Um Arraial Alegre
O arraial
do Salobrinho era realmente um lugar assaz divertido. O seu povo era alegre e
folgazão, tendo na expressão a singeleza das coisas imaculadas. Tudo ali estava
bem, e as pessoas viviam individualmente, livres do fantasma do medo, da inveja
e da arrogância. Ninguém criticava, discriminações não havia, tudo era belo e
risonho.
Havia brincadeiras
das mais variadas, sem agressões e desprovidas da maldade. A alegria de viver
era a tônica principal, e as festas tradicionais eram comemoradas com mais
vida, mais calor e mais entusiasmo, a exemplo dos ternos-de-reis, promovidos
por Dona Pureza, uma sergipana muito alegre e descontraída. Havia os ensaios,
os preparativos para que tudo ficasse direitinho e, no dia de santos reis, lá estava
Dona Pureza e família arrastando a multidão às ruas.
Quantas recordações
das festas juninas! Fogueiras enormes crepitavam por toda a noite, iluminando
as ruas escuras do arraial, além dos balões que coloriam o céu ante os olhares
fascinados das crianças.
No período
carnavalesco, cordões e batucadas tomavam conta do lugar. Blocos disputavam
entre si o primeiro lugar, porque cada qual queria melhor mostrar o seu
trabalho, por isso havia sempre algumas brigas sem maiores consequências. Certa
ocasião, o encontro de dois blocos, na Rua do Zinco, redundou numa grande
confusão. As porta -bandeiras aproveitaram
o ensejo para extravasarem uma antiga rixa. Nunca vi tamanha balbúrdia... E o
saldo daquela parafernália foi muita gente com a cara quebrada, pois a briga
envolveu quase todos os foliões.
Os blocos pertenciam a Amândio Arouca e a Dona
Dudu. Apesar dos incidentes desagradáveis que às vezes aconteciam, tudo era
considerado como natural, porque só se verificavam estas coisas em épocas
festivas, assim mesmo quando alguém se excedia na bebida, para provocar
desordens. No mais, tudo transcorria normalmente, sem nenhum problema. As
festas natalinas eram promovidas com muito esmero e cuidado: ao longo das
pracinhas, viam-se dezenas de barracas, que vendiam adereços, bolas de soprar e
uma variedade de brinquedos, enquanto outras sorteavam objetos domésticos.
No ar, uma
música lenta se fazia ouvir... Era o serviço de alto-falante “A Voz do
Salobrinho” que, sob o comando do Mestre Leal , tocava uma música suave do Natal e anunciava aos quatro ventos,
convidando o povo para a missa do galo. Aquele serviço de comunicação foi um
marco importantíssimo na história do Salobrinho. Através dele, conseguiram-se
inúmeros benefícios em prol da comunidade.
No que se
refere às datas comemorativas, creio que foi válida a nossa modesta participação, porque muitas
vezes promovemos festinhas alusivas aos dias das mães, das crianças e dos namorados.
Em frente ao Grupo Escolar Herval Soledade, alegrávamos as crianças do arraial
com programas de calouros, à proporção em que distribuíamos presentes para a
meninada.
O anoitecer
ali era sereno e mais bonito, porque através do serviço de alto-falante ,
podíamos retransmitir A VOZ MARIANA, um programa religioso que havia na Rádio
difusora Sul da Bahia, da cidade de Itabuna e que era levado ao ar todos os
dias às dezoito horas. Aos domingos, moças e rapazes solicitavam músicas
apaixonadas; quando havia aniversários, casamentos, batizados, aumentavam os
pedidos musicais, que deixavam o Salobrinho embevecido.
(SALOBRINHO - ENCANTOS E DESENCANTOS DE UM POVOADO)
Sherney Pereira
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