18 de julho de 2017
Paulo Henrique Américo de Araújo
No vocabulário de expressões modernas surgiu mais uma
novidade: o jogo da “Baleia Azul”.
Ao contrário do que o nome “Baleia Azul” sugere, não há
inocência por detrás de tal brincadeira. Ela pode até levar um jovem ao
suicídio, caso a vítima aceite os desafios propostos por um desconhecido online,
controlador do jogo.
No mês de maio último, a polícia encontrou alguns
adolescentes à beira de uma rodovia no Distrito Federal1. Chorando de
desespero, eles procuravam cumprir a última etapa da “baleia azul”: atirar-se
na frente de um ônibus em alta velocidade!
Em outros casos, não houve tempo de salvar a vítima.
A onda do macabro jogo é provavelmente passageira e parece
que vai saindo “de moda”. Mas um assunto de maior vulto relaciona-se
diretamente com ele. Por que adolescentes suicidam-se cada vez mais?
Calculando a dimensão do problema
Segundo recente artigo da BBC Brasil2, um estudo baseado em
dados oficiais do Sistema de Informações de Mortalidade (SIM), do Ministério da
Saúde, revela dados preocupantes. A primeira informação: considerando toda a
população brasileira, entre 1980 e 2014, houve um aumento de 60% na taxa de suicídios.
Quanto aos dados relativos à população jovem, o mesmo artigo
reproduz o que diz o estudo: “Em 1980, a taxa de suicídios na faixa etária
de 15 a 29 anos era de 4,4 por 100 mil habitantes; chegou a 4,1 em 1990 e a 4,5
em 2000”. Já no período entre 2002 e 2014, a taxa subiu de 5,1 para 5,6
por 100 mil habitantes. O estudo conclui: “Assim, entre 1980 a 2014, houve
um crescimento de 27,2%” na taxa de suicídios, considerando a mesma faixa
de idade.
Para se ter uma ideia mais concreta do que tais números
representam, a mesma pesquisa mostra que em 2014, houve, somente no Brasil,
2.898 suicídios de jovens de 15 a 29 anos.
Insisto, pois a questão se impõe: por que tantos jovens
acabam com a própria vida?
É importante fazer notar, antes de tudo, que o artigo citado
tenta fornecer algumas respostas à pergunta acima, usando declarações de
diversos sociólogos e psicólogos. Segundo esses especialistas, “o problema
é normalmente associado a fatores como depressão, abuso de drogas e álcool,
além das chamadas questões interpessoais, violência sexual, abusos, violência
doméstica e bullying”.
De fato, podemos encontrar tais causas por detrás dos
suicídios. Contudo, o que impele um jovem a usar drogas, por exemplo, ou o que
ocasiona sua depressão? Qual é a raiz da violência doméstica?
A falta da noção do sofrimento na vida
O mais fundo do problema reside, sem dúvida, na decadência
moral generalizada do mundo contemporâneo. Essa decadência afeta diretamente a
constituição da família. Se a família se desfaz, é inevitável a propensão do
jovem para as drogas e a violência, de um lado; e sua menor capacidade, por
outro lado, de suportar as dificuldades quotidianas, cujo desfecho pode ser a
depressão.
Há mais um fator, ignorado pelo artigo da BBC: o mundo
contemporâneo oferece sem cessar múltiplos divertimentos e prazeres. Sendo a
juventude o grupo que mais deveria se “beneficiar” deles, a lógica conclui que,
quanto mais jovem, maior o desejo de aproveitar a vida e, portanto, mais
afastada a hipótese de suicídio.
Contudo, não é o que ocorre na prática. E aqui fica
desmascarada uma grande ilusão de nossos dias: quanto mais gozo da vida, mais
felicidade. Se assim fosse, deveria haver menos suicídios, sobretudo entre os
jovens.
Volto ao jogo da “Baleia Azul”. Supostamente, jovens
conectados à internet têm diante de si possibilidades ilimitadas de
entretenimento. Diversões fáceis e constantes, sempre mais almejadas. No
banquete frenético de diversões aparece outra: um jogo de desafios cada vez
mais ousados. O último deles termina em suicídio.
Assim, a saturação dos prazeres leva à frustração, a qual,
por sua vez, provoca a busca intensa de novidades e entretenimento. Diversões,
festas e jogos em demasia… decepção, desespero, suicídio!
E não adianta dizer que os suicídios atingem jovens das
classes baixas ou com menos oportunidades na vida. O artigo mencionado
demonstra que jovens considerados de elite, como estudantes de medicina,
pertencem também às estatísticas de suicídio. E não nos esqueçamos do grande
número de viciados em drogas entre a juventude das classes mais altas.
Revela-se aqui uma das maiores causas do suicídio juvenil: a
hipertrofia dos prazeres — incentivada pela grande mídia e pela pedagogia
moderna, como o ensino da chamada Ideologia de Gênero —, que além de
rejeitarem e negarem a ideia do sofrimento e, por conseguinte, do pecado, criam
um circuito de ilusões na mente dos jovens. O pecado leva a outro pecado, e
como consequência surge o fantasma dos problemas de consciência, sofrimento
interior… suicídio!
A admirável lição de Santa Teresinha
O que fazer diante dessa constatação? Talvez uma rápida
lição de santidade deite um pouco de luz nessas sombras.
Abro a famosa História de uma Alma, autobiografia de
Santa Teresinha do Menino Jesus, e leio o seguinte trecho sobre sua
juventude: “Tudo, ao redor de mim, era alegria e felicidade; eu era
festejada, acariciada, admirada, numa palavra, [...] minha vida foi semeada só
de flores… Confesso que esta vida tinha encantos para mim”3.
A “pequena santa” de Lisieux reconhece os atrativos e os
prazeres da juventude. Mas logo adiante — algo negado à juventude moderna — vem
a reflexão serena e coerente: “Aos dez anos o coração deixa-se
facilmente fascinar, por isso considero uma grande graça não ter ficado em
Alençon; os amigos que tínhamos aí eram muito mundanos, [...] Não pensavam
bastante na morte e, no entanto, a morte veio visitar um grande número de
pessoas jovens, ricas e felizes, que conheci!!!”.
Eis aí uma lição a ser ensinada aos jovens de hoje. Os
momentos de felicidade são transitórios e muitas vezes ilusórios. A vida não se
constitui só de prazeres. E estes devem ser moderados e regulados segundo a
moral. É necessário ter diante de si as dificuldades e os sofrimentos de todos
os dias. Saber enfrentá-los reverte-se em eficaz remédio contra a frustração, o
desespero, e, por fim, o suicídio.
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Notas:
Manuscritos autobiográficos, 2ª edição, Cotia – SP, 1960, p.
100.
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