Autor de diversos títulos pela Editus, Editora da
Universidade Estadual de Santa Cruz (Bahia), Cyro de Mattos, em entrevista
concedida à Associação Brasileira de Editoras Universitárias, fala sobre um de
seus últimos livros, premiações literárias e a projeção global que elas
oferecem para o conteúdo de suas obras.
Cyro de Mattos é contista, poeta, cronista, ensaísta,
romancista e também autor de livros infantis. Já publicou mais de 50 livros no
Brasil e 14 no exterior, sendo 9 deles com o selo editorial da Editus -
Editora da UESC. No mês de setembro de 2014, o escritor foi agraciado com o
título de Doutor Honoris Causa pela UESC. Em sua trajetória, ele já recebeu
mais de 40 prêmios literários, entre eles o Vânia Souto Carvalho, concedido
pela Academia Pernambucana de Letras, com o livro “Berro de Fogo e outras
histórias”, que em 2013 ganhou nova edição pela Editora da UESC. Seu livro
“Vinte Poemas do Rio”, português-inglês, foi indicado para o vestibular da
Universidade Estadual de Santa Cruz, durante três anos, como também “O Conto em
Vinte e Cinco Baianos”, antologia que ele organizou.
Recebeu ainda prêmios da Academia Brasileira de Letras, Pen
Clube do Brasil, Associação Paulista de Críticos de Artes, Menção Honrosa no
Prêmio Jabuti e Menção entre os quatro finalistas no Concurso Internacional
Plural, México. Algumas de suas obras destacam a civilização cacaueira baiana
como um dos espaços do seu imaginário fecundo, no qual retrata a paisagem,
personagens, lugares, hábitos e histórias. Dois outros grandes acontecimentos
marcaram a vida do escritor. Foi eleito para a cadeira nº 22 da Academia
de Letras da Bahia, que tem como fundador Rui Barbosa, e o seu livro,
“Histórias dos Mares da Bahia”, antologia que ele organizou, foi lançado na 24ª
Bienal Internacional do Livro de São Paulo, no estande da Associação Brasileira
de Editoras do Nordeste - ABEU. A obra faz parte da Coleção Nordestina, projeto
editorial que reúne livros produzidos pelas editoras da ABEU Nordeste.
Essa coletânea reúne dezesseis escritores baianos, e, entre eles, João
Ubaldo Ribeiro, Hélio Pólvora, Ruy Espinheira Filho, Guido Guerra, Gláucia
Lemos e Aramis Ribeiro Costa. No ano passado, seu livro "Cancioneiro do
Cacau", Prêmio Nacional Ribeiro Couto da União Brasileira de Escritores
(Rio) e Segundo Prêmio Internacional Maestrale Marengo d’Oro, Gênova, Itália,
foi lançado na Bienal Internacional do Livro do Rio, em segunda edição.
1. As suas obras expressam muito da cultura do sul da Bahia,
com destaque especial para a civilização nascida ao longo do tempo pela
implantação da lavra cacaueira. Essas representações ganharam projeções internacionais
e também importantes premiações no cenário nacional. Como é ver o local de suas
criações ganhar uma projeção global? Como o senhor avalia pessoal e
profissionalmente essas importantes premiações?
Canta a tua aldeia e serás universal, disse o russo Tolstoi.
Para Fernando Pessoa, o genial poeta português, o melhor rio não era o Tejo,
mas o rio que passava ao pé de sua aldeia, porque era o rio de sua aldeia.
Houve quem observasse que o homem faz o lugar e não o contrário. E o lugar é
onde se registra a memória. O lugar tem sido motivação e símbolo para algumas
de minhas criações. Minhas origens e vivências locais têm sido uma das
vertentes de minhas produções em prosa e verso. Isso acontece quando às vezes,
das germinações à execução da ideia, tomo como ponto de partida minhas
vivências na infância, em outras vou buscar ou imaginar o assunto no cerne da
história, aproveitando o que vi, colhi dos mais velhos ou até pesquisei.
Pode até mesmo acontecer que imagine um espaço sem localização
geográfica, identificável com alguma parte do sul da Bahia, como no romance “Os
Ventos Gemedores”, no qual criei o condado de Japará para desenvolver a trama,
auscultar os personagens através de conflitos no drama. Assim, desde que
meu texto leve aos outros uma nova forma de conhecimento da vida, através da
linguagem que poetiza a vida, situações e gente com nervos e sentimentos, tendo
como resultado final um alcance universal e reconhecimento, aqui na região e
fora de nossas fronteiras, fico contente, torno-me menos incompleto na
existência, que para nós humanos é falha, limitada, precária, vulnerável, não
basta. É gratificante, um verdadeiro prêmio que é dado ao autor esse tipo de
reconhecimento. Acho sensato ser reconhecido em vida pelo meu trabalho, depois
de morto só serve para o orador, que passa como herói, ao ressaltar no
sepultamento as qualidades de quem se foi para sempre, não está mais neste
mundo, ficou submetido ao inexorável.
2. O senhor foi eleito para ocupar a cadeira 22 da Academia
de Letras da Bahia e recebeu o primeiro título de Doutor Honoris Causa da
Universidade Estadual de Santa Cruz pela sua contribuição à literatura e à
cultura. O que significam esses novos reconhecimentos na sua carreira literária?
São qualificações de meu trabalho no mais alto nível.
Sinto-me honrado, fortalecido, incentivado para continuar a jornada nessa
estrada solitária, a essa altura comprida. Nela, paro às vezes, olho para
trás, vejo à direita e à esquerda, sigo em frente com tantas vozes no peito,
dos outros, mas que no fundo são também minhas. Vou formando com elas e a minha
voz o diálogo necessário, o disfarce múltiplo que desfaz o real e projeta outra
realidade com novos sentidos, externa outra linguagem através dos sinais
visíveis da escrita, com seu poder metafórico intenso e de proliferação, que me
ajuda a sobreviver e a conhecer um tanto mais do que sou, entre o alegre e o
triste, o transitório e o permanente, o belo e o feio. Vou cumprindo uma
missão, usando as palavras para explicar o inexplicável, mas que é belo, com
suas verdades retiradas da vida, a ela devolvidas com razão e emoção, porque
assim deve ser.
3. O seu último livro, “História dos Mares da Bahia”, antologia
integrada por autores baianos, foi lançado na 24ª Bienal Internacional do Livro
de São Paulo, no estande coletivo da ABEU pela Editus. A publicação traz 16
contos de importantes escritores baianos, que revelam um cenário de muitas
histórias. Por que o mar como fonte de inspiração e ambientação? Como foi a
escolha dos autores?
Como se vê, sem esforço, trata-se de antologia temática. As
histórias têm como foco o mar da Bahia, que entra como o cenário, ora
interferindo no destino dos personagens, ora como elemento de composição da
paisagem humana. O mar é assim a fonte de inspiração e ambientação de cada
história. O mar sempre exerceu uma sedução e atração aos seres humanos. E, como
temos ficcionistas na Bahia da melhor qualidade, que souberam focar o mar como fonte
de suas criações, resolvi fazer uma antologia com o tema e com esses autores
expressivos. O critério da escolha dos contistas se deu em função da qualidade
do texto. Convenhamos que, como em toda a antologia, ocorre a omissão, mas os
autores selecionados para a coletânea “Histórias dos Mares da Bahia” são os
mais representativos do gênero na Bahia. Eu diria sem hesitar que são contistas
brasileiros da Bahia, fortes no discurso coeso. Com seus projetos
estéticos e resultados positivos, todos eles vêm contribuindo para que as
letras brasileiras operem como meio eficaz de comunicação humana em sua função
social.
* * *
Nenhum comentário:
Postar um comentário