03.06.2020
Instalou-se no Brasil um estresse político que,
mantido, conduzirá a um final infeliz. Ou seja, a tensão está aumentando e
arrastando a nação a um estágio cada vez mais crítico. Não haverá solução boa
pelo caminho das picuinhas e da crescente violência verbal e comportamental.
O quadro é alarmante. Chega-se ao fim de cada dia abastecido
de notícias que amplificam os sentimentos de pânico, medo, revolta, e de uma
raiva que arde no peito e clama pelo mau lenitivo chamado... vingança. Na
política, passada a régua nessa conta, comprou-se por cem um estresse que
talvez não valesse vinte. De outro lado, epidemia de temores é abastecida com
dose diária de notícias alarmantes em que recordes são batidos e barreiras
ultrapassadas, como se estivéssemos numa olimpíada funesta do obituário
internacional.
O povo, que tanto agita os fantasmas mentais de alguns
senhores da Suprema Corte, não tem culpa alguma na instabilidade política do
país. O povo, o soberano povo, é vítima. É dele o desemprego, o prato magro do
pouco alimento, o teto perdido, o lazer impossível, o beco sem saída, a
esperança perdida, os longos dias vazios e as ainda maiores noites de insônia.
Todos esses apertos passam longe, bem longe dos que exibem a musculatura do
respectivo poder enquanto se encaram com aquele olhar gentil com que os
boxeadores esquentam hormônios para a luta.
Muitos titulares de poder de Estado talvez se sentissem
melhor se o povo se recolhesse em isolamento sanitário horizontal, em
isolamento político vertical e num lockdown acústico de onde sequer suas vozes
fossem ouvidas. No entanto, as manifestações populares estão salvando a
democracia enquanto os poderes se provocam, rixam, e disputam supremacia onde
deveria haver independência e harmonia.
Por longos meses, o governo vitorioso nas urnas buscou
escorar-se no povo, com o qual Bolsonaro tem conexão incomum. No entanto, à
medida que preservava o estilo e os laços com o povão, indispensáveis para
manter suas salvaguardas no tabuleiro da política, ele perdia apoiadores
naquela parcela da elite que votou nele, mas nunca o acolheu muito bem.
Prefeririam, esses, um conservador estilo britânico, tipo Stanley Baldwin, ou
seja, um Bolsonaro gentleman, que nunca existiu. Seu apoio perde vigor entre
aqueles que, vendo as dificuldades enfrentadas pelo governo esperam dele uma
atitude impossível. A atitude possível, perfeitamente possível, é dar o
primeiro passo no rumo certo.
Muitas vezes, ao longo dos anos, ouvi dizer que “o Brasil é
maior do que a crise”, e tem sido. No entanto, se mais estável, com
instituições melhores, seria um país melhor para seus filhos. Este é o país de
Bonifácio, de Nabuco, de Caxias, de Pedro II, de Mauá. Não será derrotado num
conflito de picuinhas! As urnas falaram alto em 2018 e exigem respeito,
principalmente daqueles, tão poderosos e arrogantes, que a ninguém julgam dever
respeito.
Zele Deus por esta sua nação.
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* Percival Puggina (75), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é
arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista
de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o
totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do
Brasil. Integrante do grupo Pensar+.
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