5 de outubro de 2018
♦ Mons.
José Luiz Villaça
Resposta — Atendo com muito gosto ao pedido do
consulente, frisando de antemão que minha resposta não tem nenhum caráter
político-partidário; trata-se apenas de uma orientação teórica para as
consciências a respeito do reto exercício dos direitos e obrigações dos fiéis
na sua participação na vida pública.
Deve-se de início ressaltar que os cidadãos são moralmente
corresponsáveis pela sociedade em que vivem, de modo especial numa
democracia, na qual são convocados para eleger representantes que irão reger e
legislar em seu nome. Não devem esquecer que a finalidade da votação deve ser,
em última análise, a promoção do bem comum da sociedade.
A qualidade de um candidato, seja qual for o cargo público
que pleiteie ocupar, não deve ser medida apenas com base em sua personalidade
(simpatia, facilidade para falar em público, habilidade em gestão
administrativa, etc.), mas também com base na sua personalidade pública: os
princípios e os programas que ele pretende desenvolver para promover o bem
comum.
Valores que um candidato não pode desprezar
A proteção da vida humana inocente
desde a concepção até a morte natural,
uma das condições para um católico votar em consciência
desde a concepção até a morte natural,
uma das condições para um católico votar em consciência
O Catecismo da Igreja Católica menciona os componentes
essenciais do bem comum: os direitos fundamentais e inalienáveis da pessoa
humana (nº 1907); o bem-estar social e o desenvolvimento da sociedade,
incluindo a educação, a cultura, o trabalho, a saúde, etc. (nº 1908); a paz e a
segurança cidadã (nº 1909). Portanto, a ordem social “tem por base a
verdade, constrói-se na justiça e é vivificada pelo amor” (nº 1912).
Existe uma hierarquia entre esses componentes do bem comum:
alguns são essenciais e não negociáveis, outros são contingentes e
permitem várias propostas. Logicamente, os valores não negociáveis devem ter
primazia nas preferências dos eleitores católicos, porque dizem respeito a
valores essenciais da pessoa humana e da vida social, cuja violação é um mal
intrínseco e não pode ser justificado por nenhum motivo ou circunstância. A
posição de um candidato a respeito dos valores não negociáveis deve ser, portanto,
o critério essencial para julgarmos sua aptidão para ocupar um cargo público.
Atualmente os valores não negociáveis para um
eleitor católico são:
*A proteção da vida humana inocente desde a concepção até a
morte natural;
*O reconhecimento e a promoção da estrutura natural da
família, baseada no matrimônio indissolúvel entre um homem e uma mulher;
*A proteção do direito primário dos pais de educar seus
filhos (cfr. Papa Bento XVI – discurso a um grupo de parlamentares europeus em
30-3-06).
Critérios básicos para bem eleger
Reconheço que, para muitos leitores, escolher em quem votar
é uma tarefa por vezes difícil. Mas determinar em quem não votar é
relativamente fácil, pois são todos os candidatos que promovem o desrespeito e
a violação dos mencionados valores não negociáveis. Tais candidatos são
inimigos do bem comum, e sua eventual eleição para os cargos que disputam
causaria muitos males ao Brasil e aos direitos dos seus habitantes.
Alguém poderia perguntar: Quais são os princípios morais que
obrigam os eleitores, em consciência, a excluir do voto os candidatos
favoráveis ao aborto, às uniões homossexuais ou à ideologia de gênero?
O fundamento é triplo.
Primeiro, porque a regra fundamental da moralidade é fazer o
bem e evitar o mal. Mas para isto ser factível é preciso sabermos quais os bens
que devem ser procurados e, acima de tudo, os males que devem ser evitados.
Segundo, porque os critérios que permitem fazer tais
discernimentos entre o bem e o mal nos são dados pela moral católica, com base
nos Mandamentos de Deus e na Lei natural: “O Deus Criador é, de fato, a
única e definitiva fonte da ordem moral no mundo por Ele criado. O homem não
pode por si mesmo decidir o que é bom e o que é mau, não pode ‘conhecer o bem e
o mal, como Deus’” (João Paulo II, encíclica Dominum et vivificantem,
nº 36).
Segue-se daí, em terceiro lugar, o que escreve São
Boaventura: “A consciência é como o arauto de Deus e o seu
mensageiro; e o que ela diz não provém dela própria, mas provém de Deus, à
semelhança de um arauto quando proclama o edito do rei. Disto deriva o fato de
a consciência ter a força de obrigar” (João Paulo II, encíclica Veritatis
Splendor, n° 58).
Portanto, os eleitores católicos devem votar de acordo com a
sua consciência, mas primeiro formá-la segundo os ensinamentos de Jesus Cristo
e do Magistério da Igreja perene. Não devem seguir as modas do mundo, nem as
inovações de alguns falsos teólogos descarrilados.
As leis humanas, de fato, só obrigam em consciência quando
são justas. Quando prescrevem algo intrinsecamente imoral, seu cumprimento não
é obrigatório, pelo contrário, é pecado obedecê-las (cfr. Atos 5,29). É
intrinsecamente injusto (ou seja, é pecado, e pecado grave) elaborar uma lei
semelhante ou votar a seu favor.
Não se pode contribuir com práticas imorais
Duas condições não negociáveis para se pensar ao votar em
alguém:
o reconhecimento e a promoção da estrutura natural da família,
baseada no matrimônio indissolúvel entre um homem e uma mulher,
e a proteção do direito primário dos pais de educar seus filhos.
o reconhecimento e a promoção da estrutura natural da família,
baseada no matrimônio indissolúvel entre um homem e uma mulher,
e a proteção do direito primário dos pais de educar seus filhos.
Alguém poderá objetar como sendo exagerado proibir por tais
motivos o voto em candidato que é bom em outras coisas. Respondemos que não é
exagerado, porque votar em um candidato que promove a violação dos
valores não negociáveis equivale a colaborar formalmente com a
prática dos inúmeros pecados que resultarão da aprovação legal de tal violação
da ordem moral. Equivale também a contribuir para a deformação moral de toda a
população, pois a ordem legal tem natureza pedagógica.
No caso específico do aborto, votar por um candidato
pró-aborto equivale a associar-se ao que já foi qualificado pelo Concílio
Vaticano II como crime abominável (Constituição Gaudium et Spes,
nº 51). “A Igreja afirmou, desde o século I, a malícia moral de todo o
aborto provocado. E esta doutrina não mudou. Continua invariável. O aborto
direto, isto é, querido como fim ou como meio, é gravemente contrário à lei
moral”, afirma categoricamente o Catecismo da Igreja Católica (n ° 2271).
Coerência entre vida privada e vida pública
Além dessas regras gerais de moral, cumpre ainda respeitar
algumas normas elementares de prudência na escolha dos candidatos. Tanto mais
isso é necessário quando se constata que grande parte dos nossos políticos não
é transparente quanto às suas verdadeiras convicções no âmbito da moral, menos
até do que no manejo dos fundos públicos. A vida pública nacional tem mostrado
claramente isso nos últimos anos. Por isso, recomendo vivamente aos leitores
investigar qual é a posição dos candidatos em relação aos valores não
negociáveis mencionados acima. Não basta confiar na ideia simplória de que
o candidato deve ser bom, se figura na lista do partido no qual se costuma
votar. E se algum candidato ainda não manifestou o que pensa sobre o aborto, as
uniões homossexuais, a ideologia de gênero, etc, é necessário pedir-lhe que se
explique publicamente.
Devo lembrar que alguns candidatos se afirmam católicos e
dizem que se opõem a essas práticas abomináveis, mas na realidade tomaram
iniciativas em favor delas; ou também não estão dispostos a apoiar a sua
revogação. Recomendo que desconfiem especialmente desses candidatos com posição
ambígua ou contraditória, que afirmam distinguir entre sua vida privada e sua
vida pública, entre suas opiniões privadas e suas condutas públicas. Porque
contradizer na vida pública a fé e a moralidade que se declara ter na vida
privada revela, no melhor dos casos, uma espécie de esquizofrenia espiritual,
como salientou Bento XVI. Ou senão, um simples abuso da etiqueta de católico
para angariar mais votos.
Finalmente, aconselho a todos rezarem a Nossa Senhora
Aparecida, Rainha e Padroeira do Brasil, para que nos proteja e impeça que os
valores não negociáveis sejam violados na Terra da Santa Cruz.
* * *
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