13 de março de 2017
Estudos estatísticos comprovam: a gravidez precoce produz
enormes problemas sociais, aumenta as chances de miséria e criminalidade dos
filhos, impede o avanço da escolarização dessas jovens mães, condenando-as e a
seus filhos a uma vida desgraçada. E como está o Brasil nisso?
Adolescentes deram à luz 431 mil bebês em 2016, o
equivalente a 21% dos nascimentos no ano no Brasil. A gravidez precoce é hoje
no Brasil a maior causa da evasão escolar entre garotas de 10 a 17 anos.
Precisamos falar mais desse assunto. É o que faz o jornalista Carlos Alberto Di
Franco em sua coluna de
hoje, tocando na ferida do problema:
A culpa não é só do entretenimento permissivo ou da TV, que,
frequentemente, apresenta bons programas. É de todos nós — governantes,
formadores de opinião e pais de família—, que, num exercício de anticidadania,
aceitamos que o país seja definido mundo afora como o paraíso do sexo fácil,
barato, descartável. É triste, para não dizer trágico, ver o Brasil ser citado
como um oásis excitante para os turistas que querem satisfazer suas taras e
fantasias sexuais com crianças e adolescentes.
O governo, assustado com o crescimento da gravidez precoce e
com o crescente descaso dos usuários da camisinha, investe pesadamente nas
campanhas em defesa do preservativo. A estratégia não funciona. E não
funcionará. Afinal, milhões de reais já foram gastos num inglório combate aos
efeitos. A raiz do problema, independentemente da irritação que eu possa
despertar em certas falanges politicamente corretas, está na onda de baixaria e
vulgaridade que tomou conta do ambiente nacional. Hoje, diariamente, na televisão,
nos outdoors, nas mensagens publicitárias, o sexo foi guindado à condição de
produto de primeira necessidade.
Se quisermos um entretenimento de qualidade, precisamos
separar o exercício da liberdade de expressão da prática do entretenimento
mundo cão. Há uma liberdade de mercado que produz um mercado da liberdade. De
resto, mesmo que exista uma demanda de vulgaridade e perversão, deve-se aceder
a ela?
Muitos colegas liberais ou libertários não se dão conta de
que nem toda demanda é louvável. Claro que o livre mercado é
fundamental para o progresso de uma sociedade, mas o mercado é amoral, não faz
julgamento de valor. Quem deve fazer isso são os cidadãos. E por isso a
importância, em minha opinião, do casamento intelectual entre liberalismo e
conservadorismo: os conservadores são aqueles que focam mais nesses aspectos
culturais, e por isso acabam acusados com frequência de “moralistas”.
Mas não é moralismo barato se preocupar com o nosso entorno,
com os valores morais disseminados pela sociedade, pois isso tem impacto direto
sobre nossas vidas. O argumento da empatia deveria bastar: liberais
individualistas não precisam ser sociopatas, e podem muito bem se importar com
o destino de estranhos à sua volta, com a vida do próximo. Mas se esse apelo
cristão não for suficiente, então que sirva o próprio “egoísmo racional” mesmo:
uma sociedade destroçada é muito pior para o próprio indivíduo que vive nela.
Acredito muito na interação entre cultura e instituição,
entre valores morais e mecanismo de incentivos. Acho que um não se sustenta sem
o outro. A liberdade do mercado não sobrevive num vácuo de valores. Se todas as
instituições americanas fossem adotadas no Brasil hoje, não seríamos como a
América, pois a cultura ficaria faltando. Precisamos mudar nossa cultura
também, não só nossas instituições.
Se considerarmos como
equivalente moral atender a demanda de quem quer consumir alta cultura e a de
quem quer consumir pornografia, por exemplo, tratando ambos como
“empreendedores de sucesso” sem qualquer juízo de valor, estaremos contribuindo
para a decadência cultural de nossa sociedade.
Até onde deve ir o apreço, ou pior, o endeusamento do livre
mercado? Di Franco coloca uma questão para nossa reflexão: “Suponhamos que
exista um público interessado em abuso sexual de crianças, assassinatos ao
vivo, violência desse tipo. Nem por isso a TV deveria ter programas
especializados em pedofilia e assassinatos. O mercado não é um juiz inapelável.
Não se deve atuar à margem dele, mas não se pode sobrevalorizá-lo”.
Quando algo assim é defendido, não precisamos, como
liberais, reagir instintivamente contra alguma censura ou intervenção estatal,
pois não é disso que se trata. Estamos falando apenas de uma responsabilidade
moral que deveria ser cobrada de qualquer cidadão, mais ainda de quem tem o
poder de influenciar milhões de cabeças, como no caso dos grandes grupos de
comunicação. Di Franco parece dar um recado direto a essa turma:
Ninguém quer criar um Conselho da Moral e dos Bons Costumes
que vai avaliar cada programa. Isso seria absurdo e extremamente perigoso. Mas
não podemos cair no extremo oposto, que seria ignorar totalmente qualquer
aspecto moral do livre mercado. Sim, a empresa é livre para produzir um
programa como “Amor & Sexo”. Sim, cada um é livre para assistir ou não a
tal programa. E sim: também somos livres, como cidadãos, para exercer esse
papel de condenar publicamente essa mensagem hedonista, imoral e irresponsável.
É nesse campo dos valores que penso que mais liberais
deveriam entrar também, sem medo de serem “acusados” de conservadores. A
alternativa é negligenciar um grave e crescente problema social, só por receio
de ser rotulado pela patrulha. Confundir liberalismo com libertinagem tem sido
o “pecado capital” de muito “liberal” moderno. O relativismo moral só interessa
aos que defendem a imoralidade.
Como prova de que a cultura importa e tem total ligação com
esse problema da gravidez precoce, basta ver a proporção bem maior de meninas
latinas que passam por isso, em relação às americanas. Nos Estados Unidos, as
hispânicas têm sete vezes mais chance de ter um filho entre 10 e 14 anos do que
as brancas (1,4 por cada mil contra 0,2 por cada mil), segundo um estudo do
Centers for Disease Control.
Ann Coulter falou disso em seu influente livro Adios,
America!, em que alerta para a “latinização” do país e as consequências
práticas dessa mudança cultural. Ela cita o caso de Gloria Trevi, a popstar
conhecida como a “Madonna mexicana”, que alegou ser aceitável em seu país de
origem o sexo com crianças (acima de 12 anos). De fato, em 31 de 32 estados
mexicanos a idade de consentimento para sexo é 12 anos, e na Cidade do México é
14.
Essa cultura da permissividade, que confunde liberdade com
libertinagem, que acha legal ser vista como a “sociedade do sexo fácil”, que
incentiva a sexualidade cada vez mais precoce e que condena como “moralismo”
qualquer tentativa de se impor limites aos jovens, é a grande responsável por
essa situação calamitosa, que condena milhões a um futuro sombrio. Não se
importar com isso não é ser liberal individualista; é ser um monstro moral!
Rodrigo Constantino
Economista pela PUC com MBA de Finanças pelo IBMEC,
trabalhou por vários anos no mercado financeiro. É autor de vários livros,
entre eles o best-seller “Esquerda Caviar” e a coletânea “Contra a maré
vermelha”. Contribuiu para veículos como Veja.com, jornal O Globo e Gazeta do
Povo. Preside o Conselho Deliberativo do Instituto Liberal.
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