Pedro Ladeira - 17.set.2015/Folhapress
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Celso de Mello,
ministro do Supremo Tribunal Federal
08/12/2016
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O carnaval
institucional está muito perto de capítulos dramáticos
Aproveite: nenhum dos seus antepassados teve a oportunidade
de testemunhar um nível de maluquice dos dirigentes nacionais como se vê agora.
O passado produziu crises de todos os tipos. O presente, porém, não é, na sua
originalidade, uma crise a mais. É um fenomenal desvario. Uma orgia dos poderes
institucionais, tocada pela explosão de excitações da mediocridade e da
leviandade brasilianas.
O ministro Celso de Mello cobrava ontem, no Supremo Tribunal
Federal, a nossa “reverência à lei fundamental”, à Constituição, e “aos Poderes
da República”. Qual dos próprios Poderes faz tal reverência? Ilegalidades são
neles aceitas, e aproveitadas, inclusive como normas. A exemplo do custo, em
“benefícios”, de cada congressista, sem sequer a contrapartida de obrigações
rígidas na função parlamentar; ou dos descaminhos processuais no Judiciário,
nos quais o desprezo de prazos é sempre a negação da justiça merecida por uma
das partes; ou da ilegitimidade de um Executivo que entregou parcelas
importantes do seu poder a corruptos históricos, sem sequer despertar a
administração sonolenta.
É essa natureza despudorada imposta às instituições que se
eleva agora ao paroxismo. E rompe as barreiras restantes, mais aparentes que
reais, na confrontação que disputa hierarquia e predominância entre os Poderes.
Presidente do Supremo, a ministra Cármen Lúcia tem ilustrado
a explosão com intervenções cíclicas talvez apropriadas, nas circunstâncias,
mas inesperáveis. Já na posse, concitou os integrantes do Judiciário à união
porque “unidos seremos mais fortes”. Na intenção de força estava implícita a
ideia de combates não perceptíveis nas perspectivas do Supremo e do Judiciário.
Muito ao contrário, em um e em outro depositavam-se esperanças de solução mansa
e inteligente para muitas das aspirações e frustrações da cidadania.
Em seguida a informar-nos que “o papel da Justiça é
pacificar”, os modos suaves e o conceito de serenidade judicial da ministra nos
trazem, como a erupção de profundezas ígneas, um brado alarmante: (…) “o Estado
democrático previsto tem sido, ou parece ser até aqui, nossa única opção. Ou a
democracia ou a guerra”. Completou-se o chamado à união do Judiciário para se
tornar mais forte, mas a alternativa apresentada pelos autores do impeachment,
e pelo alheamento do Supremo na ocasião, não tinha duas hipóteses.
Faz lembrar o madrilenho “No passarón”, de La Passionaria. Seria
uma conclusão da presidente do Supremo sobre o presente conflitivo? Uma
proposta? Alguma nostalgia, talvez? Ininteligível. Sobretudo diante do que se
constata: Renan Calheiros desafiou o Supremo e venceu –o que não deve ser
exemplo para nenhum cidadão, por mais honra e razão que tenha. A lógica das
guerras e dos privilégios é complexa demais para os não beneficiários.
No reino das extravagâncias institucionais, não cabe esperar
um encaminhamento razoavelmente saudável. Os que me desancaram quando escrevi
que a crise passava de política a institucional afiem, agora, os insultos: se
ainda vale alguma coisa o que testemunhei, o carnaval institucional está muito
perto de capítulos dramáticos. Tomara que ao menos não passem a trágicos.
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