Solenidade de Pentecostes – Domingo, 09/06/2019
Anúncio do Evangelho (Jo 20,19-23)
— O Senhor esteja convosco.
— Ele está no meio de nós.
— PROCLAMAÇÃO do Evangelho de Jesus Cristo + segundo
João.
— Glória a vós, Senhor.
Ao anoitecer daquele dia, o primeiro da semana, estando
fechadas, por medo dos judeus, as portas do lugar onde os discípulos se
encontravam, Jesus entrou e, pondo-se no meio deles, disse: “A paz esteja
convosco”. Depois dessas palavras, mostrou-lhes as mãos e o lado. Então os
discípulos se alegraram por verem o Senhor. Novamente, Jesus disse: “A paz
esteja convosco. Como o Pai me enviou, também eu vos envio”. E, depois de
ter dito isso, soprou sobre eles e disse: “Recebei o Espírito Santo. A
quem perdoardes os pecados, eles lhes serão perdoados; a quem não os
perdoardes, eles lhes serão retidos”.
– Palavra da salvação.
- Glória a Vós, Senhor!
Ligue o vídeo abaixo e acompanhe a reflexão do Pe. Paulo
Ricardo:
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Pentecostes: de portas abertas
“...estando fechadas as portas do lugar onde os discípulos
se encontravam, por medo dos judeus...”
Lembremo-nos que, no domingo passado, após a Ascensão, os
discípulos retornaram ao Templo de Jerusalém: “E estavam sempre no Templo,
bendizendo a Deus” (Lc 24, 53). Isso quer dizer que eles ainda não estavam em
movimento; eles não tinham tomado consciência de que eram habitados pelo Espírito
Santo e que deviam sair do Templo para partir em missão. No entanto, em
Pentecostes eles se deram conta de que deviam sair do Templo para transmitir o
Sopro de vida (vento), para reunir no Amor todos os povos (fogo) e para
comunicar a todos o Amor universal (línguas). A presença do Espírito rompeu os
espaços atrofiados e os fez viver de portas abertas. Esta é a missão do
Espírito Santo.
A Igreja, como povo de Deus, cheia de graça e de verdade,
hoje se veste de festa porque está celebrando seu nascimento. Ela finca suas
raízes no acontecimento de Pentecostes quando o Pai, por seu Filho, envia o
Espírito da verdade e da vida à humanidade. Os discípulos receberam a força do
Espírito em um contexto de debilidade e de medo. As portas estavam fechadas, no
meio do mundo, por temor. E é no meio desse mundo desafiador e do medo
paralisante que o Espírito rompe as portas e destranca as janelas; o que era
realidade fechada e assustada se converte em comunidade “em saída”, apostólica,
missionária.
O Ressuscitado cumpre a promessa definitiva: envia seu
Espírito. Espírito de vida e confiança, de fortaleza e verdade, de amor e
graça. É o Espírito da liberdade, que arranca as portas dos temores e das
seguranças e abre as janelas para deixar entrar o vento que faz viver o risco
no amor comprometido; é o Espírito do fogo que aviva a luta pela dignidade e a
possibilidade da reconciliação do ser humano ferido com o Deus providente e
curador, que se revela como compaixão e misericórdia; é o Espírito que torna
possível outro mundo, que ativa o cuidado para com a natureza: a ecologia que
se faz comunhão e se humaniza, frente ao medo da destruição do universo e
daqueles que o habitam.
Com sua presença rompedora, o Espírito enche a casa onde os
discípulos estavam juntos. Ele não se deixa sequestrar em certos lugares que
dizemos “sagrados”. Agora “sagrada” torna-se a casa: a minha, a tua e todas as
casas são o espaço privilegiado da ação Espírito. Ele vem de imprevisto, e nos
apanha de surpresa, pois nem sempre estamos preparados para deixar-nos conduzir
por Ele. O Espírito não suporta esquemas, rompe o que está programado, é um
vento de liberdade, fonte de vida expansiva.
Um vento que sacode nossa casa, que a enche de luz e segue
adiante, que traz pólens de primavera e dispersa a poeira, que traz fecundidade
e dinamismo para o interior de cada um, «esse vento que faz nascer os
garimpeiros de ouro» (G. Vannucci).
Vivemos um permanente Pentecostes. Quando sentimos medo é
porque nos centramos em nós mesmos, nos auto-referenciamos, e a realidade nos
força a buscar refúgio e proteção. Nossa fragilidade e a violência do mundo nos
alarmam e buscamos segurança e conservação. Mas isso dificulta anunciar o
evangelho, levar a boa notícia ao mundo e impede nossa própria realização como
cristãos, pois apaga nossa criatividade e esvazia nossa presença inspiradora.
Celebrar Pentecostes é acreditar que “outra igreja é possível”, que temos de
superar nossos medos para construir e ser a comunidade da confiança, aquela que
se arrisca na missão e no exercício da misericórdia, aquela que se descobre
como fermento no meio da massa e leva a alegria do evangelho.
O medo, a obscuridade e o fechamento da “casa interior” se
transformam, agora com a presença do Espírito, em paz, alegria e envio
missionário. São sinais palpáveis da ação misteriosa e transformante do
Espírito no interior de cada um e da comunidade.
Na vida cristã, ser espiritual faz referência ao Espírito de
Deus. “Espirituais”, de algum modo, somos todos, mas a chave para deixar que
essa dimensão da vida cresça está em facilitar que, dentro de nós, o Espírito
de Deus tenha espaço para mover-se, ressoar e suscitar inquietações. Não se
trata de que, ao habitar-nos, o Espírito nos invada. Antes, trata-se de uma
convivência que potencia o melhor de nós mesmos, que faz que a solidão seja
habitada e mantém os sentidos muito mais alerta.
O Espírito ressoa na oração, na atividade, ao ver o
noticiário, ao dar um abraço, ao ler um livro, em uma canção, ao contemplar um
quadro, fazendo um passeio, escutando alguém que nos fala de sua vida... Ressoa
na história e na imaginação que nos convida a sonhar um futuro melhor. Ressoa
no encontro humano. E, sob seu impulso, amadurecem em cada um de nós aquelas
atitudes que nos levam a viver com mais plenitude: compaixão, justiça, verdade,
amor...
A violência, a injustiça, a intolerância e o preconceito em
todos as instâncias da sociedade atual nos enchem de medo, desalento e
desesperança. Não vemos saída e preferimos fechar-nos em nós mesmos, em nossos
ambientes mofados e práticas religiosas alienadas, esquecendo-nos do grande
movimento de vida desencadeado por Jesus, conduzido pelo Espírito de vida. É
este mesmo Espírito que irrompe em nosso interior, transpassa as portas do
coração e ilumina o entendimento para que compreendamos a novidade do Evangelho
e tenhamos presença diferenciada no contexto em que vivemos.
Deixar-nos habitar pelo Espírito implica romper a bolha que
asfixia nossa vida e derrubar os muros que cercam nosso coração e atrofia nossa
própria existência. A mudança de mente, de coração, de esperança, de
paradigmas... exige que todos, em tempos de Pentecostes, revisemos nossas
vidas, conservando umas coisas, alterando outras, derrubando ideias fixas,
convicções absolutas, modos fechados de viver... que impedem a
entrada do ar para arejar o próprio interior.
Nada mais contrário ao espírito de Pentecostes que uma vida
instalada e uma existência estabilizada de uma vez para sempre, tendo pontos de
referência fixos, definitivos, tranquilizadores... Numa vida assim faltaria por
completo o princípio da criatividade, a capacidade de questionar-se, a audácia
de arriscar, a coragem de fazer caminho aberto à aventura.
Há em todo ser humano uma tendência a cercar-se de muros, a
encastelar-se, a criar uma rede de proteção. Também os cristãos não estão
imunes a esta tentação. A cultura da indiferença edifica uma barreira
intransponível entre nós e os outros. Tornamo-nos uma ilha sem vida e triste,
negamos a condição criatural de vivermos ao lado dos diferentes, nossos semelhantes.
Em nós, a indiferença, a intolerância e a violência são sintomas de
desumanização. E essa desumanização é tanto prejudicial a nós quanto às outras
pessoas. Todo mundo perde. Aos poucos, nos recolhemos em nossos medos, em
nossas inseguranças e começamos a acreditar que os diferentes são nossos
inimigos. A partir de nossa reclusão religiosa, social, política..., passamos a
divulgar discursos fascistas, alimentar práticas fundamentalistas de
segregação, apoiar-nos em moralismos estéreis...
O Espírito de Pentecostes nos desarma e nos capacita a viver
a cultura do encontro; isso significa desenvolver a própria capacidade de
contemplação, de compaixão, de assombro, escuta das mensagens e dos valores
presentes no mundo à nossa volta. Ela ativa uma relação sadia com todos; o
centro se expande em direção aos outros e à criação, fazendo-nos viver uma
conexão livre com toda a realidade, através da íntima solidariedade e do
compromisso ativo.
Texto bíblico: Jo 20,19-23
Na oração: Quê sinais da presença dinamizadora do
Espírito de Deus você pode perceber em sua vida pessoal, familiar e
comunitária?
Você conhece pessoas que atuam sob a ação do Espírito? Por
quê? Quê você pode fazer para descobrir e potenciar os dons e ministérios que o
Espírito continua suscitando nas pessoas e comunidades?
- Faça um tempo de oração mais profunda, procurando escutar
as moções que o Espírito suscita em seu interior e que talvez não tenha
condições de escutar na pressa diária.
- Que portas você mantém fechadas? Que portas continuam
fechadas nas igrejas? São portas, ou se converteram em fronteiras? Por medo de
quê? De quem?
Pe. Adroaldo Palaoro sj
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