02/06/2017
Rodrigo Casarin
Depois que um dono de circo agrediu Joãozinho, seu irmão
menor, que Dioguinho, então com cerca de 20 anos, entrou para o mundo do crime.
Foi tirar satisfações e, durante a discussão, deu uma facada no peito do homem,
que logo morreu... Na justiça, alegou que tinha agido em legítima defesa, falou
que o rival havia sacado uma arma de fogo e, por isso, foi obrigado a
esfaqueá-lo antes de ser baleado. A história colou.
Diogo da Rocha Figueira nasceu no mês de outubro de 1863, em
Botucatu, cidade do interior de São Paulo, região que transformaria o seu nome
em uma lenda do final do século 19. Na ficha de Dioguinho constam ao menos 24 assassinatos...
mas há quem especule que a quantidade de pessoas mortas pelo homem ultrapasse a
centena. Alternando acertos de contas pessoais e crimes sob encomenda, a fama
do bandido se espalhou rapidamente pelos campos paulistas.
Mas Dioguinho não era
um simples assassino. Agrimensor, também trabalhava em fazendas de café e por
isso lidava com alguns dos homens mais poderosos do país. Os bons contatos lhe
garantiam tanto encomendas de serviços macabros quanto a garantia de que a justiça
não lhe colocaria atrás das grades.
Matava usando porretes, facões ou armas de fogo, compôs um
grupo de bandidos para garantir o sucesso das ações e, após cada aniquilação,
arrancava a orelha da vítima, pedaço do corpo que servia para provar que o serviço
encomendado do tinha sido executado. Dessas ironias típicas da história
brasileira, o contato com gente influente fez com quem Dioguinho chegasse a ser
nomeado oficial de justiça.
Somente quando abraçou uma tramoia que envolvia os próprios
poderosos que o mundo criminoso de Dioguinho ruiu. Após cometer mais um
assassinato, seu grupo violentou uma mulher, que acabou viajando para São Paulo
para dar queixa contra os bandidos. Tinham ido longe demais. Policiais da
capital partiram em busca daqueles meliantes caipiras. Era final de abril de
1897.
Encontraram o grupo próximo ao rio Mogi Guaçu, trocaram
tiros, mataram alguns e viram Dioguinho fugindo em uma canoa. Por mais que
tenham alvejado a embarcação, não conseguiram acertar o principal alvo, que pulou
na água e sumiu. Os policiais garantiram que mesmo assim Dioguinho estava
morto, mas jamais acharam seu corpo. Histórias dão conta de que muitas pessoas
o viram depois disso em diversos lugares do país.
HQ inspirada no matador de aluguel
A história do lendário bandido já inspirou filmes e livros,
como “Dioguinho – O Matador de Punhos de Renda” (Casa Amarela), do jornalista
João Garcia, que passou cinco anos investigando os passos do assassino. Agora,
uma nova representação da trajetória do matador de aluguel chega às livrarias:
“Cão”, graphic novel de Breno Ferreira publicada pela Mino.
“Desde de pequeno escuto relatos sobre o tal do Dioguinho e
outras histórias parecidas com a dele nos encontros da família no interior.
Esses causos sempre me interessaram, são daqueles contos que te prendem na
cadeira do começo ao fim, algo mágico da narrativa oral”, diz o autor que, ao
se aproximar das passagens relacionadas ao bandido, percebeu que poderia ser
uma boa desenhá-las. “De um certo modo, eram bem pitorescas as atrocidades que
o cara cometia.
“Cão” é a primeira HQ longa produzida por Breno, que nasceu
e foi criado no interior de São Paulo – primeiro em São José dos Campos, depois
em Limeira. Desde 2012 ele atua como quadrinista, publicando tiras da websérie
“Cabuloso “Cabuloso Suco Gástrico” – que também já saiu em livro pela editora
Elefante – e atuando junto ao coletivo Miolo Frito.
Para escrever e desenhar a história de Dioguinho, o artista
conta que desde as primeiras pesquisas ficou claro que tudo relacionado ao
assassino é uma espécie de mistura entre a realidade e as lendas que foram
criadas com seu nome. “Isso acontecia em quase todos os materiais que
encontrei, e era o que mais me interessava. Tem a ver, acho, com essa questão
de ser uma história antiga e com poucos documentos disponíveis, o boca a boca
substituiu as escrituras. Ainda bem, porque a coisa toda ganha muito com essa
dualidade entre ficção e realidade”.
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