pai, o tipógrafo João
Henrique, que, poucos anos depois, é diagnosticado como neurastênico, o que o
levaria a ficar recolhido pelo resto da vida. A doença do pai o obriga a deixar
a Politécnica para sustentar a família como Amanuense do Ministério da Guerra.
Inicia sua colaboração regular para a imprensa em 1905, no Correio
da Manhã. O jornal, extinto em 1974, serviu de inspiração para a criação de
Recordações do Escrivão Isaías Caminha, publicado em 1909. Pelas críticas à
imprensa no livro, Lima Barreto é retirado do quadro de colaboradores do
Correio da Manhã e tem proibida qualquer citação ao seu nome nas páginas do
diário, mesmo trinta anos depois de sua morte. Passa a colaborar, sob
pseudônimo, para revistas como a Fon-Fon e Revista da Época, fazendo uma
crítica social e política do Rio de Janeiro e o Brasil.
Em 1911, escreve e publica Triste fim de Policarpo Quaresma
em folhetim do Jornal do Comércio. O livro seria editado em livro quatro anos
depois.
Lima, devido ao alcoolismo, é internado pela primeira vez no
hospício em agosto de 1914, repetindo a tragédia pessoal de seu pai. A primeira
internação serve, contudo, de inspiração para sua obra a posteriori.
Vida e morte de M. J. Gonzaga de Sá, livro que dialoga com o
gênero biográfico, é publicado em 1919. No dia 25 de dezembro deste ano, o
autor é internado pela segunda vez.
Lima Barreto morre, aos 41 anos, em 1º de novembro de 1922,
Dia de Todos os Santos. No dia 3 de novembro, morre seu pai.
Clara dos Anjos, livro que foi escrito e reescrito durante
quase toda a vida de Lima, é publicado em livro no mesmo ano de sua morte.
A obra de Lima Barreto passa por um resgate e uma refundação
a partir da biografia publicada por Francisco de Assis Barbosa, A vida de Lima
Barreto, e da recuperação de seus escritos, feita a partir do acervo pessoal
catalogado pelo próprio autor.
O autor torna-se objeto de estudo de intelectuais de
referência em diversas áreas da inteligência brasileira, como Antonio Candido,
Nicolau Sevcenko, Osman Lins, Alfredo Bosi, Antonio Arnoni Prado, Beatriz
Resende e Lilia Schwarcz.
“Por muito tempo Lima Barreto ficou na ‘aba’ de literatura
social, e sua obra e trajetória possibilitaram muitos debates sobre a sociedade
brasileira. O que eu gostaria, mesmo, é que a Flip contribuísse para revelar o
grande autor que ele é. Para além das questões importantíssimas sobre o país
que ajuda a levantar, tem uma expressão literária inventiva e interessante, à
frente de sua época em termos formais, capaz de inspirar toda uma linhagem da
literatura em língua portuguesa”, afirma Joselia Aguiar, curadora da Flip 2017.
“O Lima é o autor de um território. O universo literário
dele é determinado pela criação da Avenida Central, do Rio de Janeiro, que
estabelece os diferentes graus de distância dos subúrbios com a Zona Sul e o
Centro da Cidade”, afirma Mauro Munhoz, diretor-geral da Flip. “O olhar do Lima
sobre a variedade de personagens brasileiros – seja nos subúrbios, seja nas
regiões centrais – é determinado pela experiência do território onde viveu por
quase toda a vida. Desse modo, sendo um grande autor, ele fez valer a máxima
‘Se queres ser universal, começa por pintar a tua aldeia’, do Tolstói.”
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Flip 2017 terá mais vozes femininas e negras participando
dos debates, conta curadora
Será a primeira vez que haverá mais mulheres compondo as
mesas da festa que, este ano, homenageia Lima Barreto
Norna Odara
Brasil de Fato | São Paulo (SP)
23 de Junho de 2017
Festa Literária de Paraty de 2009 / Monica/ Flickr
Com um autor negro como homenageado, Lima Barreto, e tendo,
pela primeira vez na história, mais vozes femininas do que masculinas
participando dos debates — serão 24 mulheres e 22 homens na composição das
mesas — a já tradicional Festa Literária Internacional de Paraty
(Flip) chega a sua 15ª edição com mais representatividade de gênero e raça.
O evento, que ocorrerá do dia 26 a 30 de julho, na cidade de
Paraty, no Rio de Janeiro, reunirá autoras e autores nacionais e
internacionais, como a nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie, a mineira Conceição
Evaristo, a gaúcha Eliane Brum e o pernambucano Marcelino Freire, entre
muitos outros.
"O que a gente está propondo com essa Flip é um
recorte que não é, de maneira nenhuma, o espelho do que existe no mercado
editorial. Trata-se de um novo recorte, uma nova proposta de
representação", comenta a curadora da Flip e pesquisadora Josélia Aguiar.
A inspiração para a edição deste ano, segundo Josélia, veio
de campanhas como "Leia Mulheres" (read women), fomentada pela britânica
Joanna Walsh, em 2014, no Reino Unido, que buscava incentivar a leitura de
obras de mulheres, em contraposição ao mercado editorial, que não lhes
proporcionava visibilidade. Outra iniciativa inspiradora para a edição da
feira foi o "Vidas Negras Importam" [Black Lives Metter], que
surgiu nos Estados Unidos com o intuito de se contrapor à violência
policial e hostilidade sofrida contra negros e negras e para
ressaltar fato de que as vidas negras têm valor.
Homenageado do ano e grandes autores
"Não há muito tempo, em dias de carnaval, um rapaz
atirou sobre a ex-noiva, lá pelas bandas do Estácio, matando-se em seguida. A
moça com a bala na espinha, veio morrer, dias após, entre sofrimentos
atrozes". Esse trecho é de uma crônica de 1915 escrita por Lima Barreto, o homenageado
na Festa Literária de Paraty (FLIP) deste ano, abordando o tema do
feminicídio no início do século 19. A crônica intitulada "Não as
matem" é parte da publicação "Vida Urbana", uma coletânea de
crônicas e artigos do autor publicada em 1953.
A curadora da Flip, Josélia Aguiar, explica sobre a escolha
deste autor, que "escreveu sobre diversos gêneros" e mantinha uma
"visão da sociedade brasileira que é muito atual".
"Lima Barreto me interessa há uns cinco anos por causa
do projeto de um livro, que já está praticamente pra ser lançado, que é a biografia
do Jorge Amado. Ele muito jovem adorava o Lima Barreto. Então, eu tive que ler
Lima Barreto e as conexões entre eles", conta Josélia.
Josélia reforça que a expectativa para o evento é grande e
ressalta a importância de trazer cada vez mais autores e autoras de diversos
países, gêneros e abordagens para um evento da magnitude da Festa: "A
história da Flip é muito bonita, de uma festa literária que ajuda a pautar a
literatura, que trouxe grandes autores e autoras, inclusive grandes autores
negros e negras, como a escritora [estadunidense] Toni Morrison e, no ano
passado, Svetlana Aleksiévitch, prêmio Nobel".
Edição: Vanessa Martina Silva
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