A Política é o Permanente
A política, não só no Brasil, mas em toda parte, tem andado
numa maré de desprestígio. Isso é da maior gravidade, pois gera um círculo vicioso:
os jovens que se preocupam com a sociedade e com a justiça social se afastam da
vida pública, que passa a ser ocupada cada vez mais por pessoas incompetentes
que trabalham por seus interesses pessoais, esquecendo o Estado e o bem comum,
aumentando o desgaste da política.
Sem a política, é impossível que as instituições
democráticas funcionem. Se onde elas existem a coisa é difícil, imaginem onde
não existem.
Aristóteles dizia que o discurso, próprio do homem, serve
para distinguir o justo e o injusto, e assim buscar o bem. Daí a criação do
Parlamento e da representação política. O Parlamento é a maior instituição
política já criada pelo homem na busca do autogoverno. Nele o povo detém o
poder de questionar, de protestar, de fiscalizar, de mudar. Deve ser sagrado na
cabeça do povo. Ele é a essência das liberdades. Quando o Parlamento é fechado
ou nulo, o sistema se abala.
Há bons políticos e maus políticos. Não vamos generalizar.
Uma das excelências da democracia representativa é que ela se constitui sempre
de mandatos transitórios, e o povo tem o poder de mudá-los, expulsá-los da
política.
No Brasil, queremos fazer que a democracia funcione sem
partidos, sem políticos, sem política. Ela está a cada dia descambando mais
para uma ação concentrada entre amigos e inimigos que se reúnem em questões
tópicas para gerir crises e administrar o cotidiano. Não existe nenhuma visão
prospectiva da solução dos problemas do País.
Fomos incapazes de aprofundar a democracia que conquistamos
e construímos. O desenvolvimento estagnado e medíocre do neoliberalismo
mostrou-se incapaz de assegurar um mínimo de justiça social e oportunidade de
melhor qualidade de vida.
Eu fico preocupado. Não com a democracia, mas com a
qualidade e a saúde de nossa democracia. Já muito foi dito que ela é mais um
estado de espírito do que um regime. Com o exercício de eleições passamos a
julgar a democracia unicamente por estas. Não bastam instituições democráticas,
mas é preciso educação democrática.
O Brasil perde gradativamente o respeito pelos valores da
democracia, que passam a ter o crivo da circunstância, sem a noção de que um
sistema de valores é perene e aspira à eternidade. Acumulamos um retrocesso.
Destruíram-se os partidos, acabaram-se as ideias, sumiram os programas, a ética
e a moralidade foram banidas do processo político. É o caos.
O problema, assim, é político. O resto é conjuntura. A
política é o permanente.
Os Divergentes, 09/01/2022
https://www.academia.org.br/artigos/politica-e-o-permanente
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José Sarney - Sexto ocupante da Cadeira nº 38, eleito em 17 de julho de
1980, na sucessão de José Américo de Almeida e recebido em 6 de novembro de
1980 pelo Acadêmico Josué Montello. Recebeu os Acadêmicos Marcos Vinicios
Vilaça e Affonso Arinos de Mello Franco.
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