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quinta-feira, 7 de novembro de 2019

A ILHA DOS MEUS FILHOS


Por Clare Boyd-Macrae
 Os bens mais valiosos que podemos dar a eles não podem ser comprados em lojas


         Toda Páscoa nossa família vai acampar com amigos no remoto trecho de um rio, a seis horas de carro da cidade. Como uma espécie de provação antes de atingirmos o objetivo, os últimos 20 quilômetros são de difícil acesso: uma trilha cheia de cascalhos descendo a montanha, com passagem para um só veículo e um precipício num dos lados. Se deparamos com outro carro, como em geral acontece, é preciso uma boa dose de negociação.

            Na descida dessa trilha, descortinam-se vistas magníficas do rio lá embaixo. Ziguezagueando sob a proteção dos picos cobertos por pinheiros, as margens brancas e as piscinas fundas naturais trazem lembranças de férias passadas.

            Então chegamos e, quando a irritante tarefa de montar o acampamento termina, damos início àquela o que é para nós a melhor semana do ano.

            Dessa vez fizemos algo diferente. As crianças descobriram uma ilha. Era pequenina, e elas a exploraram minuciosamente. Ali havia rochas, arbustos e um pequeno banco de areia com espaço suficiente para 6 crianças dormirem. o melhor de tudo: era uma ilha de verdade, cercada por águas rasas, mas velozes.

            Exultantes, as crianças pediram para dormir ali na última noite. Concordamos com a aventura, contanto que não se importassem de nós, os pais, dormirmos numa praia próxima, de onde as pudéssemos ver e ouvir.

            Jantamos cedo e atravessamos o rio, levando sacos de dormir, forros impermeáveis e lanternas até a ilha. Arrumamos o local para os meninos dormirem e juntamos lenha para a fogueira matinal. As crianças haviam examinado e dado nome a cada recanto e fresta da ilha, mostrando-nos tudo. Rocha Torre de Vigia, Bumbum de Neném (tão lisa quanto), Spa...

            Voltamos e preparamos o lugar na praia onde dormiríamos. Acendemos uma fogueira, abrimos uma garrafa de vinho e nos esparramamos na areia refrescante, conversando. Eu me sentia como uma adolescente deitada na praia com o namorado. Experimentava uma sensação de aventura.

            A cada meia hora, até às 20h30, as crianças acendiam uma lanterna para indicar que estava tudo bem. Em resposta nós gritávamos com animação e prazer, e dávamos boa noite através das corredeiras. Às 21 horas, tudo estava quieto e às 22h30, nós, os adultos, também nos deitamos. Acordei no meio da noite pensando ter ouvido um grito de criança, mas era apenas um pássaro. Fiquei ali deitada, olhando para as estrelas e a lua brilhante, ouvindo a música do rio e se sentindo o acalento da terra à minha volta. De manhã, minha filha de 13 anos disse que mal conseguira dormir de tanta felicidade.

            Crianças de sorte! Quando eu era pequena, tinha de me contentar com um “acampamento virtual”: devorava livros de aventura maravilhosos que meus filhos agora adoram. Mas eles têm também a experiência para valer: a vida no seio da mãe Terra. Aventura, coragem e responsabilidade com a segurança da presença dos pais por perto.

            Esses são os fatos que as crianças lembram com os olhos brilhantes e o peito estufado de orgulho, quando recordamos os bons momentos. Não o jogo de computador, o website da Internet ou a série de TV recentes, mas a magia - antiga como a própria humanidade – de barracas e fogueiras, de histórias e noites passadas sob as estrelas.

            Esses são presentes que podemos dar a nossos filhos como amuletos contra o desespero que tantos jovens sentem.

            São essas as lembranças que vão encantar sua infância, conduzi-los à idade adulta e aquecê-los na velhice.

                                               ..........
1999 CLARE BOYD-MACRAE AGE (1º DE AGOSTO DE 1999), 250 SPENCER ST., MELBOURNE, VICTORIA 3000, AUSTRÁLIA

(Reader’s Digest – Seleções – ABRIL 2000)

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