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João Ubaldo Ribeiro: Uma referência
Não somos brancos,
negros ou índios; somos baianos. Não pertencemos, no maior rigor da palavra, a
nenhuma religião, nem mesmo somos ateus; somos baianos. Não pretendemos ser
melhores que ninguém. Mas somos baianos. (Trecho do discurso de posse na
Academia Baiana de Letras).
À exceção de Nélson
Rodrigues, Fernando Sabino e Millôr Fernandes, o escritor e jornalista João
Ubaldo Ribeiro foi um dos maiores cronistas, crítico/sátiro, da literatura
brasileira.
Não queria ser
lembrado com um mito, e sim companheiro de pessoas comuns e humildes, a exemplo
dos velhos conhecidos com que se encontrava nas manhãs ensolaradas e nas tardes
amenas na Ilha de Itaparica, Bahia, onde nasceu em 23 de janeiro de 1941, local
em que se refugiava nas férias de janeiro e ali escreveu boa parte de uma das
mais importantes obras: Viva o povo brasileiro (1984), considerada obra máxima,
um clássico da literatura, romance histórico, conteúdo da ocupação portuguesa –
Estado Novo e a Ditadura, trama passada também em outros cenários como o Rio de
Janeiro, São Paulo e Lisboa, no período de 1647 a 1977.
Era comum ver o mago
literário João Ubaldo Ribeiro no bar e restaurante Tio Sam, no Leblon, tomando
o seu chope em tulipa, onde jogava fora conversa fiada e distraída, com velhos
conhecidos daquele bairro carioca, onde residia, e seus admiradores, sempre
solícito, com seu vasto bigode já grisalho e sorriso largo, idêntico ao seu
pai, o ilustre professor Manoel Ribeiro, sempre aos sábados, domingos e
feriados.
A influência do cotidiano
brasileiro e do sociopolítico foi retratada em toda sua vasta produção
literária, deixando um legado inexorável para os amantes da literatura e
estudantes que tentam ingressar nas universidades brasileiras – uma referência.
O escritor baiano João Ubaldo
Ribeiro revolucionou a literatura, com seu jeito crítico, sátiro, espirituoso,
social e jornalístico.
O seu grande saber jurídico
foi adquirido através do incentivo do seu pai Manoel Ribeiro, o qual era
advogado, professor, jurista, político (deputado estadual em Sergipe, vereador
e procurador de Salvador), além de ter feito parte da cúpula da Secretaria de
Segurança Pública (SSP) do estado baiano.
Não obstante bacharel em
Direito, João Ubaldo lecionou Ciências Políticas em Salvador (BA), mas não quis
seguir carreira de advogado, como o pai e o irmão Manoel Ribeiro Filho,
renunciando a tudo para se tornar um escritor.
Multifacetado, amante da
liberdade e das coisas simples, obteve sucesso, tornando-se um grande
romancista, além de escrever livros infantis, com sabedoria e ironia, estilo
singular, encontrando também em sua obra o lado lírico, telúrico e
pornográfico, como no romance A casa dos budas ditosos, publicado em 1999, que
inclusive foi proibido em alguns estabelecimentos.
Conheci
indiretamente João Ubaldo Ribeiro através de seu pai Manoel Ribeiro, quando
tive a honra de ser sua aluna, em 1980, no curso de Direito Administrativo da
UCSAL (Universidade Católica de Salvador). Embora mestre rígido, exigente e
sério, apresentava um humor inigualável, causando uma empatia mútua entre
professor e aluna.
Criado esse elo carinhoso com
o mestre Manoel Ribeiro, fumante inveterado e apreciador de um bom uísque,
passamos a manter conversas sobre literatura, filosofia, economia e história,
daí o seu desejo que eu viesse a conhecer o filho João Ubaldo, o qual teria
afirmado o desejo de conhecer esta então estudante, a quem seu pai dedicara um
carinho diferenciado, em razão de, com membro do Diretório Acadêmico da UCSAL,
em 1979, termos lançado a coletânea de poema Poejusto, como também de lhe ter
ofertado o meu primeiro livro editado, Mulher: poesias inéditas (1979), cujo
prefácio foi do professor de Direito Internacional Público, seu conterrâneo
Jayme Messeder de Suárez, exemplar esse que vi carregando várias vezes e ter me
dito, pessoalmente, que o poema de folhas 29, tinha muita identificação com o
seu pensamento, o que me deixou muito feliz e lisonjeada, com a certeza que
está bem guardada em sua biblioteca.
Nas conversas entre aulas,
aconselhava-me a seguir na carreira literária e me orientava ao hábito da
leitura como aprendizado.
O desejo de Manoel Ribeiro em
que eu conhecesse seu filho não foi realizado por outras circunstâncias, além
de o mesmo morar em outro estado, com várias viagens pelo mundo afora. Todavia,
como o destino tem os seus desígnios, através do encontro de Tadeu Ribeiro,
sobrinho de João Ubaldo, com meu filho Maurício Pimenta, no Colégio Anchieta,
pude manter contato com a família Ribeiro.
Traduzir João Ubaldo Ribeiro
como cidadão comum é muito simples. Trabalhou na Prefeitura de Salvador como
office-boy, até chegar à vaga da cadeira 34 na Academia Brasileira de Letras
(ABL), antes ocupada por Carlos Alberto Castelo Branco.
Do mesmo modo, citar suas
obras é perda de tempo, porque todos as conhecem. Mas vale destacar que muitas
delas inspiraram outras artes como o cinema (Sargento Getúlio, 1983; Tieta do
Agreste, 1996; Deus é brasileiro, 2003), a televisão (O sorriso do lagarto,
1991).
Todas e quaisquer homenagens
ao grande escritor são justas, como as feitas no carnaval carioca, pela escola
de samba Império da Tijuca, no desfile do ano de 1987, e o Bloco Areia, ano
passado, além de lhe ser concedidos prêmios de tamanha importância, como o
Prêmio Camões, em 2008.
Por tudo isso, Viva o povo
brasileiro na pessoa de João Ubaldo Ribeiro, o grande, senão o maior brasileiro
em seu gênero.
Sione
Maria Porto de Oliveira, poetisa.
Membro da Academia de Letras de Itabuna - ALITA
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