Aramis Ribeiro Costa*
Não
fosse essa tragédia que se abateu sobre a humanidade em forma de vírus, e
certamente a Academia de Letras da Bahia estaria celebrando, com pompas e
circunstâncias, o centenário de nascimento de Wilson Lins. A data é 25 de
abril, mas o ano nem sempre foi um ponto pacífico na biografia do jornalista,
político, escritor e acadêmico. É que havia, na primeira metade do século
passado, o costume de se alterar a data do nascimento em documentos e
informações biográficas, para atender a certas circunstâncias, como, por
exemplo, matricular-se em curso superior, emancipar-se, casar-se, e tantas
outras coisas. E o resultado é encontrarmos uma quantidade surpreendente de
pessoas que, durante toda a vida, tiveram duas datas de nascimento, a
verdadeira, oculta, e a inventada, a servir aos interesses.
Não sei o que aconteceu com a data de
nascimento de Wilson Lins, qual o motivo da duplicidade. O fato é que o ano de
1919 aparece em vários verbetes e informativos biográficos como o ano do seu
nascimento. Não foi por outro motivo, aliás, que publiquei um longo artigo
intitulado “O Escritor Wilson Lins” na Revista da Academia de Letras da Bahia
nº57, trazendo, no pé da página, a informação de que se tratava de “uma
homenagem do autor ao centenário de nascimento do acadêmico Wilson Lins,
nascido em 25 de abril de 1919”. Mas era engano. Meu e de muita gente. Wilson
nasceu, na verdade, em 1920.
Wilson Mascarenhas Lins de Albuquerque baiano de Pilão Arcado, foi uma dessas personalidades que, no seu tempo,
dispensava qualquer apresentação. Tornou-se, muito moço, redator-chefe do
jornal O Imparcial, de propriedade do seu pai Franklin Lins de
Albuquerque, quando também se fez cronista político. Fechado O Imparcial,
passou a exercer o jornalismo no Diário de Notícias, depois no Diário
da Bahia e, finalmente, em A Tarde. Os mais velhos ainda devem se
lembrar de Rubião Braz, o pseudônimo que fazia tremer os políticos da época com
sua mordacidade e sua aguda ironia.
Do
jornalismo passou à política, tendo sido deputado estadual por mais de uma
legislatura, presidente da Assembleia Legislativa de Bahia, secretário de
Educação e presidente do Conselho Estadual de Cultura da Bahia. Na Academia de
Letras da Bahia, para a qual foi eleito em 1967, ocupou a Cadeira número 38.
Não
fora eleito para a casa das letras por acaso. Mais do que um notável da Bahia,
tratava-se de um de seus maiores escritores. A obra que publicou em livro é
considerável e diversificada, passa por coletâneas de crônicas, ensaios, uma
novela, memória, mas, principalmente, é alicerçada em seis romances, cinco dos
quais poderiam figurar, sem nenhum favor, no cânone da literatura brasileira,
como exemplares no seu gênero.
E, de
fato, o são. Os Cabras do Coronel, O Reduto, Remanso da Valentia, Responso
das Almas e Militão sem Remorso, romances de coronéis e jagunços,
recriam uma dura realidade do sertão baiano no início do século passado,
realidade que fez parte da infância do autor, filho de pai coronel. Não fossem
as inexplicáveis barreiras que impedem a divulgação, para o resto do país, da
literatura produzida na Bahia, ao menos daqueles que daqui não saem, e esses
cinco romances de Wilson Lins estariam no catálogo nacional, ao lado dos de
Jorge Amado, Adonias Filho e Herberto Sales, o que vale dizer, ao lado do que
melhor se fez nesse gênero, na literatura brasileira e em qualquer outra.
...................
*Aramis Ribeiro Costa é ficcionista, poeta e orador de primeira
linha, fazendo uso da palavra serena e atraente. Membro efetivo da Academia de
Letras da Bahia, na qual exerceu o mandato de presidente por duas temporadas.
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