12º Domingo Comum - 25/06/2017
Anúncio do Evangelho (Mt 10,26-33)
— O Senhor esteja convosco.
— Ele está no meio de nós.
— PROCLAMAÇÃO do Evangelho de Jesus Cristo + segundo
Mateus.
— Glória a vós, Senhor.
Naquele tempo, disse Jesus a seus apóstolos: “Não
tenhais medo dos homens, pois nada há de encoberto que não seja revelado, e
nada há de escondido que não seja conhecido. O que vos digo na escuridão
dizei-o à luz do dia; o que escutais ao pé do ouvido, proclamai-o sobre os
telhados! Não tenhais medo daqueles que matam o corpo, mas não podem matar
a alma! Pelo contrário, temei aquele que pode destruir a alma e o corpo no
inferno! Não se vendem dois pardais por algumas moedas? No entanto, nenhum
deles cai no chão sem o consentimento do vosso Pai. Quanto a vós, até os
cabelos da vossa cabeça estão contados. Não tenhais medo! Vós valeis mais
do que muitos pardais. Portanto, todo aquele que se declarar a meu favor
diante dos homens, também eu me declararei em favor dele diante do meu Pai que
está nos céus. Aquele, porém, que me negar diante dos homens, também eu o
negarei diante do meu Pai que está nos céus.
— Palavra da Salvação.
— Glória a vós, Senhor.
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Ligue o vídeo abaixo e acompanhe a reflexão do Pe. Paulo
Ricardo:
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Evangelizar nossa interioridade
“Vede, eu vos envio como ovelhas para o meio dos lobos; sede
prudentes como as serpentes e simples como as pombas” (Mt 10,16)
Os conflitos são constantes no caminho da fidelidade ao
Evangelho: conflitos externos que surgem a partir da presença inspiradora e
provocativa dos(as) seguidores(as) de Jesus; conflitos internos que afloram
quando a mensagem evangélica ressoa na interioridade de cada um, desvelando
seus contraditórios impulsos, tendências, dinamismos, forças...
O ser humano vive tencionado entre dois polos: entre luz e
escuridão, céu e terra, fragmentação e unidade, espírito e instinto, solidão e
vida comum, medo e desejo, amor e ódio, razão e sentimento, sagrado e
profano..., enfim, entre animalidade e humanidade.
Não se trata de alimentar uma luta entre esses dois
impulsos, como um combate entre o bem e o mal; tampouco se trata de uma leitura
moralista diante da presença das chamadas “tentações”.
O combate dualístico desemboca no puritanismo, no
farisaísmo, no legalismo, no perfeccionismo, no voluntarismo..., esvaziando a
pessoa de toda densidade humana.
A questão de fundo é saber qual dos dois dinamismos nós
alimentamos; é aqui que entra a liberdade (ordenada) para deixar-nos conduzir
pelo Espírito. O centro é o Espírito. Só quando dizemos sim a esta tensão
básica de nossa vida é que conseguimos superar a divisão interna.
Viver uma “vida segundo o Espírito” significa, antes de
tudo, chegar à compreensão e integração das polarizações internas, dos
dinamismos opostos, dos movimentos contraditórios... que nos mantêm “despertos”
e que dão calor e sabor à nossa existência.
É próprio do Espírito, reunir, integrar, conciliar,
pacificar, conduzir-nos a um “lugar interior”, a um centro de calma, onde tudo
tem seu lugar, onde tudo encontra seu espaço. Sua discreta presença nos move a
acolher em nós nosso potencial de ternura, de cuidado e de resistência diante
de todas aquelas situações e forças que desintegram a vida. A atitude
fundamental é a de sermos dóceis para nos deixar conduzir pelos impulsos do
Espírito, por onde muitas vezes não entendemos e não sabemos.
À luz do evangelho deste domingo, vamos considerar os
“conflitos internos”. E a questão primeira que surge é esta: como integrar,
pacificar, harmonizar... os “animais interiores”, para que o seguimento de
Jesus Cristo não termine num combate espiritual que desgasta, tornando pesada a
vivência cristã e levando ao sentimento de impotência e desânimo?
Sob o impulso do Espírito, somos chamados a conhecer,
reconhecer, nomear e integrar os animais que nos habitam. E caminhar
fraternalmente com eles. Cada um deles representa os instintos, impulsos,
paixões, fragilidades, sensualidade, sentimentos... que, quando não pacificados
e integrados, criam uma desarmonia interior.
Somos como a “arca de Noé”, no grande Oceano da vida,
carregando em nosso interior todos os animais, com seus instintos selvagens e
primitivos; e o maior desafio é, justamente, a harmonia e a convivência, onde
cada um deles tem sua importância, seu papel sagrado e revelador da nossa
identidade humana. São eles que nos facilitarão o acesso às nossas riquezas
interiores.
Algumas vezes agimos como uma cobra, ficamos ariscos e escondidos
como uma onça, rugimos como um leão ou atacamos como um cão feroz. Outras
vezes, até agimos igual a animais ruminantes que mastigam continuamente os
rancores e mágoas do passado.
Eles não cessam de ladrar enquanto não lhes damos atenção. É
preciso, antes de tudo, pacificar nossos animais interiores. Trata-se de
conhecê-los, aprender a linguagem deles, fazer amizade com eles para que eles
não nos destruam por dentro.
Faz parte da maturidade e crescimento pessoal encontrar e
entender, em cada um de nós, a mensagem e o desafio de animais interiores como
a pomba, o cachorro, o corvo, a serpente, a raposa, a perdiz, o lagarto, o
falcão, o lobo, o leão... Cada animal deve ser verbalizado, integrado
harmoniosamente no tempo certo e no lugar adequado. Ao fazer isso,
descobriremos as diferentes dimensões da ecologia espiritual, paradisíaca e
harmônica, para bem viver a maravilha da vida plena e em abundância.
Quando todas as energias animais são ordenadas, elas
colaboram para o conhecimento pessoal, o refinamento da identidade e a busca da
autenticidade, elas são fonte interior de sabedoria e de desfrute espiritual.
Então, os animais pacificados irão nos conduzir ao mais profundo e nos
mostrar onde o tesouro está escondido, e ajudam-nos a desenterrá-lo. Aqui está
o lado “humanizante” da vida.
Fomos forçados, durante nossa formação cristã, a viver uma
espiritualidade que nos ensinou a reprimir e a manter presos todos os
animais na gruta interior e a levantar junto dela um edifício de “grandes
ideais”. Lutar contra os animais interiores é permanecer na superfície de si
mesmo e não ter acesso às reservas de riqueza do próprio coração.
Tal vigilância e suspeita nos levaram a viver constantemente
com medo de que os animais pudessem fugir e nos devorar. Fomos obrigados a
fugir de nós mesmos, ficamos com medo de olhar para dentro de nós, pois
poderíamos correr o risco de nos deparar com os eles. Quanto mais os amarramos,
tanto mais perigosos eles se tornam; eles nos atacam por dentro, tirando a
disposição, o ânimo de viver.
Com isso nos excluímos do prazer de viver, porque tudo é
reprimido e nossa animalidade é violentada. E onde está o nosso medo pode estar
também o nosso tesouro enterrado. “Não tenhais medo deles. Não há nada de
oculto que não venha a ser revelado, e nada de escondido que não venha a ser
conhecido” (Mt 10,26).
Sem a superação cotidiana desse medo, nossa missão estará
comprometida; perderá sua força inovadora, garantida pela novidade do Projeto
de Deus. Sabemos que tudo quanto nós reprimimos nos faz falta à nossa vida. Os
“animais selvagens” tem muita força. Quando os prendemos, gera um
desgaste muito grande e fica nos faltando a sua força de que temos necessidade
para o nosso caminho para Deus, para nós mesmos e para os outros.
Nosso compromisso deveria ser a de travar um diálogo amoroso
com os animais dentro de nós. Então tornar-se-á realidade o que o profeta
Isaías prometeu: “O cordeiro e o leão andarão juntos, e a pantera se deitará
com o cabrito...” (Is. 11,6ss). O compromisso com o Reino requer de todos uma
forte dose de coragem e uma alma ágil, animada e vivificada pelo sabor da
aventura e da novidade. Vencido o medo, nós nos tornaremos autênticos,
criativos e audazes seguidores de Jesus.
Texto bíblico: Mt 10,16-33
Na oração: Na vivência cristã, o que importa é ter a coragem
de entrar na “arca interior” e dialogar amigavelmente com todos os animais.
Então eles indicarão o caminho do tesouro escondido. Este tesouro pode
ser “uma nova vitalidade e autenticidade, um sonho ousado, uma intuição,
um dom especial, o encontro com o verdadeiro eu, a imagem que Deus faz de cada
um de nós...”
“Entrar na arca” significa “buscar e encontrar a Deus”
exatamente em nossas paixões, em nossos traumas, em nossas feridas, em nossos
instintos, em nossa impotência e fragilidade... Viver uma nova espiritualidade
significa, então, não buscar “ideais de perfeição”, mas dialogar com nossas
paixões, nossas fragilidades, nossas carências...Poderíamos nos interrogar o
que é que Deus deseja nos revelar por meio delas, e como justamente através
delas Ele deseja nos conduzir ao tesouro escondido no interior de nossa
vida.
Pe. Adroaldo Palaoro sj
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