O anseio por explicações angustia a população, presa às incertezas do futuro. Uma coisa, porém, é certa: há muita manipulação em jogo, seja econômica, política ou ideológica. Em círculos mais restritos, esse processo de falsificação da realidade é chamado de “propaganda”
Daniel Lopez, teólogo e doutor em linguística: “A
pandemia trouxe uma oportunidade de reflexão sobre os jogos de propaganda
midiática”
Em tempos de pandemia, sentimos prazer ao observarmos a
virtude humana sobressair no trabalho incansável dos profissionais dedicados a
manter minimamente a ordem social em meio ao caos. Por outro lado, vícios
também são revelados. Fraudes online crescem vertiginosamente, homicídios
aumentam em determinados locais, ainda que, em certos casos, o indício de
furtos tenha decaído, provavelmente em virtude da menor circulação de pessoas.
Multidões buscam, na internet, respostas para perguntas que
nem os maiores especialistas ainda encontraram. O anseio por explicações
angustia boa parte da população, presa na incerteza do que virá no futuro. Não
sabemos ao certo como acabará essa história. Uma coisa, porém, é certa: há
muita manipulação em jogo, seja econômica, política e ideológica. Em círculos
mais restritos, esse processo de falsificação da realidade é chamado de
“propaganda”. É nesse mundo da perversão dos fatos para fins particulares que
se situa, por exemplo, a Programação Preditiva, conceito que aqui utilizo
como ensejo para uma reflexão sobre a estranha realidade dos dias atuais.
Programação Preditiva é uma teoria – um tanto conspiratória
- segundo a qual governos ou uma elite poderosa estariam usando filmes,
programas televisivos e livros de ficção como ferramentas de controle das
massas. O objetivo seria adestrar a população para aceitar como válidos eventos
projetados para o futuro. Proposta pela primeira vez pelo pesquisador Alan
Watt, a estratégia tornaria as pessoas mais propensas a aceitar uma nova
realidade imposta.
Nesse contexto, a indústria cultural funcionaria como veículo
para implementar essa tática de propaganda. Isso porque, ao assistir algo que
uma pessoa normalmente percebe como entretenimento, a resistência crítica é
reduzida e as mensagens são recebidas com maior facilidade.
Há quem aponte uma relação entre a Programação Preditiva e
a Teoria da Aprendizagem Social. A Aprendizagem Social é a capacidade de
reproduzir um comportamento observado, funcionando, portanto, com base na
imitação. No experimento mais popular relacionado a essa teoria, as crianças
batem ou ignoram um boneco de palhaço, dependendo do comportamento que viram
ser exibido por um adulto.
Muitos reputam como exagerada essa concepção da maneira como
os eventos são premeditados. Um nome, porém, é capaz de trazer um fio de
realidade a essa teoria. Estou me referindo a Chase Brandon. Ele trabalhou
durante trinta e cinco anos como oficial de operações clandestinas da CIA.
Aposentou-se em 2006, mas continua prestando consultoria para diversas
instâncias da comunidade de inteligência, do Departamento de Defesa e para
várias organizações estaduais e federais americanas.
Em sua missão final, Brandon era um oficial sênior da
diretoria da Agência Central de Inteligência, atuando como porta-voz da
organização e - o mais importante para nós aqui - como contato oficial da CIA
com a indústria do entretenimento. Ele prestou consultoria técnica a muitos
filmes, séries e documentários, como Missão Impossível III, Identidade Bourne e
24 Horas, além dos canais Discovery, Learning e Military. Chase Brandon era
exatamente a conexão entre os projetos do serviço de inteligência e os
produtores de Hollywood. A mais poderosa indústria cultural do mundo tinha nele
a ligação com a maior agência de propaganda americana.
Supondo que a Programação Preditiva não seja tão delirante,
e sabendo que há um link direto dos serviços de inteligência com a indústria do
entretenimento, proponho um exercício prático. Nele, analisaremos um episódio
dos Simpsons, que pode funcionar como um importante exercício para
entendermos o que está acontecendo no mundo hoje. Não quero dizer que o
episódio previu o futuro, mas creio que serve como uma perfeita metáfora para
extrairmos algumas reflexões sobre a estranha realidade que hoje nos
cerca.
O episódio em questão se chama “The
Fool Mounty”, e foi ao ar na vigésima segunda temporada dos Simpsons, no
dia 21 de novembro de 2010. No enredo, preocupado com a queda de receita, um
grupo de executivos da televisão marca um encontro secreto para descobrir como
fazer as pessoas assistirem mais TV. A ideia seria criar uma crise de saúde
pública, para que os telespectadores fossem forçados a voltar a assistir o
noticiário em busca de informações importantes sobre a epidemia.
Eles decidiram que uma epidemia causada por uma "gripe
do gato doméstico” traria o resultado esperado, uma vez que causaria medo a um
grande número de pessoas. O agente da gripe foi testado pela primeira vez num
representante da emissora NBC, e provou ser eficaz, quando a “cobaia” sofreu
uma morte horrível e dolorosa. A notícia da gripe doméstica foi anunciada
na TV. As pessoas ficaram com medo de seus gatos, e algumas até tomaram medidas
extremas, como queimar todos os itens que seus animais domésticos haviam
tocado.
Mais tarde, uma vacina foi anunciada e as pessoas
enfrentavam longas filas para obtê-la. Porém, como meio para manter o pânico (e
impedir que a audiência caísse), a vacina foi racionada para uma criança por
família. No final da história, não se sabe como a epidemia foi resolvida ou se
o público descobriu o que a causou.
O mais curioso, porém, está nos diálogos. Quando olhamos as
falas dos personagens no episódio em questão, alguns detalhes curiosos saltam
aos olhos. No topo da Estátua da Liberdade, acontece a reunião secreta dos
donos de todas as grandes empresas de mídia dos Estados Unidos. O líder da
reunião diz: “Eu telefonei para vocês para reunir este grupo secreto dos
impérios da mídia americana. Estamos aqui para apresentar a próxima crise falsa
para colocar os americanos de volta onde eles pertencem - em salas escuras,
colados às suas televisões, aterrorizados demais para pular os comerciais”. O
chefe continua dizendo: "Eu acho que devemos usar a velha estratégia de
criar uma crise de saúde”.
Neste momento, uma das mulheres participantes diz: "Uma
nova doença! Ninguém está imune! É como o Verão do Tubarão, exceto que, em vez
de um tubarão, é uma epidemia. E, em vez do verão, é o tempo todo!”.
Permitam-me abrir um parêntesis aqui para explicar um detalhe.
O “Verão do Tubarão" refere-se à cobertura de
ataques de tubarão pela mídia americana no verão de 2001. A abordagem
sensacionalista começou após um incidente no fim de semana de quatro de julho,
que vitimou Jessie Arbogast, um menino de 8 anos, e continuou quase inabalável
- apesar de não haver evidências de um aumento real dos ataques - até quando
aconteceu da derrubada das Torres Gêmeas no dia onze de setembro, que desviou a
atenção da mídia. Desde então, o “Verão do Tubarão" é lembrado como um
exemplo de sensacionalismo televisivo, que perpetua uma história sem fundamento
como parte de uma estratégia para aumentar a audiência.
Voltando aos diálogos do episódio dos Simpsons, temos,
agora, o detalhe mais importante. Um dos homens diz: “Olha eu odeio ser o cara
que que estraga a festa, mas nós temos padrões. Isso não pode ser uma doença
inventada. A única coisa moral a fazer é lançar um vírus mortal no público em
geral". O líder da reunião responde o seguinte: "Temos algo em que
estamos trabalhando, mas ainda não foi testado”.
Ele então injeta uma seringa no representante da NBC, que
cai, aparentemente morto. Todos na sala dizem: "Uau. Uau! Oh sim! Então,
nós temos nossa doença mortal. Agora só temos que culpar algo que está em todas
as casas, algo que as pessoas já têm um pouco de medo”. Logo em seguida, corta
para uma notícia urgente na televisão, em que o apresentador diz: "A gripe
do gato doméstico está chegando, pessoal! O Centro de Desinformação de Doenças
prevê com algum grau de probabilidade que a gripe do gato doméstico irá
espalhar-se de forma rápida”. E o programa segue com o desenrolar da história.
Comparando com o que estamos vivendo hoje, será que se trata
de um exemplo da Programação Preditiva em ação?
Não. Mas tais coincidências nos oferecem uma oportunidade de
reflexão sobre os jogos de propaganda midiática que estamos vendo diante de
nossos olhos. Enquanto americanos culpam a China, e chineses afirmam que foi o
Pentágono que levou o vírus a Wuhan durante os Jogos Mundial Militares em
outubro de 2019, a mídia segue aumentando sua audiência. Em vez do gato
doméstico, temos o morcego, o pangolim e até um tigre do zoológico de Nova
York. O problema é real, vidas estão sendo perdidas e ainda não sabemos como
isso vai terminar. Mas uma coisa é certa: a guerra de propaganda segue forte
como nunca.
Daniel Lopez (@Daniel_L_Lopez no Twitter)
Teólogo, doutor em linguística e pastor da Bola de Neve
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